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TERRA DE TODOS NÓS!

Texto: Acácio Carreira


1ª CENA – (Entrada da trupe Malacubacos, ao som de uma música instrumental “forte”, depois
altera a música para xique xique.)

ESCALAFOTE: Esperem! Que lugar é esse?

VENANCIO: Deixe-me ver, pelos meus cálculos, pela velocidade do vento, pelo cheiro de rio,
afragância das palmeiras... Bom, não sei!

TODOS: Aaah!

SENFIRA: Painho, por que o senhor não olha no mapa?

ESCALAFOTE: Mapa?!

GERBERA: É meu irmão, temos uma mapa.

TODOS: É, um mapa... um mapa... mapa.

ESCALAFOTE: Certo! Temos um mapa. E onde está esse bendito mapa?

SENFIRA: Está com Ximoco.

ESCALAFOTE: Ximoco!!! O mapa, quero ele em minhas mãos agora!

(Ximoco se atrapalha para pegar o mapa, por que está carregando as malas e bolsas)

PROFÁCIO: É um atrapalhado mesmo. Me dá aqui esse mapa!

(Escalafote tenta ver o mapa, mas Profácio não deixa)

PROFÁCIO: Vejamos... Estamos exatamente, em... Em... Hum! Em...

TODOS: Em...???

PROFÁCIO: Ca...

TODOS: Ca...???

PROFÁCIO: Hum, Ca...

TODOS: Ca...???

PROFÁCIO: Não sei dizer o nome deste lugar!

ESCALAFOTE: Pois me dê cá. (Escalafote tenta ler o nome com muita dificuldade)
Caiú... Catu... Caratu...

(Todos tentam falar o nome “Carutapera”, e não conseguem).

SENFIRA: Carutapera!

TODOS: Ãnh???

SENFIRA: Carutapera.

(Todos riem)

MURIEL: Que nome mais engraçado. Como é mesmo.. Caiu tua perna?

(Todos riem)

ZENDAYA: Caratupera?

(Todos riem)

SENFIRA: Carutapera!
TODOS: Ãnh???

SENFIRA: Carutapera. Carutapera é o nome deste lugar.

VENANCIO: Mas que é estranho isso é.

ESCALAFOTE: É estranho sim, é diferente, é autêntico! E por isso que passando por aqui,
vindo de qualquer lugar, de lugar nenhum, vamos contar a história deste lugar. Carutapera
vai virar espetáculo!

TODOS: Iêta!

SENFIRA: Oxente, a gente vai ter que pensar como que vai ser painho.

ESCALAFOTE: “O mundo não se faz para pensarmos nele.”


O meu olhar é nítido como um girassol.
Tenho o costume de andar pelas estradas
Olhando para a direita e para a esquerda,
E de, vez em quando olhando para trás...

MURIEL: E o que vejo a cada momento


É aquilo que nunca antes eu tinha visto,
E eu sei dar por isso muito bem...

PROFÁCIO: Sei ter o pasmo essencial


Que tem uma criança se, ao nascer,
Reparasse que nascera deveras...
Sinto-me nascido a cada momento
Para a eterna novidade do Mundo...

ZENDAYA: Creio no mundo como num malmequer,


Porque o vejo. Mas não penso nele
Porque pensar é não compreender ...

ESCALAFOTE: O Mundo não se fez para pensarmos nele


Mas para olharmos para ele e estarmos de acordo...

VENANCIO: Eu não tenho filosofia: tenho sentidos...


Se falo na Natureza não é porque saiba o que ela é,
Mas porque a amo, e amo-a por isso,

GERBERA: Porque quem ama nunca sabe o que ama


Nem sabe por que ama, nem o que é amar ...

TODOS: Amar é a eterna inocência,


E a única inocência não pensar...

2ª CENA – (Os atores da Trupe vão começar a organizar as coisas, o cenário)

ESCALAFOTE: Já que vamos montar um grande espetáculo, precisamos também montar


acampamento, organizar tudo. Trupe, vamos ao trabalho! (FUNDO MUSICAL)

ESCALAFOTE: Já sabem o que fazer não é mesmo?

GERBERA: É claro meu irmão, cada um de nós vai sair pra um canto desta cidade, e vai
observar, anotar tudo que conseguir.

VENANCIO: Sem deixar escapar nenhum detalhe, os detalhes é que são preciosos, os detalhes!

MURIEL: A gente tem que ver e ouvir o modo de falar do povo deste lugar.
PROFÁCIO: E se tem poesia, a gente também tem que anotar.

ZENDAYA: Tem que ver o que tem de bom, e o que tem de ruim, pois é isso que faz a história
de um lugar.

SENFIRA: Então acho que já podemos começar.

ESCALAFOTE: Então vamos simbora criaturas! E não deixem nada escapar aos olhos e ouvidos
de vocês.

TODOS: Iêta!!!

(Todos saem, menos Ximoco)

ESCALAFOTE: Ximoco?! Já sabe, não deixe que nada que seja nosso desapareça, entendido?
(Ximoco afirma que entendeu) (Escalafote sai, em seguida Senfira entra)

SENFIRA: Ximoco?! Não se preocupe, eu trago alguma lembrança pra tu, visse?

(Senfira sai, Ximoco fica organizando as coisas sozinho e resmungando)

BLACKOUT

3ª CENA – (Os atores chegam da rua, e começam a dialogar)

ESCALAFOTE: Chegamos!!! (Diálogo entre eles)

ESCALAFOTE: Atenção! Agora é a hora de jogarmos na mesa as informações colhidas.

VENANCIO: Podia ser jogado na mesa era uma bela comida.

(Todos dão risadas)

ESCALAFOTE: Agora não é o momento pra pensar em comida Venâncio. Gerbera minha irmã, o
que foi que conseguiu?

GERBERA: Carutapera é um município do estado do Maranhão, e fica localizado na foz do Rio


Gurupi, sua capital é São Luís, que fica distante 570 quilômetros. Quem nasce em Carutapera
é chamado de Carutaperense, e esse nome curioso, deve-se ao fato de que os primeiros
habitantes deste lugar foram os índios Carus, uma tribo que aqui vivia, e como este lugar era
considerado uma tapera, que significa aldeia velha ou casa abandonada, daí surgiu o nome
Carutapera, mas há pouco tempo abriu-se uma nova discussão em relação aos índios, dizem
que se chamavam índios urubus, e não índios Carus, enfim... Carutapera é o estado mais ao
norte de todo o estado do Maranhão.

VENANCIO: E por falar em Norte, antigamente era muito mais fácil as pessoas daqui chegarem
a Belém do Estado do Pará, do que para sua própria capital São Luís, e Viseu do Pará é sua
cidade vizinha, e pode se chegar lá viajando de embarcações pelo Rio Gurupi. Por conta da
junção de famílias maranhenses com família paraenses, um novo sotaque surgiu, um sotaque
próprio Carutaperense, essa junção aconteceu também ao longo dos anos com a cultura em
geral, comidas típicas, danças folclóricas e outros costumes, essa junção de culturas
diferentes, formando uma nova cultura é chamada de sincretismo cultural. Aqui se fala égua,
toma açaí e não jussara, aqui tem o boi bumbá, mas também tem o bumba meu boi.

MURIEL: Carutapera faz aniversário dia 03 de Junho, e atualmente tem 82 anos de


emancipação política, uma grande festa sempre é realizada para comemorar essa data, com
atrações para todos os gostos. No mês de Junho e Julho, tem as festas de São João com
apresentações culturais, quadrilhas, carimbos, danças portuguesas, bumba meu boi, boi
bumbá, e outras apresentações, na Praça principal da cidade, Praça Padre Augusto Mozzett,
mas que é chamada de Praça da Matriz, por causa da igreja da igreja Matriz de São Sebastião,
que fica localizada na praça, considerada uma das igrejas mais belas de toda a região, de
arquitetura italiana, e o padroeiro da cidade é o São Sebastião.

ZENDAYA: E no mês de Janeiro acontece uma das maiores e mais populares festas do litoral
Oeste do Maranhão, a festa do padroeiro São Sebastião, com missas, chegadas de caravanas, a
tradicional Caravana Caru de Belém do Pará, shows, entre tantas outras atrações, e tudo isso
acontece entre os dias 11 até 21 de janeiro.

PROFÁCIO: Carutapera tem artistas, tem gente que canta, que dança, que interpreta, aqui
tem teatro, tem atores, vejam só que beleza, viva o teatro!

TODOS: Viva!!!

PROFÁCIO: ...Tem escritor e tem poeta, o saudoso poeta Marcírio Gonçalves dos Santos, e a
saudosa Dona Izabelzinha, parteira e praticante da Umbanda, religião que também é
encontrada aqui. E a maior economia da cidade é o pescado, daqui saem para outros estados,
tudo quanto é tipo de pescado, e tem também igarapés, que por aqui dizem “um bom banho
de rio”, tem também a praia de São Pedro, e outras praias quase desertas com belezas que
ninguém nunca viu igual, visse.

ESCALAFOTE: Aqui é assim, se você não está de um lado de um partido político, você está
contra ele.

PROFÁCIO: Meu caro Escalafote, isso é em todo o mundo.

ESCALAFOTE: Exatamente, e aqui não poderia deixar de ser diferente. Nessa cidade tudo vira
rivalidade, política, futebol, são joão, gincana, e por aí vai, mas calma, muitas vezes não é
uma rivalidade sadia, tem brigas, discussões, tem até gente que fica de mal. Assim como
muito lugar, tem tempos que aqui está uma maravilha, mas tem tempos que está um
verdadeiro caos, é normal, é natural, não é uma particularidade apenas de Carutapera, às
vezes chega a dar medo, por isso não poderia deixar de citar.

SENFIRA: Pegando carona nessa do medo, Carutapera tem lendas que muitos hoje
desconhecem, tem o calça molhada, que saia do rio nas madrugadas e perambolava a cidade,
e as pessoas podiam ouvir o barulho da sua calça encharcada de água, havia uma velhinha
feiticeira que se transformava em uma porca, muitos afirmaram ter visto, e um homem que
se transformava em bicho, muitas vezes em bode.

VENANCIO: Eita povo que gostava de virar animal.

SENFIRA: Da escola Moacir Heráclito dos Remédios, se ouvia um choro de uma criança, um
choro desconhecido, nunca encontrado, em outras escolas, ouviam—se cadeiras arrastar,
portas bater, alguém chamar. No hospital regional então, nem se fala, é cada história de
arrepiar. Se é verdade ou não, fica a se critério acreditar, mas lenda é lenda não é mesmo,
então disso eu tinha que falar.

ESCALAFOTE: Já temos muitas informações que já dá pra começar, Carutapera por si só já é


um verdadeiro espetáculo. Meus parabéns a todos!

TODOS: Iêta!

ESCALAFOTE: Mas o trabalho não pode parar.

VENANCIO: Essas lendas me deram um pouco de medo.

SENFIRA: Buh!

VENANCIO: Aaaaai!!! (Todos riem) Quer que eu caia duro aqui Senfira? Que medo!
4ª Cena – (Todos recitam poesia sobre o medo)

ESCALAFOTE. O medo

Em verdade temos medo.


Nascemos no escuro.
As existências são poucas;
Carteiro, ditador, soldado.
Nosso destino, incompleto.
E fomos educados para o medo.

MURIEL. Cheiramos flores de medo.


Vestimos panos de medo.
De medo, vermelhos rios
Vadeamos.
Somos apenas uns homens e a natureza traiu-nos.
Há as árvores, as fábricas,
Doenças galopantes, fomes.

GERBERA. Refugiamo-nos no amor,


Este célebre sentimento,
E o amor faltou: chovia,
Ventava, fazia frio em São Paulo.
Fazia frio em São Paulo...
Nevava.

ENDAYA. O medo, com sua capa,


Nos dissimula e nos berça.
Fiquei com medo de ti,
Meu companheiro moreno.
De nos, de vós, e de tudo.
Estou com medo da honra.
Assim nos criam burgueses.
Nosso caminho: traçado.

PROFÁCIO. Por que morrer em conjunto?


E se todos nós vivêssemos?
Vem, harmonia do medo,
Vem ó terror das estradas,
Susto na noite, receio
De águas poluídas. Muletas
Do homem só.
Ajudai-nos, lentos poderes do
Láudano.
Até a canção medrosa se parte,
Se transe e cala-se.

VENANCIO. Faremos casas de medo,


Duros tijolos de medo,
Medrosos caules, repuxos,
Ruas só de medo, e calma.
E com asas de prudência
Com resplendores covardes,
Atingiremos o cimo
De nossa cauta subida.
O medo com sua física,
Tanto produz: carcereiros,
Edifícios, escritores,
Este poema,
Outras vidas.

SENFIRA. Tenhamos o maior pavor.


Os mais velhos compreendem.
O medo cristalizou-os.
Estátuas sábias, adeus.
Adeus: vamos para a frente,
Recuando de olhos acesos.
Nossos filhos tão felizes...
Fiéis herdeiros do medo,
Eles povoam a cidade.
Depois da cidade, o mundo.
Depois do mundo, as estrelas,
Dançando o baile do medo.

5ª Cena- (Cena de diálogos “atravessados”)

MURIEL: Está cansado?

PROFÁCIO: Cansado como todos estão, minha cara.

ZENDAYA: Quer que eu te traga um café?

ESCALAFOTE: Não vai ser preciso.

MURIEL: Uma massagem quem sabe.

PROFÁCIO: Não é necessário!

ZENDAYA: Por que não vai descansar?

ESCALAFOTE: Eu preciso terminar uma poesia.

MURIEL: Porque não deixa pra depois?

PROFÁCIO: Alguns pensamentos podem se perder até o depois.

(Muriel e Zendaya caminham até se encontrarem no meio do Palco)

MURIEL E ZENDAYA: Tu sabe que eu tenho sentimentos mais profundos por ti não sabe?

(Escalafote e Profácio levantam juntos da cadeira)

ESCALAFOTE E PROFÁCIO: Sei, isso já não é mais nenhum segredo.

MURIEL: E o que você pensa a respeito?

PROFÁCIO: E tu sabes que eu não nutro o mesmo sentimento por ti.

ZENDAYA: Eu sei que seu coração é de outra pessoa.

ESCALAFOTE: É, e eu não tenho culpa, não posso desgostar assim, fazer meus sentimentos
mudarem de rumo.
MURIEL: Mas tu podia pelo menos tentar.

PROFÁCIO: Ia ser tudo em vão!

ZENDAYA: (Indo em direção a Profácio, ao mesmo tempo Muriel caminha em direção a


Escalafote) Eu posso te ajudar!

ESCALAFOTE: Ajudar como, não tem remédio, não tem uma descoberta. Quando se gosta, se
gosta, e nada mais, ou vai ser feliz, ou vai ser infeliz, só tem esses dois caminhos.

MURIEL: Então não tem nada que eu possa fazer?

PROFÁCIO: Tem sim. Deixe seu coração livre, quem sabe seus sentimentos não encontram os
sentimentos de outro, e juntos se entrelaçam.

(Escalafote e Profácio vão saindo)

ZENDAYA: Não vai acabar sua poesia?

ESCALAFOTE: Não!

PROFÁCIO: Ela se perdeu no caminho do depois.

(Profácio e Escalafote saem de cena)

(Ximoco aparece no canto do cenário)

ZENDAYA E MURIEL: O que tu tá fazendo aí Ximoco? Venha até aqui! (Ximoco faz gesto que
não) Venha!

(Ximoco se aproxima) (Gerbera e Muriel vão para perto das mesas com espelhos)

MURIEL: Eu sou bonita!

ZENDAYA: Sou graciosa!

MURIEL: Tenho muitas qualidades.

ZENDAYA: O que mais eu preciso?

MURIEL: Não preciso deixar meu coração livre.

ZENDAYA: Meus sentimentos já são pra ele.

MURIEL E ZENDAYA: Maldito!

(Muriel e Zendaya cantam a música “Eu vou fazer uma macumba pra te amarrar, maldito”)
(Ximoco faz parte da cena)

(Muriel e Zendaya saem, Ximoco logo atrás)

6ª Cena – (Venancio e Gerbera dialogam)

VENANCIO: Percebeu o que tá acontecendo?

GERBERA: Percebi, só eles é que não perceberam.

VENANCIO: Falam de amor, mas ao mesmo tempo tem rancor nas palavras.

GERBERA: É verdade!

VENANCIO: Não são igual nós dois né meu bombom de coco?


GERBERA: Não mesmo, a gente já se percebeu e já se encontrou faz tempo. (Venancio tenta
beijar Gerbera, mas ela desvia) Mas eu tava aqui pensando, será que eles já perceberam que
a gente tá juntinho?

VENANCIO: Se já perceberam ou não, não me importa, somos dois adultos, livres pra viver
nosso romance.

GERBERA: Mas o que Escalafote deve pensar?

VENANCIO: Que é uma mulher madura, desimpedida e que merece ficar ao lado de um
homem elegante, bonito, inteligente e raro feito eu.

VENANCIO: E além disso, modesto meu caro Venancio, modesto.

VENANCIO: Mas é claro minha formosa Gerbera. Agora vamos aproveitar pra namorar um
pouquinho.

GERBERA: Mas aqui?

VENANCIO: Não! Eu já sei, vamos até o cais da cidade, dizem que de lá pode se ver o melhor
pôr do sol do mundo, e ai de quem dizer o contrário.

GERBERA: E depois podemos dar uma volta na avenida, é lá que os casais se encontram, os
amigos conversam, e ainda dá pra admirar um céu todo estrelado.

VENANCIO: É lamentável que as pessoas hoje em dia não admirem mais um céu estrelado, e
não saibam a sensação maravilhosa que isso dá, de calmaria, de paz, de liberdade.

GERBERA: Em noite estrelada, busca algo novo.


Encontra-se deslocado
ao olhar a lua
se lembra de uma música.
Esquece os prazeres de algo inovador
escritas são sua unica lembrança.
Tudo que passou, passou
A vida continua.
O céu se abre.O sol se põe.
os pássaros cantam.
Por fim as estrelas continuam a brilhar
fazendo companhia ao luar.

VENANCIO: Agora vamos meu bombonzinho de coco, não quero perder esse por do sol.
(Venancio sai puxando Gerbera pelo braço)

7ª Cena – (Ximoco imitando Zendaya e Muriel, mímica e resmungos)

(Senfira entra)

SENFIRA: O que é isso Ximoco? (Ximoco leva um susto) Fica calmo! O que tu tava fazendo é
muito bonito, é talentoso. Tu precisa mostrar isso pra painho, ele vai te colocar na trupe.

(Ximoco faz gesto que não)

SENFIRA: Tá bem, eu não vou falar nada! (pausa) E porque tu não fala nada, tu é mudo
mesmo Ximoco? Ximoco! Tu lembra, eu que te dei esse nome, quando a gente te encontrou
naquela estrada, sozinho, triste, sem saber falar seu nome, e desde então nunca falou nada.
Tu é mudo mesmo Ximoco? (pausa)
SENFIRA: Tudo bem. (pausa) Eu não gosto de jeito que te tratam visse? Olha o que eu trouxe
pra ti? (tira da bolsa um artesanato de Carutapera) Gostou?
(Ximoco faz gesto que sim)

SENFIRA: É típico daqui de Carutapera, é artesanato daqui, tem um homem que vende ali na
numa calçada da rua do comércio. Ximoco sabe como as pessoas daqui falam quando vão para
a rua do comércio? (Ximoco faz gesto que não) Falam que vão lá em baixo. (Ximoco ri)
Engraçado né?

(Senfira vai rindo até ficar com um semblante de tristeza, Ximoco percebe)

SENFIRA. Não, eu não tô triste? É que eu tô pensando, que desde que mainha se foi, painho
nunca mais arranjou ninguém, eu sei que ele gosta de alguém, mas falta coragem, e penso
que ele tem medo de eu não aceitar. Mas é claro que eu vou aceitar, eu quero mais é que ele
seja feliz!

(Ximoco faz gesto pedindo para Senfira falar com seu pai)

SENFIRA. Tu acha mesmo que dá certo se eu falar com ele? (Ximoco faz gesto que sim) Então
eu vou falar. Obrigada Ximoco!

SENFIRA: Enfim, depois de tanto erro passado


Tantas retaliações, tanto perigo
Eis que ressurge noutro o velho amigo
Nunca perdido, sempre reencontrado.

É bom sentá-lo novamente ao lado


Com olhos que contêm o olhar antigo
Sempre comigo um pouco atribulado
E como sempre singular comigo.

Um bicho igual a mim, simples e humano


Sabendo se mover e comover
E a disfarçar com o meu próprio engano.

O amigo: um ser que a vida não explica


Que só se vai ao ver outro nascer
E o espelho de minha alma multiplica...

8ª Cena- (Escalafote entra, Ximoco sai) (Escalafote mexendo em uma agenda)

SENFIRA. Painho, porque todos tratam mal o Ximoco?

ESCALAFOTE. Minha filha, ninguém trata mal o Ximoco não.

SENFIRA. É claro que tratam, usam ele, tudo quem tem que fazer é o Ximoco, tratam ele
como escravo, e sempre debocham, ficam rindo.

ESCALAFOTE. Não é assim minha filha!

SENFIRA. Somos uma trupe de teatro, somos atores, somos artistas, somos seres humanos sim,
e cometer erros é perdoável, mas a nossa forma de viver, a forma como a gente enxerga as
coisas painho, não deveria dar espaço pra esses tipos de atitudes. Entende painho?

ESCALAFOTE. Minha filha que belo tudo isso que tu falou! Muito verdadeiro e puro. Tô muito
orgulhoso de tu.

SENFIRA. Eu aprendi isso com o senhor, mas eu não sei em que momento o senhor parou de
pensar assim, e isso me deixa triste. (pausa) Painho, eu sei que o senhor gosta de alguém, eu
não me importo, quer dizer eu me importo sim, eu quero que o senhor seja feliz, fique feliz.
Mainha sempre vai tá comigo, nas minhas lembranças, no meu coração. E ela também ia
querer que o senhor ficasse feliz.
(Senfira dá um abraço no pai)

(Senfira vai saindo)

ESCALAFOTE. Senfira minha filha... Lhe amo!

SENFIRA. Eu lhe amo painho!

9ª Cena – Todos entram ao som de um música instrumental.

ESCALAFOTE. Ai! Tomar um banho no rio do seu Domingo, é sensacional, que lugar mais lindo
e agradável!

GERBERA: Achei bonito o Rio do Mateus, mas é triste que não seja mais cuidado, eu ouvi
histórias de que era um bom rio pra se tomar banho, além do rio do polônio e do piritiá, que
chamam de piritiuá.

VENANCIO: Hum! Enchi minha pança, de carangueijo, siri, açaí, peixe assado na brasa, ostras,
manga rosa, tô quase satisfeito.

MURIEL: Fui assistir os ensaios, da Cia Revelação, Banho de Cheiro, Explosão Carú, Matutos do
Reino, Rosa de Cheiro e Xamego do São João, são todas quadrilhas daqui, é cada coreografia
linda, e os trajes então? É de encher os olhos de tanta beleza, eu fiquei doidinha pra dançar.
Ah e não posso me esquecer do Boi atraidor que é tradição daqui também.

PROFÁCIO: Fui olhar as embarcações, os pescadores remendando e fazendo as redes, e depois


fiquei admirando o rio Gurupi ali mesmo da pracinha do Santo Antônio.

ZENDAYA: Passeei pelo Bairro da Santa Rita, no início com um pouco de medo, pois tem fama
de ser o mais perigoso, mas depois fiquei sossegada, afinal, existe perigos em todos os lugares
do mundo, e conversei com moradores do bairro que fizeram com que eu me sentisse mais
bem acolhida.

SENFIRA: Eu fui assistir uma apresentação do grupo de Teatro Fênix daqui de Carutapera,
vocês precisam ver, é bonita demais, dá pra ver o amor pela arte que eles tem, o teatro é da
paróquia, Teatro São José, fica bem do ladinho da casa paroquial, ou casa do padre, até
tomei a benção do Padre Mario Racca, Monsenhor Padre Mário Racca, muito respeitado e
admirado por todos, é italiano, mas de coração Carutaperense. Mas vocês acreditam que tem
gente que nem sabe que ali é um teatro, fiquei muito boba com isso. Eu assistir uma comédia
e dei muitas risadas, levei Ximoco comigo, e ele gostou muito.

PROFÁCIO: Ximoco?

(Todos dão risadas, exceto Escalafote e Senfira)

PROFÁCIO: Ele tava ajudando nas coxias?

(Todos dão risadas, exceto Escalafote e Senfira)

VENANCIO E GERBERA: Montando o cenário?

(Todos dão risadas, exceto Escalafote e Senfira)

MURIEL E ZENDAYA: Ajudando na maquiagem?

(Todos dão risadas, exceto Escalafote e Senfira)

PROFÁCIO: (cantando) Ximoco? Ximoco! Ximoco!


TODOS: (Exceto Escalafote e Senfira) Jogam pedra no Ximoco, esculacham o Ximoco, ele é
bom pra te servir, ele é bom pra sacudir!

SENFIRA: Parem! Ximoco não é isso que vocês tão dizendo. Ele é inteligente, companheiro, e
vocês não sabem mas Ximoco... Ele é artista!

(Os outros dão risadas)

PROFÁCIO: Ximoco, artista? Ele não sabe nem andar direito.

VENANCIO: Ande aí pra gente ver Ximoco.

(Ximoco fica com medo)

ZENDAYA, GERBERA E MURIEL: Ande!

SENFIRA: Ande Ximoco!

(Ximoco começa a andar)

(Todos riem, exceto Senfira e Escalafote)

PROFÁCIO: Olhem só como ele anda? (risos)

PROFÁCIO: Parece um qualira, um fresquinho.

(Todos dão risadas, exceto Escalafote e Senfira)

(Ximoco bate o pé chão e começa a cantar a música “Não recomendado”)

(Quando Ximoco termina de cantar todos aplaudem)

ESCALAFOTE: Sensacional Ximoco!

SENFIRA: Eu disse que ele era artista.

PROFÁCIO: Estupendo!

VENANCIO: Bravo, muito bom!

GERBERA: Quanto talento!

MURIEL: Ximoco é artista!

ZENDAYA: Ximoco é artista!

TODOS: Ximoco é artista.

ESCALAFOTE: Mas por que nunca falou antes Ximoco?

SENFIRA: Pode falar Ximoco.

XIMOCO: Quando vocês me acharam na estrada, eu não conseguia mesmo falar, eu tava ali
consumido de tristeza, tinha perdido tudo, perdido todos, tava sem ninguém, meus sonhos
haviam se acabado, e tudo isso por causa do coração ruim do ser humano, eu via o que o
homem fazia com o seu semelhante, a falta de respeito, a falta de amor, eu fazia parte de
um circo, e um dia alguém mandou tocar fogo no circo, sem motivo algum, só porque não
gostava de arte, e isso pra mim não é motivo, eu fui o único que consegui sobreviver, e então
vocês me encontraram.

SENFIRA: E eu te dei no nome de Ximoco. E qual é teu verdadeiro nome?

XIMOCO: Eu não me lembrava, e nunca me lembrei, então passei a ser Ximoco, e sou Ximoco
até hoje, e Ximoco continuarei sendo.
PROFÁCIO: E porque nunca contou isso antes, depois que ficou bom?

XIMOCO: Vocês não deixavam, e eu tava em contato com a arte, fazendo aquilo o que me
fazia melhor! Não me importava tanto se tinha que fazer as coisas pra vocês. E te agradeço
Senfira por ter se preocupado comigo desde o começo. Acho que no fundo Ximoco era meio
que um personagem criado por mim, pra não encarar os medos, não tinha coragem de sair da
cidade e encarar um outro mundo, de ir pra outros lugares, de sair debaixo da asa de
proteção da família, de ir pra capitais, conquistar os sonhos, de ter medo de ir, sabendo que
eu podia voltar.

ESCALAFOTE: Devemos muitos pedidos de desculpas pra tu Ximoco, falo por todos quando
digo que estamos muito arrependidos.

XIMOCO: Não tem nada não, tudo está bem quando começa a ficar bem.

TODOS: Tudo está bem quando começa a ficar bem.

PROFÁCIO: Agora Ximoco é oficialmente da Trupe Malacubacos.

SENFIRA: Ele sempre foi da nossa trupe, não é mesmo Ximoco?

TODOS: Nos desculpe Ximoco!

XIMOCO: Tudo está bem quando começa a ficar bem.

TODOS: Tudo está bem quando começa a ficar bem.

(várias vezes essa frase, até todos saírem de cena)

10ª Cena- (Muriel e Zendaya estão olhando o céu estrelado, entram Escalafote e Profácio.)

ESCALAFOTE: Tá uma bela noite não é mesmo?

ZENDAYA: Tá sim!

PROFÁCIO: Eu tive pensando, talvez eu...

MURIEL: Não, eu sei o que vai dizer.

ESCALAFOTE: Sabe?

ZENDAYA: Sim.

PROFÁCIO: E o que pensa a respeito?

MURIEL: Agora eu penso que realmente os meus sentimentos estejam apontando pra direção
errada.

ESCALAFOTE: E os meus precisando de correspondência.

ZENDAYA: Às vezes a gente tá tão cego, que não se dá conta que sentimento correspondido tá
ali bem do ladinho.

PROFÁCIO: As coisas vão ficar bem não é mesmo?

MURIEL: Vão sim.

TODOS: Tudo tá bem, quando começa a ficar bem.


11ª Cena- (Vão falando e andando, até Escalafote esbarrar em Zendaya, e Profácio esbarrar
em Muriel)

ESCALAFOTE E PROFÁCIO: Desculpa!

ZENDAYA E MURIEL: Tudo bem.

ESCALAFOTE E PROFÁCIO: Tá uma bela noite não é?

ZENDAYA E MURIEL: Maravilhosa! (Pausa)

ZENDAYA E MURIEL: Quer que eu faça um café?

ESCALAFOTE E PROFÁCIO: Só se me acompanhar.

ZENDAYA E MURIEL: Será um prazer!

(Vão saindo)

12ª Cena- (Final, apresentação do espetáculo)

ESCALAFOTE: É chegada a hora! Carutapera!

VENANCIO: Carutapera!

GERBERA: Carutapera!

MURIEL: Carutapera!

PROFÁCIO: Carutapera!

ZENDAYA: Carutapera!

SENFIRA: Carutapera!

XIMOCO: Carutapera!

TODOS: Terra amada idolatrada terra!


Defendemos tua áurea flâmula, e a sublime glória que ela encerra.

Obs – Continuação dessa cena com música, canto e dança.

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ESCALAFOTE: Carutapera por si só já é um espetáculo.

VENANCIO: Apresentada pela trupe Malacubacos.

GERBERA: Quem viu, viu, quem não viu, não viu, mas pode ver.

PROFÁCIO: É só vim a Carutapera do Maranhão, dá pra viver tudo isso e muito mais emoção.

ZENDAYA: Quem vai embora, sempre volta, e quem não volta, quer voltar, nem que seja só
pra passear e matar a saudade desse lugar.

MURIEL: Como disse o saudoso Seu Marcírio, Carutapera é um espaço, um sorriso, um abrigo...

XIMOCO: ...Um aperto de um abraço, do braço de cada amigo.

SENFIRA: Carutapera, terra boa de se viver, mesmo pequenininha é um lugar que dá prazer.

TODOS: Carutapera é um espaço, um sorriso, um abrigo, um aperto de um abraço, do braço


de cada amigo! Viva Carutapera!

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