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Max Andrade and Regina Coeli Ruschel

arquitextos 150.00: Construir e configurar

abstracts Jean-Nicolas Louis Durand, Combinações horizontais de colunas, pilastras,


muros e portas [Em Précis des leçons d’architecture, 1823, lâmina 3]

p
ortuguês 
Atribuir valor artístico à construção para que
ela ascenda à condição de arquitetura é um
uso inconstante dos arquitetos, mas que expõe a
acepção de arte na qual acredita, que oscila de idéias
superiores da arte a uma apreensão mais vulgar.
Ludwig Mies van der Rohe: Residência Farnsworth, 1945-50; Residência
 Caine, 1950; Residência 50 x 50, 1950-51 [BLASER, Werner. Mies van der Rohe]

Ordenar (2) a forma e conciliar requisitos da edifica-


how to quote ção contam entre as principais tarefas do projeto de
arquitetura para antecipar fórmulas que assegurem
ESPALLARGAS GIMENEZ, Luis. Construir e configu- sua construção e bom resultado. Apesar das várias
rar. Arquitextos, São Paulo, 13.150, Vitruvius, nov acepções para o termo construir, admite-se que a
2012 <http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/ decisiva tarefa arquitetônica não seja construir, mas
arquitextos/13.150/4508>. conceber. Se a matéria é imutável e eterna e a apa-
rência é variada e transitória pode parecer que as
“Para poder conocer la unidad, tenemos que re- ações de construir e configurar estejam imersas em
conocer, en toda vida, la dualidad. Porque quien diferentes campos do conhecimento. Tanto é possível
ve la unidad – en el tiempo – como una aparencia construir com perfeição um edifício mal concebido,
singular, ve la unidad aún vaga e inconcreta. Por como arruinar uma configuração apropriada com
ver la unidad como dualidad, distinguimos por equivocada construção material. O Centro Cultural
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primera vez en qué manera existe la unidad (es São Paulo, 1977, de Eurico Prado Lopes e Luiz Be-
decir el equilíbrio). Por eso la Nueva Imagen no es nedito de Castro Telles é um desses exemplos, em
la manifestación de un concepto de la vida dualís- que a concepção do programa no lugar é compreen-
tico, al contrario: es la manifestación del sentido de sível e animadora, porém a verve experimentalista
unidad consciente, madurado, que forma la base e a fecundidade inventiva dos sistemas construti-
de la nueva consciência del tiempo” vos perverte o resultado, dissolve a integridade e
Piet Mondrian, La nueva imagen en la pintura (1) compromete durabilidade e manutenção. Pilares
metálicos e vigas de concreto.

A ordenação arquitetônica alega motivos variados


técnica construtiva, função, significado e geografia
– a um empenho artístico filiado a alguma opção
estética (3). No caso específico da arquitetura, a
reivindicada primazia artística esbarra sempre na

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finalidade e na gravidade técnica. É, portanto, na própria construção, ou a estrutura material, tanto


arquitetura que a milenar dicotomia entre arte e informa, como preenche o mote artístico e assume
técnica, reivindicada por Vitruvio, mostra ser mais relevância estética, já que a técnica construtiva é a
evidente e enigmática. operação material intrínseca ao objeto de arquite-
tura, sua corporificação. Esta simultaneidade torna
Seja qual for o argumento a metáfora do projeto de especial, particular, o papel da técnica e matéria.
arquitetura, exceção feita à cardboard architecture Se no sistema clássico, o Tratado antecipa essa uni-
(4), seu objetivo final é construir o edifício notável e dade porque a construção já está representada pelos
durável. Assim, o inequívoco destino da arquitetura elementos configuradores, no caso da arquitetura
desemboca no embate construtivo e sua última ins- moderna a forma é entendida como relação ou es-
trução se faz por intermédio de desenhos técnicos trutura formal que direciona e encampa a estrutura
que garantam esse fim. Por isso, mesmo quando material e com ela funde-se, confunde-se, como a
a determinação material não orienta a concepção operação diáfana que repudia camadas e represen-
do objeto, é impossível eludir a derradeira reali- tações. Assim, o ideal da forma moderna é impor-se,
dade material e, por isso, impõe-se o acordo com sem sobreposição, à figura técnica aplanada, ao de-
as instâncias técnico-construtivas para explorar talhe construtivo conciso, imediato e invisível, para
pontos favoráveis e fixar limites. Discorre-se, ao que prevaleçam as principais condições modernas:
final das contas, sobre a técnica construtiva ade- síntese e abstração.
quada às características e condições do projeto.
Nos melhores casos, quando a técnica é precursora,
orienta e abona a concepção que configura o edifí-
cio enquanto que, na maioria das vezes, é apenas
complementar ao projeto que planeja e detalha a
construção. Aumenta o número de circunstâncias
em que a técnica é constrangida ao contorcionismo
e à aberração para escorar volumetrias fantásticas.
Na arquitetura, como em todas as artes, intervêm
técnicas que, mesmo sem instruir, inerem, seja como
suporte prático da arte, seja pelo interesse estético
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que lhes confere a própria interpretação artística: Bodiansky, Candilis, Piot e Woods / ATBAT – Afrique. Carrières Centrales,
a expressão técnica, construtiva e material. Edifício Nid d’abeille R+4 e Edifício Semírames, Casablanca, Marrocos, 1953
[JOEDICKE, Jürgen. Candilis Josic Woods: Una década de arquitectura y
urbanismo]
O entendimento e a ponderação sempre fazem
retornar a acontecimentos em que desaparece a A forma moderna não tem autoridade histórica,
distinção entre técnica e arte, quando há unidade e pode alcançar legalidade com pertinência quando é
tudo fica resumido na noção de techné dos tempos oportuna ao interpretar o programa, quando intro-
em que o artista não rivaliza o artesão. jeta a técnica construtiva, quando alcança consenso
pela configuração reconhecida e compartilhada co-
Quando a técnica construtiva subsidia a arquite- letivamente. Daí existirem formas que, sem serem
tura, como ocorre com as outras técnicas artísticas, determinadas, são propícias, versáteis e aderentes
ela também manifesta a presença, a inerência, a aos programas, à matéria e à sua técnica, portanto
convergência e a unidade: a desejável coincidên- mais eficazes que os formalismos egocêntricos ou
cia, entre construir e configurar o objeto. Assim, a herméticos à razão construtiva.

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Se existem diferentes possibilidades de conhecer diversa daquela obtida pelo sentido visual, também
– conhecimento claro, ou racional e conhecimento implica regularidade, esclarecimento, classificação,
confuso, ou estético –, isso não implica que esses dedução e geometria. A modulação que informa a
modos condicionem questões, tornando-as incomu- ordem construtiva e a sistematiza advém da objetivi-
nicáveis ou exclusivas. A maneira de ordenar, que dade técnica, enquanto que a forma da arquitetura
num dos tipos de conhecimento seja lógica ou ma- submetida a essa retícula quadrada é provida ora
temática, também pode expor correção formal, ou pelo modelo simétrico e hierárquico, ora pelo juízo
visual, segundo diferente apreensão. Basta pensar estético moderno. Na quadrícula modular, as tipolo-
nas surpreendentes relações matemáticas e formais gias de Jean-Nicolas Louis Durand (1760-1834) e as
implícitas na geometria. Talvez a hesitação sobre plantas de Ludwig Mies van der Rohe (1886-1967)
quais sejam as origens da concepção em arquitetura correspondem a formalismos (5) diversos. A ordem
possa explicar tanta confusão em torno daquilo que construtiva obtida com sistematização de etapas,
é decisivo na configuração desses objetos e, conse- tarefas e detalhes decorre da disciplina racional, em
quentemente, ajude a entender o constante apelo grande medida, prevista na geometria regular do
à condição racional da arquitetura. A insistência e preconceito tipológico e usual no tratado de arqui-
precocidade com que se rotula a arquitetura mo- tetura, mas também é aderente à ordem concebida
derna como racional, mascara quanto dela se decide pela intelecção visual, com o sentido estético que
e ordena na subjetividade estética, em mecanismo sempre prevalece. O Palácio de Cristal, em Londres,
ordenador e capaz, mas pouco evidente. Essa coin- 1851, de Joseph Paxton (1803-1865) é admirável pela
cidência explicaria a simultaneidade de diversas fabricação seriada aplicada ao modelo neoclássico
condições ordenadoras confundidas, mas assemel- enquanto que a patente Mero com nó universal em
hadas e, provavelmente, complementares. Talvez a poliedro metálico de dezoito faces rosqueadas ma-
modulação, princípio mais elementar de disciplina e terializa o próprio módulo espacial, exemplar pela
regularidade, corresponda à idéia mais imediata da máxima sistematicidade construtiva, pela versati-
ordem e das regras. É possível entender a modulação lidade de arranjos tridimensionais e pela mínima
como artifício racional visando a sistematização e subjetividade estética. Diferentes em seu resultado, a
adição construtiva e, por esse motivo, ela seja in- estrita modulação da Residência Butantã, 1964, São
tuída pelos arquitetos como uma instrução rígida Paulo, de Paulo Mendes da Rocha dissipa-se numa
desfavorável à decisão sensível, à excepcionalidade, potente síntese plástica. Não é o que anuncia a pre-
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à exaltação e à expressão, consideradas na polifonia cedente Residência Savoye, 1929, Poissy. Regulada
artística. Em todo caso, a modulação racional e a es- pela patente Dom-inó de Le Corbusier (1887-1965)
trutura formal sensível, entendida, a primeira, como é inconstante, cada pavimento tem um mote que se
garantia de sistematicidade e disciplina construtiva insurge contra a estrutura e a identidade. O ático é
e, a segunda, como princípio subjetivo de ordem, a tela purista, o primeiro andar organiza-se como
obtêm, juntas, resultado notável, mas improvável uma casa-pátio elevada para mitigar a discrepância
sucesso quando empregadas à parte. entre boa orientação e paisagem e o térreo tropeça
na simetria aristocrática de um percurso veicular.
Se a ação de ordenar é um tópico da arquitetura, há
de se lembrar que também é prerrogativa da técnica
alcançar eficiência, relacionar, dispor, reproduzir
e perseguir o melhor desempenho com economia
material. A razão propicia ordem e clareza aos
conceitos e às idéias. Uma ordem elementar e estrita,

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diferentes de conhecer e considerar. No entanto, ao


longo da história, da história da boa arquitetura, não
acusam antagonismo ou adversidade. Se a concep-
ção ordena e configura o artefato com características
típicas e reconhecíveis, então há solução constru-
tiva adequada. Quando a configuração do objeto é
particular, ousada e extravagante cresce o risco de
conflito interno no objeto.

Sentido e coerência

Entendido como uma sensação ou reação imediata,


o sentido é próprio do juízo do que tem cabimento,
do apropriado e conveniente , da intuição e da esté-
tica. Uma decisão instantânea e irrefletida ativada
pela evidência captada pelos sentidos. Dessa ma-
neira, o sentido antecipa-se à razão. Se fosse possível
compartimentar maneiras de decidir e reconhecer,
poderia atribuir-se o juízo à estética, e sua escolha
aos sentidos; o julgamento associá-lo à ética e a suas
convenções e a dedução filiá-la à razão e a seus
processos lógicos.

Moshe Safdie, Habitat 67, Montreal, 1967 A coerência, a ausência de contradição, é associativa
Foto Luis Espallargas Gimenez porque estabelece ligação: nexos, conexões, adesões
e reciprocidades. Diferente da conseqüência, ou do
Se o processo de arquitetura contemporânea encon- vínculo entre causa e efeito, a coerência relaciona
tra sua explicação nos discursos presunçosos, nos coisas diferentes.
sucessivos elixires teóricos e na espetaculosidade
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midiática, isso anima o arquiteto ao desafio, a des- A configuração, condição decisiva da arquitetura,
denhar a prévia coerência construtiva e esquecer a admite juízo – faz sentido – por intermédio da esté-
experiência e a lógica constitutiva de seus elementos, tica, do conhecimento impreciso, pela reação sen-
já que inflaciona o arsenal técnico para não conce- sível e visual ao que é oportuno, ou inoportuno, no
ber a forma em concomitância com alguma pauta artefato agradável, ou desagradável. Se for assim,
ou medida. No final, a fortaleza técnica socorre, cabe duvidar que a construção material do objeto
mas não aplaca o estranhamento, não estabelece fosse determinante e submetesse a ordem visual.
paridade no objeto. Tem-se a impressão de que,
mesmo aquém do materialismo, a técnica, sem ser À razão não compete configurar o artefato de ar-
determinante, não pode ser abreviada, pois mesmo quitetura, já que ela pode, quando muito, refletir e
camuflada, delata inconformidade aos olhos mais metodizar sobre tipos pré-estabelecidos. Por isso
atentos. a criação de edifícios não é ensinada em escolas
de engenharia. O saber construtivo é insuficiente
No campo da arte, como no da arquitetura, acredita- para conceber um artefato e será sempre depen-
se que os processos técnicos e os critérios visuais dente do modelo, do que já está concebido. A resi-
sejam distintos, já que corresponderiam a maneiras dência projetada por Paul Engelmann (1891-1965)

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e Ludwig Wittgenstein (1889-1951) para Margaret rar produz apenas alegoria, da mesma maneira que,
Stonborough, irmã do filósofo, expõe esse caso, em quando a forma desdenha sua construção, expressa
que a dedicada lógica é refém na escolha do objeto, arbitrariedade. Por outro lado, quando no processo
uma cópia óbvia e convencional. configurador e estético se recorre à técnica para
selecionar um princípio construtivo que assegure
A apreensão visual estabelece uma ordem formal e a estabilidade e a materialidade do projeto, essa es-
abstrata, ainda imaterial, sem finalidade, genérica colha técnica considera a aceitabilidade estética da
e disponível, sem recurso para indicar a construção receita material. Ademais de solucionar o problema
material do edifício. Neste ponto apoia-se a crítica construtivo, é necessário que a técnica admita, acate,
formalista. É a união e nexo da visualidade com a ordem prevalecente do objeto.
a lógica construtiva, com o formato e com a fun-
ção o que assegura à forma moderna adquirir o
sentido próprio da forma moderna da arquitetura.
Todavia abstrata, a forma moderna em arquitetura
difere da forma moderna pictórica, porque deve
ser confirmada, acolhida, pela condição primordial
da arquitetura: pela exigência de sua construção
material e, obviamente, de sua finalidade. Além do
sentido visual é indispensável que alcance coerência
material e sentido espacial. Matéria e forma devem
identificar-se. Maior a congruência entre formar
e construir, maior a consistência e intensidade do
artefato. Sem a imediata relação de causa e efeito
ou compromisso ético, construção e aparência pre-
cisam ser visualmente verossímeis, consequentes e
adequadas. Na quase totalidade dos edifícios apenas
há acordo, tolerância ou convivência entre concep-
ção e construção do artefato de arquitetura. O que
confere sentido à forma moderna é: o contínuo
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processo de verificação técnico e o coeso acordo


técnico aos desígnios da forma moderna.

Por outro lado, transferir a importância estética do


artefato para sua técnica construtiva, por perfeita
e escrupulosa que seja, embaralha a avaliação ar-
tística. A Baukunst (6), a arte de construir e consti-
tuir estilos, refere-se à excelência construtiva que,
mesmo admirável, nada acrescenta àquilo que seja
apropriado na formação do edifício. Essa mudança
de foco é responsável por importantes mal-enten-
didos na arquitetura. Quando técnica e material
pretendem afiançar o valor artístico do artefato
ou quando a obrigação artística estetiza a técnica Gravura de Charles Eisen para a capa da segunda edição de livro de Laugier
construtiva ao invés de buscar nela a legalidade da [LAUGIER, Abade Marc-Antoine. Essai sur l’architecture]

forma é quando a relação entre construir e configu-

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construtivos são dotados de ordem por estabelecer


soluções sistemáticas e resolver detalhes eficientes,
econômicos e consistentes. Peles correspondem à
aparência superficial, quase sempre descolada da
ordem constitutiva do objeto na que reside sua in-
tegridade.

Para especular sobre as relações entre contingê-


ncias materiais e aparência subjetiva de objetos
de arquitetura há de se especular na origem para
formular algumas hipóteses sobre a atividade in-
Gottfried Semper, cabana caribenha, The Great Exhibition, 1851, Londres trínseca, acordos e combinações da arquitetura.
[SEMPER, Gottfried. Der Stil]

A coerência entre forma e construção é sensível e


Além da classificação das técnicas e tarefas constru- é propiciada pelos mecanismos que autenticam a
tivas também é costume isolar os problemas constru- arquitetura moderna, que afastam o inconveniente
tivos das decisões sobre aparência que, segundo do formalismo, entendido como a forma sem sen-
as prioridades, recebam maior ou menor destaque tido, como forma pela forma.
e independência nas escolhas para arquitetura. A
técnica tem seu lugar porque é um saber consti- Primeira cabana
tuído, a aparência interessa e tem autonomia porque
desencadeia significados, porque representa uma Ao se propor que a técnica construtiva é congênita à
figura independente da construção. concepção do artefato de arquitetura, cabe imaginar
o problema original.
Confunde pensar que essas duas realidades – técnica
e aparência estabeleçam âmbitos autônomos entre No princípio, mesmo antes da cabana primitiva, a
os que a arquitetura opera. A esfera da estrutura e inquietação e as decisões sobre o abrigo devem ter
da construção que corresponde à racionalidade e atendido urgência e sobrevivência, depois adquiri-
a esfera da aparência, do resultado estético. Muitas ram experiência técnico-construtiva para, só depois,
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vezes a aparência do objeto corresponde à estrita poder especular sobre aparência, acabamento, or-
decisão técnico-construtiva, outras vezes, a técnica namento e apuro. Proteger-se em copas de árvores
construtiva constitui a expressão artística e tectônica como os primatas ou disputar grutas com outros
(7), com a musculação ou hipérbole estrutural, ou animais deve ter sido o começo. Não é razoável ima-
com a figuração tecnológica. Há exemplos em que ginar que correspondesse à circunstância originária
a pele, a aparência anódina do objeto, nada refere considerar aparência e superfluidade, enquanto não
à construção. estivesse equacionada a materialidade regular e
elementar, o domínio, do artefato primordial, a
Também é aceita a idéia de ordem dada na apa- exigência original e construtiva. É aceitável o ar-
rência, na configuração simulada do objeto. A pele, gumento de José Ortega y Gasset (1883-1955) sobre
essencial para os que não estão preocupados com as demandas supérfluas e de bem-estar humano im-
a construção do objeto, ou a ignoram, constitui a plícitas na tarefa técnica, como também é ponderado
novidade aparente, é capaz de assear, aformosear considerar que a emergência escale prioridades e
e suavizar o plano – restaurá-lo e, assim, prescindir admita, antes, objetos improvisados de improvável
da construção vertebrada do objeto, de sua estru- perfeição e concisão, apenas imprescindíveis (8). Se
tura formal e material, cujos critérios técnicos e alguns contrapuserem que esse objeto não é ainda

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portador da proeminência arquitetônica, outros


podem lembrar que a base definidora das ques-
tões básicas da arquitetura fica antecipada e presta
contas à conjuntura construtiva, ao imperativo de
sua aplicação que, sem ser determinante, ameniza a
aflição que é abrigar. Alguma teoria da arquitetura
se refere à cabana primitiva como quintessência,
fundamento da moradia humana quando idealiza
a cabana perfeita e a imagina com características
construtivas consequentes e essenciais.

Em consonância com a típica mitificação das teorias


de arquitetura, a suposição poética da cabana pri-
mitiva do abade Marc-Antoine Laugier (1713-1769)
na capa do Essai sur l’architecture, 1755, ilustra a
origem da cabana ao apontar a visão da cabana
natural. Análoga à nefelomancia (9), nesse caso,
pela interpretação da figura florestal, com aparên-
cia ordenada e esclarecida para o construtor que
confirma, na natureza, a origem clássica e na árvore
o ícone protetor, ancestral e constitutivo do edifício
humano. Em todo caso, pese o apelo mítico, dignifica
a visão fantasiosa como o sentido que identifica
ordem naquilo que é informal ao mesmo tempo em
que adapta a natureza à história da arquitetura e a Le Corbusier estuda plantas e maquete da Unité d’Habitation, 1946 [Acervo
sua autoridade, ao sugerir similitude e metamorfose Life Magazine]

com figuras atestadas pelas ruínas.


Um século mais tarde, a descrição da cabana cari-
benha feita por Gottfried Semper (1803-1879), em
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1851, tem outra repercussão (10). O positivismo das


conclusões e a base documental etnológica devem
ter desapontado os arquitetos, Nela, técnicas pri-
mitivas estão referidas a uma específica e precisa
cabana em complexa combinação de arremates
e interferências de escasso estilismo, com quatro
elementos e técnicas que escancaram a vaga noção
que se costuma ter da técnica construtiva e de sua
influência na configuração do artefato. A cerâmica
com o lar, o têxtil com a parede, a estereotomia com
a base e a carpintaria ou tectônica com o telhado.
Não é necessário comentar quanto essa reflexão
(11) fica coagida no determinismo, nem porque ima-
gens visionárias da primeira cabana primitiva em J.
François Blondel (1705-1774), Sir William Chambers

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(1723-1796) e Eugène Viollet-le-Duc (1814-1879) têm tética capaz de configurar o objeto e conduzir um
mais fortuna no ambiente inspirado dos arquitetos. sentido arquitetônico completo. Dá no mesmo que
seja a estética da empatia, da emoção e dos afetos,
Para muitos, a primeira cabana é a essencial res- ou que seja a estética cognitiva que aspira à uni-
posta construtiva do abrigo. No entanto, a cabana versalidade.
também poderia supor a criação que intui uma
configuração a partir do sentido estético de inci- Essa tarefa estética poderia explicar como se dá a
pientes meios técnicos. Não se trata de considerar concepção do objeto segundo o reconhecimento de
o problema da cabana original como se o essencial uma ordem visual intuída na relação das variáveis
fosse sua construção, mas especular se a alterna- que interferem no problema formal. Adverte-se que
tiva técnica, ainda que um débil princípio, possa ter a superior, metódica, segura e solúvel racionalidade
servido de motivo para que a perspicácia estética técnica é, todavia, insuficiente para configurar. Tal
vislumbrasse a configuração do refúgio. No caso lapso fica sempre encoberto porque essa incapa-
da arquitetura, a relação com a técnica construtiva cidade é acobertada pelo recurso ao modelo, ao a
quase sempre ocorre com mediação estética, por- priori.
tanto, a construção sempre estaria representada e,
no caso ideal, apresentada – condensada na forma Apesar de o coro repudiar a condição utilitária e
pura. A curiosidade dos arquitetos não parece téc- delatar a coerção técnico-construtiva, adverte-se
nica, apenas sonha com a primeira vez em que a que a arquitetura respeitada é sempre arte discipli-
arte transcende a construção. nada pela construção. Insubmissa ao determinismo
material transforma o nexo construtivo em índice
Em todo caso, o avanço construtivo que deve culmi- de benefício, coesão e pertinência que estabeleçam
nar num sistema reprodutível e coletivo – tradição coerência e vínculo entre constituição e aparên-
transmitida e acatada de construir deve ter sido in- cia do objeto. A figura desfavorável deforma sua
fluenciada, também, pela aparência da construção, materialização, ao desprezar o propósito técnico,
pela apreciação e aceitação da forma ou figura que equivoca seus meios, deturpa ou sacrifica know-how
interferem na eficiência, economia, desempenho construtivo, apenas para produzir a extravagância.
e confiabilidade das decisões técnicas do objeto.
http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/13.150/4508

Parte das cabanas aborígenes corresponde a gros-


seiros abrigos improvisados. Menor é o número de
cabanas que expõem processos técnico-construti-
vos que pressuponham a seleção, refinamento e
textura, entrelaçado regular de materiais que se
diferenciem do simples empilhamento e recobri-
mento de folhagem que responde pela idéia mais
precoce do abrigo.

Mesmo assim, pode se sustentar que a construção do


objeto não prescreve todas suas características. Há
ambivalência entre as ações de edificar e aparentar e
há um abismo entre a construção material da forma
e o sentido visual da forma. A sensação de conflito
e congruência varia segundo a racionalidade da
construção em contraposição à sensibilidade es-

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um insensível e impositivo rumo do urbanismo.


Anunciada com precedência nos Inmeubles-Villas
de Le Corbusier, 1922, essa dispersão favorece que
unidades legitimadas pela história, no caso, simulta-
neamente referidas à cultura marroquina e à técnica
moderna que responde com a cidade vertical, propi-
ciem, juntas, a fusão entre a tradição horizontal dos
clusters com casas-pátio islâmicas e o empilhamento
em esquemas verticais desencontrados para aven-
turar uma resposta progressista e engajada, como é
proposto pela equipe George Candilis (1913-1995) e
Sadrach Woods (1923-1973), ambos remanescentes
do canteiro da Unité d’Habitation de Marselha, com
Vladimir Bodiansky (1894-1966) e Henri Piot (?-?),
para a sucursal ATBAT-Afrique, na urbanização de
Carriéres Centrales, Casablanca, com os edifícios
Nid d’abeille e Semiramis, 1953. Nesses edifícios a
identificação e a hegemonia da unidade introspec-
tiva e a desejável insolação nos pátios empilhados
impõem um procedimento atípico ao prédio com
Francesc Mitjans, Edifício Seida, 1958, Barcelona, Espanha paredes externas cegas e aspecto celular.
Foto Helio Piñón

O mesmo se aplica à função da estrutura, e dos para-


Estrutura e célula mentos que se particularizam com a especialização,
com o cálculo estrutural, com alternativas produti-
Parece aceitável associar a fragmentação teórica vas, com a diversificação material adequada a cada
do edifício e a autonomia de suas partes à doutrina tarefa, com a utilidade e as características ajusta-
teleológica. Mas, finalidades isoladas desencadeiam das aos fins. Já a metáfora biológica que distingue
análises excludentes. Nunca se questiona a singu- esqueleto e carne, ou carne e pele, corresponde à
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laridade do tema do 2º Congresso Internacional de interpretação organicista, menos como vida, demo-
Arquitetura Moderna – CIAM de 1929, em Frankfurt, cracia, aparência biológica e oposição ao standard
Unidade Mínima de Existência – Die Wohnung das artificial ou racional, e mais pela especialização e
Existenzminimum –, já que, poderia contrapor-se diferença dos órgãos e a organização natural sen-
que ao ser a cidade a soma das intervenções com sível na arquitetura quando distingue ou disseca
arquitetura, não faz sentido discutir a subsistência partes ao considerar e conceber.
e a moradia mínima como tema privilegiado e ex-
cluir os sistemas distributivos e organizacionais, Finalmente, pode ser que a distinção entre elemen-
densidades, tipos e gabaritos, espaços abertos e tos de sustentação e partes sustentadas resulte da
públicos, redes de infraestrutura e tantas relações avaliação do próprio princípio construtivo e de
que formam a cidade. sua concomitante apreensão visual. Pode não ser
mera casualidade que o termo estrutura se refira
Superestimar a célula muda o rumo da arquitetura simultaneamente ao artifício resistente e à ordem
ao permitir que ela se torne um princípio do pro- formal do edifício, que a estrutura material coincida
jeto para promover excêntricas matrizes habita- com a pauta da estrutura abstrata, como costuma
cionais indiferentes à demanda urbana. Faz nascer acontecer.

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arquitextos 150.00: Construir e configurar

A estrutura transforma-se numa operação particu-


lar e destacada da construção de edifícios, mesmo
quando a inércia faz com que as subsequentes tare-
fas construtivas a escondam, amalgamando-a com
revestimento. É razoável que os processos analíticos
e a crescente dimensão das estruturas viabilizada
pelo progresso tecnológico e por equipamentos gi-
gantescos tenham inflado seu papel, estimulado a
especulação e a espetaculosidade com mega-estrutu-
ras, que essa escala descomunal promova um novo
status construtivo equiparado à cidade e à grande
arte. Por outro lado, sem esquecer a acepção mo-
derna mais sensível, faz sentido considerar que a
estrutura aparente, ou isenta, indique a construção
espacial, ao armar uma pauta elementar que, além
de racional, indique traçados – estrutura formal de
irrecusável repercussão estética e recurso ordena-
dor. Apartar essas manifestações estruturais ajuda Kisho Kurokawa. Torres Cápsula Nakagin, planta e cortes, Tóquio, 1970-72
a distinguir a arquitetura moderna da subsequente [KUROKAWA, Kisho. Metabolism in architecture]

moda brutalista. Revela, inclusive, uma profunda


degradação artística. Em consequência e com questões que vão além das
técnicas de paramento ou cladding (12), as unidades
– termo que anuncia a condição massiva e sistemá-
tica da moradia do edifício são propostas como
projetos autônomos, como no caso das casas unifa-
miliares na famosa perspectiva de Le Corbusier para
a cidade linear sobre lajes no Plano Obus, 1939, em
Algers. A estrutura da forma moderna prevalece,
porém perde em abstração e ganha em fantasia ao
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ser trivializada pelo vanguardismo utópico, tardio e


visionário de Yona Friedman (Budapest, 1923), ou do
grupo Superstudio (13). A unidade concebida como
célula é projetada para produção seriada segundo
novas técnicas produtivas.

A dificuldade em submeter estruturas territoriais


à produção da indústria e à montagem remota
poderia, em tese, ser superada no caso da indus-
trialização de células tridimensionais resumidas
a habitáculo. Essa distinção acentua ainda mais a
exclusão conceptiva e produtiva entre arcabouço
e moradia.

A expressão estrutural coincide com a prerrogativa


moderna. A exposição estrutural que explicite os

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arquitextos 150.00: Construir e configurar

elementos construtivos apresenta-os como valores programas. Menos arrojada, talvez por isso menos
estéticos. No entanto, isso não explica, completa- conhecida, a proposta modular “le brevet 226 x 226 x
mente, a separação conceptiva e formal entre ossa- 226” é indicada no projeto Roq et Rob, em Cap Mar-
tura e célula. Parece haver outro fenômeno decisivo tin, 1949. Neste caso, a estrutura da célula coincide
nessa operação. com a própria estrutura do conjunto, como exige,
apesar da encantadora foto, a realidade construtiva
Patenteado em 1915, o sistema Dom-ino não detém da Unité.
a primazia de isolar a estrutura das demais tare-
fas construtivas. Muitos sistemas estruturais de Seja como for, Le Corbusier inaugura aderentes
concreto patenteados por calculistas e esqueletos possibilidades estéticas que subentendem dispo-
metálicos são comuns em edifícios públicos e priva- nibilidade técnica nessa relação independente, mas
dos desde a segunda metade do século XIX. Apesar que esbarram na irracionalidade proveniente da
disso, a famosa perspectiva nua, sem fechamentos, construção de arcabouço portante e casca celular
do sistema estrutural deve, aos poucos, convencer como estruturas independentes.
Le Corbusier e outros da antecipação estética do
feito estrutural e da consequente excisão que auto- A hipótese que envolve a complementaridade entre
nomiza estrutura e célula – Existenzminimum – na estrutura e célula implica numa específica inter-
concepção do edifício, ou da cidade, ou da infraes- pretação moderna que leva ao limite não apenas
trutura. Jogada no chão, uma unidade duplex do a sistematização produtiva da arquitetura e da
immeuble-villa, da Ville Contemporaine, 1922, exibe cidade, seu standard, como também apropria de
independência no papel de Pavillion de L’Esprit Nou- outras organizações verticais a condição distribu-
veau na Exposición des Arts Décoratifs et Industriels tiva e ordenadora dos componentes que, às vezes,
Modernes, 1925, em Paris e, alguns anos mais tarde, rememoram soluções de estocagem, já que a sepa-
a estrutura ondeante do Plano Obus, ao longo da ração da estrutura e da cápsula sugere uma relação
baía de Argel, agrega infra-estrutura e estrutura à semelhante a da estante e da embalagem.
cidade. A estrutura linear parte de Fort L’Empereur
e disponibiliza uma cidade nova com auto-estrada
para que iniciativas individuais e culturas quais-
quer, imprevisíveis, proponham moradias que, em
http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/13.150/4508

todo caso, correspondem a figura da célula.

Os projetos que sistematizam o edifício na obra de


Le Corbusier já aparecem na Ville Contemporaine,
nos Quartiers modernes Frugès, Pessac, em 1925,
e com as Maisons Loucheur, em 1929, mas a intui-
ção da independência entre estrutura e célula é
contingente dos formatos e também dos protocolos
que regem estrutura e células. A visão que parece
deslocar-se da idéia de construção para a idéia de
montagem surge na Unité d’Habitation, a partir
de 1946, em Marselha, registrada na famosa foto
da maquete com a mão – guindaste que encaixa
a unidade duplex na gaiola estrutural. Mais tarde,
já mais maduro, propõe um arcabouço cúbico e
metálico, um sistema construtivo apto para diversos

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apartamentos, as janelas que perfuram paredes não


expressam a unidade habitacional. Apenas uma
observação atenta pode identificar os caixilhos de
cada ambiente e, dessa maneira, mapear, desde o
exterior, a distribuição de unidades no conjunto. A
apresentação em módulos habitacionais faz instan-
tâneo esse entendimento. Individualizar cápsulas e
sugerir sistemas abertos, territoriais, desmoraliza
a síntese formal característica da composição e da
proporção. Talvez seja esse o maior embaraço para
considerar as Torres Nakagin modernas.

Edifícios apresentam unidade com a estrutura mo-


nolítica, mas também podem expressar fachadas
compostas pela justaposição de unidades seriadas e
autônomas, inclusive com células tridimensionais.
Comuns em fachadas contemporâneas, caixas em-
pilhadas pressupõem um amontoado sobre uma es-
trutura vertical e hiperestática. Excessivas camadas
esmagariam containers resistentes. A construção
de cada uma dessas expressões subentende uma
estrutura: a produzida in loco e a confiada à indus-
trialização da construção. A incoerência de L’Ha-
bitat 67 de Moshe Safdie (Haifa, 1938), na EXPO de
Montreal, cresce com a dissimulação da estrutura
diagonal acobertada por módulos assistemáticos
em composição pitoresca, numa época em que se
investe em células tridimensionais de concreto pré-
moldado pela importância da ocasião ou, o mais
http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/13.150/4508

provável, pela publicidade. L’Habitat corresponde a


uma expressão tecnológica específica, por isso omite
Isay Weinfeld e Domingos Pascali, Edifício 360°, São Paulo, em construção a estrutura auxiliar – a prótese de pilares e vigas que
Foto Luis Espallargas Gimenez resolve circulações e compartilha o empilhamento
de onze camadas. Primeiro, porque essa estrutura
A célula reproduzida e seriada é a metáfora da nada mais é do que um artifício para conseguir uma
produção habitacional para as massas, para a me- altura que os módulos, por robustos que fossem não
trópole, dessa maneira, adquire significado que atingiriam e, segundo e mais importante, porque a
explicita com a cápsula, no tipo, o reduto do indi- tônica construtiva não está focada na inescapável
víduo igualado ao indivíduo por preservar autono- ossatura, mas no vigor e aptidão do habitáculo, na
mia física e constituir unidade. Também tem esse célula. Há uma clara cumplicidade da parte de fotó-
sentido unitário e íntegro conferido pela produção grafos instados a registrar boas intenções e omitir
industrializada que institui a união dos produtos quebra-galhos. Menos noticiado, porém notável
repetidos pela fabricação. Deve ser por esse mo- e da mesma época, para o evento HemisFaire ’68
tivo que as Torres Nakagin são ironizadas como em San Antonio no Texas, é o surpreendente Hotel
cemitério de lavadoras de roupa. Num edifício de Hilton Palácio Del Rio, 1964-65, com apartamentos

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arquitextos 150.00: Construir e configurar

em prismas modulados e pré-moldados de concreto


chumbados alternadamente em núcleo longitudinal.

A avaliação do discutível projeto de Safdie deve


considerar os requisitos da construção convencio-
nal. Essa adaptação mostra a extrema dificuldade
para cumprir a exigência resistente e para que se
obtenha apenas independência de pesados e cus-
tosos módulos habitacionais.

Construir e conceber com células

O Edifício Seida, 1959-67, de Francesc Mitjans


(1909-2006), Barcelona, na sua fachada expressa
um formalismo desapegado, caprichoso, ao fanta-
siar paralelepípedos empilhados e desencontra-
dos. Há desentendimento entre o rigor das plan-
tas convencionais e simétricas, sempre iguais, de
sistema construtivo correto e a simulação da fa-
chada. A organização diagonal na fachada principal
se deve, como sempre, à alternância dos terraços
duplos das salas que, deslocados, ora são frontais,
ora escorregam para os lados, para frente dos dor-
mitórios. Admirável é que essa ilusão não fere, nem
constrange a construção do edifício, apenas a ne-
cessária e contínua linha horizontal do balanço sus-
tenta, na ausência dos terraços, pérgulas supérfluas
e intercaladas que filtram luz nos planos laterais Saul Steinberg (1914-1999), Chest of Drawers Cityscape, 1950, tinta sobre
e traseiros e contribuem para destacar ainda mais fotografia 22,2X17,5cm [SARAIVA, Roberta (org.) Saul Steinberg: as aventuras
http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/13.150/4508

da linha / The Saul Steinberg Foundat]


os paralelepípedos.
A fachada sedutora e dissimulada refuta o prumo
O Edifício Seida é anterior às vanguardas tardias que a constrói. Para isso, recorre ao pintor, ao
do segundo pós-guerra, mas pode ser referido às trompe-l’oeil que transfigura a exagerada termi-
imagens de Le Corbusier para os imeubles-villa. A nação horizontal do guarda-corpo numa fictícia
pérgula que separa as unidades habitacionais tem espessura branca que ilude separar os planos dos
a mesma intenção individuadora dos primeiros pisos e dos tetos. Uma boutade que afronta o em-
duplex de Le Corbusier. penho da forma moderna com alegoria. Também
o Banque Lambert, Bruxelas, 1965, coordenado por
Gordon Bunshaft (1909-1990) para o escritório SOM,
explicita, de outra maneira, essa descontinuidade
entre o princípio construtivo e a exibição do edifício.

Assim, a arquitetura perde integridade para se


tornar manifestação artística menor, em que suas
partes são truncadas, como, no caso, a fachada en-

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tendida como o plano destacado e representativo Torres Cápsula Nakagin encarnam os desenhos
recebe relevo, reforço artístico. Pouco pode se falar mecânicos da produção mais exaltada do segundo
sobre um processo integral de concepção do objeto, pós-guerra estimulada pelo revisionismo realista
pois parece que construção e utilidade ficam atrás, da década de 1960. É imediato associá-las ao ima-
enquanto a fachada é tratada com ironia e engenho. ginário da precedente cidade Mecano ou Plug-in do
A atenção que compreende a fratura visual entre as grupo britânico Archigram (15).
partes percebe que, mais além do truque, abando-
nam-se as premissas para propor, não a falsidade,
mas a ilusão, uma aparência alheia à constituição
do objeto, uma composição emprestada, como po-
deria ser a dos tijolos desencontrados da parede,
ou dos sacos de café empilhados no armazém (14).

Corajosa é a fixação de módulos tridimensionais


nas arbóreas Torres Cápsula Nakagin, 1970-72, de
Kisho Kurokawa (1934-2007), em Shinbashi, Tóquio.
Cápsulas tridimensionais, fabricadas, equipadas e
parafusadas com chumbadores no núcleo central
definem, com precisão, duas ações – finalidades
construtivas: os gigantes monolíticos e a industria-
lização de habitáculos. Se o expressionismo meta-
bolista contraria regras com variedade para ofere-
cer arranjo mais pitoresco com discreta variação
modular e se as escotilhas circulares metaforizam
naves ou máquinas não há qualquer dano concep-
tivo, nem incoerência entre aspecto e construção.
As 140 cápsulas fabricadas na cidade de Nagasaki,
transportadas e montadas em Tóquio estão previstas
para durar 25 anos e para ser então substituídas.
http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/13.150/4508

A mudança de direção dos módulos desobedece


ao princípio construtivo e provoca desnecessária Archigram (1961-1974), fotomontagem em cidade americana com cápsulas e
produção de células mutantes e espalhadas para a Plug-in city [Blog Youaretheshit]

obter espontaneidade e casualidade contrárias à


alegada monotonia da sistematicidade inflexível da A cidade como estrutura de treliças espaciais, gaiolas
lei única e perfeita. Mostra que a aparência vívida – e mastros para acoplar células parece retomar Le
metabólica continua a ser um cuidado decisivo da Corbusier e seus territoriais imeubles-villes, agora
arquitetura e que nem mesmo a notável concepção desprovidos de avaliação geográfica, com pueril
ajustada à perfeita produção é capaz de dar impor- sistematicidade emprestada da linguagem tecno-
tância e resultado solvente à arquitetura. Mesmo futurista da história em quadrinhos, porém feroz e
que nesse caso haja legalidade no uso de cápsulas, empenhada em desmoralizar e desprezar a arquite-
a fachada expressa a mesma insegurança obser- tura moderna e discreta do International Style (16),
vada no Edifício Seida, o recurso a expedientes para responsabilizada pelo esmorecimento artístico do
chamar a atenção. feito moderno. Tudo em nome de pretensa mesmice
repisada por críticos entediados. Hornsey Housing

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Study, em 1966, de Peter Cook antecipa cápsulas O projeto do Edifício 360º é ganhador de dois prê-
em técnicas mistas de material moldado e gaiolas mios do Concurso Architectural Record’s Future
metálicas. Project na categoria residencial e como o melhor
projeto de todas as categorias. Corresponde a um
Finalmente, o Edifício 360° iniciado em 2011, em projeto de época em que a arquitetura não se sujeita
São Paulo, de Isay Weinfeld e Domingos Pascali, ao escrutínio técnico, mas a um preconceito ou re-
expõe um intricado realismo artístico, atípico na presentação improvável da construção do objeto que
arquitetura, por constranger a técnica construtiva inquieta. Pertence à época da exuberância tecnoló-
com miríade de operações para encenar módulos gica, quando se quer acreditar, com certa inocência e
prismáticos sobrepostos. Uma contida ficção de de- irresponsabilidade, que as técnicas construtivas são
sordem programada que subverte a inteligibilidade capazes de tudo. Há produções na história em que “a
do edifício para favorecer a retórica e a frivolidade. arquitetura é a paráfrase da construção” (18). É pos-
Numa estrutura bem plantada e regular, os balan- sível identificar nela os elementos construtivos que
ços e as arestas são desencontrados para fabricar pertencem a sua origem e constituição. Assim são
a espontaneidade, ou informalidade, típica das ci- as ordens do tratado de arquitetura, os capitéis, as
dades sem arquitetos, das vilas montanhesas, ou colunas, os entablamentos, sempre estudados como
das favelas. depósito de significados, representam os edifícios
que podem ser então entendidos por intermédio
É incoerente quando se faz com que as lajes típicas da citação. Em outros casos, a arquitetura convoca
do edifício sejam construídas segundo diferentes figuras sem DNA construtivo. Formatos ou curvas
técnicas de concreto estrutural. Certamente porque sem sentido construtivo claro ou possível. Porque
não se limita a forma à recomendação da técnica, tal concepção desdenha a condição construtiva do
apenas convoca a técnica por conveniência. Na re- objeto, ao convocar arranjos irredutíveis à lógica
gião entre os pilares, o sistema convencional com material, ao desafiar o cálculo e os materiais com
lajes armadas em vigas robustas que conectam os excepcionalidades e distorções que mais do que
pilares, enquanto que, nos balanços mais arrojados desafiar a técnica, a desacatam.
aplica-se protensão para retesar placas delgadas sem
dobras de enrijecimento. Esbeltos planos horizon- No edifício 360º, como outros projetos de sucesso,
tais, mais tarde, travestidos em volumes com ares- explora-se um formalismo arrebatado, não só por
http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/13.150/4508

tas de alvenaria variada. Nessa estrutura principal sua discrepância com a estrutura do edifício, como
são encostadas e amparadas com escoras metálicas por sua estranha intervenção na tarefa estrutural.
importantes peças pré-moldadas de concreto com Ele simula aspectos de uma produção tecnológica
seção em “L” para destacar abas de cobertura dos inexplorada em seu caso, o empilhamento com pa-
apartamentos, pontes térmicas descoladas dos pisos ralelepípedos autônomos, resistentes em arranjo
superiores no setor em balanço. Portanto, a borda espontâneo ou compositivo e, em que pese seu
inferior de concreto exposto nas fachadas não é sistema construtivo manual e habitual, referido à
estrutural, constitui um puxado sobre a estrutura aparência das experiências construtivas típicas da
principal que multiplica o momento no balanço in- pré-moldagem em concreto ou da industrialização
ferior, tamanha operação para que se confirme o da construção, duas maneiras diferentes de referir-
fingimento com sombras que destaquem os andares se à produção de módulos habitacionais completos
e insinuem uma fictícia pilha de paralelepípedos que a partir de grandes peças pré-moldadas.
sem ser células, tampouco são independentes (17).
Pintar faixas pretas horizontais em relevos das vigas O velho módulo empilhado, o mesmo que nos anos
entre os andares pouparia excêntrica construção e de 1960, concebe-se como produto de fábrica, trans-
cumpriria a mesma ilusão. portado e montado em estruturas urbanas torna-se

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agora um simulacro artesanal, tijolo por tijolo, sobre unidade (quer dizer, o equilíbrio). Por isso a Nova
estrutura convencional de concreto conformada por Imagem não é a manifestação de um conceito de
camadas pré-moldadas de cobertura e incontáveis vida dualístico, ao contrário: é a manifestação do
juntas horizontais com consequente calafetagem. A sentido de unidade consciente, maduro, que forma
obra conta com recursos e soluções técnicas atuais, a base da nova consciência do tempo”.
mas sua aparência vanguardista e requentada é
encenada com escassos meios construtivos. Exige- 2
se da técnica quando há de se montar o cenário de Neste artigo a noção de ordenar está sempre asso-
um empilhamento inexistente. São apenas cômodos ciada à disposição e traçado, portanto a um arranjo
e arestas expostas, alvenarias recortadas na borda ou estrutura formal. Diferente da noção de organizar
de diversos balanços. Um flerte melancólico e en- que se refere a relações funcionais, de conceitos
fraquecido com a vaga lembrança da firme concep- ou idéias: às ligações das partes de uma entidade,
ção do mundo novo, da transformação futura e do às vinculações num organismo. Relações que não
homem moderno. pressupõem obrigatoriamente a intelecção visual.

O empréstimo iconográfico contenta-se com o que 3


é remanescente, com as imagens amareladas da A idéia original de estética proposta por Alexander
linguagem arquetípica da habitação metropolitana Gottlieb Baumgarten (1714-1762), em seu inacabado
para as massas, do tempo em que se olha para frente, livro Ästhetik (1750-58), a maneira de conhecer, ou
quando há convicção, inteligência e contestação, reconhecer, por intermédio dos sentidos, conheci-
quando se integra e se pensa em inclusão social e tec- mento sensível ou conhecimento confuso, desloca-
nológica, economia de escala e redução de tempo e se em Immanuel Kant (1724-1804) para a idéia do
energia. Descartada a consciência, tudo é rebaixado juízo que se estabelece pelos sentidos, pela sensação
à banalidade, ao diferencial para vender à classe gnosiológica, a estética transcendental, no caso da
média, vale-se da memória frouxa para que figuras visão, pelo juízo da forma. A idéia de estética como
desprendidas dos nexos legítimos e sujeitadas a pro- conhecimento ou juízo é distinta da sensação esté-
cessos vexatórios sejam, no mercado exclusivo, um tica sentimental ou emotiva associada à empatia
privilégio do grupo de consumidores distinguidos ou simpatia.
com muito recurso e pouco critério.
http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/13.150/4508

4
notas Entre os vários significados da cardboard architec-
ture – arquitetura de papelão – menciona-se aqui o
1 que sustenta que a arquitetura constitui atividade
MONDRIAN, Piet. La nueva imagen en la pintura. intelectual auto-regulada e ideal. Em que é possível
La realización del neoplasticismo en la arquitectura desenvolver e conhecer o objeto de arquitetura pe-
del futuro lejano y de hoy. Comisión de la Cultura los conceitos, com desenho, simulação, imagem, ou,
del Colegio Oficial de Aparejadores y Arquitectos ainda, pela maquete de papelão sem que haja real
Técnicos, Galería-Librería Yerba e Consejería de Edu- compromisso de construir, sequer de considerar
cación de la Comunidad Autónoma: Murcia, 1983, hipótese construtiva. Corresponde a um momento
p. 87-88. Para poder conhecer a unidade, temos que radical talvez diletante da frivolidade teórica e
reconhecer, em tudo, a dualidade. “Porque quem especulativa sobre a noção prática comum, ou evi-
vê a unidade – no tempo – como uma aparência dente de arquitetura. Coincide com a degeneração
singular, vê uma unidade ainda vaga e incorreta. da arquitetura e com as experiências de desenhos
Ao vermos a unidade como dualidade, nós distin- de arquitetura feitos como forma bastante de arte
guimos, pela primeira vez, de que maneira existe a para exposição em galerias. Por conveniência e

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simulação a arquitetura de papelão é prestigiada e seus materiais com os estilos. Equiparar aquilo
e exerce forte influência e atração sobre acadêmi- que está bem construído à arquitetura ao procurar
cos das escolas de arquitetura, já que empresta o atributos da arte na construção é típico das Arts and
oportuno álibi para que, em milhares de ateliers, o Crafts e do Art Nouveau.
projeto de arquitetura seja ensinado à margem da
profissão e desoriente estudantes com presunções 7
teóricas e citações literárias. É tectônica a arte de construir e tectônico tudo aquilo
que está construído. No entanto a noção do que é
5 tectônico prevalece quando é protagonista o aspecto
A noção dominante de formalismo está associada construtivo do objeto. Quando a presença material e
ao uso arbitrário, desajuizado e irresponsável da construtiva surpreende, quando há plágio das placas
forma. Quando aplicado à arquitetura moderna cos- tectônicas e geológicas e adesão ao sentimento su-
tuma adquirir um sentido contrário ao da idéia que blime. Ao reconhecer situação construtiva exposta e
o formalismo clássico sustenta. Com certa razão, a oportuna. No entanto, a condição tectônica revela o
antecipação da categoria da forma sobre função e melhor quando o artefato é vertebrado por estrutura
conteúdo é apontada e criticada no objeto quando que renuncie à personificação e ao elogio técnico.
sua configuração não fica legalizada pelo juízo ou Quando há unidade e reconhecimento imediato
pela experiência. No entanto, o formalismo, que entre construção do objeto e aparência do objeto.
também é rigor, deve ser entendido como um
conjunto de normas e princípios da forma que fa- 8
vorecem a pertinência do objeto e propiciam seu ORTEGA Y GASSET, José. Meditación de la técnica
reconhecimento e aceitação pelo sujeito. O melhor y otros ensayos sobre ciência y filosofia. Alianza:
exemplo dessa acepção de formalismo é o sistema, Madrid, 1998.
também antecipado, das formas, modelos e figuras
que constituem o tratado da arquitetura clássica. O 9
formalismo corresponde à forma pela forma quando Nefelomancia. Arte da adivinhação por meio da
não evidencia pertinência, quando não estabelece observação das nuvens.
um sentido e concomitante reconhecimento. A
concepção em arquitetura precisa sempre anteci- 10
http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/13.150/4508

par algum formalismo. Por sinal, esse formalismo SEMPER, Gottfried. Style in the technical and tec-
parece ser a base daquilo que se entende como estilo. tonics arts, or, Practical aesthetics. Getty Research
Para fugir à denúncia de arbitrariedade ou levian- Institute: Los Angeles, 2004.
dade formal forja-se o resultado formal para fazer
parecer que pertence a um processo de decisões 11
lícitas e controladas. Der Stil in den technischen und tektonischen Künsten
oder Praktische Ästhetik, publicado em dois volumes
6 em 1861 e 1863.
Do alemão, o termo Baukunst é sinônimo de Ar-
chitektur – arquitetura – e Baustil – estilo de arqui- 12
tetura , a palavra composta por construir e arte, Fachadas montadas a seco. Os painéis com janelas
admite valor e arte na construção, ou construir com do tipo “Ideal” são o melhor exemplo dessa tecno-
arte, como o artista. Tal acepção, além de deslocar logia no meio paulistano e não é por acaso que cor-
o valor artístico do objeto de arquitetura para a téc- respondem a um dos períodos mais admirados da
nica e matéria, para a qualidade e superioridade da arquitetura moderna brasileira, pois o problema da
construção, estabelece também a relação da técnica arquitetura, deslocado mais tarde para a expressão

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da estrutura, alcança o melhor resultado como um fantásticas e expressivas que possam ser notadas
problema de apresentação da arquitetura por in- pela alienação das massas.
termédio de elementos fabricados pela indústria e
concebidos para fechar vazios. 17
Um efeito semelhante é imaginado por Lina Bo Bardi
13 (1914-1992) nos croquis do Conjunto das Artes, Rua
O grupo arquitetônico Superstudio dura de 1966 a Pamplona, São Paulo, 1962, em que a construção
1978. Aos fundadores Adolfo Natalini e Cristiano e sustentação do segundo plano de cobertura são
Toraldo juntam-se, mais tarde, Roberto Magris, Gian incompreensíveis. Em FERRAZ, Marcelo  Carvalho
Piero Frassinelli, Alessandro Magris e Alessandro (org.). Lina Bo Bardi. São Paulo, Instituto Lina Bo e
Poli. P. M. Bardi, 1993, p. 164-165.

14 18
O Projeto Burgo, 1991, Porto, de Eduardo Souto Expressão utilizada pelo arquiteto e professor Helio
Moura, empresta a ordem do empilhamento de Piñón para referir-se à relação entre arquitetura e
sarrafos aparelhados. Esse formalismo com sen- construção ao longo de toda a história da arquite-
tido estrutural e ordenado, acaba por não impor tura. Citada em conversas com o arquiteto.
uma condição construtiva. Então, na opção final é
usado indistintamente nos dois sentidos, vertical referências bibliográficas
no caso da lâmina horizontal, e horizontal no caso
da torre do conjunto. BENDER, Richard. A Crack in the Rear-View Mirror:
a view of industrialized Building. Nova York, Van
15 Nostrand Reinhold, 1973.
Archigram. Grupo britânico fundado em 1961 pelos
arquitetos: Peter Cook, Warren Chalk, Ron Herron, BLACHÈRE, Gérard. Technologies de la construction
Dennis Crompton, Michael Webb e David Greene. industrialisée. Paris, Eyrolles, 1975.
Parece restaurar a máquina e a saudade vanguar-
dista da arquitetura ao propor utopias e futurismos BLASER, Werner. Mies van der Rohe. São Paulo, Mar-
figurados com tecnologia espacial e infra-estrutura tins Fontes, 1994, p. 104-105, p. 115 e p. 117.
http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/13.150/4508

metropolitana, apresentadas segundo técnicas do


comics, da publicidade e dos recursos midiáticos. DURAND, Jean-Nicolas Louis. Précis des leçons d’ar-
chitecture, 1823.
16
International Style, de nome da exposição de arquite- FORD, Edward R.. The Details of Modern Architec-
tura moderna no MoMA de Nova York em 1932, dos ture. Cambridge/Londres, The MIT Press, 1994.
curadores Henry-Russell Hitchcock e Philip Johnson,
passa a designar o que seria um subproduto, ou toda FRAMPTON, Kenneth. Studies in Tectonic Culture.The
a arquitetura comercial e corporativa produzida poetics of Construction in Nineteenth and Twentieth
por imaginado, vendido e decadente establishment Century Architecture. Cambridge and London, The
arquitetônico. Parece que os críticos e jornalistas Mit Press, 1995.
precisam de material mais perturbador, pois não
conseguem ver na discrição e na crescente coerência JOEDICKE, Jürgen. Candilis Josic Woods: una década
qualquer atributo de interesse popular e imagético. de arquitectura y urbanismo. Barcelona, Gustavo
Precisam de figuras mais ousadas, provocativas, Gili, 1968, p. 28 e 32.

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vitruvius.com.br

arquitextos 150.00: Construir e configurar

KUROKAWA, Kisho. Metabolism in architecture.


Londres, Macmillan, 1977.

LAUGIER, Abade Marc-Antoine. Essai sur l’archi-


tecture. 2ª edição, 1755.

NEUMEYER, Fritz. The Artless Word. Mies van der


Rohe on the building art. Cambridge/Londres, The
MIT Press, 1991.

PARICIO, Ignacio. La construcción de la arquitec-


tura. V 1-3. Barcelona, Instituto de Tecnologia de
la Construcción Catalunya, 1995.

SARAIVA, Roberta (org.) Saul Steinberg: as aventuras


da linha. São Paulo, IMS/Pinacoteca do Estado de
São Paulo, 2011, p. 131.

SEMPER, Gottfried. Der Stil. 2ª edição. Londres, vol.


2, p. 263,1878.

sobre o autor

Luis Espallargas Gimenez é arquiteto (1977) e doutor


pela FAU USP (2004). É professor do IAU USP São
Carlos, desde 2007. Desde 1993 é titular do escritório
Luis Espallargas Arquitetura, com menções e pre-
miações em concursos nacionais de arquitetura e
Bienal Internacional de Arquitetura de São Paulo.
http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/13.150/4508

Editou, com Abílio Guerra, a revista Óculum n. 10-11,


1997, dedicada ao projeto Céramique de Jo Coenen,
em Maastricht, Holanda. É autor de diversos artigos
e capítulos dos livros Eduardo de Almeida (Romano
Guerra, 2002), Paulo Mendes da Rocha (UPC, 2003),
Eduardo de Almeida (UPC, 2005) e Habitação e cidade
(Escola da Cidade, 2009).

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