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Entenda a Educomunicação
Prof. Ismar fala de educomunicação para a revista Geografia
Ismar de Oliveira Soares, 65 anos, é jornalista, doutor em comunicação pela ECA/USP, com
pós-doutorado na Marquette University, em Wisconsin, nos Estados Unidos. Coordenador
e fundador do Núcleo de Comunicação e Educação da Universidade de São Paulo (NCE-
USP), Soares foi precursor dos estudos de educomunicação no Brasil. Leia a seguir trechos
da entrevista concedida à reportagem, na qual ele explica como surgiu e qual é significado
do conceito educomunicação, além de indicar caminhos para os professores que queiram
inserir as mídias em suas práticas de ensino.
No caso, a parte da cidadania passou a ser mais importante que os jogos do mercado. E, ao
longo dos anos, essa prática foi se concretizando em algumas ações específicas. Uma delas
era o que se chamou por muito tempo de leitura crítica dos meios de comunicação. A
primeira prática educomunicativa era observar o comportamento da mídia. Como era
prática educomunicativa também usar a mídia e forma alternativa. Então, a mídia
alternativa e a leitura crítica da mídia eram dois braços, duas vertentes da mesma prática.
Eu pesquisei junto a esse público e descobri que o que eles faziam era assumir novas
práticas. Eles faziam uma educação para a comunicação no sentido da leitura crítica da
mídia ou produziam uma comunicação alternativa, que era toda a comunicação feita fora da
indústria cultural para a defesa dos interesses de grupos populares. Agora, o que aconteceu
de diferente naquele contexto é que toda a inspiração de Paulo Freire fez com que os que
produziam comunicação alternativa começaram a observar como eles a produziam. Se, ao
produzirem comunicação alternativa, seguiam as mesmas regras da indústria cultural, que
são as regras de distribuição de funções em que existe um editor, um repórter, o dono do
veículo, e jogos de interesse manejando a definição do que era pauta, conteúdo. A
comunicação alternativa começou, nesse sentido, a examinar se reproduziam essas formas
ou se estavam optando por uma gestão democrática dos processos. Quando se entendia
que o grupo que produzia era um grupo que se autogovernava, se a gestão comunicativa
era uma gestão comunitária, com base em práticas participativas, se entendia que estava
existindo ali um perfil diferenciado de produção de mídia. A mesma leitura crítica passou a
ser uma autoleitura crítica ou leitura da própria comunicação. Então, a educomunicação se
consolida neste contexto, quando grupos de pessoas de vários lugares da América Latina,
Estados Unidos, Índia, tiveram consciência de estarem articulados de forma democrática.
Elas vão, com isso, consolidando um novo modo de produção, que tem referencial
semelhante, metodologias semelhantes, e, por consequência, resultados semelhantes.
CP Geografia - Assim nasceu o conceito, mas o termo, quando foi utilizado pela primeira
vez?
Ismar de Oliveira Soares - O termo educomunicação já era usado em 1980 pela Unesco
para indicar leitura crítica dos meios e a USP foi ressemantizar esse termo, que não era
muito conhecido, para dar a ele um novo sentido. Que é o sentido de uma prática nova.
Um exemplo é a Revista Viração, prática em que você toma a decisão de fazer uma gestão
participativa de uma revista, de fazer processos dialógicos, e não só isso, mas quando você
cria condições para que isso aconteça. No caso, a Revista Viração se avalia, faz a sua
autoleitura crítica, corrige rumos, vê a sua coerência epistemológica, que é a coerência entre
teoria e prática. Junto com o exemplo da Viração, você pode encontrar uma escola com
suas produções midiáticas.
CP Geografia - Mas como um professor sabe que ele está fazendo educomunicação em
sala de aula?
CP Geografia - Mas não falta formação para que o professor de geografia esteja preparado
para trabalhar com educomunicação?
Ismar de Oliveira Soares - O NCE-USP está trabalhando para que a USP tenha a sua
primeira licenciatura em educomunicação em 2010. Então, o que nós vamos formar é um
professor para atender às carências de educomunicação. Só que a gente sabe, isso é um
indício, o que existe na prática são cursos de curta duração, como é o caso do 'Mídias na
Educação', do Ministério da Educação (MEC), curso que foi desenhado na perspectiva da
tecnologia educativa, porém, já discutindo educomunicação dentro de seu conteúdo. No
Brasil, temos 50 mil professores que estarão tomando contato com a educomunicação
através desse curso. Cursos de especialização ou de curta duração têm sido feitos, mas são
poucos. O que é importante para o professor que não tem tido contato imediato com a
educomunicação é perseguir a palavra no Google. Buscar revistas como a Comunicação e
Educação, publicada pela Editora Paulinas, ou consultar o site do NCE-USP. O que ele vai
descobrir são fios de uma meada que ele vai perseguindo. E nessa busca há grande
possibilidade de que ele descubra que muita coisa que ele já faz é educomunicação. E com
isso ele vai ter algumas noções básicas de como continuar. A questão aqui não é só
dominar a técnica de como fazer rádio, software, é a intencionalidade do processo. É a
definição por uma comunicação dialógica, participativa. E isso é mais complicado. Então,
se nós tivermos um professor que se demonstra interessado em desenvolver um processo
democrático e somar a isso o uso das tecnologias, ele vai aperfeiçoando. A
educomunicação chega com teatro, com desenho, com música, com jornal, com rádio.