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Nota do autor

Após a publicação de “O Maravilhoso Mágico de Oz”; Eu comecei a receber cartas de crianças,


contando de seu prazer ao ler a história e me pedindo para “escrever mais alguma coisa” sobre o
Espantalho e o Homem de lata. De início eu considerei estas cartinhas, em sua franqueza e
honestidade, apenas como bonitos elogios; mas as cartas continuaram a chegar durante
sucessivos meses, e até anos.

Finalmente eu prometi a uma menininha, que fez uma longa jornada para me ver e apresentar seu
pedido - uma “Dorothy” - que quando milhares de garotinhas tivessem me escrito milhares de
cartinhas perguntando pelo Espantalho e pelo Homem de Lata eu iria escrever o livro.

Ou uma destas pequenas Dorothy era uma fada disfarçada que agitou sua varinha mágica, ou o
sucesso da produção teatral de “O Maravilhoso Mágico de Oz” fez novos amigos para a história,
pois as milhares de cartas chegaram a seu destino desde então – e muitas outras as seguiram.

E agora, apesar de me declarar culpado pelo atraso, eu mantive minha promessa neste livro.

L. FRANK BAUM.

Chicago, Junho, 1904


1
Tip constrói um Cabeça-de-Abóbora.

No país de Gillikins, que fica no norte da Terra de Oz, morava um jovem chamado Tip. Havia mais
no nome dele do que isso, porque a velha Mombi frequentemente declarava que o nome completo
dele era Tippertarius, mas ninguém falaria uma palavra tão longa quando “Tip” também serviria.

O garoto não lembrava nada dos pais, por que ele tinha sido trazido muito novo para ser criado
por uma velha conhecida como Mombi, cuja reputação, sinto muito por dizer isso, não era das
melhores. Porque o povo de Gillikins tinha razões para suspeitar que ela cedia às artes mágicas, e
portanto hesitavam em se associar com ela.

Mombi não era exatamente uma Feiticeira, por que a Feiticeira Bondosa que dominava aquela
parte da Terra de Oz havia proibido qualquer outra Feiticeira de existir nos domínios dela. Então a
tutora de Tip, por mais que aspirasse ao trabalho magico, percebeu que seria ilegal ser uma
feiticeira, sendo um tipo simples de Bruxa.

Tip era mandado a carregar madeira, para que a velha mulher pudesse ferver o caldeirão. Ele
também trabalhava nos campos de milho, capinando e descascando; e ele alimentava os porcos e
ordenhava a vaca de quatro chifres, que era o maior orgulho de Mombi.

Mas você não deve supor que ele trabalhava o tempo todo, pois ele sentia que isso seria ruim
para ele. Quando mandado para a floresta, Tip geralmente subia nas árvores a procura de ovos
de pássaro, ou se divertia caçando o bando de coelhos brancos ou pescando no riacho com um
anzol torto. Então ele pegava apressadamente o monte de comida e levava pra casa. E quando
era pra ele estar trabalhando nos campos de milho, e as espigas altas escondiam-no da visão de
Mombi, Tip geralmente cavava os buracos das toupeiras, ou se estivesse afim, ele deitava de
costas nas fileiras de milho e tirava um cochilo. Então, tomando cuidado para não fadigar suas
forças, ele crescia forte e robusto como um garoto tem que ser. A magia curiosa de Mombi
geralmente amedrontava seus vizinhos e eles a tratavam de forma tímida, ainda assim respeitosa,
por causa de seus estranhos poderes. Mas Tip francamente a odiava e não fazia questão de
esconder seus sentimentos. Na verdade, as eles às vezes mostrava menos respeito pela velha do
que deveria mostrar, considerando que ela era sua tutora.

Havia abóboras nos campos de milho de Mombi, espalhando um vermelho dourada por entre as
espigas verdes; e essas foram plantadas e cuidadosamente tratadas para que a vaca de quatro
chifres pudesse come-las no inverno. Mas, um dia, depois que o milho tinha todo sido colhido e
tirado das espigas, ele teve a ideia de fazer um boneco com cabeça de abóbora para dar um
susto na velhota.

Então ele escolheu uma abóbora boa e grande - uma com uma cor vermelha alaranjada lustrosa-
e começou esculpi-la. Com a ponta de sua faca ele fez dois olhos redondos, um nariz triangular e
uma boca com a forma de uma lua nova.

O rosto, quando terminado, não podia ser considerado exatamente bonito; mas tinha um sorriso
tão grande e vasto, e era tão contente de expressão, que até Tip riu enquanto olhava admirado o
seu trabalho. O menino não tinha amigos com quem brincasse e não sabia que muitas vezes os
meninos esculpiam bonecos com cabeça de abóbora, e no espaço interno colocavam uma vela
para iluminar. Mas ele teve uma ideia que prometia ser super efetiva. Ele decidiu manufaturar a
forma de um homem, que usaria essa cabeça de abóbora, e coloca-lo num lugar onde velha
Mombi iria dar de cara com ele.

“E então”, disse Tip para si mesmo com uma risada, “ela vai guinchar mais alto que a leitoa
marrom guincha quando eu puxo o rabo dela e se arrepiar mais do que eu fiz no ano passado
quando tive malária. Ele tinha tempo de sobra pra conseguir essa tarefa, por que Mombi tinha ido
a vila- comprar mantimentos, ela disse- e essa era uma jornada de dois dias pelo menos.

Então ele levou o seu machado para a floresta, selecionou algumas mudas retas e robustas, que
ele cortou e podou todos os galhos e folhas. Desses ele faria os braços e pernas e pés do
homem. Para o corpo, ele tirou uma folha de casca grossa do redor de uma grande árvore, e com
muito trabalho criou um cilindro aproximadamente do tamanho certo, prendendo as bordas junto
com estacas de madeira. Então, assobiando alegremente enquanto trabalhava, ele
cuidadosamente articulou os membros e prendeu-lhes ao corpo com pinos modelados no formato
com a faca.

Durante os momentos em que ele passou fazendo isto, começou a escurecer, e Tip lembrou que
ele deveria ordenhar a vaca e alimentar os porcos. Então ele pegou o homem de madeira e levou-
o de volta para casa com ele. Durante a noite, com a luz do fogo na cozinha, Tip cuidadosamente
arredondou todas as bordas das articulações e alisou os lugares ásperos de uma maneira limpa e
diligente. Então, ele colocou a figura em pé contra a parede e a admirou. Parecia extremamente
alto, mesmo para um homem adulto, mas isso era um ponto positivo aos olhos de um menino, e
Tip não se opôs a todo tamanho de sua criação.

Na manhã seguinte, quando ele olhou para o seu trabalho novamente, Tip viu que havia
esquecido de dar ao boneco um pescoço, por meio do qual ele iria poder prender o a cabeça de
abóbora no corpo. Então ele foi novamente para a floresta, o que não era muito longe, e picou de
uma árvore vários pedaços de madeira para completar seu trabalho. Quando voltou ele amarrou
uma peça transversal à extremidade superior do corpo, fazendo um buraco no centro para manter
o pescoço na posição vertical. O pedaço de madeira que formavam este pescoço também foi
aguçado na extremidade superior, e quando tudo estava pronto Tip colocou a cabeça de abóbora,
fixando-a bem no pescoço, e descobriu que se encaixava corretamente.

A cabeça podia ser girada de um lado para o outro, como ele quisesse, e os pinos dos braços e
pernas lhe permitiam colocar o boneco em qualquer posição que desejasse.

"Agora, isso", declarou Tip, orgulhosamente, "é realmente um homem muito bom, e isso deve
causar vários gritos da velha Mombi! Mas seria muito mais realista se ele fosse devidamente
vestido."

Encontrar a roupa certa parecia uma tarefa fácil, mas Tip corajosamente saqueou o grande baú no
qual Mombi mantia todas as suas lembranças e pertences, e na parte inferior, ele descobriu umas
calças roxas, uma camisa vermelha e um colete cor-de-rosa, que era salpicado com manchas
brancas. Estes, ele levou para o seu homem e conseguiu, embora as peças não se combinassem
muito bem ao vestir a criatura de uma forma alegre. Algumas meias de malha pertencentes a
Mombi e um par muito gasto de seus próprios sapatos concluíram o vestuário do homem, e Tip
estava tão encantado que ele dançou para cima e para baixo e riu alto na alegria juvenil.
“Eu devo lhe dar um nome”, ele gritou. “Um homem tão bom como esse merece ter um nome.” “Eu
creio”, disse ele depois de alguns momentos pensativos, “ que eu vou chama-lo de Jack Cabeça-
de-Abóbora.”
2
O Maravilhoso Pó da Vida

Depois de considerar a importância disto com cuidado, Tip decidiu que o melhor lugar para
colocar Jack seria na curva da estrada, a pouca distância da casa.

Então ele começou a carrega-lo para lá, mas achou o homem pesado e um pouco difícil de
manusear. Depois de arrastar a criatura uma pequena distância, Tip o colocou de pé e dobrou a
articulação de uma das pernas, depois da outra perna, e empurrando por trás, o menino
controlava Jack para fazê-lo andar para a curva da estrada.

Isto não ocorreu sem alguns tombos, e Tip realmente trabalhou mais do que ele já havia
trabalhado nos campos ou na floresta; mas o amor da travessura o guiava, e lhe agradava colocar
em prática a esperteza de sua criação.

“Jack está bem e funcionando bem!” ele disse a si mesmo, enquanto arquejava devido ao esforço
excessivo. Mas então ele descobriu que o braço esquerdo do homem havia caído no caminho,
então teve que voltar para busca-lo e esculpiu pinos novos e mais fortes para a articulação do
ombro, ele consertou tão bem que o braço ficou mais firme do que antes.

Tip também percebeu que a cabeça de abóbora de Jack havia girado e o rosto estava para trás;
mas isto foi facilmente remediado. Quando finalmente o homem estava colocado olhando o
caminho onde a velha Mombi estava para aparecer, ele parecia natural o suficiente para passar
por uma razoável imitação de um fazendeiro Gilikin, - e não natural o suficiente para assustar
qualquer um que viesse a ele desavisado.

Como ainda estivesse cedo para esperar a velha mulher voltar para casa, Tip desceu ao vale
após a casa da fazenda e começou a juntar nozes das árvores que cresciam ali.

Entretanto, a velha Mombi retornou mais cedo que o esperado. Ela tinha se encontrado com um
feiticeiro corcunda que morava em uma caverna solitária nas montanhas, e tinha tratado de
importantes segredos de mágica com ele. Tendo nisto adquirido três novas receitas, quatro pós e
uma seleção de ervas de poderes maravilhosos, ela tinha mancado para casa o mais rápido que
ela pôde, no desejo de testar suas novas feitiçarias.

Tão determinada estava Mombi nos tesouros que ela tinha adquirido, que quando ela dobrou a
curva da estrada e teve um vislumbre do homem, ela meramente acenou com a cabeça e disse:

“Boa tarde, senhor”

Mas, um momento depois, notando que a pessoa não se moveu ou respondeu, ela deu uma boa
olhada em sua cara e percebeu sua cabeça de abóbora elaboradamente esculpida pelo canivete
de Tip.

“Hah!” proferiu Mombi, dando um tipo de berro; “aquele garoto miserável está aprontando
travessuras outra vez! Muito bem! Muito bem! Vou torna-lo azul e preto por tentar me assustar
com estas roupas!”
Com muita raiva, ela levantou sua bengala para meter na sorridente cabeça de abóbora do
boneco; mas um pensamento repentino a fez parar com a bengala erguida no ar.

“Por que não? Aqui está uma boa oportunidade para testar meu novo pó!” disse ela avidamente.

“Então eu poderei dizer se aquele feiticeiro corcunda fez negociações de razoáveis, ou se ele
estava me fazendo de idiota tanto quanto eu malignamente o fiz.”

Então ela baixou sua cesta e começou a procurar nela por um dos preciosos pós que havia obtido.

Enquanto Mombi estava ocupada nisto, Tip estava voltando, com seus bolsos cheios de nozes, e
descobriu a velha mulher em pé na frente do homem e aparentemente nem um pouco assustada
por ele.

Primeiro ele ficou um tanto desapontado; mas no momento seguinte ficou curioso para saber o
que Mombi estava para fazer. Então ele se escondeu por trás de um arbusto, de onde ele podia
ver sem ser visto, e ficou observando.

Depois de alguma procura, a mulher tirou de sua bolsa uma velha caixa de pimenta, sobre a qual
havia uma etiqueta escrita pelo feiticeiro a lápis:

“Pó da Vida”

“Ah – aqui está!” ela murmurou cheia de alegria. “E agora vamos ver se isto é potente. O feiticeiro
mesquinho não me deu muito disso, mas acho que é o suficiente para duas ou três doses.”

Tip estava muito surpreso ao ouvir tudo isto. Então ele viu a velha Mombi levantar seu braço e
espalhar o pó da caixa sobre a cabeça de abóbora de seu homem Jack. Ela fez isso do mesmo
modo que colocaria pimenta em uma batata cozida, e o pó espalhou-se pela cabeça de Jack e
desceu pela camisa vermelha, o colete rosa e as calças roxas com as quais Tip o havia vestido e
uma porção também caiu nos sapatos usados e remendados.

Então, colocando a caixa de pimenta de volta no cesto, Mombi ergueu sua mão esquerda, com o
dedo mindinho apontado para cima, e disse: "Weaugh!"

Então ela levantou sua mão direita, com o polegar apontado para cima, e disse: "Teaugh!"

E então ela levantou ambas as mãos, com todos os dedos abertos, e disse: "Peaugh!"

Jack Cabeça de Abóbora deu um passo para trás, com isso, e disse em um tom de reprovação:

“Não grite assim! Você acha que eu sou surdo?”

A velha Mombi dançava em volta dele, agitando-se com deleite.

“Ele está vivo!” ela gritou: “Está vivo! Está vivo!”

Então ela jogou a bengala para cima e pegou de volta quando caiu; e ela abraçou a si mesma
com os dois braços, e tentava fazer uns passos de dança; e repetia o tempo todo, entusiasmada:

“Está vivo! – Está vivo! – Está vivo!”

Agora como você bem pode supor, Tip observava tudo isto maravilhado.
A princípio ele estava tão amedrontado e horrorizado, que ele queria correr dali, mas suas pernas
tremiam e se agitavam tanto que ele não pôde. Em seguida, lhe pareceu uma coisa muito
engraçada Jack ganhar vida, especialmente porque a expressão na cara de abóbora era tão
cômica e hilária que provocava riso no mesmo instante. Então, recuperando-se do medo anterior,
Tip começou a gargalhar; e o barulho chegou aos ouvidos da velha Mombi e a fizeram mancar
rapidamente para o arbusto, onde ela agarrou Tip pelo colarinho e o trouxe para onde ela tinha
deixado sua cesta e o homem de cabeça de abóbora.

“Moleque impertinente e maldoso!” ela exclamou furiosa: “Vou ensiná-lo a não espiar meus
segredos e rir de mim!”

“Eu não estava rindo de você” protestou Tip. “Eu estava rindo do velho Cabeça de abóbora! Olhe
para ele, não é uma figura e tanto?

“Eu espero que você não esteja se referindo à minha aparência” disse Jack; e era tão engraçado
de ouvir sua voz séria, enquanto a cara continuava mostrando o sorriso alegre, que Tip começou
novamente a gargalhar.

A própria Mombi estava com um interesse curioso no homem que sua mágica tinha trazido à vida;
e depois de olhar bem para ele, ela perguntou:

“O que você sabe?”

“Bem, isto é difícil de dizer,” respondeu Jack “Pois embora eu sinta que eu sei um bocado, eu
ainda não sei o quanto há no mundo para se saber. Vou me dar um pouco de tempo para
descobrir se sou muito sábio ou muito tolo.”

“Com certeza” disse Mombi, pensativa.

“Mas o que vamos fazer com ele, agora que está vivo?” perguntou Tip.

“Eu preciso pensar sobre isso,” respondeu Mombi. “Mas precisamos ir para casa logo, pois está
escurecendo. Ajude o Cabeça de Abóbora a andar.”

“Não se preocupe comigo” disse Jack “Eu posso andar tão bem quanto você. Tenho pernas e pés,
e eles são articulados”

“Eles são?” perguntou a mulher, voltando-se para Tip

“É claro que são; eu mesmo fiz assim” respondeu o garoto com orgulho.

Então se puseram a caminho de casa, mas quando eles chegara a certa distância da fazenda, a
velha Mombi conduziu o homem-abóbora para o estábulo das vacas e o colocou numa cocheira
vazia, fechando a porta com segurança pelo lado de fora.

“Tenho que acertar as contas com você, primeiro” ela disse, balançando sua cabeça para Tip.

Ao ouvir isto, o garoto ficou preocupado; pois ele sabia que Mombi tinha um coração mau e
vingativo, e que não hesitaria em lhe fazer alguma coisa de ruim.

Eles entraram na casa. Era uma casa arredondada, com estrutura de cúpula, como eram todas as
casas de fazenda próximas na Terra de Oz.
Mombi mandou o menino acender uma vela, enquanto ela colocou sua cesta num armário e
pendurou o casaco num cabide. Tip obedeceu rapidamente, pois estava com medo dela.

Depois que a vela estava acesa, Mombi mandou que ele fizesse fogo na lareira, enquanto ele
estava ocupado nisto, a velha mulher estava jantando.

Quando o fogo começou a crepitar, o menino veio a ela e pediu um pouco de pão e queijo; mas
Mombi lhe negou.

“Estou com fome!” disse Tip, num tom de lamento.

“Você não vai ter fome tão cedo” respondeu Mombi, com um olhar cruel.

O garoto não gostou desta fala, pois soava como uma maldade; mas ele se lembrou que tinha
nozes em seu bolso, então ele quebrou algumas delas e comeu, enquanto a mulher se levantava
e sacudia as migalhas de pão e colocava uma pequena chaleira preta sobre o fogo.

Então ela mediu partes iguais de leite e vinagre e colocou na chaleira. Em seguida ela separou
vários pacotes de ervas e pós, e começou a colocar porções de cada um deles na chaleira.

De vez em quando ela olhava algum desenho perto da vela, e lia em um papel amarelado,
receitas da gororoba que ela estava cozinhando.

Quando Tip olhou para ela, a inquietação aumentou.

“Para que é isso?” ele perguntou.

“Para você” respondeu Mombi prontamente.

Tip contorceu-se em seu banquinho e deu uma boa olhada para a chaleira, enquanto ela
começava a borbulhar. Ele olhou para a séria e enrugada bruxa e desejou estar em qualquer
lugar, menos naquela cozinha escura e enfumaçada, onde até mesmo as sombras feitas pela luz
da vela na parede eram o suficiente para aterrorizá-lo. Depois de uma hora, na qual o silencio era
apenas quebrado pelo borbulhar da chaleira e o chiado das chamas.

Finalmente Tip falou outra vez.

“Eu tenho que beber essa coisa?” ele perguntou, acenando para a panela.

“Sim” disse Mombi.

“O que isto vai me fazer?” Tip perguntou

“Se estiver corretamente misturado” respondeu Mombi “irá transformá-lo numa estátua de
mármore”

Tip gemeu e limpou o suor da testa com a manga.

“Eu não quero ser uma estátua de mármore!” ele protestou.

“Não me importa que você não queira ser” disse a velha, olhando para ele severamente.

“Que utilidade eu vou ter então” perguntou Tip. “Você não terá ninguém para trabalhar para você”.
“Farei o cabeça de abóbora trabalhar para mim” disse Mombi.

Tip gemeu outra vez.

“Por que não me transforma num bode, ou uma galinha?” perguntou ele, preocupado. “Você não
pode fazer nada com uma estátua de mármore”.

“Oh, sim, eu posso” respondeu Mombi “eu planejo plantar um jardim de flores na próxima
primavera, e irei coloca-lo no meio, para decorar. Estou surpresa de não ter feito isso antes; você
tem me aborrecido por anos”.

Com essa terrível declaração Tip sentia as gotas de suor brotando por todo o corpo, mas ele
permanecia sentado e tremendo e olhava preocupado para a chaleira.

“Acho que não irá funcionar” ele murmurou, numa voz que parecia fraca e sem coragem.

“Oh, eu penso que irá” respondeu Mombi, alegremente. “Eu raramente erro”.

Novamente houve um período de silêncio, um silêncio tão longo e melancólico, que quando
Mombi finalmente retirou a chaleira do fogo, já estava próximo da meia noite.

“Você não pode beber enquanto não estiver completamente frio” anunciou a velha bruxa, pois
segundo a lei ela tinha acabado de praticar feitiçaria.

“Podemos ir dormir agora, e durante o dia eu vou lhe chamar e transformá-lo de uma vez em
estátua de mármore”.

Com isto ela seguiu para seu quarto levando a fumegante chaleira consigo, e Tip ouviu-a fechar e
trancar a porta.

O garoto não conseguiu ir para a cama como ela tinha mandado, mas permaneceu sentado
olhando para as brasas que morriam na lareira.
3
O vôo dos fugitivos

Tip pensava:

"É difícil ser uma estátua de mármore", pensou revoltado "e eu não vou me tornar uma. Ela disse
que, por anos, eu tenho sido um incômodo; e que vai se livrar de mim. Bem, há um jeito mais fácil
do que se tornar uma estátua. Nenhum garoto jamais poderia se divertir ficando pra sempre no
meio de um jardim. Eu vou fugir, é o que eu vou fazer - e vou antes de ela me fazer beber aquela
coisa horrível da chaleira".

Ele esperou até que os roncos da bruxa velha anunciassem que ela tinha dormido e, então, ele
surgiu sorrateiro e foi até o armário achar algo pra comer.

"Não adianta iniciar uma jornada sem comida". Ele decidiu procurar nas prateleiras estreitas.

Ele achou alguns pedaços de pão, mas teve que olhar na cesta de Mombi para achar o queijo que
ela trouxera do vilarejo. Enquanto revirava os itens na cesta, ele achou uma caixinha que continha
o "pó da vida".

"Eu devo levar isso comigo" - pensou - "ou Mombi usará isso pra fazer mais travessuras". Então,
ele colocou a caixa no bolso, junto com o pão e o queijo.

Então ele, cautelosamente, deixou a casa trancando a porta ao sair. Do lado de fora, a lua e as
estrelas brilhavam, e a noite parecia calma e convidativa após a pequena e malcheirosa cozinha.

"Estou feliz em fugir" sussurrou Tip; "porque eu nunca gostei daquela velha. Eu me pergunto como
eu vim morar com ela."

Ele caminhava vagarosamente pela estrada quando um pensamento o fez parar.

"Eu não quero deixar o Jack cabeça de abóbora à mercê da velha Mombi", ele sussurrou. "E Jack
me pertence. Foi eu quem o fez, mesmo que a bruxa velha tenha dado vida à ele."

Ele retomou seus passos em direção ao estábulo e abriu a porta do celeiro, onde o homem
cabeça de abóbora foi deixado.

Jack estava no meio do estábulo e, sob a luz da lua, Tip podia ver que ele estava sorrindo
alegremente como sempre.

"Vamos!" disse o menino acenando.

"Pra onde?", perguntou Jack.

"Você saberá assim que sairmos" respondeu Tip, sorrindo simpaticamente.

"Tudo o que temos que fazer agora é sair".

"Muito bem", respondeu Jack, andando desajeitadamente para fora do estábulo sob a luz da lua.
Tip caminhou em direção à estrada e o homem o seguiu. Jack andava mancando e, de vez em
quando, a articulação de uma de suas pernas virava para trás, ao invés de pra frente, quase o
fazendo cair. Mas o cabeça-de-abóbora percebeu rápido e começou a andar devagar, assim
corria menos risco de acidentes.

Tip o conduziu pela estrada sem parar. Eles não podiam andar rápido, mas andavam
constantemente e, quando a lua se escondeu e o sol surgiu nas montanhas, eles tinham ido longe
o bastante, e o menino não tinha razões para temer que a velha bruxa fosse atrás deles.

Além disso, primeiro eles foram por um caminho e, depois, por outro, assim seria muito difícil
segui-los porque era difícil adivinhar por qual caminho eles tinham fugido ou onde procura-los.

Feliz por ter escapado - ao menos por enquanto - de ser transformado em uma estátua de
mármore, o menino e seu companheiro fizeram uma pausa e se sentaram em uma pedra à beira
da estrada.

"Vamos tomar café da manhã", ele disse.

Jack cabeça de abóbora assistia Tip curiosamente, mas se recusava a participar da refeição.
"Parece que eu não fui feito da mesma forma que você", disse.

"Eu sei que não", respondeu Tip, "porque eu fiz você".

"Oh, você fez?", perguntou Jack.

"Certamente. Eu montei você. E esculpi seus olhos e seu nariz, suas orelhas e sua boca", disse
Tip orgulhoso, "E vesti você".

Jack olhou seu corpo criticamente.

"Me parece que você fez um ótimo trabalho", comentou.

"Mais ou menos", respondeu Tip, modestamente, começando a observar certos defeitos na


construção de seu companheiro. "Se eu soubesse que iriamos viajar juntos, teria feito um trabalho
melhor".

"Então", disse o cabeça-de-abóbora em tom de surpresa, "você deve ser o meu criador, meu
pai!".

"Ou seu inventor", respondeu rindo. "Sim, filho. Acredito que sim!".

"Então e te devo obediência", continuou, "e você me deve cuidado".

"Exatamente", disse Tip, levantando. "então, vamos andando".

"Aonde vamos?" perguntou Jack logo que retomaram a caminhada.

"Eu não tenho certeza", disse o menino, "mas acredito que estejamos indo para o Sul e, mais
cedo ou mais tarde, chegaremos na Cidade das Esmeraldas".

"Que lugar é esse?", questionou o cabeça-de-abóbora.


"Bem, é o centro de Oz e a maior cidade da região. Eu nunca estive lá, mas ouvi muitas histórias.
Ela foi construída por um mago poderoso chamado Oz, e tudo na cidade é verde - assim como
tudo aqui em Gillikins é púrpura."

"Tudo aqui é púrpura?" perguntou Jack.

"Claro, não está vendo?" respondeu o menino.

- "Pensei que eu fosse daltônico", disse o cabeça de abóbora depois de pensar nisto.

"Bem, a grama é púrpura, as árvores são púrpura, as casas e as cercas são púrpura", explicou
Tip. "Até a lama das estradas é púrpura. Mas na Cidade das Esmeraldas tudo é verde. E na terra
dos Munchkins, no oriente, tudo é azul; E na cidade dos Quadlings, ao sul, tudo é vermelho; e na
terra dos Winkies, à Oeste, onde o homem de lata governa, tudo é amarelo."

"Oh!” disse Jack. Depois de uma pausa, ele perguntou: “Você disse que um homem de lata
governa os Winkies?”

- "Sim, ele ajudou Dorothy a destruir a bruxa má do leste, e os Winkies ficaram tão agradecidos
que o convidaram para ser seu governante - assim como as pessoas na Cidade das Esmeraldas
convidaram o espantalho para ser seu governante”.

"Nossa!", disse Jack, "estou confuso com toda essa história. Quem é o espantalho?"

"Outro amigo de Dorothy", respondeu Tip.

"E quem é Dorothy?"

"É uma garota que veio do Kansas, um lugar no gigantesco mundo externo. Ela chegou a Oz em
um ciclone e, enquanto esteve aqui, o espantalho e o homem de lata a acompanharam em suas
viagens.”

"E onde ela está agora?", perguntou o cabeça-de-abóbora.

"Glinda, a bruxa boa, que governa os Quadlings, mandou-a de volta para casa", disse o menino.

"Oh. E o que aconteceu com o espantalho?"

- "Eu te disse. Ele governa a Cidade das Esmeraldas", respondeu Tip.

"Eu pensei que você tinha dito que ela era governada por um mago", disse Jack parecendo mais
confuso.

- "Bem, eu disse. Agora, preste atenção. Eu vou explicar." disse Tip, falando bem devagar e
observando o sorriso do cabeça-de-abóbora encostar em seus olhos. "Dorothy foi à Cidade das
Esmeraldas, pedir ao mago que a mandasse de volta para casa. Mas o mago não podia mandá-la
de volta, pois não era tão mago como deveria. E então, eles ficaram com raiva do mago, e
ameaçaram denunciá-lo; então o mago fez um grande balão e fugiu nele e, desde então, nunca
mais foi visto."

"É uma história muito interessante", disse Jack, bem satisfeito "e eu entendi perfeitamente a
explicação".
"Fico feliz que tenha entendido", respondeu Tip. "Depois que o mago se foi, o povo da Cidade
das Esmeraldas fizeram do espantalho, seu rei; e eu ouvi que ele se tornou um governante muito
popular"

"E nós vamos ver esse estranho rei?" perguntou Jack, interessado.

"Acho que devemos", respondeu o menino, "a menos que você tenha algo mais interessante para
fazer".

"Ah, não pai", disse o cabeça-de-abóbora. "Estou disposto a ir onde você for."
4
Tip faz um experimento mágico

O garoto, pequeno e de aparência delicada, pareceu se sentir atrapalhado por ser chamado de
"pai", pelo alto e estranho cabeça-de-abóbora. Mas, para evitar uma longa e tediosa discussão
sobre o tipo de relacionamento, ele mudou de assunto rapidamente: “Você está cansado”?

"Claro que não!", respondeu o outro. "Mas", continuou após uma pausa, "é certo de que minhas
juntas de madeira vão desgastar se continuar andando."

Tip refletiu, enquanto caminhavam. Ele começou a se arrepender por não ter feito os membros de
madeira mais resistentes e com maior cuidado. E ainda, como ele nunca poderia imaginar que o
homem que ele tinha feito, apenas para assustar a velha Mombi, seria trazido à vida por meio de
um pó mágico contido em uma caixinha velha de pimenta?

Assim, ele deixou de reprovar a si mesmo, e começou a pensar em como ele ainda poderia
corrigir as deficiências das articulações de Jack.

Assim, enquanto ocupados, eles chegaram ao pé de uma árvore, e o menino sentou-se para
descansar em um velho cavalete que algum lenhador deixou por lá.

"Por que não se senta?" perguntou ao cabeça-de-abóbora.

"Não vai esticar minhas articulações?", perguntou o outro.

"Claro que não. Vai descansá-las." respondeu o menino.

Então, Jack tentou sentar, mas assim que ele dobrou suas juntas mais do que o de costume, elas
estalaram. Ele caiu no chão, fazendo um som com como se tivesse quebrado. Tip temeu que ele
estivesse completamente arruinado.

Ele correu até Jack, o levantou, endireitou seus braços e pernas e verificou sua cabeça para saber
se tinha quebrado. Mas Jack parecia estar em perfeito estado, apesar de tudo, e Tip disse a ele:

"Acho que é melhor você ficar assim. Parece mais seguro."

"Muito bem, querido pai. Como quiser.", respondeu Jack, sorridente, que tinha ficado confuso
com a queda.

Tip sentou novamente. Em seguida, o cabeça-de-abóbora perguntou:

"O que é isso em que você tá sentado?”.

"Ah, isso é um cavalo", respondeu o menino, descuidadamente.

"E o que é um cavalo?", perguntou Jack.


"Um cavalo? Bem, existem dois tipos de cavalo", respondeu Tip, meio confuso para explicar. "Um
tipo de cavalo tem vida, e tem quatro patas e uma cabeça e um rabo. E as pessoas montam
neles".

"Entendi", disse Jack, alegre. "Esse é o tipo de cavalo no qual você está sentado agora".

"Não, não é", respondeu Tip prontamente.

"Por que não? Ele tem quatro patas, uma cabeça e um rabo." Tip olhou o cavalete
cuidadosamente, e percebeu que o cabeça-de-abóbora estava certo. O corpo tinha sido feio de
um tronco de árvore e um ramo projetava-se em uma das extremidades e se parecia muito com
um rabo. Na outra ponta, havia dois nós que se pareciam muito com olhos, e havia uma rachadura
que poderia facilmente ser confundida com a boca de um cavalo. Quanto às quatro patas, elas
eram quatro troncos de árvore ligeiramente presos ao corpo, sendo bem afastados para que o
cavalo estivesse firme, quando uma tora fosse apoiada nele para ser serrada.

"Isso se parece mais com um cavalo do que eu imaginei", disse Tip, tentando explicar. "Mas um
cavalo de verdade está vivo, e cavalga, empina e come feno, enquanto esse é apenas um cavalo
feito de madeira, e usado pra serrar toras."

"Se ele estivesse vivo, ele não andaria, empinaria e comeria feno?", questionou o cabeça-de-
abóbora.

"Talvez ele até cavalgasse, mas não comeria feno", respondeu o menino, rindo da ideia. "Mas é
claro que ele nunca poderia estar vivo, porque é feito de madeira."

"Tanto quanto eu", respondeu o homem. Tip o olhou com espanto.

"Claro, você também é!", exclamou. "E o pó mágico que o trouxe a vida está aqui no meu bolso."

Ele pegou a caixinha de pimenta e a olhou curiosamente.

"Eu queria", disse pensativo, "que fosse possível dar vida ao cavalo."

- "Se fosse possível", respondeu Jack, não parecendo surpreso, "Eu poderia montar nele, e não
iria desgastar minhas juntas ao andar".

"Eu vou tentar!", disse o garoto, ficando de pé. "Eu gostaria de lembrar as palavras que a velha
Mombi disse, e da forma que ela levantou as mãos."

Ele pensou por um momento. Uma vez que tinha assistido cuidadosamente cada movimento da
velha bruxa e ouvido suas palavras, ele acreditava que poderia repetir exatamente o que ela tinha
feito.

Então ele começou a jogar um pouco do pó mágico da vida sobre o corpo do cavalo. Depois,
levantou sua mão esquerda, com o dedo apontando para cima e disse:

"Weaugh!"

"O que isso significa papai?", perguntou Jack, curioso.

"Eu não sei", respondeu Tip. Depois ele levantou a mão direita, com o polegar apontado para
cima e disse:
"Teaugh!"

"O que é isso, pai?", questionou Jack.

"Significa que você deve ficar quieto!", respondeu o menino, irritado por ter sido interrompido em
um momento tão importante.

"Como eu aprendo rápido!", comentou o cabeça-de-abóbora, com o seu eterno sorriso.

Agora Tip tinha levantado as duas mãos acima de sua cabeça, com todos os dedos apontados
para cima, e gritou bem alto:

"Peaugh!"

Imediatamente, o cavalo se moveu, esticou suas patas, relinchou com sua boca cortada, e
sacudiu seu corpo, tirando um pouco de pó de seu corpo. O restante do pó parece ter sido
absorvido pelo corpo do cavalo.

"Bom!", disse Jack, enquanto o menino olhava atônito. "Você é um feiticeiro muito inteligente,
papai!"
5
O Despertar do Cavalete

O Cavalete, percebendo que estava vivo, parecia estar mais atônito do que Tip. Ele mexia seus
olhos de nó de um lado para outro, dando uma primeira olhada maravilhado no mundo, no qual
agora ele tinha uma existência. Então ele tentou olhar para si mesmo; no entanto ele não tinha um
pescoço pra girar; então, na tentativa de ver seu corpo, ficou dando voltas e voltas, sem conseguir
contemplar a si mesmo. Suas pernas eram duras e não se dobravam, pois não tinha articulações
dos joelhos; de repente ele deu uma batida em Jack Cabeça-de-Abóbora e derrubou o
personagem sobre o musgo da beira da estrada.

Tip ficou assustado com o acidente, e também pela insistência do Cavalete em ficar girando em
círculos, então ele chamou:

“Ôooa! Ôooa lá!”

O Cavalete não deu nenhuma atenção a este comando, e de repente bateu com uma das pernas
na perna de Tip, que sentiu dor e correu para longe, de onde gritou outra vez:

“Eu disse, ôooaa! Ôooaa!”

Jack agora estava sentado, e olhava para o Cavalete com interesse.

“Não creio que o animal possa ouvir você” ele disse.

“Eu gritei alto, não?” respondeu Tip, zangado.

“Sim, mas este cavalo não tem orelhas” disse o Cabeça-de-Abóbora sorridente.

“Realmente você está certo!” exclamou Tip, percebendo este fato pela primeira vez. “Então, como
faço pra pará-lo?”

Mas, por um instante o Cavalete parou sozinho, pois concluiu que era impossível ver o próprio
corpo. Ele olhou para Tip novamente e veio para perto dele, para olhar para o menino mais
atentamente.

Era realmente engraçado ver a criatura andando, pois ele movia as duas pernas de cada lado de
uma só vez. Como um cavalo de brinquedo faz, balançando-se como um berço.

Tip deu tapinhas carinhosas na cabeça dele e disse: “Bom garoto! Bom garoto!” e o Cavalete
empinou-se e foi examinar o Cabeça-de-Abóbora com seus olhos arregalados.

“Tenho que arranjar arreios para ele” disse Tip; e dando uma procurada nos bolsos, encontrou um
fio de corda forte. Desenrolando, ele se aproximou do Cavalete e amarrou a corda em volta de
seu pescoço, e prendeu a outra ponta em uma grande árvore. O Cavalete, sem entender o
significado disto, andou para trás e partiu a corda facilmente; mas não fez nenhuma tentativa de
fugir.

“Ele é mais forte do que pensei” disse o menino, “e mais obstinado também,”
“Porque você não faz umas orelhas para ele?” perguntou Jack. “Então poderá dizer a ele o que
fazer”.

“Que ideia esplêndida!” disse Tip. “Como você conseguiu pensar numa coisa dessas?”

“Bem, eu não pensei sobre isso,” respondeu o Cabeça-de-Abóbora “não precisei, pois esta era a
coisa mais simples a se fazer.”

Então Tip puxou sua faca e esculpiu orelhas a partir do galho de um pequena árvore.

“Não devo faze-las muito grandes” ele disse enquanto esculpia, “ou nosso cavalo vai se tornar um
burro.”

“Como assim?” perguntou Jack, estando ao lado da estrada.

“Bem, um cavalo tem orelhas maiores que as de um homem; e um burro tem orelhas maiores que
as de um cavalo” explicou Tip.

“Então, se minhas orelhas fossem maiores, eu poderia ser um cavalo?” perguntou Jack.

“Meu amigo” disse Tip muito sério, “você jamais será outra coisa além de um Cabeça-de-Abóbora,
não importa quão grandes sejam suas orelhas.”

“Oh” disse Jack assentindo com a cabeça “acho que entendi”.

“Se você entendesse seria bom,” respondeu o menino “mas não há mal em achar que entendeu.
Eu acho que essas orelhas estão prontas agora. Você segura o cavalo enquanto eu as coloco
nele?”

“Claro, se você me ajudar a ficar de pé” disse Jack.

Então Tip o colocou de pé, e o Cabeça-de-Abóbora veio até o cavalo e segurou a cabeça dele
enquanto o menino fazia dois buracos nela com a lâmina da faca e inseria as orelhas.

“Elas o fazem ficar muito bonito” disse Jack admirado.

Mas estas palavras, ditas perto do Cavalete, foram o primeiro som que ele ouviu, de modo que ele
se assustou e pulou, derrubando Tip para um lado e Jack do outro. Em seguida ele continuou
correndo em frente, como se estivesse com medo do barulho dos seus próprios passos.

“Ôooa!” gritou Tip, levantando-se; “Ôooa! Seu idiota,ôooaa!” O Cavalete provavelmente não teria
prestado atenção a isto, mas neste momento ele enfiou a perna num buraco de toupeira e ficou no
chão caído de pernas para cima, mexendo freneticamente as patas no ar.

Tip correu até ele.

“Você é um ótimo tipo de cavalo, tenho que admitir!” ele exclamou ironicamente. “Porque você não
parou quando eu gritei ‘ôoa’?

“Então ‘ôoa’ significa parar? Perguntou o Cavalete, numa voz surpresa, enquanto virava os olhos
para ver o garoto.

“É claro” respondeu Tip.


“E um buraco no chão significa parar também, não é?” continuou o cavalo.

“Com certeza; a menos que você queira parar nele” disse Tip.

“Que lugar estranho” falava a criatura, como se estivesse maravilhado. “O que eu estou fazendo
aqui?”

“Bem, eu trouxe você à vida” respondeu o menino “mas você não irá se machucar nunca se me
ouvir e fizer o que eu lhe digo.”

“Então eu irei fazer tudo o que você me disser” respondeu o Cavalete humildemente. “Mas o que
aconteceu comigo um momento atrás? Eu não estou mais vendo as coisas direito, de algum
modo”.

“Você está de cabeça para baixo” explicou Tip. “Mas deixe essas pernas paradas por um minuto
e eu vou colocar você do lado certo outra vez”.

“Quantos lados eu tenho?” perguntou a criatura admiradamente.

“Muitos” disse Tip “mas mantenha essas pernas paradas”.

O Cavalete então ficou quieto, e deixou as pernas imóveis; então Tip, depois de muito esforço,
conseguiu virá-lo para o lado certo.

“Oh, eu vejo tudo corretamente agora” disse o animal alegremente, com um sorriso.

“Uma das orelhas está quebrada” Tip falou após um cuidadoso exame. “Tenho que fazer uma
nova.”

Então ele levou o Cavalete de volta para onde Jack estava tentando, sem sucesso, se colocar de
pé, e depois de ajudar o Cabeça-de-Abóbora a levantar-se, Tip esculpiu uma nova orelha e
rapidamente a colocou na cabeça do cavalo.

“Agora” ele disse, dirigindo-se ao cavalo “preste atenção no que eu vou lhe dizer. ‘Ôoa!’ significa
que você deve parar; ‘Em frente!’ significa que você deve andar para a frente; ‘Trotar!’ significa
que você deve ir o mais rápido que puder. Entendeu?”

“Acho que entendi” respondeu o cavalo.

“Muito bom. Nós estamos indo em uma jornada para a Cidade das Esmeraldas, para ver sua
Majestade, o Espantalho; e Jack Cabeça-de-Abóbora vai montado em suas costas, para não
desgastar as articulações”.

“Tudo bem” disse o Cavalete. “Tudo que lhe satisfaz me satisfaz.”

Então Tip ajudou Jack a montar sobre o cavalo.

“Segure firme” ele avisou “ou você poderá cair e quebrar sua cabeça de abóbora.”

“Isto seria horrível!” disse Jack estremecendo. “Mas em quê vou me segurar?”

“Bem, segure nas orelhas dele” respondeu Tip, depois de um momento de hesitação.

“Não faça isso!” reclamou o Cavalete; “pois senão eu não vou poder ouvir.”
Parecia ter sentido, então Tip tentou pensar em mais alguma coisa.

“Vou consertar isso!” ele disse por fim. Ele foi a floresta e cortou um pequeno toco de madeira de
uma árvore jovem e robusta. Num dos lados ele esculpiu uma ponta, e então ele fez um buraco
nas costas do Cavalete, bem atrás da cabeça. Em seguida ele pegou uma pedra da estrada e
martelou forte o toco com ela, prendendo-o firme nas costas do animal.

“Pare! Pare!” exclamou o cavalo; “você está me rangendo terrivelmente.”

“Dói?” perguntou o menino.

“Não dói exatamente” respondeu o animal; “mas me faz ficar bastante nervoso por estar
rangendo.”

“Bem, já está terminado” disse Tip, encorajando. “Agora Jack, segure-se forte neste toco e então
não poderá cair e se quebrar”.

Jack segurou firme, e Tip disse ao cavalo:

“Em frente.”

A criatura obediente começou a andar para a frente, balançando-se de um lado para o outro
enquanto levantava os pés do chão.

Tip caminhava ao lado do Cavalete, bastante contente com este acréscimo ao grupo. Ele
começou a assobiar.

“O que este som significa?” perguntou o cavalo.

“Não dê nenhuma atenção a isto” disse Tip. “Estou apenas assobiando, e isto quer dizer apenas
que estou muito satisfeito.”

“Eu poderia assobiar, se eu conseguisse juntar meus lábios” disse Jack. “Temo, querido pai, que
em alguns aspectos eu esteja em falta.”

Depois de percorrerem uma longa distancia, o estreito caminho por onde estavam seguindo se
tornou em uma larga estrada, pavimentada com tijolos amarelos. Ao lado da estrada Tip percebeu
um poste de sinalização que dizia:

“CIDADE DAS ESMERALDAS A 14 KILOMETROS”

Mas estava escurecendo, então eles decidiram acampar por esta noite ao lado da estrada, e
continuar a jornada no amanhecer do dia seguinte. Ele levou o Cavalete até um monte de grama
alta no meio de algumas árvores e ajudou o Cabeça-de-Abóbora a desmontar.

“Eu acho que devo deixa-lo deitado sobre o chão durante a noite” disse o menino. “Você vai estar
seguro deste modo.”

“E eu?” perguntou o Cavalete.

“Você não se machuca por ficar de pé” respondeu Tip; “e como você não ode dormir, pode vigiar
para que ninguém se aproxime para nos incomodar.”
Então o menino se deitou sobre a grama próximo ao Cabeça-de-Abóbora e como estava muito
cansado pela jornada, dormiu rapidamente.
6
Jack Cabeça-de-Abóbora cavalga para a Cidade das
Esmeraldas

Na madrugada Tip foi acordado pelo Cabeça-de-Abóbora. Ele afastou o sono dos olhos tomando
banho num pequeno riacho, e então comeu um pouco de pão e queijo. Estando assim preparado
para um novo dia, o garoto disse:

“Devemos começar imediatamente, nove quilômetros é uma distância e tanto, mas devemos
chegar pelo meio dia, se não acontecer nenhum acidente.” Então o Cabeça-de-Abóbora foi
novamente empoleirado na garupa do Cavalo-Serrado e a viagem foi retomada.

Tip notou que a coloração roxa da grama e das árvores, tinha agora se tornado um roxo-lavanda
entediante; e depois de algum tempo este lavanda passou a assumir uma coloração esverdeada,
e o verde se tornava mais intenso e radiante à medida que eles se aproximavam da grande
cidade, onde o Espantalho governava.

O pequeno grupo tinha percorrido umas pequenas duas milhas, quando chegaram a um ponto em
que um rio de forte correnteza cruzava a estrada de tijolos amarelos . Tip ficou confuso sobre
como atravessar, mas depois de um tempo ele descobriu um homem em um tipo de balsa, se
vindo da margem oposta do rio.

Quando o homem estava próximo, Tip perguntou:

“Você vai nos levar para o outro lado?”

“Sim, se você tiver dinheiro” respondeu o barqueiro, que tinha uma cara desagradável.

“Mas eu não tenho dinheiro” disse Tip.

“Nenhum mesmo?” perguntou o homem.

“Nenhum mesmo” respondeu o garoto.

“Então não irei gastar meus remos levando você” disse o barqueiro decididamente.

“Que homem agradável!” comentou o Cabeça-de-Abóbora, sorridente.

O barqueiro olhou para ele, mas não respondeu. Tip estava tentando pensar, pois era uma grande
decepção ter sua jornada encerrada assim tão de repente.

“Eu preciso chegar à Cidade das Esmeraldas” ele disse ao barqueiro; “mas como eu posso
atravessar o rio se você não me levar?”

O homem riu, e não era uma risada agradável.


“Aquele cavalo de madeira irá flutuar” ele disse; “e você pode atravessar montado. Quanto ao
Cabeça-de-Abóbora tratante que lhe acompanha, deixe-o afundar ou nadar, isso não vai importar
muito nesse caso”

“Não se preocupe comigo”, disse Jack, rindo com prazer por causa do desagradável barqueiro,
“tenho certeza de que irei flutuar lindamente.”

Tip achou que a experiência valia a pena, e o Cavalete, que não sabia o significado de perigo,
não fez objeções.

Então, o menino o levou para dentro da água e subiu em suas costas. Jack também entrou até os
joelhos e segurou-se na cauda do cavalo para que pudesse manter a cabeça de abóbora acima
da água.

“Agora”, disse Tip, instruindo o Cavalete, “se você agitar suas pernas, provavelmente vai nadar; e
se você nadar, vai provavelmente alcançar o outro lado.”

O Cavalete com isto começou a mexer suas pernas, que atuaram como remos e moveu
lentamente os aventureiros ao lado oposto do rio. A viagem foi tão bem sucedida que agora eles
estavam subindo, molhados e pingando, a margem gramada.

As pernas da calça de Tip e seus sapatos estavam completamente encharcados; mas o Cavalete
tinha flutuado tão perfeitamente que dos joelhos para cima o garoto estava inteiramente seco.
Quanto ao Cabeça-de-abóbora, cada parte de sua linda roupa pingava água.

“O sol logo vai nos secar”, disse Tip “e de qualquer maneira estamos salvos do outro lado,
independente do barqueiro, e podemos prosseguir nossa jornada.”

“Eu não me importo de nadar, seja como for” comentou o cavalo.

"Eu também não," acrescentou Jack.

Eles logo reencontraram a estrada de tijolos amarelos, que mostrou ser uma continuação da
mesma que eles deixaram do outro lado, então Tip montou o Cabeça-de-abóbora mais uma vez
na garupa do Cavalete.

“ Se você cavalgar rápido” ele disse “o vento irá ajudar a secar suas roupas. Eu vou segurar no
rabo do cavalo e correr atrás. Fazendo assim todos nós iremos ficar secos e pouquíssimo tempo.”

"Então o cavalo deve apressar o passo," disse Jack.

"Vou fazer meu melhor" respondeu o Cavalete, alegremente.

Tip agarrou a ponta de galho que servia como cauda do Cavalete e gritou alto: “Vamos nessa!”

O cavalo começou num bom passo, e Tip seguiu atrás. Então ele decidiu que eles poderiam ir
mais rápido, então gritou: “Trotar!”

Agora o Cavalete se lembrou que esta palavra era o comando para ir o mais rápido que pudesse;
ele começou a bambear pela estrada num tremendo passo, e Tip teve muito trabalho – correndo
mais rápido do que ele já tinha em toda sua vida – para acompanhar o passo.
Logo ele estava sem ar, e por mais que ele quisesse gritar um “Whoa!” para o cavalo, ele
descobriu que não conseguia tirar nada da garganta. Então a ponta da cauda que ele estava
segurando, sendo nada mais do que um galho morto, quebrou-se de repente, e no minuto
seguinte o garoto estava rolando na poeira da estrada, enquanto o cavalo e seu cavaleiro da
cabeça de abóbora frustrada e rapidamente desapareceram na distancia.

Nesse tempo, Tip levantou-se e limpou a poeira da garganta para poder dizer “Ôoaa!”, mas não
havia mais necessidade de dizer isto, pois o cavalo já tinha sumido de vista a tempo.

Então, ele fez a única coisa sensata que podia fazer. Ele sentou-se e deu uma boa descansada,
depois começou a caminhar ao longo da estrada.

“Em algum momento eu certamente vou alcança-los” ele refletiu; “pois essa estrada acaba nos
portões da Cidade das Esmeraldas, e eles não podem ir mais longe do que isso.”

Enquanto isso, Jack estava segurando forte no toco e o Cavalete estava rasgando pela estrada
como um cavalo de corrida. Nenhum deles percebeu que Tip tinha ficado para trás, pois o
Cabeça-de-abóbora não olhou em volta e o Cavalete não podia fazer isso.

Enquanto cavalgava, Jack percebeu que a grama e as arvores tinham adquirido uma cor verde-
esmeralda brilhante, então ele supôs que estavam se aproximando da Cidade das Esmeraldas,
mesmo que as cúpulas e torres altas ainda não estivessem à vista.

Por fim, um muro alto de pedra verde, cravejado grosseiramente com esmeraldas, surgiu diante
deles; e com medo que o Cavalete não fosse sábio o suficiente para parar e então esmaga-los
com força contra o muro, Jack aventurou-se a berrar “Ôooaa!” o mais alto que ele pôde.

Repentinamente o cavalo obedeceu, e se não estivesse bem agarrado a seu toco, a cabeça de
Jack teria voado longe, e ele teria seu belo rosto arruinado.

“Isto foi um passeio rápido, querido pai!” ele exclamou; e então, sem ouvir resposta, ele se virou e
descobriu pela primeira vez que Tip não estava lá.

Esta aparente deserção intrigou o Cabeça-de-abóbora, e o deixou confuso. E enquanto ele se


perguntava o que teria acontecido com o garoto, e o que deveria fazer nestas circunstâncias
difíceis, uma porta foi aberta no muro verde e um homem saiu.

Este homem era baixinho e arredondado, com uma cara gorda notavelmente bem humorada. Ele
estava todo vestido de verde e usava um vistoso chapéu verde pontudo e óculos verdes.
Inclinando-se diante do Cabeça-de-abóbora ele disse:

“Eu sou o guardião dos Portões da Cidade das Esmeraldas. Posso perguntar quem são vocês, e
quais são seus negócios?”

“Meu nome é Jack Cabeça-de-abóbora” disse o outro, sorrindo; “mas quanto a meus negócios, eu
não tenho a mínima ideia no mundo do que seja isto”

O Guardião dos Portões olhou-o surpreso, e sacudiu a cabeça como se estivesse insatisfeito com
a resposta.

“O que você é, um homem ou uma abóbora?” ele perguntou educadamente.


“Sou os dois, se quer saber” respondeu Jack.

“E este cavalo de madeira – ele está vivo?” questionou o Guardião.

O cavalo deu uma olhada maliciosa para Jack e piscou um olho. Então ele empinou-se e desceu
com uma das patas sobre o pé do guardião.

“Aaai!” gemeu o homem; “Me desculpe, eu perguntei isso, mas a resposta é mais que
convincente. O senhor tem alguma incumbência na Cidade das Esmeraldas?”

“Parece-me que eu tenho,” respondeu o Cabeça-de-abóbora seriamente; “mas eu não consigo


pensar o que é. Meu pai sabe tudo sobre isso, mas ele não está aqui."

“Este é um caso estranho, muito estranho!” declarou o Guardião. “Mas você parece ser
inofensivo. Pessoas não sorriem tão deliciosamente quando pretendem fazer travessuras.”

“Quanto a isso,” disse Jack, “Eu não posso ajustar meu sorriso, pois ele foi esculpido na minha
cara com um canivete.”

“Bem, venho comigo em minha sala,” concluiu o Guardião, “e eu verei o que posso fazer por
você.”

Então Jack conduziu o Cavalete através da porta para uma pequena sala construída no muro. O
Guardião puxou a cordinha de um sino e um soldado muito alto apresentou-se – vestido em um
uniforme verde – entrou por uma porta do lado oposto. Este soldado portava uma longa arma
verde sobre o ombro e tinha amáveis bigodes verdes que desciam até seus joelhos. O Guardião
se dirigiu a ele dizendo:

“Aqui está um estranho cavalheiro que não sabe porque veio para a Cidade das Esmeraldas, ou o
que ele quer. Diga-me, o que devemos fazer com ele?”

O Soldado de bigode verde olhou para Jack com muita atenção e curiosidade. Finalmente ele
balançou a cabeça positivamente, de modo que pequenas ondas agitaram seu bigode, então ele
disse:

“Devemos leva-lo para Sua Majestade, o Espantalho.”

“Mas o que Sua Majestade o Espantalho fará com ele?” perguntou o Guardião dos Portões.

“Isso são negócios de Sua Majestade,” respondeu o soldado. “Eu já tenho problemas suficientes
por minha conta. Todos os problemas de fora devem ser encaminhados para Sua Majestade.
Então coloque os óculos neste camarada e eu irei leva-lo ao palácio real.”

Então o Guardião abriu uma grande caixa de óculos e tentou encaixar um par nos grandes olhos
de Jack.

“Eu não tenho um par no estoque que vá realmente cobrir esses olhos” disse o homenzinho com
um suspiro; “e sua cabeça é tão grande que vou precisar amarrar os óculos nela.”

“Mas porque eu preciso usar óculos?” perguntou Jack.

“Esta é a moda aqui,” disse o soldado, “e eles vão impedir você de ser cegado pelo brilho intenso
e resplandecente da Cidade das Esmeraldas.”
“Oh!” exclamou Jack. “Amarre-o do melhor modo possível. Eu não quero ficar cego.”

“Nem eu!” interrompeu o Cavalete; então um par de óculos verdes foi rapidamente fixado sobre
os nós salientes que lhe serviam de olhos.

Então o soldado de bigode verde levou-os pelo portão interno e eles saíram na rua principal da
magnífica Cidade das Esmeraldas.

Grandes pedras verdes cintilantes ornamentava a frente de lindas casas e as torres e obeliscos
eram todos cobertos com esmeraldas. Até mesmo o pavimento de mármore verde brilhava com
pedras preciosas, e isto era mesmo um grande e maravilhoso espetáculo para quem via pela
primeira vez.

Entretanto o Cabeça-de-abóbora e o Cavalete não sabiam nada sobre luxo e riqueza, dando
pouca atenção para a maravilhosa visão que eles viam através dos óculos.

Eles calmamente seguiam atrás do soldado verde, e mal percebiam a multidão de pessoas verdes
que olhavam para eles surpresas. Quando um cachorro verde saiu correndo e latiu para eles, o
Cavalete o chutou com sua perna de pau o que o fez correr uivando para uma das casas; mas
não houve nada mais sério que isso para interromper seu caminho para o palácio real.

O Cabeça-de-abóbora queria subir os degraus de mármore verde montado e ir diretamente à


presença do Espantalho; mas o soldado não permitiria isso. Jack desmontou com grande
dificuldade e um servo levou o Cavalete para a retaguarda, enquanto o soldado de bigode verde
escoltou o Cabeça-de-abóbora ao palácio, pela porta principal.

O estrangeiro foi deixado em uma sala de espera luxuosamente enfeitada, enquanto o soldado
saiu para anuncia-lo. Acontece que naquele momento Sua Majestade estava com tempo livre e
grandemente aborrecido por não ter nada de interessante para fazer, assim, ordenou que seu
visitante fosse levado à sala do trono naquele exato momento.

Jack não sentiu medo ou constrangimento em conhecer o governante de tão magnífica cidade,
pois ele era totalmente ignorante sobre todos os costumes comuns. Mas quando foi introduzido à
sala do trono e viu Sua Majestade o Espantalho pela primeira vez, sentado em seu trono
reluzente, ele parou maravilhado.
7
Sua majestade, o Espantalho
Suponho que qualquer leitor deste livro saiba o que é um espantalho, mas Jack cabeça-de-
abóbora nunca tinha visto algo do tipo, e ficou mais surpreso ao encontrar o notável Rei de Cidade
das Esmeraldas do que qualquer experiência em sua curta vida.

Sua majestade, o espantalho, estava vestindo um terno azul desbotado, e sua cabeça era
somente um saco cheio de palha, em que os olhos, orelhas, nariz e boca foram rudemente
pintados para representar um rosto. As roupas também eram preenchidas com palha, de forma
tão desigual ou descuidada que os braços e pernas de Sua Majestade pareciam mais acidentados
do que o necessário. Sobre suas mãos havia luvas com longos dedos, que eram forradas com
algodão. Tufos de palha saiam do casado do monarca e, também, de seu colarinho e botas. Sobre
sua cabeça, ele usava uma pesada coroa de ouro grosso com joias cintilantes, e o peso da coroa
causava rugas em sua testa, dando ao rosto pintado, uma expressão pensativa. De fato, só a
coroa o indicava como majestade. No restante, o Rei Espantalho era um simples espantalho:
frágil, estranho e insubstancial.

Mas se a aparência estranha de Sua Majestade parecia chocante a Jack, a forma do cabeça-de-
abóbora não parecia menos estranha ao espantalho. As calças roxas, o colete rosa e a camisa
vermelha pendiam sobre as articulações de madeira que Tip tinha feito, e o rosto esculpido na
abóbora sorria sempre, como se considerasse a vida a coisa mais alegre que se pudesse
imaginar.

A princípio, Sua Majestade pensou que seu entranho visitante estava rindo dele, e estava disposto
a ressentir-se de tal liberdade; mas não era à toa que o Espantalho tinha atingido a reputação do
mais sábio personagem do Mundo de Oz. Ele examinou seu visitante mais cuidadosamente, e
logo descobriu que o rosto de Jack tinha sido esculpido com um sorriso e que ele não poderia
olhar sério mesmo que quisesse.

O Rei foi o primeiro a falar. Depois de olhar Jack por alguns minutos, disse, em tom de admiração:

“De que lugar da terra você veio, e como pode estar vivo?”

“Perdão, Vossa Majestade”, respondeu o cabeça-de-abóbora, “mas eu não entendi”.

“O que você não entendeu?”, perguntou o Espantalho.

“Ora, eu não entendo o seu idioma. Veja, eu venho do país de Gillikins, por isso sou estrangeiro”.

“Ah, claro!”, exclamou o Espantalho. “Eu falo a língua dos Munchkins, que também é a língua da
Cidade das Esmeraldas. Mas suponho que você fale a língua dos cabeça-de abóbora”.

“Exatamente por isso, Vossa Majestade”, respondeu o outro, inclinando-se. “Por isso, será
impossível que possamos nos entender”.

“Isto, certamente, é uma infelicidade”, disse o Espantalho, pensativo. “Precisamos de um


interprete”.

“O que é um intérprete?”, perguntou Jack.


“Alguém que entenda bem as duas línguas, Quando eu disser algo, o intérprete pode traduzir a
você, e quando você disser algo, o intérprete me dirá o que você quer dizer. Pois um intérprete
pode entender as duas línguas tão bem quanto falar”.

“Isso certamente é sábio”, disse Jack, muito contente por encontrar um caminho tão simples para
resolver o problema.

Então, o Espantalho ordenou ao soldado do bigode verde que procurasse, entre a população,
alguém que entendesse a língua de Gillikins tão bem quanto a língua de Cidade das Esmeraldas,
e que trouxesse essa pessoa a ele.

Quando o soldado saiu, o Espantalho disse:

“Não quer pegar uma cadeira enquanto espera?”.

“Vossa Majestade esquece que eu não posso entendê-lo”, respondeu o cabeça-de-abóbora. Se


desejas que eu me sente, precisa fazer um gesto para que eu entenda”. O Espantalho desceu de
seu trono e puxou uma poltrona até o cabeça-de abóbora. Depois, ele empurrou Jack tão
repentinamente, que o dobrou como um canivete, de forma que era difícil sair daquela posição.

“Você entendeu esse sinal?”, perguntou Sua Majestade, educadamente.

“Perfeitamente”, declarou Jack, usando os braços para virar a cabeça para frente, pois a abóbora
tinha virado sobre seu apoio.

“Você parece ter sido feito às pressas”, disse o Espantalho, observando o esforço de Jack para se
ajeitar.

“Não mais do que Vossa Majestade”, respondeu francamente.

“Há uma diferença entre nós”, disse o Espantalho, “visto que eu me dobro, mas não quebro e você
quebra, mas não se dobra”.

Neste momento, o soldado retornou trazendo uma jovem. Ela parecia doce e modesta, com um
rosto bonito e lindos olhos e cabelos verdes. Uma elegante saia de seda verde alcançava os
joelhos, mostrando meias de seda bordadas com ervilhas e chinelos de cetim verde, decorado
com folhas de alface, ao invés de arcos ou fivelas. Sobre a cintura, havia trevos bordados e ela
vestia um casaco enfeitado com esmeraldas cintilantes de tamanho uniforme.

“Ora, é a pequena Jellia Jamb!”, exclamou o Espantalho, enquanto a donzela se inclinava a ele.
“Você entende o idioma dos Gillikins, querida?”

“Sim, Vossa Majestade”, respondeu, “pois eu nasci no país do norte”.

“Então, você será nossa intérprete”, disse o Espantalho, “e dirá ao cabeça-de-abóbora tudo o que
eu disser e a mim, o que ele disser. Está de acordo?”, perguntou ao seu convidado.

“Certamente”, foi a resposta.

“Pergunte a ele”, disse o Espantalho, dirigindo-se a Jellia, “o que o traz à Cidade das Esmeraldas”.

Mas, ao invés disso a garota, que tinha ficado assustada com Jack, disse a ele:
“Você certamente é uma criatura estranha. Quem o fez?”.

“Um menino chamado Tip”, respondeu Jack.

“O que ele disse?”, perguntou o Espantalho. “Meus ouvidos me enganam. O que ele disse?”

“Ele disse que Vossa Majestade parece ter perdido o cérebro”, respondeu a garota,
recatadamente.

O espantalho se inquietou em seu trono, apoiando a cabeça em sua mão esquerda.

“Que interessante é entender duas línguas”, disse ele, suspirando perplexo. “Pergunte a ele,
querida, se ele tem alguma objeção a ser trancafiado na prisão, por insultar o líder de Cidade das
Esmeraldas.”

“Eu não o insultei!”, protestou Jack, indignado.

“Silêncio”, advertiu o Espantalho, “aguarde até que Jellia traduza meu discurso. Para quê temos
um intérprete, se você age desta forma imprudente?”.

“Tudo bem, vou esperar”, respondeu o cabeça-de-abóbora, em um tom mal-humorado – contudo,


seu rosto sorria como sempre. “Traduza o discurso, mocinha”.

“Sua Majestade pergunta se está com fome”, disse Jellia.

“Oh, de modo algum!”, respondeu Jack, educadamente, “pois é impossível que eu coma”.

“Para mim também”, disse o Espantalho. “O que ele disse Jellia, querida?”

“Ele perguntou se você sabe que um dos seus olhos foi pintado maior do que o outro”, disse a
menina, maliciosamente.

“Não acredite nela, Vossa Majestade”, chorou Jack.

“Oh, eu não acredito”, respondeu o Espantalho, calmamente. Então, lançando um olhar


penetrante na garota, perguntou:

“Você tem certeza que entende bem ambos os idiomas dos Gillikins e dos Munchkins?”.

“Certeza, Vossa Majestade”, disse Jellia, tentando não rir na frente da realeza.

“Então, porque tenho a impressão que entendo tudo o que ele diz?”, perguntou o Espantalho.

“Porque elas são a mesma língua!”, declarou a garota, rindo alegremente. “Vossa Majestade não
sabia que no mundo de Oz, apenas uma língua é falada?”.

“É realmente assim?”, gritou o espantalho, aliviado ao ouvir isso, “então eu poderia ter sido meu
próprio intérprete”.

“A culpa é toda minha, Vossa Majestade”, disse Jack, parecendo um pouco tonto, “Pensei que
pudéssemos falar idiomas diferentes, uma vez que viemos de terras diferentes”.

“Isto deve ser um aviso para que você nunca pense”, respondeu o Espantalho, severamente. “a
menos que seja sábio, é melhor permanecer um boneco – e isso, você certamente é”.
“Eu sou! – Certamente eu sou!”, concordou o cabeça-de-abóbora.

“Me parece”, continuou o Espantalho, “que seu criador abriu mão de boas tortas para criar um
homem indiferente”.

“Eu afirmo à Vossa Majestade, que não pedi para ser criado”, respondeu Jack.

“Nem eu”, disse o Rei, gentilmente. “Então, como somos diferentes das pessoas ordinárias,
vamos ser amigos”.

“Com todo o meu coração”, exclamou Jack.

“Então, você tem um coração?”, perguntou o Espantalho, surpreso.

“Não, é apenas imaginário – devo dizer uma figura de linguagem”, disse o outro.

“Bem, sua figura mais importante parece ser uma figura de madeira, por isso, peço-lhe que
contenha sua imaginação que, por não ter cérebro, você não pode possuir”, sugeriu o Espantalho,
em advertência.

“Certamente!”, disse Jack, sem ao menos compreender direito.

E, então, Sua Majestade dispensou Jellia Jambs e o soldado de bigode verde. Assim que os dois
saíram, ele pegou o novo amigo pelo braço e o levou até o jardim para jogar um jogo de
lançamento de argolas.
8
O Exército da Revolta da General Jinjur
Tip estava ansioso para reencontrar Jack e o Cavalete que andou mais da metade da distância
até a Cidade das Esmeraldas sem parar para descansar. Então, descobriu que estava faminto e
que as bolachas e o queijo que reservara para a jornada já tinham sido comidos.

Enquanto pensava no que fazer nesta emergência, ele avistou uma garota sentada à beira da
estrada. Ela vestia uma roupa que quase o cegou de tão brilhante: seu colam de seda era feito de
esmeraldas verdes, e seu vestido tinha quatro cores diferentes – azul na frente, amarelo do lado
esquerdo, vermelho na parte de trás e roxo do lado direito. Prendendo o vestido, na parte da
frente, havia quatro botões – o primeiro era azul, o segundo amarelo, o terceiro vermelho e o
último era roxo.

O esplendor do vestido era fantástico; isso justificava o fato de Tip olhar tanto para ele antes que
seus olhos fossem atraídos pelo lindo rosto sobre eles. Sim, era um belo rosto, pensou. Porém,
tinha uma expressão de descontentamento com um ar de desconfiança ou rudeza.

Enquanto o menino olhava atônito, a garota o fitava calmamente. Uma cesta de comidas estava
ao lado dela, e ela segurava um delicioso sanduíche em uma mão e um ovo cozido em outra,
comendo com um apetite evidente, o que ganhou a simpatia de Tip.

Ele estava quase pedindo um pouco de comida, quando a garota se levantou e tirou as migalhas
de sua roupa.

“Aqui!”, disse ela. “É hora de ir. Carregue esta cesta para mim e sirva-se se tiver com fome.”

Tip carregou a cesta com vontade e começou a comer, seguindo a garota por um tempo, sem se
preocupar em fazer perguntas. Ela andava na frente, a passos rápidos, e havia nela um ar de
decisão e importância que o levou a suspeitar que ela fosse alguém importante.

Finalmente, quanto saciou sua fome, ele correu até ela e tentou manter seu ritmo de caminhada –
algo bem difícil, pois ela era mais alta que ele e estava com pressa.

“Muito obrigado pelos sanduíches”, disse Tip, enquanto corria. “Posso perguntar o seu nome?”.

“Eu sou a General Jinjur”, ela respondeu rapidamente.

“Oh!”, disse o menino surpreso. “Que tipo de general?”.

“Eu comando o Exército da Revolta nesta guerra”, respondeu a general com uma agressividade
desnecessária.

“Oh!”, exclamou novamente. “Eu não sabia que havia uma guerra.”

“Você não deveria saber disso”, ela respondeu, “porque mantemos isso em segredo, e
considerando que nosso exército é composto apenas por garotas” continuou, “é surpreendente
que nossa revolta ainda não foi descoberta”.

“Concordo”, respondeu Tip. “Mas onde está seu exército?”


“A uma milha daqui”, disse General Jinjur. “Reunimos forças de todos os cantos de Oz, ao meu
comando. Este será o dia em que conquistaremos Sua Majestade O Espantalho e tomaremos o
seu trono. O Exército da Revolta aguarda apenas minha chegada para marchar para a Cidade das
Esmeraldas”.

“Bem”, suspirou Tip, respirando profundamente. “Isto é algo surpreendente! Posso perguntar o
porquê você quer conquistar Sua Majestade O Espantalho?”

“Porque a Cidade das Esmeraldas tem sido governada por homens tempo demais. Por isso!”,
disse a garota.

“Além disso, a Cidade é enfeitada com pedras maravilhosas, que podem ser usadas em anéis,
braceletes e colares, e há dinheiro suficiente no reino para comprar, para cada garota de nosso
exército, uma dúzia de vestidos. Então, queremos conquistar a Cidade e usar o governo para nos
vestir”.

Jinjur disse essas palavras com muita vontade e decisão, o que provou que ela estava falando
sério.

“Mas guerra é algo terrível”, disse Tip, pensativo.

“Esta guerra será prazerosa”, respondeu a garota, com energia.

“Muitas de vocês vão morrer!”, continuou o garoto com uma voz de admiração.

“Oh, não”, disse Jinjur. “Que homem se oporia a uma garota, ou ousaria a machuca-la? E não há
nenhum rosto feio em meu exército”.

Tip riu.

“Talvez esteja certa”, disse ele. “Mas o guardião do portão é leal, e o exército do Rei não deixará a
cidade ser conquistada sem resistência”.

“O Exército é velho e fraco” respondeu a General Jinjur, com deboche. “Seu esforço foi todo
usado para reunir poucos soldados, e suas esposas são tão irritadas que já cortaram mais da
metade deles pela raiz. Quando o Incrível Mágico comandou o exército de ‘bigodes verdes’ era
um exército Real muito bom, pois todos temiam o Magico. Mas ninguém teme o Espantalho, então
seu Exército Real não conta muito numa guerra”.

Após esta conversa eles seguiram algum tempo em silêncio e logo chegaram a uma enorme
clareira na floresta, onde quatrocentas mulheres jovens estavam reunidas. Elas riam e
conversavam tão felizes, como se tivessem se reunido para um piquenique ao invés de um a
guerra.

Elas estavam divididas em quatro companhias, e Tip notou que todas vestiam um uniforme similar
ao da General Jinjur. A única diferença era que as garotas que vieram do país dos Munchkins
tinham a cor azul na frente de seus vestidos; as que vieram do País dos Quadlings tinham a cor
vermelha na frente; as que vieram dos lados dos Winkies tinham a cor amarela na frente e as
garotas de Gillikins tinham a cor roxa na frente. A cintura de todas era verde, representando a
cidade que queriam conquistar, e o primeiro botão de cada vestido indicava pela cor de onde elas
tinham vindo. Os uniformes eram alegres e atraentes e eficientes quando todos estavam juntos.
Tip pensava que este exército estranho não carregava armas ou algo do tipo, mas estava errado.
Cada garota tinha, entre os laços de seus cabelos, duas longas e brilhantes agulhas de tricô.

A General Jinjur imediatamente subiu em um toco de árvore e se dirigiu ao seu exército.

“Amigas, cidadãs e garotas”, disse. “estamos iniciando nossa grande revolta contra os homens de
Oz! Marchemos para conquistar a Cidade das Esmeraldas – para destronar o Espantalho – para
adquirir milhares de pedras maravilhosas – para roubar o tesouro real e reinar sobre nossos
opressores!”

“Urra!” disseram aquelas que estavam ouvindo, mas Tip pensou que a maior parte do Exército
estava muito entretida conversando para prestar atenção nas palavras da General.

A ordem para marchar tinha sido dada, e as garotas formaram quatro batalhões ou companhias, e
caminhavam rapidamente para a Cidade das Esmeraldas.

O Garoto seguia atrás delas, carregando muitas cestas, embrulhos e pacotes que vários membros
do exército tinham deixado à seu cuidado. Não muito tempo depois, elas chegaram aos grandes
muros verdes da Cidade e pararam na frente dele.

O Guardião do portão saiu de seu posto e as olhou curiosamente, como se um circo tivesse
chegado à cidade. Ele carregava um molho de chaves penduradas em seu pescoço por uma
corrente de ouro. Suas mãos estavam descuidadamente colocadas nos bolsos e ele parecia não
ter ideia que a cidade estava sendo atacada por rebeldes. Ele se dirigiu delicadamente às garotas,
dizendo:

“Bom dia, queridas! O que posso fazer por vocês?”

“Renda-se agora!”, respondeu a General Jinjur, ficando frente a ele e o encarando tão
terrivelmente quanto sua jovem face a permitia.

“Render-me!”, repetiu o homem, espantado. “Mas isso é impossível. É contra a Lei! Nunca ouvi
algo assim na minha vida!”

“Você deve se render!”, exclamou a General. “Estamos revoltadas!”

“Vocês não parecem!”, disse o Guardião, olhando uma a uma, admirado.

“Mas estamos!” gritou Jinjur, batendo o pé no chão, impaciente. “E queremos conquistar a Cidade
das Esmeraldas”.

“Que graça!”, respondeu o Guardião dos Portões. “Que idéia mais sem noção! Voltem para suas
mães, mocinhas, e ordenhem as vacas e façam o jantar. Não sabem que é perigoso conquistar
uma cidade?”

“Não temos medo!”, respondeu a General. Ela parecia determinada e isso preocupou o Guardião.

Então, ele soou o sinal para avisar os soldados de barba verde, em seguida, se arrependeu de tê-
lo feito. Imediatamente, ele foi cercado por um grupo de garotas, que apontavam suas agulhas
afiadas próximas às bochechas gordas e aos olhos cerrados.

O pobre homem gritou por misericórdia e não ofereceu resistência quando Jinjur retirou o molho
de chaves de seu pescoço.
Seguida por seu exército, a General marchava rumo ao portão, onde se deparou com o Exército
Real de Oz – que era o outro nome do Soldado de Bigodes Verdes.

“Pare!”, o gritou, apontando sua longa arma para o rosto da líder.

Algumas das garotas gritaram e recuaram, mas General Jinjur ficou bravamente onde estava e
respondeu:

“E agora? Você atiraria em uma pobre e indefesa garota?”

“Não”, respondeu o soldado, “porque minha arma não está carregada”.

“Não está carregada?”

“Não, por medo de acidentes. E eu esqueci onde escondi a pólvora e as balas. Mas se esperar um
pouquinho, posso tentar procura-las”.

“Não se preocupe”, disse Jinjur alegre. Então, ela se voltou ao seu Exército e gritou:

“Garotas, as armas não estão carregadas!”

“Urra”, gritaram as rebeldes, contentes pela notícia. Elas correram em direção ao soldado de
bigodes verdes em grande volume, e é curioso como as pontas das agulhas não se encontravam.

Mas o Exército Real de Oz estava tão amedrontado para confrontar o inimigo, que ele
simplesmente recuou, correndo o mais rápido que podia para dentro do palácio real, enquanto a
General Jinjur e seu exército adentravam a cidade desprotegida.

Assim, a Cidade das Esmeraldas havia sido conquistada sem derramar uma única gota de
sangue. O Exército da Revolta se tornou um Exército de conquistadoras.
9
O Espantalho Planeja uma Escapada

Tip escapou das meninas e seguiu rapidamente após o Soldado de Bigodes Verdes. O exército
invasor entrou na cidade de forma mais lenta, pois eles pararam para arrancar esmeraldas das
paredes e pavimentos de pedra, com as pontas das suas agulhas de tricô. Então o Soldado e o
menino chegaram ao palácio antes que se espalhasse a notícia de que a cidade fora conquistada.

O Espantalho e Jack Cabeça de Abóbora ainda estavam brincando de argolas no pátio, quando
foram interrompidos pela entrada abrupta do Oficial do Exército de Oz, que veio quase voando,
sem chapéu ou arma, com as roupas tristemente desalinhadas e sua longa barba flutuando um
metro atrás dele enquanto corria.

“Detalhe para mim”, disse o Espantalho calmamente “O que há de errado, homem?” ele disse
dirigindo-se ao soldado.

“Oh! Sua Majestade – Sua Majestade! A Cidade foi tomada!” Tossia o Oficial do Exército, que
estava quase sem respiração.

“Isto é muito repentino”, disse o Espantalho. “Mas por favor, vá e feche todas as portas e janelas
do palácio, enquanto eu mostro a este Cabeça de Abóbora como se joga uma argola.”

O Oficial apressou-se para fazer isto, enquanto Tip que tinha acabado de chegar, permaneceu no
pátio olhando para o Espantalho com olhos arregalados.

Sua Majestade continuou arremessando as argolas tão divertidamente, como se nada ameaçasse
seu trono, mas o Cabeça-de-Abóbora, tendo avistado Tip, caminhou em direção ao garoto, tão
rápido quanto permitiam suas pernas de madeira.

“Boa tarde, nobre pai!” ele falou com alegria. “Estou feliz de ver que você está aqui. O terrível
Cavalete correu adiante comigo.”

“Eu suspeitei disso”, disse Tip. “Você se machucou? Quebrou alguma coisa?”

“Não, eu cheguei saudável”, respondeu jack, “e sua Majestade tem sido realmente muito gentil
comigo.”

Neste momento o Soldado de Bigodes Verdes retornou, e o Espantalho perguntou:

“Por falar nisso, quem me conquistou?”

“Um regimento de meninas, vindas dos quatro cantos da Terra de Oz”, respondeu o Soldado,
ainda branco de medo.

“Mas onde estava meu Exército Permanente nessa hora?” perguntou sua Majestade, olhando
gravemente para o Soldado.

“Seu Exército Permanente estava correndo”, respondeu o indivíduo honestamente; “Pois nenhum
homem queria encarar as terríveis armas dos invasores.”
“Bem,” disse o Espantalho, depois de um momento de reflexão, “Eu não lamento muito a perda do
meu trono, pois é um trabalho cansativo governar a Cidade das Esmeraldas. E esta coroa é tão
pesada que faz minha cabeça doer. Mas eu espero que os Conquistadores não tenham a intenção
de me fazer mal, apenas por ter acontecido de eu ser o Rei.”

“Eu ouvi o que elas disseram” lembrou-se Tip, com alguma hesitação, “elas disseram que
pretendem fazer um carpete com a sua parte de fora e encher os sofás com a sua parte de
dentro.”

“Então eu estou realmente em perigo,” declarou sua Majestade positivamente, “e seria esperto de
minha parte planejar uma maneira de escapar.”

“Para onde você poderia ir?” Perguntou Jack Cabeça-de-Abóbora.

“Para o meu amigo Homem de Lata, que governa sobre os Winkies, e chama a si mesmo de
Imperador” foi a resposta. “Eu tenho certeza que ele irá me proteger.”

Tip estava olhando pela janela.

“O palácio está cercado pelos inimigos”, ele disse. “É muito tarde para escapar. Elas irão logo
desmontá-lo em pedaços”.

O Espantalho gargalhou.

“Numa emergência,” ele anunciou, “sempre há algo de bom para parar e refletir. Por favor, me
deem licença enquanto eu paro e reflito.”

“Mas nós também estamos em perigo,” disse o Cabeça-de-Abóbora, ansiosamente. “Se alguma
dessas meninas souber cozinhar, meu fim não estará distante!”

“Sem sentido” exclamou o Espantalho. “Elas estariam muito ocupadas para cozinhar, mesmo se
elas soubessem como!”

“Mas eu poderia ser feito prisioneiro por muito tempo,” protestou Jack, “Eu posso apodrecer.”

“Ah! Então você não poderia passar por isto”, falou o Espantalho. “O problema é mais sério do que
eu suspeitava.”

“Você” disse o Cabeça-de-Abóbora humildemente, “é apto para viver por muitos anos. Minha vida
é necessariamente curta. Então eu devo ter vantagem nos poucos dias que ainda me restam.”

“Certo então, não se preocupe!” respondeu o Espantalho pensativamente; “Se vocês ficarem
quietos por um tempo suficiente, para que eu pense, eu tentarei achar uma maneira para
escaparmos.”

Então os outros esperaram num silêncio paciente enquanto o Espantalho andou para um canto e
colocou a cara na parede por uns cinco minutos. Ao fim desse tempo ele estava com a melhor
expressão que já tivera em sua cara pintada.

“Onde está o Cavalete que você cavalgou até aqui?” ele perguntou ao Cabeça-de-Abóbora.

“Bem, eu disse que ele era jóia, então seu homem o trancou no tesouro real,” disse Jack.
“Isso me agrada muito,” disse o Espantalho. “O animal está sendo bem alimentado?”

“Oh, sim; Eu dei a ele uma tigela cheia de pó de serra.”

“Excelente!” falou o Espantalho. “Tragam o cavalo até aqui mais uma vez.”

O Soldado se apressou, e logo eles ouviram o barulho das pernas de madeira do cavalo andando
sobre o pavimento enquanto era trazido para o pátio.

Sua Majestade olhava para o cavalo de modo avaliativo. “Ele não parece muito gracioso!” ele
comentou pensativo. “Mas será que ele pode correr?”

“Ele pode, com certeza”, disse Tip, contemplando o Cavalete admiradamente.

“Então, ele irá nos transportar em suas costas, e ele deve cruzar as fileiras das rebeldes e nos
levar para o meu amigo Homem de Lata.” Anunciou o Espantalho.

“Ele não pode carregar quatro!” Objetou Tip.

“Não, mas talvez ele possa carregar três” disse sua Majestade. “Acho que podemos deixar o
Oficial do Exército para trás. Pois, pela facilidade com que fomos conquistados, não tenho muita
confiança na força dele.”

“Ele pode correr”, disse Tip, gargalhando.

“Eu esperava este golpe” disse o Soldado com mau humor; “Mas eu posso suportar isso. Eu
posso me disfarçar, cortando meus adoráveis bigodes verdes. E, além disso, não será mais
perigoso encarar essas garotas imprudentes do que montar este feroz e indomável cavalo de
madeira!”

“Talvez você esteja certo” observou sua Majestade. “Mas, de minha parte, não sendo um soldado,
eu gosto de perigo. Agora, meu garoto, você deve montar primeiro. E por favor sente o mais perto
possível do pescoço do cavalo.”

Tip subiu rapidamente para seu lugar, e o Soldado e o Espantalho conseguiram colocar o Cabeça-
de-Abóbora sentado logo atrás dele. Restou tão pouco espaço para o Rei, que ele estaria prestes
a cair assim que o cavalo começasse a correr.

“Busque um varal” disse o Rei ao seu Oficial, “e amarre-nos todos juntos. Assim, se um cair, todos
caem juntos.”

E enquanto o Soldado foi buscar o varal, sua Majestade continuou, “eu devo ser cuidadoso, pois
minha própria existência está em perigo.”

“Eu tenho que ser tão cuidadoso quanto você”, disse Jack.

“Não exatamente,” replicou o Espantalho. “Pois se alguma coisa me acontecer, este será o fim
para mim. Mas se alguma coisa acontecer a você, poderão usá-lo para plantar.”

O Soldado retornou com uma grande corda de varal e amarrou os três firmemente juntos, também
amarrando-os ao corpo do Cavalete; Então parecia haver pouco perigo de que eles caíssem.”
“Agora abram os portões”, comandou o Espantalho, “e nós iremos fazer um caminho para a
liberdade ou para a morte”,

O pátio onde eles estavam era localizado no meio do grande palácio, que era cercado por todos
os lados. Mas em um lugar uma passagem levava para um outro portão exterior, que o Soldado
havia fechado por ordem do seu soberano. Era por ele que sua Majestade pretendia escapar, e o
Oficial do Exército agora conduziu o Cavalete pela passagem e destrancou o portão, que se
escancarou com estrondo.

“Agora”, disseTip ao cavalo “você deve salvar a todos nós. Corra o mais rápido que você puder
para o portão da Cidade, e não deixe que nada pare você.”

“Tudo bem!” respondeu o Cavalete, bravamente, e correu tão repentinamente que Tip ficou sem ar
e se segurou firmemente no pino que ele havia colocado no pescoço da criatura.

Muitas das meninas, que estavam guardando o palácio do lado de fora, foram atropeladas pela
corrida maluca do Cavalete. Outras correram gritando para fora do caminho, e apenas uma ou
duas espetaram suas agulhas de tricô nos prisioneiros que escapavam. Tip teve uma pequena
picada no braço esquerdo, que ardeu por cerca de uma hora; mas as agulhas não tiveram efeito
no Espantalho ou em Jack Cabeça-de-Abóbora, que nem mesmo suspeitaram que estavam sendo
atacados.

Quanto ao Cavalete, ele fez um maravilhoso estrago num carrinho de frutas, derrubando alguns
homens que olhavam perplexos, e finalmente derrubando a nova guardiã do Portão – uma
menina gorda exigente, nomeada pela General Jinjur.

Os impetuosos fugitivos não pararam de jeito nenhum. E estando fora das paredes da Cidade das
Esmeraldas, o Cavalete correu pela estrada oeste, com passos rápidos e violentos, que tiravam a
respiração do menino e encheram o Espantalho de admiração.

Jack tinha cavalgado neste ritmo ruim antes, então ele dedicou todos os seus esforços para
segurar, com as duas mãos, sua cabeça de abóbora sobre sua base, encarando todos os
solavancos com a coragem de um filósofo.

“Mais devagar! Mais devagar!” gritou o Espantalho. “Minha palha está toda descendo para as
minhas pernas.”

Mas Tip estava sem respiração para falar, então o Cavalete continuou sua corrida selvagem, sem
se importar e com velocidade inabalável.

Eles chegaram às margens de um rio largo, e sem fazer pausa, o cavalo de madeira deu um salto
final e eles subiram no ar.

Um segundo depois eles estavam rolando, se debatendo e balançando-se na água, o cavalo


tentando rapidamente encontrar apoio para seus pés e para os cavaleiros, sendo primeiro
mergulhados sob a rápida correnteza e em seguida flutuando sobre a superfície como rolhas.
10
A jornada para o Homem-de-Lata

Tip estava bem encharcado e pingando água por todos os cantos de seu corpo. Mas ele
conseguiu se inclinar para frente e gritar no ouvido do Cavalete:

"Fique quieto, seu idiota! Fique quieto!"

O cavalo parou de lutar e boiava calmamente sobre a superfície, o seu corpo de madeira era tão
flutuante quanto uma jangada.

"O que a palavra "tolo" quer dizer?" perguntou o cavalo.

"É uma repreensão", respondeu Tip, um pouco envergonhado da expressão. "Eu só uso quando
estou com raiva."

"Então eu posso chamá-lo um tolo, em troca", disse o cavalo. "Por que eu não criei o rio, nem o
coloquei em nosso caminho, portanto, recriminação é algo adequado para quem fica zangado
comigo por cair na água."

"Isso é evidente", respondeu Tip: "Eu reconheço o meu erro". Então ele chamou o Cabeça-de-
Abóbora: "Está tudo bem, Jack?"

Não houve resposta. Então, o menino chamou o Rei "está tudo bem, Vossa Majestade?".

O Espantalho gemeu.

"Eu estou errado, de alguma forma", disse ele, em voz fraca. "Como essa água é molhada!"

Tip estava preso tão firmemente pelo cordão que ele não podia virar a cabeça para olhar para os
seus companheiros, então ele disse para o Cavalo:

"Reme com as pernas em direção à margem."

O cavalo obedeceu, e, apesar de seu progresso lento eles finalmente chegaram à margem oposta
do rio em um lugar onde era baixo o suficiente para permitir que a criatura subisse em terra firme.

Com alguma dificuldade, o garoto tirou sua faca do bolso e cortou as cordas que prendiam todos
ao cavalo de madeira. Ele ouviu o Espantalho cair no chão com um som mole, e então ele
rapidamente desmontou e olhou para o amigo Jack.

O corpo de madeira, com sua linda roupa, ainda estava em pé sobre as costas do cavalo, mas a
cabeça de abóbora tinha ido embora, e só o pau afiado que servia de pescoço era visível. Quanto
ao Espantalho, a palha em seu corpo tinha descido com os solavancos, embolando-se em suas
pernas, e a parte inferior de seu corpo parecia inchada e redonda, enquanto sua parte superior
parecia um saco vazio. Sobre a sua cabeça o Espantalho ainda usava a coroa pesada, que havia
sido costurado para evitar que a perdesse. Mas a cabeça estava tão úmida e mole que o peso do
ouro e jóias caíram para frente e esmagou o rosto pintado em uma massa de rugas que o faziam
parecer exatamente como um buldogue japonês.
Tip teria rido, se ele não estivesse tão preocupado com Jack. Mas o Espantalho, mesmo
danificado, estava inteiro, enquanto a cabeça de abóbora, que era tão necessária para a
existência de Jack, estava faltando. Por isso, o garoto pegou uma vara comprida, que felizmente
estava à mão, e voltou ansiosamente para o rio.

De longe, ele avistou o tom dourado da abóbora, que balançava suavemente para cima e para
baixo com o movimento das ondas. Naquele momento, ela estava fora do alcance de Tip, mas
depois de um tempo, ela flutuava cada vez mais perto, até que o menino foi capaz de alcançá-la
com a vara e empurrá-la para a margem. Então, ele trouxe-a para cima, limpou cuidadosamente a
água da abóbora com um lenço, e correu com ela para Jack, colocando-a sobre o pescoço do
homem.

"Minha nossa!" foram as primeiras palavras de Jack. "Que experiência terrível! Gostaria de saber
se a água estraga abóboras?"

Tip achou que não era preciso responder, pois sabia que o Espantalho também estava precisando
de sua ajuda. Então, ele cuidadosamente removeu a palha do corpo e das pernas do Rei, e a
espalhou para secar ao sol. A roupa molhada, ele pendurou sobre o corpo do Cavalo.

"Se a água estraga abóboras", observou Jack, com um profundo suspiro, "então meus dias estão
contados".

"Eu nunca vi água estragar abóboras", respondeu Tip, "a menos que a água esteja fervendo. Se a
cabeça não está rachando, meu amigo, você deve estar em bom estado".

"Oh, pelo menos minha cabeça não está rachando", declarou Jack, aliviado.

"Então não se preocupe", respondeu o menino. "O Cuidado, uma vez, matou um gato."

"Então", disse Jack, sério: "Estou feliz por não ser um gato".

O sol estava secando as roupas rapidamente, e Tip espalhou a palha de Sua Majestade para que
os raios quentes pudessem absorver a umidade e torná-lo tão seco como antes. Feito isso, ele
preencheu o Espantalho em forma simétrica e alisou o rosto para que ele voltasse à expressão
alegre e encantadora, como o habitual.

"Muito obrigado", disse o monarca, brilhantemente, ao andar e perceber que estava bem
balanceado.

"Há várias vantagens em ser um espantalho. Porque, se alguém tem amigos à mão para reparar
os danos, nada de muito grave pode acontecer com você".

"Eu me pergunto se sol quente pode rachar abóboras", disse Jack, com um tom de ansiedade em
sua voz.

"Nem um pouco, nem um pouco!" respondeu o Espantalho, alegremente. "Tudo o que você
precisa ter medo, meu rapaz, é a velhice. Quando sua preciosa juventude deteriorar acabará a
nossa amizade. Mas você não precisa olhar para frente. Vamos descobrir a verdade nós mesmos,
e notificá-lo. Mas venha! Vamos continuar a nossa jornada. estou ansioso para cumprimentar meu
amigo, o Homem-de-Lata".
Então eles remontaram no Cavalo: Tip segurando no pino, o Cabeça-de-Abóbora agarrado em Tip
e o Espantalho, com ambos os braços ao redor do corpo de madeira de Jack.

"Vá devagar, por enquanto, não há perigo de perseguição", disse Tip ao cavalo.

"Tudo bem!" respondeu a criatura, com uma voz um tanto rouca.

"Você não está um pouco rouco?" perguntou o Cabeça-de-Abóbora educadamente.

O Cavalo empinou com raiva e olhou para Tip.

"Veja só", ele rosnou, "você não pode me proteger de um insulto?"

"Com certeza!" respondeu Tip suavemente. "Tenho certeza de Jack não quis ofender, e não vou
fazer a gente brigar, sabe? Todos nós devemos continuar bons amigos."

"Eu não faço mais nada para esse Cabeça-de-Abóbora", declarou o Cavalo, violentamente. "Para
mim, ele perde a cabeça com muita facilidade".

Parecia não haver resposta apropriada para esse discurso, assim, eles andaram em silêncio.

Depois de um tempo o Espantalho comentou:

"Isso me faz lembrar os velhos tempos. Foi sobre esta colina gramada que uma vez salvei
Dorothy das picadas de abelhas da Bruxa Má do Oeste".

"Picadas de abelha ferem abóboras?", perguntou Jack, olhando ao redor com medo.

"Elas estão todas mortas, por isso não importa", respondeu o Espantalho. "E aqui é onde Nick o
lenhador destruiu os lobos cinzentos da Bruxa Má".

"Quem foi Nick o lenhador?", perguntou Tip.

"Esse é o nome do meu amigo, o Homem-de-Lata, respondeu Vossa Majestade. E aqui é onde os
macacos alados capturaram e prenderam a gente, e voaram para longe com a pequena Dorothy",
continuou ele, depois de terem andado um pouco.

"Macacos alados comem abóboras?", perguntou Jack, com um arrepio de medo.

"Eu não sei, mas você não tem com o que se preocupar, pois os macacos alados agora são
escravos de Glinda, a Bruxa Boa. Ela é dona do Chapéu de Ouro que comanda os seus serviços",
disse o Espantalho, pensativo.

Em seguida, o monarca se perdeu em pensamentos, recordando os dias de aventuras passadas.


E o Cavalete trotava deliciosamente sobre os campos de flores espalhadas e levou todos
rapidamente pelo caminho.

O sol se pôs, lentamente, até surgirem sombras da noite. Então Tip parou o cavalo e todos
desceram.

"Estou cansado", disse o garoto bocejando, "e a grama é macia e fresca. Vamos deitar aqui e
dormir até de manhã".

"Eu não consigo dormir", disse Jack.


"Eu nunca dormi", disse o Espantalho.

"Eu nem sei o que é dormir", disse o Cavalo

"Ainda assim, temos que ter atenção para este pobre menino, que é feito de carne, sangue e
ossos, e se cansa", sugeriu o Espantalho, em sua forma pensativa habitual. "Eu me lembro que
era igual com a pequena Dorothy. Nós sempre tivemos que sentar durante a noite enquanto ela
dormia".

"Sinto muito", disse Tip, humildemente, "mas eu não posso ajudá-los. E eu estou terrivelmente
faminto, também!"

"Este é mais um perigo!" comentou Jack, melancolicamente. "Eu espero que você não goste de
comer abóboras".

"Não, a menos que elas sejam cozidas e transformadas em tortas", respondeu o rapaz, rindo.
"Então, não tenha medo de mim, amigo Jack".

"Que covarde o Cabeça-de-Abóbora é!" disse que o Cavalete, com desdém.

- "Você mesmo seria um covarde, se soubesse que poderia estragar!", Jack respondeu irritado.

- "Alto lá!", interrompeu o Espantalho, "não vamos brigar. Nós todos temos as nossas fraquezas,
queridos amigos. Devemos nos esforçar para sermos atenciosos com os outros e, uma vez que
este pobre menino está com fome e não tem nada para comer, vamos nos acalmar e permitir que
ele durma, pois dizem que, durante o sono, um mortal pode esquecer até mesmo a fome".

- "Obrigado!", exclamou Tip, agradecido. "Sua Majestade é tão bom quanto sábio, e está dizendo
algo bom!".

Ele, então, se estendeu sobre a grama e, utilizando o Espantalho como travesseiro, adormeceu
rapidamente.
11
Um imperador metálico

Tip acordou logo ao amanhecer, mas o Espantalho já tinha levantado e arrancado, com os dedos
desajeitados, um punhado de frutos maduros de alguns arbustos perto. O menino comeu
avidamente, como se fosse um grande café da manhã e, depois, o pequeno grupo retomou sua
viagem.

Depois de uma hora de viagem eles chegaram ao cume de uma colina, de onde avistaram a
Cidade dos Winkies, e observaram as cúpulas altas do palácio do imperador entre as habitações
mais modestas.

O Espantalho ficou muito animado com esta visão, e exclamou:

"Como estou encantado em ver meu velho amigo, o Homem de Lata novamente! Espero que ele
tenha obtido mais sucesso em governar seu povo do que eu em governar o meu!"

"O Homem de Lata é o imperador dos Winkies?" perguntou o Cavalete.

"Sim, de fato. Eles o convidaram para governá-los logo depois que a Bruxa Má foi destruída, e
como Nick o Lenhador tem o melhor coração em todo o mundo, tenho certeza que ele tem se
mostrado um excelente e capaz imperador."

“Eu pensei que ‘Imperador’ fosse o título de uma pessoa que governasse um império”, disse Tip,
“e o País dos Winkies é apenas um reino".

"Não diga isso ao Homem-de-Lata!" exclamou o Espantalho, sinceramente. "Você magoaria os


sentimentos dele terrivelmente. Ele é um homem orgulhoso, e tem toda a razão de ser, e ele
prefere ser chamado de Imperador, em vez de Rei".

"Tenho certeza de que isso não faz diferença para mim", respondeu o menino.

O Cavalete avançava em um ritmo tão rápido que seus pilotos tinham dificuldade para ficar em
cima de suas costas, por isso, havia menos conversa até que ele parou ao lado dos degraus do
palácio.

Um velho Winkie, vestido com um uniforme prateado, se aproximou para ajudá-los a descer.
Então, o Espantalho disse a ele:

"Leve-nos de uma vez ao seu mestre, o Imperador."

O homem olhou de um para outro de uma forma envergonhada, e finalmente respondeu:

"Eu devo pedir-lhe para esperar um tempo. O Imperador não está recebendo visitas esta manhã."

"Como isso?" perguntou o Espantalho, ansiosamente. "Eu espero que não tenha acontecido nada
com ele."

"Oh, não. Nada sério", respondeu o homem.


"Mas este é o dia de Sua Majestade ser polido e, neste momento, seu corpo está besuntado com
lustra-alumínio".

"Entendo!", disse o Espantalho, sossegado. "Meu amigo estava sempre disposto a ser um dândi, e
acho que agora ele está mais orgulhoso do que nunca de sua aparência pessoal."

"Ele é, na verdade," disse o homem, em um tom educado. "Nosso poderoso imperador foi
niquelado ultimamente".

"Que maravilha!", exclamou o Espantalho ao ouvir isso. "Sua inteligência tem a mesma avidez
como a de um imperador deve ser! Mas leve-nos a ele. Tenho certeza o Imperador vai nos
receber, mesmo em seu estado atual".

"O estado do Imperador é sempre magnífico", disse o homem. "Mas eu vou arriscar a dizer-lhe
sobre sua chegada, e ele receberá os seus cumprimentos”. Então o grupo seguiu o servo até uma
esplêndida antessala, e o Cavalete caminhou desajeitadamente atrás deles, não tendo
conhecimento de que um cavalo deveria permanecer no lado de fora.

A princípio, os viajantes estavam admirados pela beleza dos arredores, e até mesmo o
Espantalho parecia impressionado enquanto examinava as cortinas prateadas em nós e presas
com pequenos machados de prata. Logo após, uma bela mesa de centro, onde havia um grande
pote de óleo prateado, gravado com cenas das aventuras passadas do Homem-de-Lata, Dorothy,
o Leão Covarde e o Espantalho: as linhas gravadas sobre a prata eram feitas em ouro amarelo.
Nas paredes pendiam vários retratos, a do Espantalho parecendo ser o mais proeminente e
cuidadosamente construído, enquanto uma grande pintura do famoso Mágico de Oz, no ato de
presentear o Homem-de-Lata com um coração, cobriu quase uma extremidade inteira do quarto.

Enquanto os visitantes olhavam estas coisas, silenciosamente admirados, de repente ouve-se


uma grande voz no próximo quarto:

"Bem! Bem! Bem! Que grande surpresa!"

E, em seguida, a porta se abriu e Nick o Lenhador correu para o meio deles e pegou o Espantalho
em um abraço tão apertado e amoroso que ele o amassou em muitas pregas e rugas.

“Meu velho amigo! Meu nobre companheiro!”, chorou de felicidade o Homem-de-Lata. “Quão feliz
estou em vê-lo novamente!”.

E então ele soltou o Espantalho, mantendo o braço em seu ombro, enquanto examinava as
características do amigo.

Mas, infelizmente, o rosto do Espantalho e outras partes de seu corpo traziam grandes manchas
de pasta de brilho, pois o Homem-de-Lata, em sua ânsia de boas-vindas a seu amigo, tinha
esquecido completamente da condição de seu banho e tinha esfregado a espessa camada de
pasta de seu próprio corpo em seu companheiro.

"Meu Deus!" disse o Espantalho tristemente. "Quão bagunçado eu estou!"

"Não se preocupe, meu amigo", respondeu o Homem de Lata, "Eu vou mandar você para a minha
Lavandaria Imperial, e você vai sair tão bom como novo".

"Não Vou ser mutilado?" perguntou o Espantalho.


"Não, de fato!" foi a resposta. "Mas me diga, como Vossa Majestade veio até aqui, e quem são
seus companheiros?"

O Espantalho, com grande delicadeza, introduziu Tip e Jack Cabeça-de-Abóbora, e o último


personagem parecia interessar muito ao Homem de Lata.

"Você não é muito substancial, devo admitir", disse o Imperador. "mas é certamente incomum e,
portanto, digno de se tornar um membro da nossa seleta sociedade".

"Agradeço a Vossa Majestade", disse Jack, humildemente.

"Eu espero que você esteja gozando de boa saúde?" continuou o Homem-de-Lata.

"No momento, sim," respondeu o Cabeça-de-Abóbora, com um suspiro, "mas estou em constante
terror, temendo o dia em que irei estragar".

"Bobagem!" disse o Imperador, mas em um tom gentil, simpático. "Não tema. Eu lhe digo,
umedeça-a e deixe-a no sol de hoje, lave-a amanhã. E, antes de sua cabeça ter tempo de
estragar, você pode pô-la em conserva e, dessa forma, ela pode ser preservada por tempo
indeterminado".

Tip, durante esta conversa, estava olhando para o Homem-de-Lata com espanto indisfarçável, e
percebeu que o Imperador célebre dos Winkies era feito inteiramente de peças de estanho,
perfeitamente soldadas e rebitadas na forma de um homem. Ele balançava e rangia um pouco,
quando se movia, no mais, ele parecia ter sido habilmente construído, e sua aparência só era
marcada pela espessa camada de pasta de polimento que o cobria da cabeça aos pés.

O olhar atento do garoto lembrou ao Homem de Lata que ele não estava na condição mais
apresentável. Então, ele pediu a seus amigos que o desculpassem, e retirou-se para seu
apartamento privado, para que os seus servos o polissem. Isto foi realizado em um curto espaço
de tempo e, quando o imperador voltou, seu corpo niquelado brilhava tão magnificamente que o
Espantalho cordialmente felicitou-o pela sua aparência melhorada.

"Confesso que esse polimento foi um pensamento feliz", disse Nick. “E era necessário, porque eu
havia ficado um pouco arranhado durante minhas aventuras”. Observe esta estrela gravada no
meu peito esquerdo. Ela não só indica que meu coração está excelente, mas cobre muito
ordenadamente o remendo feito pelo Mágico, quando ele colocou este órgão tão valioso em meu
peito com as próprias mãos hábeis.

"Então, seu coração é real?" perguntou o Cabeça-de-Abóbora, curiosamente.

"De jeito nenhum", respondeu o imperador, com dignidade. "É, estou convencido, um coração
estritamente ortodoxo, embora um pouco maior e mais quente do que a maioria das pessoas
possuem".

Então ele se virou para o Espantalho e perguntou:

"Seus traços são sempre felizes e contentes, meu caro amigo?"

"Eu não posso dizer" foi a resposta. "pois as meninas de Oz se revoltaram e me expulsaram da
Cidade das Esmeraldas".
"Meu Deus!" gritou o Homem de Lata, "Que calamidade! Elas certamente não se queixam de suas
regras sábias e graciosas, não é?".

"Não, mas elas dizem que é uma regra boba que não funciona bem para os dois lados",
respondeu o Espantalho, "e as fêmeas também são da opinião de que os homens têm governado
a terra tempo suficiente. Então, elas capturaram minha cidade, roubando o tesouro e todas as
suas joias, e estão conduzindo as coisas para satisfazer a si mesmas".

"Meu Deus! Que ideia extraordinária!" gritou o Imperador, que estava ao mesmo tempo chocado e
surpreso.

"E ouvi alguns deles dizerem", disse Tip, "que pretendem marchar aqui e capturar o castelo e a
cidade do Homem-de-Lata".

"Ah, não devemos dar-lhes tempo para fazer isso", disse o Imperador, rapidamente, "vamos de
uma vez recapturar a Cidade das Esmeraldas e colocar o Espantalho de novo em seu trono".

"Eu tinha certeza que você iria me ajudar", comentou o Espantalho com uma voz satisfeita. "Qual
o tamanho do exército que você pode montar?"

"Nós não precisamos de um exército", respondeu o Homem-de-Lata. "Nós quatro, com a ajuda de
meu machado reluzente, somos suficientes para causar o terror nos corações dos rebeldes."

“Nós cinco”, corrigiu o Cabeça-de-Abóbora.

"Cinco?" repetiu o Homem-de-Lata.

"Sim, o Cavalete é corajoso e destemido", respondeu Jack, esquecendo sua briga recente com o
quadrúpede.

O Homem de Lata olhou em volta de uma forma confusa, para o Cavalete, que até agora se
mantinha em silêncio em pé, no canto, onde o imperador não tinha notado sua presença. Tip
imediatamente chamou a criatura de aparência estranha para eles, que se aproximou tão
desajeitadamente que quase derrubou a bela mesa de centro belo e a lata de óleo gravada.

"Eu começo a pensar", comentou o Homem-de-Lata, enquanto olhava fixamente para o Cavalete,
que minhas perguntas nunca cessarão! Como surgiu esta criatura viva?"

"Eu fiz isso com um pó mágico", afirmou modestamente o menino. "e o Cavalete tem sido muito
útil para nós."

"Ele nos permitiu escapar dos rebeldes", acrescentou o Espantalho.

"Então, nós certamente devemos aceitá-lo como um companheiro", declarou o Imperador. "Um
Cavalete vivo é uma novidade distinta, e deve provar um estudo interessante. Será que ele sabe
de alguma coisa?"

"Bem, eu não posso reclamar de qualquer grande experiência na vida", respondeu o Cavalete
para si mesmo. "Mas parece-me que aprendo muito rapidamente, e muitas vezes me ocorre que
eu sei mais do que qualquer um dos que me rodeiam".
"Talvez sim", disse o imperador, "porque a experiência nem sempre significa sabedoria, mas o
tempo é precioso agora, então vamos fazer os preparativos rapidamente para iniciar em nossa
jornada".

O imperador chamou o seu Alto Conselheiro e instruiu-o como conduzir o reino durante sua
ausência. Enquanto isso, o Espantalho foi desmontado e pintado, o saco que lhe servia de uma
cabeça foi cuidadosamente lavado e preenchido com o cérebro originalmente dado a ele pelo
grande Mago. Suas roupas também foram lavadas e passadas pelos alfaiates Imperiais, e sua
coroa, polida e novamente costurada em cima de sua cabeça, pois o Homem-de-Lata insistiu que
ele não deveria renunciar a este distintivo da realeza. O Espantalho agora apresentando uma
aparência muito respeitável e, embora não fosse vaidoso, ele estava bastante satisfeito consigo
mesmo e desfilou um pouco. Enquanto isso, Tip remendava os membros de madeira de Jack
Cabeça-de-Abóbora e o fez mais poderoso do que antes, e o Cavalete também foi inspecionado
para ver se ele estava em boas condições de funcionamento.

Então, bem cedo na manhã seguinte, eles partiram em viagem de volta para a Cidade das
Esmeraldas, o Homem-de-Lata tendo sobre os seus ombros um machado reluzente e liderando o
caminho, enquanto o Cabeça-de-Abóbora montava o Cavalete, tendo Tip e o Espantalho de
ambos os lados para se certificar que ele não cairia ou ficaria danificado.
12
Sr. E. C. Besourão C. E.

Agora, a General Jinjur – que, você deve lembrar, comandava o Exército da Revolta – estava
inquieta com a fuga do Espantalho da Cidade das Esmeraldas. Ela temia, e com boa razão, que
sua Majestade e o Homem de Lata unissem forças, isso significaria perigo para ela e todo seu
exército; pois o povo de Oz ainda não tinha esquecido os feitos destes famosos heróis, que
passaram com sucesso por tantas aventuras surpreendentes.

Então Jinjur enviou uma carta-rápida para a velha Mombi, a bruxa, e prometeu a ela grandes
recompensas se ela pudesse vir para ajudar o exército rebelde.

Mombi estava furiosa pela peça que Tip havia pregado nela, bem como sua escapada e o roubo
do precioso Pó da Vida; então não houve trabalho em convencê-la a viajar para a Cidade das
Esmeraldas para ajudar Jinjur a se defender do Espantalho e do Homem de Lata, que tinham feito
de Tip um de seus amigos.

Mombi mal tinha acabado de chegar ao palácio real, quando descobriu, por meio de sua magia
secreta, que os aventureiros estavam começando sua jornada para a Cidade das Esmeraldas;
então ela se retirou para um pequeno quarto no alto de uma torre e trancou-se lá enquanto
praticava certas artes com as quais poderia impedir o retorno do Espantalho e seus
companheiros.

Foi por isso que o Homem de Lata parou de repente e disse: “Algo muito curioso aconteceu. Eu
deveria saber de cor cada passo do caminho, mas eu temo que nós já estejamos perdidos agora.”

“Mas isto é impossível!” protestou o Espantalho. “Porque você acha, meu caro amigo, que
estamos desorientados?”

“Porque, aqui na nossa frente está um grande campo de girassóis – e eu nunca vi este
campo antes em toda a minha vida.”

Ao ouvir isso, todos olharam em volta, apenas para perceber que eles estavam cercados em um
campo de grandes caules, contendo em cima de cada caule um girassol gigantesco. E se não
bastasse que as flores fossem quase cegantes em seus tons brilhantes de vermelho e dourado,
cada uma delas ficou girando sobre suas hastes, como pequenos cata-ventos, ofuscando
completamente a visão dos espectadores e assim desorientando-os totalmente, de modo que não
sabiam por onde seguir.

“Isso é bruxaria!” exclamou Tip.

Enquanto eles pararam, hesitantes e assombrados, o Homem de Lata soltou um grito de


impaciência e avançou balançando seu machado para cortar os caules diante dele. Mas agora os
girassóis pararam de repente de girar, e os viajantes puderam ver um rosto de menina aparecer
no centro de cada flor. Aqueles amáveis rostos olhavam para o grupo atônito com sorrisos
zombeteiros, e então caíram num coro de gargalhadas alegres, pela estranheza que a aparência
deles causava.
“Pare! Pare!” gemeu Tip, segurando o braço do Homem de Lata; “elas são vivas! São
meninas!”

Naquele momento as flores começaram a girar outra vez, e os rostos desapareceram nos rápidos
giros.

O Homem de Lata baixou seu machado e sentou-se no chão.

“seria sem coração botar abaixo essas lindas menininhas” ele disse desapontado. “e eu ainda não
sei de que outra forma podemos seguir nosso caminho”.

“Elas me pareceram estranhamente ser os rostos do Exército da Revolta”, declarou o Espantalho.


“Mas eu não posso entender como as garotas poderiam ter chegado aqui tão rapidamente”.

“Eu creio que seja magia” disse Tip positivamente, “e alguém está nos pregando uma peça. Eu já
vi a velha Mombi fazer truques como esse antes. Provavelmente não passa de uma ilusão, e nem
há girassóis aqui afinal.”

“Então, vamos fechar nossos olhos e seguir em frente”, sugeriu o Homem de Lata.

“Com licença”, replicou o Espantalho. “Meus olhos são pintados e não podem se fechar. Você por
ter pálpebras de lata, não deve imaginar que fomos todos feitos do mesmo modo.”

“E os olhos do Cavalete são nós de madeira”, disse Jack, inclinando-se para examiná-los.

“De qualquer modo, você deve correr em frente o mais rápido possível”, comandou Tip, “e nós
iremos lhe seguir para tentar escapar. Meus olhos estão tão confusos que mal consigo enxergar”.

Então o Cabeça-de Abóbora montou corajosamente na frente, e Tip agarrou a cauda do Cavalete
e seguiu com os olhos fechados. O Espantalho e o Homem de Lata vieram logo atrás, e antes que
eles tivessem andado muito, Jack deu um grito alegre, anunciando que o caminho estava limpo
diante deles.

Então todos eles pararam para olhar para trás, mas não havia nem sinal do campo de girassóis.

Mais cheios de alegria, agora eles prosseguiram em sua viagem; mas a velha Mombi tinha
mudado tanto a paisagem que eles teriam certamente se perdido novamente se o Espantalho não
tivesse sabiamente concluído que eles deveriam ir em direção do sol. Pois nenhuma bruxaria
podia mudar o curso do sol, e portanto era um guia seguro.

Entretanto, outras dificuldades se abateram sobre eles. O Cavalete pisou num buraco de coelho e
caiu no chão. O Cabeça-de-abóbora foi jogado para o alto, e sua história provavelmente teria
terminado ali, se o Homem de Lata não tivesse rapidamente aparado a abóbora enquanto ela
caía, salvando-o de se arrebentar.

Tip logo a fixou sobre o pescoço novamente e colocou Jack de pé. Mas o Cavalete não escapou
tão facilmente. Pois quando sua perna ficou presa no buraco de coelho ela quebrou bem curta, e
precisava ser recolocada ou consertada antes que ele desse mais um passo.
“Isto é muito sério”, disse o Homem de Lata. “Se houvessem árvores por perto eu poderia logo
fazer uma outra perna para este animal; mas eu não consigo ver nem mesmo uma moita por
milhas ao redor.”

“E não há nem cercar nem casas nesta parte da terra de Oz”, acrescentou o Espantalho,
desconsoladamente.

“Então o que podemos fazer?” perguntou o menino.

“Eu suponho que eu possa colocar meu cérebro para trabalhar”, respondeu sua Majestade o
Espantalho; “pois a experiência tem me ensinado que eu posso fazer qualquer coisa, mas apenas
se eu tiver tempo para pensar.”

“Vamos todos pensar” disse Tip; “e talvez encontremos um jeito de consertar o Cavalete.”

Então eles sentaram sobre a grama e começaram a pensar, enquanto o Cavalete se ocupava em
olhar curiosamente para seu membro quebrado.

“Isso dói?” perguntou o Homem de Lata, numa voz suave e simpática.

“Nem um pouco”, respondeu o Cavalete, “mas meu orgulho está ferido por saber que minha
anatomia é tão frágil.”

Por um tempo o pequeno grupo permaneceu em silencioso pensamento. O Homem de Lata


levantou sua cabeça e olhou para os campos.

“Que tipo de criatura é aquela que se aproxima de nós?” ele perguntou espantado.

Os outros seguiram seu olhar, e descobriram vindo na direção deles a mais estranha coisa que
eles já tivessem visto. Avançava rápido e silenciosamente sobre a grama macia, e em poucos
minutos parou diante dos aventureiros e os contemplava com um espanto igual ao deles.

O Espantalho era calmo em todas as circunstâncias. “Bom dia!” ele disse educadamente.

O estranho tirou o chapéu com um floreio, curvou-se muito baixo, e respondeu:

“Bom dia a todos. Eu espero que todos vocês, estejam desfrutando de uma excelente saúde.
Permitam-me lhes dar meu cartão.”

Com esta fala educada ele estendeu um cartão para o Espantalho, que o revirou várias vezes nas
mãos e em seguida passou para Tip com um aceno de cabeça.

O menino leu alto:

“Sr. E. C. Besourão, C. E.”

“Mas que figura!” exclamou o Espantalho, olhando-o atentamente.

“Muito impressionante!” disse o Homem de Lata.

Os olhos de Tip estavam olhando admirados e o Cavalete soltou um suspiro e virou a cabeça para
olhar também.
“Você é realmente um besouro?” perguntou o Espantalho.

“Com toda a certeza, querido senhor!” respondeu o estranho com vivacidade. “Meu nome não está
no cartão?”

“Sim, está”, disse o Espantalho. “Mas, posso perguntar o que significa ‘E. C.’ ?”

“ ‘E. C’ significa Enormemente Crescido”, respondeu o Besourão prontamente.

“Oh, eu vejo”. O Espantalho olhava o estranho criticamente. “E você é mesmo enormemente


crescido?”

“Senhor,” disse o Besourão, “creio que você seja um cavalheiro em julgamento e sabedoria. Não
lhe ocorreu que eu sou milhares de vezes maior do que qualquer besouro que você já tenha visto
antes? Portanto é claramente evidente que eu sou Enormemente Crescido, e não há nenhuma
razão para se duvidar deste fato.”

“Me perdoe”, respondeu o Espantalho, “Meu cérebro está um pouco misturado desde que eu o
lavei na última vez. Seria impróprio para mim, perguntar também o que as letras ‘C. E.’ no final do
seu nome significam?”

“Estas letras expressam meu grau de formação.” Respondeu o Besourão, com um sorriso
condescendente. “Para ser mais claro, as iniciais significam que eu sou Completamente
Educado.”

“Ah!” disse o Espantalho bem aliviado.

Tip ainda não tinha tirado os olhos de cima deste maravilhoso personagem. O que ele viu foi um
grande e redondo corpo de inseto, apoiado sobre duas pernas finas que terminavam em pés
delicados – com as pontas voltadas para cima. O corpo do Besourão era bastante liso, e de uma
coloração marrom brilhante nas costas, enquanto que na frente ele era listrado, com faixas de
marrom claro e branco, se misturando nas bordas.

Seus braços eram tão esbeltos quanto as pernas, sobre seu longo pescoço estava a cabeça – em
nada diferente da cabeça de um homem, exceto que o nariz terminava em uma antena curva, e
suas orelhas que eram na parte superior, decorando a cabeça, eram no formato de rabinhos de
porco enrolados. É preciso admitir que os olhos pretos eram muito grandes e redondos, mas a
expressão no rosto do besourão não era desagradável.

Como roupa o inseto vestia um casaco azul escuro estilo andorinha, com forro de seda
amarela e uma flor na lapela, e um colete de pato branco, que se estendia apertado pelo corpo
largo; calças curtas de pelúcia castanho-amarelada com fivelas douradas na parte dos joelhos, e
no topo de sua pequena cabeça, estava uma cartola de seda.

De pé na frente dos nossos maravilhados amigos, o Besourão parecia ser tão alto quanto o
Homem de Lata; e certamente nenhum besouro em toda a terra de Oz tinha atingido um tamanho
tão grande antes.

“Eu confesso,” disse o Espantalho, “que sua chegada repentina me causaou surpresa, e sem
dúvida assustou meus amigos. Eu espero, no entanto, que isto não o aflija. Nós provavelmente
nos acostumaremos a você com o tempo.”
“Não se desculpe, eu imploro!” respondeu o Besourão, sinceramente. “Me dá muito prazer
surpreender as pessoas; pois certamente eu não posso ser classificado com insetos comuns e
causo admiração em todos os que conheço.”

“Você é, de fato”, concordou sua Majestade.

“Se vocês me permitem sentar-me em sua magnífica companhia,” continuou o estranho, “eu irei
alegremente relatar minha história, que fará vocês entenderem melhor minha não-usual – posso
até dizer notável? – aparência.”

“Você pode dizer o que quiser”, respondeu o Homem de Lata.

Então o Besourão sentou-se na grama, olhando para o pequeno grupo maravilhado, e contou-lhes
a seguinte história:
13
Uma História Enormemente Crescida

“Para ser honesto eu deveria reconhecer já no início do meu recital, que eu nasci como um
besouro comum”, começou a criatura, num tom franco e amigável. “Não tenho muito
conhecimento, eu usei meus braços tanto quanto as pernas, para andar e me arrastar sob as
pedras, ou me esconder entre as raízes das gramas, com nada em mente além de encontrar
alguns insetos menores do que eu para que eu me alimentasse.”

“Nas noites de frio eu ficava duro e imóvel, pois eu não usava roupas, mas a cada manhã os raios
do sol me davam uma nova vida e me traziam para a atividade. Era uma terrível existência, mas
você deve lembrar que esta é a existência comum dos besouros, assim como de tantas criaturas
que habitam a terra.”

“Mas o destino havia me escolhido, humilde como eu era, para um destino grandioso! Um dia eu
rastejei para perto de uma casa de escola do local e minha curiosidade foi avivada pelo barulho
monótono dos estudantes lá dentro, eu me esforcei para entrar e rastejei ao longo de uma fenda
entre duas placas, até chegar ao final, onde, na frente de uma lareira, estava o professor em sua
mesa”.

“Ninguém percebeu uma criatura tão pequena quanto aquele besouro, e quando eu percebi que a
lareira era quente e mais confortável que os raios de sol, eu resolvi estabelecer minha futura casa
ao lado dela. Então eu encontrei um ninho encantador entre dois tijolos e me escondi ali dentro
por muitos e muitos meses.”

“O professor Nowitall era, sem dúvidas, o mais famoso erudito da terra de Oz, e depois de alguns
dias eu comecei a ouvir as leituras e discursos que ele dava a seus alunos. Nenhum deles era
mais atento do que o humilde e desconhecido besouro, e eu obtive desta forma uma reserva de
conhecimento que eu devo confessar que é maravilhoso. Foi por isso que eu coloquei ‘C. E.’
Completamente Educado em meus cartões; pois o meu maior orgulho está no fato de que o
mundo não pode produzir outro besouro com um décimo de minha cultura própria e erudição”.

“Eu não lhe culpo,” disse o Espantalho. “Educação é uma coisa para se ter orgulho. Eu mesmo
me eduquei. A mistura de cérebro que me foi dada pelo Grande Mágico é considerada pelos meus
amigos, insuperável.”

“No entanto,” interrompeu o Homem de Lata, “um bom coração é, creio eu, muito mais desejável
do que educação ou cérebros.”

“Para mim” disse o Cavalete, “uma boa perna é mais desejável do que qualquer coisa”.

“As sementes poderiam ser consideradas como cérebros?” perguntou o Cabeça-de-Abóbora de


repente.

“Fique quieto!” disse Tip com firmeza.

“Tudo bem, querido pai” respondeu o obediente Jack.


O Besourão ouvia pacientemente – e até com respeito – a estas interrupções, e então resumiu
sua história.

“Eu devo ter vivido completos três anos naquela lareira da casa de escola.” Ele disse “bebendo
sedentamente da fonte de conhecimento que estava diante de mim.”

“Tão poético”, comentou o Espantalho, balançando sua cabeça em aprovação.

“Mas, um dia” continuou o Besourão, “um maravilhoso acontecimento ocorreu, que alterou toda
minha existência e me trouxe para o meu atual auge de grandeza. O Professor me descobriu no
ato de rastejar pela lareira, e antes que eu pudesse escapar ele tinha me capturado entre seu
indicador e seu polegar.

“’Minhas queridas crianças’ ele disse, “Eu capturei um besouro – de uma espécie muito rara e
interessante. Algum de vocês sabe que tipo de besouro é este?”

“’Não!’ gritaram os estudantes em coro.

“’Então’ disse o Professor, ‘eu vou pegar meu projetor e colocar o inseto em uma tela, num modo
enormemente crescido, deste modo vocês poderão estudar cuidadosamente sua estrutura
peculiar, e se tornar familiarizados com seus hábitos e modo de vida.’

“Então ele trouxe de um armário, um instrumento muito curioso, e antes que eu pudesse perceber
o que aconteceu, eu me encontrei jogado em uma tela, neste enormemente crescido estado – tal
e qual vocês me veem agora.

Os estudantes de levantaram em seus assentos e esticavam a cabeça para a frente, para terem
uma melhor visão de mim. E duas meninas subiram no parapeito da janela, de onde podiam ter
uma visão mais ampla.

“’Aqui está!’ disse o Professor em voz alta, ‘este enormemente crescido besouro; um dos insetos
mais interessantes da existência!’

“Sendo eu Completamente Educado, e sabendo o que é requerido de um cavalheiro numa


ocasião como estas, eu fiquei de pé, coloquei a mão sobre o peito e fiz uma reverência muito
educada. Minha ação sendo inesperada, deve ter assustado eles, pois uma das alunas
empoleiradas sobre o parapeito da janela, deu um grito e caiu para trás, para fora da janela,
derrubando sua companheira assim que caiu.

O Professor deu um grito de espanto e correu porta afora, para ver se as pobres crianças tinham
se machucado por causa da queda. Os estudantes o seguiram em multidão, e eu fui deixado
sozinho na sala de aula, neste Enormemente Crescido estado e livre para fazer o que eu
quisesse.

Imediatamente me ocorreu que esta era uma boa oportunidade para escapar. Eu estava
orgulhoso do meu grande tamanho, e percebi que agora eu poderia viajar com segurança para
qualquer lugar do mundo, enquanto minha cultura superior poderia me fazer conhecer as pessoas
mais inteligentes que eu tivesse a chance de conhecer.

Então, enquanto o Professor pegava as garotinhas – que estavam mais assustadas que feridas –
do chão, e os alunos amontoavam-se em torno dele num grupo fechado, eu calmamente caminhei
para fora da casa da escola, dobrei uma esquina, e escapei despercebido para um bosque de
árvores próximo.”

“Maravilhoso!” exclamou o Cabeça-de-Abóbora, admiradamente.

“É sim, sem dúvida”, concordou o Besourão. “Eu nunca paro de me parabenizar a mim mesmo por
escapar enquanto estava Enormemente Crescido; pois mesmo meu excessivo conhecimento teria
pouco uso para mim se eu tivesse continuado um minúsculo e insignificante inseto.”

“Eu não sabia”, disse Tip, olhando para o Besourão com uma expressão confusa, “que insetos
vestiam roupas.”

“Não fazem isto em seu estado natural,” respondeu o estranho. “Mas, nas minhas andanças, tive
a boa sorte de salvar a nona vida de um alfaiate – os alfaiates tem nove vidas, igual aos gatos,
como vocês provavelmente devem saber. Ele ficou excessivamente grato, pois perder sua nona
vida seria seu fim; então ele me implorou para me fornecer esta estilosa roupa que estou vestindo
agora. Ela me cai muito bem, não acha?” E o Besourão levantou-se e deu algumas voltas
lentamente, para que todos pudessem examinar sua pessoa.

“Ele deve ter sido um bom alfaiate”, disse o Espantalho com um pouco de inveja.

“Ele era um alfaiate de bom coração, de todo modo,” observou o Homem de Lata.

“Mas, onde você estava indo quando nos encontrou?” Tip perguntou ao Besourão.

“Nenhum lugar em particular”, foi a resposta, “embora seja minha intenção visitar a Cidade das
Esmeraldas em breve, e conseguir dar um curso a alguma seleta audiência, sobre “Vantagens do
Crescimento”.

“Nós estamos indo juntos para a Cidade das Esmeraldas agora” disse o Homem de Lata; “então,
se for do seu agrado, fique a vontade para viajar em nossa companhia.”

O Besourão curvou-se com profunda cortesia.

“Será para mim um grande prazer” disse ele, “aceito seu amável convite; por nada na Terra de Oz
eu poderia esperar conhecer uma companhia tão conveniente.”

“Isto é verdade”, reconheceu o Cabeça-de-Abóbora. “Nós somos tão convenientes quanto


moscas e mel.”

“Mas – perdoem-me se eu pareço questionador – vocês são todos, tão incomuns!” Disse o
Besourão, olhando de uns para os outros com indisfarçável interesse.

“Não mais do que você mesmo”, respondeu o Espantalho. “Tudo na vida é incomum até que você
se habitue a isto.”

“Que filosofia rara!” exclamou o Besourão admiradamente,

“Sim; meu cérebro está trabalhando bem hoje”, admitiu o Espantalho, com um tom de orgulho em
sua voz.
“Bem, se vocês estão suficientemente descansados e dispostos, vamos apertar nosso passo em
direção da Cidade das Esmeralda”, sugeriu o crescido.

“Nós não podemos”, disse Tip. “O Cavalete quebrou uma perna, então não pode apertar o passo.
E não há árvores por aqui para fazer uma nova perna. Também não podemos deixa-lo para trás,
porque o Cabeça-de-Abóbora é muito duro nas articulações e tem que montar.”

“Que infelicidade!” gemeu o Besourão. Então olhou para o grupo cuidadosamente e disse:

“Se o Cabeça-de-Abóbora tem que montar, porque não usa uma das pernas dele para fazer uma
perna para o cavalo que o carrega? Acho que ambos são feitos de madeira.”

“Uau, isso é o que eu chamo de inteligência real”, disse o Espantalho com aprovação. “Eu me
pergunto porque meu cérebro não pensou nisso antes! Vamos ao trabalho querido Nick Homem
de Lata, e transferir a perna do Cabeça-de-Abóbora para o Cavalete.”

Jack não ficou muito feliz com essa ideia; mas ele se submeteu para que sua perna fosse
amputada pelo Homem de Lata e esculpida para fazer a perna do Cavalete. Nem mesmo o
Cavalete ficou feliz com a operação também; pois não achava um bom acordo ser “massacrado”
como ele chamou isto; e no fim das contas ele declarou que a nova perna era uma vergonha para
um Cavalete tão respeitável.

“Tenha mais cuidado com as palavras”, disse o Cabeça-de-Abóbora com firmeza. “Lembre-se,
que é minha perna que você está insultando”.

“Eu não tenho como esquecer”, respondeu o Cavalete, “pois ela é tão frágil quanto o resto da sua
pessoa.”

“Frágil! Eu frágil?” choramingou Jack com raiva. “Como se atreve a me chamar de frágil?”

“É porque você foi feito de modo grosseiro” zombou o cavalo, revirando os olhos de maneira
maliciosa. “Até mesmo sua cabeça não consegue ficar alinhada, e nem você sabe quando está
olhando para a frente ou para trás!”

“Amigos, por favor não briguem!” pediu o Homem de Lata esperançoso. “Por algum motivo,
nenhum de nós é sem perfeito; então vamos deixar os defeitos uns dos outros.”

“Excelente sugestão”, disse o Besourão, aprovando.

“Você deve ter um excelente coração, amigo metálico”.

“Eu tenho”, concordou Nick com prazer. “Meu coração é a melhor parte de mim. Mas agora,
vamos retomar nossa jornada.”

Eles colocaram o Cabeça-de-Abóbora perneta sobre o Cavalete e o prenderam com cordas, para
que ele não pudesse cair.

E então, seguindo a liderança do Espantalho, eles avançaram e direção da Cidade das


Esmeraldas.
14
A velha Mombi se entrega à Bruxaria
Logo descobriram que o Cavalete mancava, porque sua nova perna era um pouco grande demais.
Então, eles foram obrigados a parar enquanto o Homem-de-Lata a cortava com seu machado,
após o qual o cavalo de madeira caminhava mais confortavelmente. Mas o Cavalo não estava
totalmente satisfeito, ainda.

“É uma pena eu ter quebrado minha outra perna!”, rosnou.

“Pelo contrário”, observou alegremente o Besourão, que estava andando ao lado. “você deve
considerar o acidente como sorte. Um cavalo não é muito útil, até que esteja quebrado.”

“Perdão”, disse Tip, provocando, pois sentiu interesse de ambos o Cavalo e Jack. “permita-me
dizer que sua piada é sem graça, e velha”.

"Ainda assim, é uma piada", declarou o Besourão, com firmeza, "e uma piada derivada de um jogo
de palavras é considerada, entre pessoas educadas, eminentemente adequadas".

“O que isso quer dizer?”, perguntou o Cabeça-de-Abóbora, estupidamente.

“Significa, caro amigo, que nossa língua contém muitas palavras com duplo significado, e que
fazer uma piada que permita ambos os significados comprova cultura e refinamento, além de um
profundo comando da língua”.

“Eu não acredito nisso!”, disse Tip, claramente. “Qualquer um pode fazer um trocadilho”.

"Não é bem assim", replicou o Besourão, rigidamente. "É preciso educação de alto nível. Você foi
educado, jovem rapaz?"

“Não especialmente”, admitiu Tip.

"Então, você não pode julgar o assunto. Eu sou completamente educado, e digo que trocadilhos
mostram gênios. Por exemplo, se eu montar em cima deste cavalo, ele não seria apenas um
animal, ele se tornaria uma carruagem".

Com isto, o Espantalho deu um suspiro e o Homem-de-Lata parou e olhou com reprovação para o
Besourão. Ao mesmo tempo, o Cavalete bufou seu escárnio, e até mesmo o Cabeça-de-Abóbora
levantou a mão para esconder o sorriso que, uma vez esculpido em seu rosto, ele não poderia
mudar.

Mas o Besourão desfilava como se ele tivesse feito alguma observação brilhante, e o Espantalho
foi obrigado a dizer:

"Eu ouvi, meu caro amigo, que uma pessoa pode se tornar mais educada. E embora eu tenha um
grande respeito por cérebros, não importa o como eles sejam organizados ou classificados,
começo a suspeitar que o seu esteja um pouco confuso. De qualquer forma, peço-lhe que para
conter a sua educação superior, enquanto em nossa sociedade".
“Não somos muito parecidos”, continuou o Homem-de-Lata, “e somos totalmente bondosos. Mas
se seu conhecimento superior interromper novamente” Ele não completou a frase, mas girou o
machado brilhante de forma tão descuidada que assustou o Besourão, e ele se encolheu para
uma distância segura.

Os outros marcharam em silêncio, e o Grande Magnífico, depois de pensar algum tempo, disse
em uma voz humilde:

“Vou me esforçar para me conter”.

"Isso é tudo que podemos esperar", respondeu o Espantalho agradavelmente. E, sendo


reintegrado ao grupo, continuaram em seu caminho.

Quando pararam novamente para Tip descansar – o menino era o único que parecia cansado – O
Homem-de-Lata notou vários buracos pequenos no gramado.

“Esta deve ser a aldeia dos Ratos do Campo”, disse ao Espantalho. “Eu me pergunto se minha
velha amiga, a Rainha dos Ratos, está nesta área.”

“Se estiver, ela pode ser de grande ajuda”, respondeu o Espantalho, que estava impressionado
por um pensamento repentino. “Veja se consegue chama-la, caro Nick”.

Assim, o Homem-de-Lata soprou uma nota estridente em um apito de prata que estava pendurado
em seu pescoço. E um pequeno rato cinza surgiu de um buraco e avançou corajosamente em
direção a eles. Pois o Homem-de-Lata já havia salvado sua vida, e a Rainha dos Ratos de campo
sabia que ele era confiável.

“Bom dia, Majestade”, disse Nick, dirigindo-se educadamente à ratazana. - “Acredito que esteja
em boa saúde”.

“Obrigado, estou muito bem”, respondeu a rainha, recatadamente, enquanto sentava-se e exibia
a pequena coroa de ouro na cabeça. “Posso fazer algo para ajudar meus velhos amigos?”

“Na verdade, pode”, respondeu o Espantalho, ansiosamente. “peço-lhe que me deixe levar uma
dúzia de seus súditos comigo para a Cidade das Esmeraldas”.

"Eles vão se machucar de alguma forma?" perguntou a Rainha, em dúvida.

"Acho que não", respondeu o Espantalho. "Vou levá-los escondido na palha que preenche meu
corpo, e quando der o sinal, ao desabotoar meu casaco, eles só têm que sair correndo e fugir pra
casa outra vez o mais rápido que puder. Ao fazer isso, eles vão me ajudar recuperar o meu trono,
que o Exército da revolta tomou de mim".

"Nesse caso", disse a Rainha, "Eu não vou recusar o seu pedido. Quando você estiver pronto,
chamarei doze dos meus súditos mais inteligentes".

"Eu estou pronto agora" retornou o Espantalho. Então ele deitou no chão e desabotoou o casaco,
exibindo a massa de palha com a qual ele foi recheado.

A rainha soou um apito e, em um instante, uma dúzia de ratos do campo tinha saído de seus
buracos e pararam em frente à sua governante, aguardando suas ordens.
Nenhum dos viajantes conseguiu entender o que a rainha disse, pois era na língua dos ratos. Mas
os ratos do campo obedeceram sem hesitação, correndo um atrás do outro e escondendo-se na
palha do corpo do espantalho.

Quando todos os doze ratos tinham-se escondido, o Espantalho abotoou o casaco de forma
segura e, em seguida, levantou-se e agradeceu a rainha por sua bondade.

"Só mais uma coisa que você pode fazer para nos servir", sugeriu o Homem-de-Lata, "que é
correr na nossa frente e mostrar-nos o caminho para a Cidade das Esmeraldas, pois algum
inimigo está evidentemente tentando nos impedir de alcançá-lo".

"Farei isso de bom grado", respondeu a Rainha. "Vocês estão prontos?"

O Homem-de-Lata olhou Tip.

"Eu já estou descansado", disse o menino. "Vamos começar".

Em seguida, eles retomaram a viagem, a pequena rainha dos ratos de campo corria rapidamente
em frente e, em seguida, fazia uma pausa até que os viajantes se aproximassem, e começava a
correr novamente.

Sem esse guia infalível, o Espantalho e seus companheiros nunca teriam chegado à Cidade das
Esmeralda, pois muitos foram os obstáculos jogados em seu caminho pelas artes da velha Mombi.
No entanto, nenhum dos obstáculos realmente existiu, todos foram enganos habilmente
inventados. Pois, quando eles chegaram ás margens de um rio caudaloso que ameaçava barrar o
seu caminho, a pequena rainha prestava muita atenção, passando pela aparente inundação em
segurança, e nossos viajantes a seguiram sem encontrar uma única gota de água.

Mais uma vez, um alto muro de granito se erguia sobre suas cabeças e impedia seu avanço. Mas
a rata de campo cinza foi direto através dele, e os outros fizeram o mesmo. O muro desapareceu
assim que passaram por ele.

Depois, quando eles pararam por um momento para Tip descansar, eles viram quarenta estradas
se ramificando a partir de seus pés em quarenta direções diferentes, e logo estas quarenta
estradas começaram a girar ao redor como uma poderosa roda, primeiro em uma direção e depois
na outra, bagunçando completamente sua visão.

Mas a rainha pediu-lhes que a seguissem e correu em linha reta, após andarem poucos passos,
os quarenta caminhos desapareceram.

O último truque de Mombi foi o mais temível de todos. Ela enviou uma lâmina de fogo crepitante
correndo sobre o prado a consumi-los, e pela primeira vez o Espantalho ficou com medo e
começou a correr.

"Se o fogo me atinge eu vou desaparecer em segundos!", disse ele, tremendo até sacudir sua
palha. "É a coisa mais perigosa que eu já encontrei".

"Também estou fora!", gritou o Cavalete, girando e empinando com agitação, "porque minha
madeira é tão seca que iria queimar como lenha".

"O fogo é perigoso para abóboras?" perguntou Jack, com medo.


"Você vai ser cozido como uma torta. e eu também!" respondeu o Besourão, descendo todos os
quatro para que ele pudesse correr mais rápido.

Mas o Homem-de-Lata, sem ter medo do fogo, evitou a debandada, dizendo algumas palavras
sensatas.

"Olhem para a rata do campo!”, ele gritou. "O fogo não a queimou. Na verdade, não é o fogo, é só
mais uma ilusão."

De fato, ver a pequena rainha marchando calmamente pelas chamas restaurou a coragem de
todos os membros do grupo, e eles a seguiram sem serem queimados.

"Esta é certamente uma aventura extraordinária”, disse o Besourão, que ficou muito espantado,
“pois isso perturba todas as leis naturais que ouvi Professor Nowitall ensinar na escola".

“Certamente”, disse o Espantalho, sabiamente. “Toda magia não é natural e, por isso, é temida e
evitada. Mas eu vejo adiante os portões da Cidade das Esmeraldas, então imagino que tenhamos
passado por todos os obstáculos mágicos que pareciam se opor a nós”.

De fato, os muros da cidade estavam claramente visíveis, e a rainha dos ratos do campo, que
havia guiado tão fielmente, aproximou-se para dizer adeus.

"Estamos muito gratos a Vossa Majestade pela sua ajuda", disse o Homem-de-Lata, curvando-se
diante da criatura bonita.

"Eu estou sempre às ordens para ajudar meus amigos", respondeu a rainha, e num piscar de
olhos ela saiu correndo em sua jornada para casa.
15
Os prisioneiros da Rainha

Ao se aproximarem da entrada da Cidade das Esmeraldas, os viajantes a encontraram guardadas


por duas garotas do Exército da Revolta, que se opuseram à sua entrada retirando as agulhas de
tricô do cabelo e ameaçando cutucar o primeiro que se aproximasse.

Mas o Homem-de-Lata não estava com medo.

“Na pior hipótese, elas podem apenas arranhar minha linda superfície niquelada”, disse. “Mas não
haverá pior hipótese, pois eu acho que consigo assustar esses soldados absurdos facilmente.
Sigam-me de perto, todos vocês!”.

Em seguida, balançando seu machado em um grande círculo para a direita e esquerda antes dele,
ele avançou sobre a porta, e os outros seguiram-no sem hesitar.

As garotas, que não esperavam nenhuma resistência, ficaram apavoradas com giro do machado
brilhante e fugiram gritando para a cidade. Assim, nossos viajantes passaram pelos portões em
segurança e marchavam pelo largo pavimento verde até o palácio real.

“Neste ritmo, logo Vossa Majestade terá seu trono de volta”, disse o Homem-de-Lata, rindo de sua
fácil conquista dos guardas.

“Obrigado, amigo Nick”, respondeu o Espantalho, agradecido. “Nada pode resistir ao seu coração
gentil e ao seu machado afiado”.

Enquanto passavam pelas fileiras de casas, eles viam pelas portas abertas que os homens
estavam varrendo, limpando e lavando a louça, enquanto as mulheres se sentavam em grupos,
rindo e fofocando.

“O que aconteceu?”, perguntou o Espantalho a um homem de aparência triste com uma barba
espessa, que usava um avental e empurrava um carrinho de bebê ao longo da calçada.

"Ora, nós tivemos uma revolução, Vossa Majestade, como você deve saber muito bem",
respondeu o homem, "e desde que você foi embora as mulheres mudaram as coisas para que se
adequassem a elas. Estou feliz que tenha decidido voltar e restaurar a ordem, pois fazer trabalhos
domésticos e cuidar dos filhos está desperdiçando a força de cada homem na Cidade das
Esmeraldas".

"Hm!" disse o Espantalho, pensativo. "Se é um trabalho tão duro como você diz, como é que as
mulheres o gerenciam tão facilmente?"

"Eu realmente não sei", respondeu o homem, suspirando. "Talvez as mulheres sejam feitas de
ferro fundido."

Não houve nenhum movimento, enquanto passavam pela rua, para se opor ao seu progresso.
Várias das mulheres pararam de fofocar tempo suficiente para lançar olhares curiosos em cima de
nossos amigos, mas logo elas lançavam uma gargalhada ou um sorriso de escárnio e retomaram
suas conversas. E quando eles se reuniram com várias meninas pertencentes ao Exército da
Revolta, as meninas soldado, em vez de ser alarmar ou parecer surpresas, apenas sairam do
caminho e lhes permitiu avançar sem protesto.

Essa ação tornou o Espantalho inquieto.

"Eu tenho medo de estarmos caminhando para uma armadilha", disse ele.

"Bobagem!", respondeu Nick Lenhador, com confiança: "as criaturas tolas já estão conquistadas!".

Mas o Espantalho balançou a cabeça de uma forma que expressa dúvida, e Tip disse:

"Está fácil demais. Espere problemas pela frente."

"Irei esperar", respondeu sua Majestade. Sem qualquer oposição chegaram ao palácio real e
marcharam até os degraus de mármore, que já haviam sido cobertos de esmeraldas, mas agora
estavam cheios de pequenos orifícios de onde as joias tinham sido brutalmente arrancadas pelo
Exército da Revolta. E até agora nem um rebelde tinha barrado seu caminho.

Através dos corredores arqueados e pela magnífica sala do trono marchou o Homem de Lata e
seus seguidores, e aqui, quando as cortinas de seda verde se abriram, viram um espetáculo
curioso.

Sentada no trono reluzente estava a General Jinjur, com a segunda melhor coroa do Espantalho
sobre sua cabeça, e o cetro real em sua mão direita. Uma caixa de caramelos, que ela estava
comendo, estava em seu colo, e a menina parecia inteiramente à vontade em seus trajes reais.

O espantalho se adiantou e confrontou-a, enquanto o Homem de Lata inclinou-se sobre o seu


machado e os outros formaram um semi-círculo em volta de Sua Majestade.

"Como você ousa sentar no meu trono?" exigiu o Espantalho, olhando severamente o intruso.
"Você não sabe que é culpada de traição, e que há uma lei contra traição?"

"O trono pertence a quem é capaz de tomá-lo", respondeu Jinjur, enquanto comia lentamente
outro caramelo. "Eu o tomei, como você vê, por isso, agora eu sou a rainha, e todos os que se
opõem a mim são culpados de traição, e devem ser punidos pela lei que você acabou de
mencionar."

Este ponto de vista do caso intrigou o Espantalho.

"Como é que é, amigo Nick?" ele perguntou, virando-se para o Homem de Lata.

"Porque, quando se trata de Direito, não tenho nada a dizer," respondeu a personagem. "pois as
leis nunca foram feitas para serem compreendidas, e é tolice tentar."

"Então o que devemos fazer?" perguntou o Espantalho, desanimado.

"Por que você não se casa com a Rainha? E, então, vocês dois podem governar", sugeriu o
Besourão.

Jinjur olhou para o inseto ferozmente.


"Por que você não a manda de volta para a mãe, onde ela pertence?" perguntou Jack Cabeça-de-
Abóbora.

Jinjur franziu a testa.

"Por que você não a tranca em um armário até que ela se comporte, e prometa ser boa"?
perguntou Tip. Os lábios de Jinjur enrolaram com desdém.

"Ou não lhe dá uma boa lição!" acrescentou o Cavalete.

"Não", disse o Homem de Lata, "devemos tratar a pobre menina com gentileza. Vamos dar-lhe
todas as jóias que ela pode transportar, e mandá-la embora feliz e contente."

Nisto, Rainha Jinjur riu alto, e no minuto seguinte bateu palmas três vezes, como se fosse um
sinal.

"Vocês são criaturas muito absurdas", disse ela, "mas eu estou cansada de seu absurdo e não
tenho tempo para se preocupar com vocês por mais tempo."

Enquanto o monarca e seus amigos ouviam com espanto a este discurso imprudente, uma coisa
surpreendente aconteceu. O machado do Homem-de-Lata foi arrancado de suas mãos por
alguma pessoa por trás dele, e ele se viu desarmado e indefeso. No mesmo instante, uma
gargalhada soou aos ouvidos do grupo, e voltando-se para ver de onde isso veio, viram-se
cercados pelo Exército da Revolta, as meninas tendo em uma das mãos suas brilhantes agulhas
de tricô. Toda a sala do trono parecia estar preenchida com as rebeldes, e o Espantalho e seus
companheiros perceberam que eram prisioneiros."

“Você vê quão tolo é a opor-se à sagacidade de uma mulher”, disse Jinjur, alegremente, “e esse
evento só prova que eu estou mais apta para governar a Cidade das Esmeraldas do que um
espantalho. Não quero fazer-lhes nenhum mal, eu lhe garanto, mas para que vocês não sejam um
incômodo para mim no futuro eu vou pedir que todos sejam destruídos. Isto é, todos, exceto o
menino, que pertence à velha Mombi e deve ser devolvido à ela. O resto de vocês não são
humanos, e, portanto, não será mau destruí-los. O Cavalete e o Cabeça-de-Abóbora serão
picados para acender a lenha, e a abóbora deve ser feita em tortas. O espantalho vai fazer muito
bem para começar uma fogueira, e o homem de lata pode ser cortado em pedaços pequenos e
dado como alimento às cabras. Quanto a este imenso Besourão..."

"Vossa Magnificência, se me permite!" interrompeu o inseto.

"Acho que vou pedir ao cozinheiro para fazer uma sopa de você", continuou a Rainha, pensativa.

O Besourão estremeceu.

"Ou, se isso não funcionar, podemos usá-lo para um guisado húngaro, cozido e muito temperado",
acrescentou ela, cruelmente.

Este programa de extermínio foi tão terrível que os prisioneiros pareciam estar em pânico. O
Espantalho foi o único a não ceder ao desespero. Ele ficou em silêncio diante da Rainha e sua
testa estava enrugada, pensando profundamente como encontrar algum meio para escapar.

Enquanto pensava, ele sentiu a palha dentro do peito se mover suavemente. Imediatamente sua
expressão mudou de tristeza em alegria, e levantando a mão ele rapidamente desabotoou a frente
de sua jaqueta. Essa ação não passou despercebida pela multidão de meninas que o cercavam,
mas nenhuma delas suspeitava do que ele estava fazendo, até um pequeno rato cinzento saltar
de seu peito para o chão e sair correndo entre os pés do Exército da Revolta. Outro rato
rapidamente o seguiu, depois outro e outro, em rápida sucessão. E de repente um grito de terror
subiu do Exército que poderia facilmente ter preenchido o mais arrogante coração com
consternação. O momento que se seguiu tornou-se correria, e a corrida em pânico.

Enquanto os ratos corriam freneticamente pela sala o Espantalho teve apenas tempo para
observar um redemoinho de saias e um piscar de pés, com as meninas desfazendo a
aglomeração e seus esforços para escapar do palácio.

A rainha, ao primeiro alarme, levantou-se sobre as almofadas do trono e começou a dançar


freneticamente nas pontas dos pés. Em seguida, um rato correu até as almofadas, e apavorada,
pobre Jinjur deu um salto sobre a cabeça do Espantalho e escapou através de um arco – correndo
sem parar até chegar aos portões da cidade. Assim, em menos tempo do que eu posso explicar, a
sala do trono foi abandonada por todos, exceto pelo Espantalho e os seus amigos. E o Besourão
soltou um profundo suspiro de alívio quando ele exclamou:

"Finalmente, estamos salvos!"

"Por um tempo, sim," respondeu o Homem-de-Lata. "Mas temo que o inimigo volte em breve."

"Vamos barrar todas as entradas para o palácio!" disse o Espantalho. "Então teremos tempo para
pensar no que é melhor a ser feito."

Então, todos, exceto Jack Cabeça-de-Abóbora, que ainda estava agarrado ao Cavalete, correu
para as várias entradas do palácio real e fecharam as portas pesadas, trancando-as com
segurança. Então, sabendo que o Exército da Revolta não poderia demolir as barreiras até vários
dias, os aventureiros se reuniram mais uma vez na sala do trono para um conselho de guerra.
16
O Espantalho Precisa Pensar

“Me parece,” começou o Espantalho, quando todos estavam reunidos novamente na sala do
trono, “que a garota Jinjur está certa em querer ser Rainha. E se ela está certa, então eu estou
errado, e nós não temos motivos para estar ocupando o palácio dela.”

“Mas você era o Rei até ela chegar,” disse o Besourão, exibindo-se com as mãos nos
bolsos; “então me parece que ela é a intrusa ao invés de você.”

“Especialmente quando nós a dominamos e a colocamos pra correr,” acrescentou o


Cabeça-de-Abóbora, enquanto mexia na cabeça com as mãos, para deixa-la virada para o
Espantalho.

“Nós realmente a dominamos?” perguntou o Espantalho tranquilamente. “Olhe pela janela e


me diga o que você vê.”

Tip subiu a janela e olhou lá fora. “O palácio está cercado por uma fileira dupla de meninas-
soldado,” ele anunciou.

“Eu acho que,” continuou o Espantalho. “Nós estamos tão verdadeiramente prisioneiros quanto
estávamos antes dos ratos as assustarem do palácio.”

“Você está certo, amigo”, disse Nick Chopper, o Homem de Lata, que estava polindo seu peitoral
com um pedaço de tecido. “Jinjur ainda é a Rainha, e nós somos seus prisioneiros.”

“Mas eu espero que ela não consiga chegar até nós,” exclamou o Cabeça-de-Abóbora, com um
tremor de medo. “Ela ameaçou fazer tortas de mim, você sabia?”

“Não se preocupe,” disse o Homem de Lata. “Isto não importa muito. Se você ficar calado aqui,
você vai apodrecer com o tempo de qualquer modo. Uma boa torta é muito mais admirável do que
um intelecto apodrecido.”

“É uma grande verdade,” concordou o Espantalho.

“Oh, não!” gemeu Jack; “que grande infeliz sou eu! Porque, querido pai, você não me fez de lata –
ou mesmo de palha ? Então eu poderia permanecer por tempo indefinido.”

“Pare com isso!” respondeu Tip com indignação. “Você deveria estar feliz por eu ter lhe feito seja
do que for.” Então acrescentou pensativo, “Todas as coisas vem e vão, algum dia.”

“Mas eu imploro por lhe lembrar,” interrompeu o Besourão, que tinha um ar de angústia em seus
olhos redondos e arregalados, “que esta terrível Rainha Jinjur sugeriu fazer uma sopa de mim –
Eu! O único Enormemente Crescido e Completamente Educado Besourão no mundo inteiro!

“Eu acho que é uma ideia brilhante,” refletiu o Espantalho, aprovando.

“Você não acha que eles poderiam fazer uma sopa de algo melhor?” perguntou o Homem de Lata
voltando-se para o seu amigo.
“Bem, talvez,” concordou o Espantalho.

O Besourão gemeu.

“Eu posso ver, com os olhos da mente,” ele disse tristemente, “Os bodes comendo pedacinhos do
meu querido camarada o Homem de Lata, enquanto minha sopa estará cozinhando numa fogueira
feita dos corpos do Cavalete e de Jack Cabeça-de-Abóbora, e a Rainha Jinjur assistindo meu
cozimento enquanto alimenta o fogo com meu amigo Espantalho!”

Esta imagem mórbida lançou uma sombra sobre todo o grupo, tornando-os inquietos e
ansiosos.

“Isto não pode acontecer por enquanto,” disse o Homem de Lata, tentando falar alegremente;
“pois nós seremos capazes de manter Jinjur fora do palácio até que ela comece a quebrar as
portas.”

“E enquanto isso eu estarei sujeito a morrer de fome, e o Besourão também,” anunciou Tip.

“Quanto a mim,” disse o Besourão, “acho que eu poderia viver por algum tempo da cabeça de
Jack. Não que eu prefira abóboras para comer; mas creio que elas são bastante nutritivas, e a
cabeça de Jack é grande e rechonchuda.”

“Que sem coração!” exclamou o Homem de Lata, muito chocado, “Nós somos canibais, eu
pergunto, ou amigos leais?”

“Eu vejo claramente que nós não devemos ficar calados aqui neste palácio,” disse o Espantalho
decidido. “Então, vamos terminar esta conversa triste e tentar descobrir uma maneira de escapar.”

Com esta sugestão todos eles se reuniram em volta do trono, onde estava sentado o Espantalho,
e quando Tip sentou em um banquinho, do seu bolso caiu uma latinha de pimenta, que rolou pelo
chão.

“Cuidado!” berrou o menino. “Este é meu Pó da Vida. Não o derrame, pois está quase no fim.”

“E o que é o Pó da Vida?” perguntou o Espantalho, enquanto Tip recolocava cuidadosamente a


latinha em seu bolso.

“É um material mágico que a velha Mombi pegou de um feiticeiro corcunda,” explicou o menino.
“Ela trouxe Jack à vida com isto, e depois eu usei para trazer o Cavalete à vida. Eu acho que ele
torna viva qualquer coisa que for salpicada por ele. Mas resta apenas cerca de uma dose.”

“Então é muito precioso” disse o Homem de Lata.

“Concordo que seja” disse o Espantalho. “Isto pode se provar ser o melhor modo de escaparmos
de nossas dificuldades. Creio que terei de pensar por alguns minutos; então eu lhe agradeço
amigo Tip, se você puder pegar sua faca e arrancar esta pesada coroa da minha testa.”

Tip logo cortou od fios que fixavam a coroa à cabeça do Espantalho, e o antigo monarca da
Cidade das Esmeraldas removeu-a com um suspiro de alívio e a pendurou num gancho por trás
do trono.

“Este é meu último momento de realeza” ele disse; “e estou feliz por ter me livrado disto. O antigo
Rei da Cidade das Esmeraldas, cujo nome era Pastoria, perdeu a coroa para o Maravilhoso
Mágico, que a passou para mim. Agora a menina Jinjur a requer, e eu sinceramente espero que
isto não dê a ela uma dor de cabeça.”

“Isto é um tipo de pensamento que eu admiro grandemente,” disse o Homem de Lata, balançando
a cabeça em aprovação.

“E agora vou me induzir a um tranquilo pensar”, continuou o Espantalho, reclinando-se novamente


no trono.

Os outros fizeram tanto silêncio quanto possível, para não perturbá-lo; pois todos tinham
confiança no extraordinário cérebro do Espantalho.

Depois do que pareceu um longo tempo, principalmente para os que assistiam ansiosos, o
pensador se levantou, olhou para seus amigos com sua cara mais triunfante e disse:

“Meu cérebro está trabalhando lindamente hoje. E eu irei provar isto. Agora escutem! Se
tentarmos escapar pelas portas do palácio, com certeza seremos capturados. E, como não
podemos escapar pelo chão, só resta um caminho a seguir. Nós devemos escapar pelo ar!”

Ele parou para notar o efeito destas palavras; mas todos os seus ouvintes pareciam confusos e
não-convencidos.

“O Maravilhoso Mágico escapou em um balão,” ele continuou. “Nós não sabemos como fazer um
balão, claro; mas qualquer tipo de coisa que possa voar pelo ar, pode nos carregar facilmente.
Então eu sugiro que meu amigo Homem de Lata, que é ótimo mecânico, possa construir algum
tipo de máquina, com asas fortes para nos carregar; e nosso amigo Tip pode então trazê-la à vida
com seu pó mágico.

“Bravo!” clamou Nick Chopper.

“Que cérebro esplêndido!” Sussurrou Jack.

“Realmente muito esclarecido!” disse o Educado Besourão.

“Eu acredito que isso pode ser feito,” declarou Tip; “isto é, se o Homem de Lata é capaz de fazer a
Coisa.”

“Farei o meu melhor,” disse Nick alegremente; “e, principalmente, eu não costumo falhar no que
eu tento, mas a Coisa deve ser construída sobre o teto do palácio, então poderá subir
confortavelmente no ar.”

“Com certeza”, disse o Espantalho.

“Então, vamos procurar pelo palácio,” continuou o Homem de Lata, “e carregar todo material que
pudermos encontrar para o teto, onde irei começar meu trabalho.”

“Primeiro, entretanto,” disse o Cabeça-de-Abóbora, “Eu lhe imploro que me livre deste cavalo, e
me faça uma outra perna para caminhar. Pois na minha atual condição eu não tenho nenhuma
utilidade nem para mim nem para ninguém.”

Então o Homem de Lata partiu uma mesa de mogno em pedaços com seu machado e retirou uma
das pernas, que foi lindamente esculpida para o corpo de Jack Cabeça-de-Abóbora, que estava
muito feliz de sua aquisição.
“Parece estranho” ele disse, enquanto olhava o Homem de Lata trabalhar, “que minha perna
esquerda possa ser a parte mais elegante e consistente em mim.”

“Isto prova que você é incomum,” falou o Espantalho, “e estou convencido de que as únicas
pessoas dignas de consideração neste mundo são as incomuns. Pois as pessoas comuns são
como folhas de uma árvore, que vivem e morrem sem ser percebidas.”

“Fala como um filósofo!” murmurou o Besourão, enquanto ajudava o Homem de Lata a colocar
Jack sobre seus pés.

“Como se sente agora?” perguntou Tip, vendo o Cabeça-de-Abóbora pisar em volta para testar
sua nova perna.

“Como novo” respondeu Jack, cheio de felicidade, “e pronto para ajuda-los a escapar.”

“Então vamos ao trabalho” disse o Espantalho, num tom de negócios.

E felizes por fazer alguma coisa com a qual pudessem terminar seu aprisionamento, os amigos
separaram-se para passear pelo palácio em busca do material adequado para usar na construção
de sua máquina aérea.
17
O Surpreendente voo da Coisa

Quando os aventureiros se reencontraram sobre o teto, havia uma variedade bem estranha de
acessórios que foram selecionados pelos membros do grupo. Ninguém parecia ter uma ideia
muito clara do que era necessário, mas todos tinham trazido alguma coisa.

O Besourão havia pego de seu lugar na parede de um grande corredor, a cabeça de um animal
empalhado que tinha chifres muito grandes. Com cuidado e muita dificuldade o inseto havia
conseguido carrega-la escada acima até o telhado. Lembrava uma cabeça de alce, mas tinha um
nariz arrebitado que lhe dava um ar atrevido, e tinha uma longa barbicha no queixo, como um
bode. Porque motivo o Besourão havia escolhido este artigo, ele não pôde explicar, exceto que
isto tinha despertado sua curiosidade.

Tip, com a ajuda do Cavalete, tinha trazido um grande e velho sofá acolchoado para o teto. Era de
um estilo antigo, com costas altas, e era tão pesado que mesmo tendo colocado a maior parte do
peso sobre as costas do Cavalete, o menino estava sem fôlego quando finalmente o desajeitado
sofá foi solto no telhado.

O Cabeça-de-Abóbora tinha trazido uma vassoura, pois foi a primeira coisa que viu. O Espantalho
chegou com um rolo de cordas de varal que ele encontrou no pátio, e em sua subida pelas
escadas ele tinha se emaranhado tanto nas pontas das cordas, que tanto ele quanto sua carga,
caíram como uma pilha sobre o teto e poderiam ter rolado para baixo, se Tip não os segurasse.

O Homem de Lata apareceu por último. Ele também trouxe algo: Ele havia cortado quatro grandes
e largas folhas de uma enorme palmeira, que era o orgulho de todos os habitantes da Cidade das
Esmeraldas.

“Meu querido Nick!” exclamou o Espantalho, vendo o que seu amigo tinha feito; “Você é culpado
do maior crime que alguém pode cometer na Cidade das Esmeraldas. Se bem me lembro, a pena
por cortar folhas da palmeira real é de ser morto sete vezes e depois ser preso pelo resto da vida.”

“Isto não ajudaria em nada agora” respondeu o Homem de Lata, soltando as grandes folhas sobre
o teto. “Mas isto pode ser mais um motivo pelo qual é necessário escapar daqui. E agora deixe-
me ver o que vocês encontraram para mim, para que eu trabalhe.”

Muitos eram os olhares de dúvida que todos lançavam sobre a grande mistura de coisas que
agora enchia o telhado, e finalmente o Espantalho sacudiu a cabeça e comentou:

“Bem, se o amigo Nick puder fazer a partir deste monte de lixo, uma Coisa que irá voar pelo ar e
nos levar para a segurança, então eu terei que admitir que ele é um mecânico melhor do que eu
suspeitava.”

Mas o Homem de Lata parecia de início não ter plena certeza de sua capacidade; só depois
de polir a testa vigorosamente com seu pedaço de tecido, ele resolveu realizar a tarefa.
“A primeira coisa necessária para a máquina,” ele disse, “é um corpo grande o suficiente para
carregar o grupo inteiro. Este sofá é a maior coisa que temos, e pode ser usado para o corpo.
Mas, se a máquina inclinar para os lados, todos nós escorregamos e caímos no chão.”

“Porque não usa dois sofás?” Perguntou Tip. “Tem outro igual a esse lá embaixo.”

“Está é uma ótima sugestão” exclamou o Homem de Lata. “Você deve trazer o outro então.”

Então Tip e o Cavalete conseguiram, com muito trabalho, trazer o segundo sofá ao teto; e quando
os dois foram colocados juntos, frente a frente, as costas e braços altos dos sofás formaram uma
muralha em volta, deixando um espaço grande e bem protegido no meio.

“Excelente!” gritou o Espantalho. “Nós poderemos sentar bem confortáveis e à vontade dentro
deste ninho.”

Os dois sofás foram então amarrados firmemente com as cordas de varal, e em seguida Nick
Chopper fixou a cabeça de animal na frente.

“Isto vai servir para sabermos onde é a frente atrás da Coisa,” disse ele, muito satisfeito com a
ideia. “Realmente, se você analisar bem, o animal lembra uma figura de proa. E estas grandes
folhas de palmeira, pelas quais arrisquei minha vida sete vezes, devem servir como asas.”

“Elas são fortes o suficiente?” perguntou o menino.

“São tão fortes quanto qualquer coisa que possamos conseguir” respondeu o Homem de Lata; “e
embora elas não sejam proporcionais ao corpo, não estamos em posição de escolher muito.”

Então ele fixou as folhas de palmeira ao sofá, duas de cada lado. E o Besourão falou admirado: “A
Coisa está completa, e apenas precisa ser trazida à vida.”

“Esperem um momento!” disse Jack. “Vocês não vão usar minha vassoura?”

“Para quê?” perguntou o Espantalho.

“Bem, ela poderia ser fixada atrás para servir de cauda,” respondeu o Cabeça-de-Abóbora. “Com
certeza não podemos dizer que a Coisa está completa sem uma cauda.”

“Hum...” disse o Homem de Lata, “eu não vejo utilidade para uma cauda. Pois não estamos
tentando copiar um animal, ou um peixe, ou um pássaro. Todos sabemos que a Coisa é para nos
carregar pelo ar.”

“Talvez, depois que a Coisa for trazida à vida, ela possa usar a cauda para se dirigir,” sugeriu o
Espantalho. “Pois se isto voar pelo ar, não será diferente de um pássaro, e eu fui informado que
todos os pássaros tem cauda, que usam como um leme enquanto voam.”

“Muito bem,” respondeu Nick, “a vassoura pode ser usada como cauda,” e ele fixou ela
firmemente na parte de trás dos sofás.

Tip tirou a latinha de pimenta de seu bolso.

“A Coisa parece muito grande” ele disse, preocupado, “e eu não tenho certeza se tem pó
suficiente para trazer ele inteiro à vida. Mas vamos até onde podemos.”
“Coloque mais nas asas,” disse Nick Chopper, “pois elas precisam ser feitas o mais forte
possível.”

“E não esqueça a cabeça!” disse o Besourão.

“Nem a cauda!” acrescentou Jack Cabeça-de-Abóbora.

“Fiquem quietos” disse Tip, nervoso; “vocês tem que me dar uma chance para trabalhar o
encantamento mágico de modo correto.”

Com muito cuidado ele começou a salpicar a Coisa com o precioso pó. Cada uma das quatro asas
foi primeiramente coberta com uma camada, em seguida os sofás foram salpicados e na vassoura
também foi dado um ligeiro revestimento.

“A cabeça! A Cabeça! Não esqueça, eu imploro, não esqueça a cabeça!” gritava o Besourão,
animado.

“Só tem um pouquinho de pó”, anunciou Tip, olhando dentro da latinha. “E me parece mais
importante dar vida às pernas do sofá do que à cabeça.”

“Não faça isso,” decidiu o Espantalho. “Todas as coisas precisam de uma cabeça para as guiar; e
desde que esta criatura é feita para voar, e não para andar, é realmente sem importância se ela
vai ter pernas ou não.”

Então Tip aceitou esta decisão e derramou o resto do pó sobre a cabeça de animal.

“Agora” ele disse, “façam silêncio enquanto eu trabalho no encantamento!”

Tendo ouvido a velha Mombi pronunciar as palavras mágicas, e tendo obtido sucesso em trazer o
Cavalete para a vida, Tip não hesitou nenhum momento em dizer as palavras cabalísticas, cada
qual acompanhada de seu gesto de mão em particular.

Foi um momento sério e impressionante de cerimônia.

Quando ele terminou o encantamento, a Coisa estremeceu seu enorme corpo, a cabeça deu um
grito estridente que é próprio destes animais e começou a bater as quatro asas furiosamente.

Tip conseguiu se agarrar a uma chaminé, senão ele teria voado para longe, pela força do vento
produzido pelas asas. O Espantalho, sendo leve, foi jogado no ar, mas felizmente Tip o agarrou
por uma das pernas. O Besourão se agachou plano sobre o telhado e assim escapou, e o Homem
de Lata, cujo peso o ancorava firmemente, passou ambos os braços em torno de Jack Cabeça-de-
Abóbora e conseguiu salvá-lo. O Cavalete caiu e ficou deitado de pernas para o ar.

E agora, enquanto todos tentavam se recompor, a Coisa levantou voo lentamente do teto e subia
pelo ar.

“Aqui! Volte!” gritou Tip, numa voz desesperada, enquanto se segurava na chaminé com uma mão
e segurava o Espantalho com a outra. “Venha logo, eu te ordeno!”

Foi então que a sabedoria do Espantalho em trazer a cabeça da Coisa à vida, em vez das pernas,
ficou provada sem sombra de dúvida. Pois o animal, já no ar, virou a cabeça ao comando de Tip e
gradualmente circulou em volta até poder ver a parte do teto onde eles estavam.
“Volte!” gritou o menino de novo.

E o animal obedeceu, lenta e graciosamente agitando suas quatro asas no ar, enquanto a Coisa
se estabilizava mais uma vez sobre o telhado e ficou ali.
18
No Ninho da Gralha
“Isto,” disse o animal numa vozinha esganiçada totalmente desproporcional ao tamanho do seu
corpo, “é a mais nova experiência de que ouço falar. A última coisa de que me lembro bem é de
estar andando pela floresta e ouvir um barulho alto. Alguma coisa provavelmente me matou, e
certamente deveria ter sido o meu fim. Mas aqui estou eu, vivo outra vez, com quatro asas
monstruosas e com um corpo que, me arrisco a dizer, faria qualquer animal ou ave respeitável, ter
vergonha de o possuir. O que significa tudo isto? Sou um veado ou um caminhão?” E quando
falava a criatura balançava a barbicha de uma maneira engraçada.

“Você é apenas uma Coisa” respondeu Tip, “Com cabeça de Veado. E nós fizemos você e o
trouxemos à vida para que você possa nos carregar pelo ar para onde desejarmos.”

“Muito bem!” disse a Coisa. “Como não sou mais um veado, não posso ter um espírito
independente nem ser orgulhoso. Então eu posso tanto lhe servir quanto não fazer nada. Minha
única satisfação é que eu não pareço ter um corpo muito forte, e eu não gostaria de viver muito
tempo em estado de escravidão.”

“Não diga isso, eu lhe imploro!” gemeu o Homem de Lata, cujo coração excelente estava
totalmente afeiçoado por estas palavras tristes. “Você não está se sentindo bem hoje?”

“Oh, eu não sei,” respondeu o veado, “é o meu primeiro dia de existência; então não tive tempo de
julgar se estou me sentindo bem ou indisposto.” E balançava seu rabo de vassoura pra lá e pra
cá, de um modo pensativo.

“Vamos, vamos!” disse o Espantalho gentilmente. “tente ser mais alegre e viver a vida que você
ganhou. Seremos bons mestres e faremos o possível para que sua existência seja agradável.
Está disposto a nos levar pelo ar aonde desejarmos?”

“Com certeza” respondeu o animal. “eu realmente prefiro viajar pelo ar, pois se eu viajasse por
terra e esbarrasse com algum outro da minha espécie, meu embaraço seria tremendo!”

Eu entendo isto,” disse o Homem de Lata simpaticamente.

“E ainda,” continuou a Coisa, “agora que olho para você cuidadosamente, meus mestres, percebo
que nenhum de vocês foi construído mais artisticamente do que eu”.

“As aparências enganam” disse o Besourão seriamente. “Eu sou Extremamente Crescido e
Completamente Educado.”

“Entendo!” murmurou o veado, indiferente.

“E meus miolos são considerados de uma espécie muito rara” adicionou o Espantalho
prontamente.

“Que estranho!” replicou o animal.

“Apesar de eu ser de lata,” disse o Homem de Lata, “Eu possuo o coração mais doce e admirável
em todo o mundo.”
“Fico contente em ouvir isso,” respondeu a Coisa dando uma pequena tossida.

“Meu sorriso,” disse Jack Cabeça-de-Abóbora, “é digno de sua melhor atenção. Pois ele sempre
será o mesmo.”

“Imperturbável” explicou o Besourão educadamente; e a Coisa voltou a olhar para ele.

“E eu,” declarou o Cavalete, depois de uma pausa “só sou notável porque não posso ajudar.”

“Estou realmente orgulhoso por me reunir com mestres tão excepcionais.” Disse a Coisa, num tom
cuidadoso. “se eu pudesse ter uma introdução que falar sobre mim mesmo, eu ficaria mais do que
satisfeito.”

“Isto virá com o tempo”, respondeu o Espantalho. “Conhecer a si mesmo é considerado um


grande feito, e até mesmo nós que somos mais velhos levamos meses para aperfeiçoar. Mas
agora,” ele acrescentou olhando para os outros, “vamos entrar a bordo e começar nossa jornada.”

“Onde devemos ir?” perguntou Tip, enquanto sentava no sofá e ajudava o Cabeça-de-Abóbora a
entrar também.

“No País do Sul governa uma Rainha muito encantadora, chamada Glinda, a Bondosa, que tenho
certeza que ficará feliz em nos receber,” disse o Espantalho entrando na Coisa desajeitadamente.
“Vamos até ela pedir sua ajuda”.

“Isto foi muito bem pensado” declarou Nick Chopper, dando um apoio para o Besourão subir e em
seguida colocando o Cavalete na parte traseira dos bancos acolchoados. “Eu conheço Glinda a
Bondosa, e creio que ela vai ser mostrar uma amiga de verdade.”

“Estão todos prontos?” perguntou o menino.

“Sim” anunciou o Homem de Lata, sentando-se ao lado do Espantalho.

“Então” disse Tip para o animal, “faça a gentileza de nos levar para o sul; e não voe muito alto,
exceto para escapar das casas e das árvores, pois isto me deixa tonto por enquanto.”

“Ok então” respondeu a Coisa.

Ele bateu suas quatro grandes asas e elevou-se lentamente no ar; e enquanto nosso pequeno
grupo de aventureiros segurava-se nos lados e nos assentos dos sofás para se apoiar, a Coisa
virou para o sul e subiu majestosamente ganhando distância.

“O efeito cênico desta altitude é maravilhoso” comentou o educado Besourão, enquanto eles
seguiam.

“Esqueça o cenário”, disse o Espantalho. “Segure-se firme ou você pode cair. A coisa parece
balançar-se muito”.

“Daqui a pouco vai anoitecer” disse Tip observando que o sol estava baixo no horizonte. “Talvez
nós devamos esperar até que amanheça. Estou me perguntando se a Coisa consegue voar
durante a noite”.
“É o que eu estava pensando” respondeu a Coisa tranquilamente. “Como vê, isto é uma
experiência nova para mim. Eu costumava ter pernas que me carregavam rapidamente no chão.
Mas agora minhas pernas parecem adormecidas.”

“Elas estão” respondeu Tip “não pudemos trazê-las à vida”.

“Era esperado que você voasse, não que andasse.” explicou o Espantalho.

“Pois podemos andar por nós mesmos” disse o Besourão.

“Começo a entender o que vocês querem de mim” respondeu a Coisa “então irei fazer o melhor
para agradar vocês” e ele voou em silêncio por um tempo.

Jack Cabeça-de-Abóbora se tornou inquieto. “Me pergunto se viajar pelo ar estraga abóboras” ele
disse.

“Só se você descuidadamente derrubar sua cabeça para fora”, respondeu o Besourão. “Neste
caso sua cabeça se transformaria em purê de abóbora.”

“Eu já não pedi para acabar com essas piadas infelizes?” questionou Tip olhando para o
Besourão com uma expressão severa.

“Você pediu, e eu contive uma boa parte delas” respondeu o inseto. “Mas há oportunidades que
são tão excelentes em nossa língua, que para alguém tão educado como eu, é quase irresistível
não se expressar.”

“Pessoas com mais ou menos educação já descobriram essas piadas a centenas de anos.” Disse
Tip.

“Tem certeza?” perguntou o Besourão com um olhar assustado.

“Claro que tenho certeza” respondeu o menino. “Um Besouro educado pode ser uma coisa nova;
mas uma educação abesourada é tão velha quanto as montanhas, a julgar pelo uso que você faz
dela.”

O inseto pareceu muito impressionado com essa observação, e por um tempo manteve um
silêncio quieto.

O Espantalho, mexendo-se em seu assento, viu sobre uma das almofadas a latinha de pimenta
que Tip tinha deixado de lato, e começou a examiná-la.

“Jogue fora” disse o menino; “Está vazia agora, não serve mais para nada.”

“Está mesmo vazia?” perguntou o Espantalho, olhando curiosamente para a lata.

“Claro que está” respondeu Tip “eu utilizei todos os grãos do pó.”

“Então esta latinha abre para os dois lados” anunciou o Espantalho, “pois a parte de fora tem
cerca de um centímetro a mais do que o interior”.

“Deixe-me ver”, disse o Homem de Lata, pegando a latinha de seu amigo.

“Sim”, ele declarou depois de olhar várias vezes, “com certeza esta coisa tem um fundo falso. E
agora eu me pergunto o porquê”.
“Você não pode abrir e descobrir?” perguntou Tip, agora interessado no mistério.

“Não consigo abrir este outro lado” disse o Homem de Lata “meus dedos são muito rígidos; veja
se você consegue abrir por favor.”

Ele passou a latinha de pimenta para Tip, que não teve dificuldade de girar a tampa do outro lado.
E na abertura do outro lado estavam três pílulas prateadas e um papel cuidadosamente dobrado
por baixo delas. O menino começou a desdobrar o papel, com cuidado para não derrubar as
pílulas, e encontrou várias linhas escritas com tinta vermelha.

“Leia alto” disse o Espantalho. Então Tip leu o seguinte:

“ADORÁVEIS PÍLULAS DO DESEJO, DO DR. NIKIDIK.

Instruções de uso:

Engula uma pílula; conte de dois em dois até dezessete; e então faça um desejo.

O desejo irá se realizar imediatamente.

CUIDADO: Mantenha num local seco e escuro.”

“Uau, esta é uma descoberta muito valiosa!” gritou o Espantalho.

“Com certeza é” respondeu Tip gravemente. “Estas pílulas podem ser de grande utilidade para
nós. Me pergunto se a velha Mombi sabia que elas estavam nessa latinha de pimenta. Eu me
lembro de ouvir ela dizer que ela conseguiu o pó da vida deste mesmo Nikidik.”

“Ele deve ser um poderoso Feiticeiro!” exclamou o Homem de Lata; “e já que o pó se provou ser
um sucesso, podemos ter confiança nas pílulas também.”

“Mas agora” perguntou o Espantalho, “é possível contar até dezessete de dois em dois?
Dezessete é um número ímpar.”

“É verdade” disse Tip muito desapontado. “Ninguém pode contar até dezessete de dois em dois”.

“Então as pílulas não tem utilidade para nós” falou o Cabeça-de-Abóbora; “e este fato me enche
de tristeza, pois eu iria desejar que minha cabeça nunca se estragasse.”

“Sem sentido!” disse o Espantalho bruscamente. “Se pudéssemos usar as pílulas para qualquer
coisa que quiséssemos, faríamos desejos muito melhores do que este.”

“Eu não vejo como alguma coisa poderia ser melhor.” Protestou o pobre Jack “se vocês fossem
apodrecer dentro de algum tempo, entenderiam minha ansiedade.”

“De minha parte” disse o Homem de Lata “eu simpatizo com você com todo o respeito. Mas desde
que não podemos contar até dezessete de dois em dois, simpatia é tudo o que você pode obter.”

Neste momento começou a anoitecer, e os viajantes encontraram acima deles um céu nublado,
que não deixava passar os raios da lua.”
A Coisa voava constantemente, e por algum motivo o enorme corpo de sofás começou a balançar
cada vez mais turbulentamente a cada hora.

O Besourão declarou que estava enjoado; e Tip também estava pálido e um pouco perturbado.
Mas os outros seguravam-se nos encostos dos sofás, sem se importar com o movimento até que
estivessem caindo.

A noite ficou mais e mais escura, e mais e mais a Coisa avançava pelos céus negros. Os viajantes
não puderam mais ver uns aos outros, e um silêncio opressivo caiu sobre eles.

Depois de muito tempo, Tip, que estava pensando profundamente, falou.

“Como iremos saber quando chegarmos ao palácio de Glinda a Bondosa?” ele perguntou.

“É um longo caminho até o palácio de Glinda” respondeu o Homem de Lata; “eu já viajei até lá.”

“Mas como iremos saber o quão rápido a Coisa está voando?” insistiu o menino. “Nós não
podemos ver nada da terra lá embaixo, e antes que amanheça nós podemos estar muito além do
lugar onde queremos chegar.”

“Realmente é verdade” respondeu o Espantalho, um pouco perturbado. “Mas eu não vejo como
podemos parar logo agora; pois poderíamos descer em um rio, ou no topo de uma torre, o que
seria desastroso.”

Então eles deixaram que a Coisa continuasse voando, com as regulares batidas de suas grandes
asas, e esperaram com paciência que amanhecesse.

Então os medos de Tip se mostraram bem fundamentados, pois com os primeiros raios da aurora
eles olharam sobre as bordas dos sofás e descobriram planícies salpicadas de estranhas aldeias,
onde as casas, ao contrário de terem o telhado arredondado, como em todas na Terra de Oz,
tinham telhados em forma de cone. Haviam também estranhos animais que se moviam pelas
planícies, e o local não era nada familiar nem para o Homem de Lata nem para o Espantalho que
já haviam anteriormente visitado Glinda a Bondosa e conheciam bem suas terras.

“Nós estamos perdidos!” disse o Espantalho arrasado. “A Coisa deve ter nos levado totalmente
para fora da Terra de Oz e sobre os desertos de areia ou no terrível mundo exterior do qual
Dorothy nos falou”.

“Temos que voltar” disse o Homem de Lata “o mais rápido possível!”.

“Dê a volta!” gritou Tip para a cabeça de veado. “volte o mais rápido que você puder!”

“Eu não sei dar a volta direito” respondeu o animal “pois eu não estou acostumado a voar, e a
melhor maneira seria pousar em algum lugar e então eu poderia girar e começar voltando a partir
dali.”

Estava certo, mas não parecia haver nenhum lugar onde eles pudessem pousar para fazer isso.
Eles sobrevoaram uma vila tão grande, que o Besourão declarou que era uma cidade, em seguida
chegaram a um desfiladeiro de altas montanhas, com muitos abismos profundos e grandes
penhascos,
“Agora é a nossa chance de parar” disse o menino, percebendo que eles estavam muito perto do
topo das montanhas. Então eles disseram para a Coisa: “Pare no primeiro lugar plano que você
encontrar!”

“Muito bem” respondeu o veado, e desceu sobre uma superfície plana de pedra no meio de dois
picos.

Mas não sendo experiente em assuntos de voo, a Coisa não conseguiu calcular sua velocidade
corretamente; e ao invés de parar sobre a rocha plana, ele bateu numa das laterais de pedra e
quebrou suas asas da direita e em seguida despencando penhasco abaixo.

Nossos amigos seguravam-se nos sofás o máximo que podiam, mas quando a Coisa bateu um
dos lados numa rocha pontuda, virou subitamente de pernas para cima e todos imediatamente
despencaram de dentro.

Por sorte, eles caíram a pouca distância e por baixo deles estava um ninho gigantesco, construído
por uma colônia de Gralhas numa concavidade da rocha. Por isso nenhum deles – nem mesmo o
Cabeça-de-Abóbora – se machucou com a queda. Pois Jack encontrou sua preciosa cabeça
descansando sobre o peitoral macio do espantalho, que dava uma ótima almofada; e Tip caiu num
monte de folhas e papéis, que o salvaram de se machucar. O Besourão tinha batido sua cabeça
redonda contra o Cavalete, mas causou a eles apenas um pequeno desconforto.

O Homem de Lata ficou muito alarmado de início; mas percebendo que ele havia escapado sem
nenhum arranhão em seu belo corpo cromado, ele logo recuperou sua alegria de costume e foi
ajudar seus camaradas.

“Nossa jornada terminou tão de repente” ele disse “e nós não podemos culpar nosso amigo a
Coisa pelo acidente, pois ele fez o melhor que podia, dadas as circunstâncias. Mas já que temos
de escapar deste ninho, deixo isto para alguém que tenha um cérebro melhor que o meu.”

Aqui ele olhou para o Espantalho; que se arrastou até a borda do ninho e olhou. Abaixo deles
havia um precipício com centenas de metros de profundidade. Por cima deles haviam pontas de
penhasco quebradas e numa delas estava o corpo da Coisa ainda pendurado por um dos cantos
do sofá. Ali realmente parecia não haver escapatória, e quando perceberam que estavam
desprotegidos e indefesos, nosso pequeno grupo de aventureiros se sentiu arrasado.

“Esta é uma prisão pior do que o palácio” disse tristemente o Besourão.

“Eu queria que tivéssemos ficado lá” gemeu Jack “Receio que o ar das montanhas não é bom
para abóboras”.

“Quero ver como vai ser quando as Gralhas voltarem” falou o Cavalete, enquanto agitava as
pernas numa tentativa inútil de ficar em pé novamente. “Gralhas gostam especialmente de comer
abóboras”.

“Você acha que esses pássaros vão voltar aqui?” perguntou Jack muito perturbado.

“Claro que vão voltar” respondeu Tip, “pois este é o ninho deles. E devem haver centenas deles”
ele continuou “pode-se ver pelo monte de coisas que eles trouxeram para cá!”

Realmente o ninho estava meio cheio com uma coleção muito curiosa de pequenas coisas que
nem teriam uso algum para os pássaros, mas que as Gralhas ladras tinham roubado durante
muitos anos das casas das pessoas. E o ninho estava seguramente protegido, onde nenhum
humano poderia alcançar, e jamais recuperar seus bens.

O Besourão, procurando no meio da bagunça de coisas inúteis que as Gralhas tinham roubado –
pois elas roubam tanto coisas valiosas quanto sem valor – levantou com o pé um belo colar de
diamantes. O Homem de Lata admirou tanto o colar, que o Besourão o presenteou a ele com
belas palavras, e depois disso o Homem de Lata o prendeu no pescoço com muito orgulho,
alegrando-se imensamente quando os diamantes brilhavam nos raios de sol.

Mas de repente eles ouviram um grande grasnado e barulho de asas batendo, e como o barulho
foi aumentando, Tip exclamou: “As Gralhas estão chegando! E se elas nos encontrarem aqui, com
certeza vão nos matar em sua fúria.”

“Estou com medo disto!” gemeu o Cabeça-de-Abóbora “Meu fim está chegando!”

“E o meu também!” disse o Besourão; “Pois as Gralhas são o maior inimigo da minha raça”.

Os outros não estavam totalmente com medo; mas o Espantalho decidiu salvar todos do grupo
que fossem propensos a ser atacados pelos pássaros raivosos. Então ele mandou que Tip tirasse
fora a cabeça de Jack e se deitasse com ela no fundo do ninho, e quando isto foi feito ele mandou
que o Besourão se deitasse ao lado de Tip. Nick Chopper que por experiência já sabia
exatamente o que deveria fazer, cortou o Espantalho em pedaços (exceto a cabeça) e espalhou a
palha sobre Tip e o Besourão, cobrindo completamente seus corpos.

E mal eles terminaram de fazer isto, quando a nuvem de pássaros os avistou. Percebendo os
intrusos em seu ninho, os pássaros gritaram furiosos.
19
As Adoráveis Pílulas de Desejo, do Dr. Nikidik

O Homem de Lata geralmente era pacífico, mas quando a ocasião requeria, ele podia lutar tão
bravamente quanto um gladiador Romano. Então, quando as Gralhas quase o derrubaram na sua
corrida de asas e bicos e garras afiadas, ameaçando danificar seu revestimento brilhante, o
Homem de Lata levantou seu machado e começou a girá-lo acima da cabeça.

Mas embora muitas tivessem sido derrubadas desta maneira; as aves eram tão numerosas e tão
bravas que continuaram o ataque tão furiosamente quanto antes. Algumas delas bicavam os olhos
da Coisa, que estava pendurado desamparado acima do ninho, mas os olhos dele eram de vidro e
não podiam ser danificados. Outras gralhas correram para o Cavalete, mas o animal ainda
estando de pernas para cima, escoiceou tão violentamente com suas pernas de madeira que
derrubou tantas quanto o machado do Homem de Lata.

Percebendo-se tão contrariados, os pássaros desceram sobre as palhas do Espantalho, que


estavam no centro do ninho cobrindo Tip, o Besourão e a cabeça de abóbora de Jack, e voavam
com elas para longe, palha por palha e soltavam no longo abismo abaixo.

A cabeça do Espantalho, percebendo espantando esta destruição que faziam do seu recheio,
gritou pelo Homem de Lata para que o salva-se; e o bom amigo respondeu com energia
redobrada. O machado brilhava intensamente entre as Gralhas, e felizmente a Coisa começou a
agitar freneticamente suas asas restantes do lado esquerdo do corpo. A vibração destas asas
encheu as Gralhas de pavor, e quando a Coisa, por seu próprio esforço, soltou da ponta de rocha
que o prendia e despencou debatendo-se dentro do ninho, a gritaria das Gralhas foi enorme, e
elas fugiram voando sobre as montanhas.

Quando a última delas tinha desaparecido, Tip rastejou por baixo do sofá e ajudou o Besourão a
segui-lo.

“Estamos salvos!” exclamou o menino cheio de alegria.

“Nós estamos mesmo!” respondeu o Educado inseto, abraçando a cabeça dura de veado em sua
alegria. “E devemos tudo isso ao agito da Coisa e ao bom machado do Homem de Lata!”

“Se eu estou salvo, tirem-me daqui!” gritou Jack, cuja cabeça ainda estava por baixo dos sofás; e
Tip rolou a cabeça fora do buraco e a colocou sobre o pescoço de Jack outra vez. Ele também
levantou o Cavalete e lhe disse: “Lhe devemos muitos agradecimentos pela bonita luta que você
teve.”

“Eu realmente acho que nós escapamos muito bem” falou o Homem de Lata em tom de orgulho.

“Nem tanto!” exclamou uma voz oculta.

Todos se viraram surpresos para ver a cabeça do Espantalho, que estava caída no fundo do
ninho.
“Estou completamente arruinado!” declarou o Espantalho, ao perceber algo. “Onde está a palha
que preenchia meu corpo?”

A pergunta assustou a todos. Eles procuraram ao redor do ninho com horror, pois nenhum
vestígio de palha havia sobrado. As Gralhas tinham jogado até o último fiapo no abismo que se
abria abaixo deles.

“Meu pobre amigo!” disse o Homem de Lata, pegando a cabeça do Espantalho e a carregando
com carinho; “quem poderia imaginar que você teria este fim repentino?”

“Eu fiz para salvar meus amigos” respondeu a cabeça; “e estou contente por morrer de forma tão
nobre e heroica.”

“Mas porque vocês estão tão desapontados?” perguntou o Besourão. “As roupas do Espantalho
ainda estão a salvo.”

“Sim” respondeu o Homem de Lata; “Mas as roupas do nosso amigo não servem para nada sem
ter o preenchimento.”

“Porque não as enchemos com dinheiro?” perguntou Tip.

“Dinheiro!” disseram todos ao mesmo tempo.

“Com certeza” disse o menino. “No fundo do ninho tem milhões de notas de dólar. – de um, de
dois, de cinco, de dez, de vinte e de cinquenta dólares. Tem o suficiente para encher dúzias de
Espantalhos. Porque não usamos o dinheiro?”

O Homem de Lata começou a revirar o lixo do ninho com o cabo do seu machado; e, com certeza,
o que eles tinham primeiramente achado que eram apenas papéis sem valor, eram na verdade
todos os tipos de notas de dinheiro, que as Gralhas perversas tinham roubado por anos nas vilas
e cidades que visitavam.

Havia uma imensa fortuna ali jogada naquele ninho inacessível; e a sugestão de Tip foi, com o
consentimento do Espantalho, rapidamente colocada em prática.

Eles selecionaram todas as notas mais limpas e novas e as juntaram em vários montes. A perna
esquerda do Espantalho foi estufada com notas de cinco dólares; sua perna direita, com notas de
dez dólares, e o corpo foi muito bem preenchido com notas de cinquenta, cem e mil dólares, que
mal dava pra fechar bem o seu casaco com conforto.

“Agora você é” disse o Besourão impressionado, quando o trabalho terminou, “o mais valioso
membro de nosso grupo; e como você está entre amigos fiéis, há pouco perigo de ficar gasto.”

“Obrigado” respondeu o Espantalho maravilhado. “Me sinto como um novo homem; e mesmo que
de primeira eu possa ser confundido com um cofre, peço que se lembrem que meu cérebro ainda
é feito do mesmo antigo material. E é esta possessão que faz de mim uma pessoa necessária em
casos de emergência.”

“Bem, aqui temos uma emergência” observou Tip; “e se o seu cérebro não nos ajudar a sair
daqui, teremos que viver o resto da vida neste ninho.”
“Que tal aquelas pílulas do desejo?” perguntou o Espantalho tirando a latinha do bolso de sua
jaqueta. “Não podemos usar para escapar?”

“Não, a menos que possamos contar até dezessete de dois em dois” respondeu o Homem de
Lata.

“Mas nosso amigo Besourão afirma ser completamente educado, então ele deve facilmente
descobrir como isso pode ser feito.”

“Não é uma questão de educação” respondeu o inseto; “é meramente uma questão matemática.
Eu já vi o professor fazer muitos tipos de contas no quadro, e ele afirmou que nada pode ser feito
com X e Y e A, e outras coisas, misturando-as com muitas somas e subtrações e igualdades, e
assim por diante. Mas ele nunca disse nada, não que eu me lembre, sobre a contagem até o
número ímpar dezessete, de dois em dois.”

“Pare! Pare!” gritou o Cabeça-de-Abóbora. “Você está fazendo minha cabeça doer.”

“E a minha também” acrescentou o Espantalho. “Sua matemática me parece como um pote de


picles mistos, que quanto mais você tenta pegar algo, menos chance você tem de conseguir. E eu
tenho certeza de que, se a coisa pode ser feita de algum modo, é de uma maneira bem simples.”

“Sim” disse Tip. “a velha Mombi não poderia usar X e subtrações, pois ela nunca foi à escola.”

“Porque não começar contando da metade de um?” perguntou o Cavalete, de repente. “Então se
pode contar até dezessete de dois em dois com muita facilidade.”

Eles olharam uns aos outros muito surpresos, pois o Cavalete era considerado o mais estúpido do
grupo.

“Você me faz ter vergonha de mim mesmo,” disse o Espantalho, curvando-se para o Cavalete.

“Apesar de tudo, a criatura está certa,” declarou o Besourão; “pois uma metade duas vezes é um,
e se você consegue chegar até um, que é fácil de contar, então consegue chegar até dezessete,
de dois em dois.”

“Me pergunto porque não pensei nisto eu mesmo.” Disse o Cabeça-de-Abóbora.

“Não sei” respondeu o Espantalho. “Você não é mais sábio que o restante de nós, é? Mas vamos
logo fazer o desejo. Quem irá engolir a primeira pílula?”

“Suponho que você deva fazer isso” sugeriu Tip.

“Eu não posso” disse o Espantalho.

“Por que não? Você tem uma boca, não tem?” perguntou o menino.

“Sim; mas minha boca é pintada, não tenho como engolir com ela.” Respondeu o Espantalho. “De
fato” ele continuou, olhando de um para outro “acredito que o menino e o Besourão são os únicos
de nosso grupo que podem engolir.”

Percebendo esta verdade, Tip disse:

“Então, eu irei fazer o primeiro desejo. Me dê uma das pílulas prateadas.”


Isto o Espantalho tentou fazer; mas suas luvas acolchoadas eram muito desajeitadas para segurar
um objeto tão pequeno, e ele apenas segurou a latinha enquanto o menino escolhia uma das
pílulas e engolia.

“Conte!” gritou o Espantalho.

“Uma metade, um, três, cinco, sete, nove, onze,” contava Tip “treze, quinze, dezessete.”

“Agora deseje!” disse o Homem de Lata ansioso.

Mas em seguida o menino começou a sentir dores terríveis e ficou alarmado.

“A pílula me envenenou!” ele tossia “Oh! O-o-o-o! Argh! Morte! Fogo! Ohh!” e então ele rolou pelo
fundo do ninho em contorções que assustou a todos.

“O que podemos fazer por você? Diga, eu imploro!” suplicava o Homem de Lata, com lágrimas de
compaixão rolando por suas bochechas de lata.

“Eu – Eu não sei!” respondeu Tip, “Oh-Ooh! Queria nunca ter engolido esta pílula!”

Então repentinamente a dor parou, e o menino ficou de pé novamente e encontrou o Espantalho


olhando surpreso para dentro da latinha de pimenta.

“O que aconteceu?” perguntou o menino, um pouco envergonhado por sua exibição recente.

“Por que as três pílulas estão na caixa novamente?!?” disse o Espantalho.

“Claro que estão” declarou o Besourão. “Tip não desejou que nunca tivesse engolido uma delas?
Então é claro que as três estão na caixa.”

“Pode ser; mas a pílula me deu uma dor terrível mesmo.” Disse o menino.

“Impossível!” declarou o Besourão. “Se você nunca engoliu a pílula, ela não pode ter lhe dado
uma dor. E como seu desejo se realizou, isso prova que você não engoliu a pílula, e isso prova
também que você não sentiu dor.”

“Então foi uma ótima imitação de uma dor” respondeu Tip com raiva.

“Acredito que você mesmo deva tentar a próxima pílula. Já perdemos um desejo.”

“Ah, não perdemos mesmo!” protestou o Espantalho. “Aqui ainda estão as três pílulas na latinha, e
cada pílula concede um desejo.”

“Agora vocês estão fazendo a minha cabeça doer” disse Tip. “Eu não posso entender tudo isso.
Mas eu não vou tomar outra pílula, eu lhe garanto!” e com isto ele se retirou para um canto do
ninho.

“Bem” disse o Besourão, “sobrou para mim salvar-nos do modo mais Enormemente Crescido e
Completamente Educado possível; pois vejo que sou o único capaz e disposto a fazer um pedido.
Me passem uma destas pílulas.”

Ele engoliu sem hesitação, e todos ficaram admirando sua coragem enquanto o Inseto contava de
dois em dois até dezessete, do mesmo modo que Tip tinha feito. E por alguma razão – talvez
porque os Besourões tem estômagos mais fortes que os meninos – a pílula prateada não lhe
causou nenhuma dor.

“Eu desejo que as asas quebradas da Coisa fiquem tão boas quanto antes!” disse o Besourão,
numa voz calma e grave.

Todos se viraram para olhar para a Coisa, e o desejo se realizou tão rápido, que ele já estava
diante deles perfeitamente consertado, e tão pronto para voar quanto quando foi trazido à vida no
teto do palácio.
20
O Espantalho Recorre a Glinda, a Bondosa

“Viva!” gritou o Espantalho alegremente. “Agora podemos deixar este ninho de Gralhas quando
quisermos.”

“Mas está quase escurecendo” disse o Homem de Lata; “é melhor esperarmos que amanheça, ou
então podemos ter problemas voando novamente. Eu não gosto de viagens noturnas, pois nunca
sabemos o que pode acontecer.”

Então eles resolveram esperar até que o sol nascesse, e se distraíram procurando coisas de valor
no ninho das Gralhas.

O Besourão encontrou dois bonitos braceletes de ouro trabalhado, que couberam muito bem em
seus braços esguios. O Espantalho pegou um monte de anéis, pois havia muitos no ninho. Em
pouco tempo ele tinha colocado um anel em cada dedo de suas luvas acolchoadas, e não
contente com esta exibição, acrescentou mais um em cada dedo. Ele escolheu cuidadosamente
os anéis que tinham pedras brilhantes, como rubis, ametistas e safiras, e as mãos do Espantalho
mostravam uma aparência deslumbrante.

“Este ninho seria um piquenique para a rainha Jinjur” disse ele pensativo “pois pelo que sei, ela e
suas meninas conquistaram a cidade apenas para roubar minhas esmeraldas.”

O Homem de Lata estava contente com seu colar de diamantes e recusou a aceitar qualquer
decoração a mais; mas Tip conseguiu para si um fino relógio de ouro que estava preso com uma
grossa corrente, e o colocou em seu bolso com muito orgulho. Ele também prendeu muitos
broches de joias no colete de Jack Cabeça-de-Abóbora, e pendurou um pequeno binóculo de
teatro no pescoço do Cavalete.

“É muito bonito” disse a criatura exibindo o binóculo com aprovação; “mas para que serve?”

No entanto, nenhum deles soube responder esta pergunta, mas o Cavalete decidiu que aquilo era
alguma decoração rara e se apaixonou pelo objeto.

Ninguém do grupo foi esquecido, e eles terminaram colocando anéis muito grandes nas pontas do
chifre do veado, no entanto este personagem estranho não parecesse apreciar muito este tipo de
atenção.

A escuridão logo chegou sobre eles, e Tip e o Besourão foram dormir enquanto os outros se
sentaram para esperar pacientemente pelo amanhecer.

Na manhã seguinte eles tiveram mais um motivo de felicidade por terem consertado a Coisa; pois
com a vinda da luz do dia, uma grande nuvem de Gralhas se aproximou para tentar mais uma
batalha pela posse do ninho.

Mas nossos aventureiros não quiseram esperar pelo ataque. Eles pularam para dentro dos
assentos acolchoados dos sofás o mais rápido possível, e Tip mandou a Coisa começar a voar.
Imediatamente ele subiu no ar, as grandes asas batendo fortemente com movimentos regulares, e
em poucos instantes eles estavam longe do ninho, que as Gralhas barulhentas logo tomaram
posse, sem tentar persegui-los.

A Coisa voou para o Norte, indo na mesma direção por onde tinham vindo. Ao menos essa foi a
opinião do Espantalho, e os outros concordaram que ele era o melhor em julgar as direções.
Depois de passarem por muitas cidades e vilas, a Coisa os levou sobre uma larga planície, onde
as casas se tornaram cada vez mais raras, até sumirem por completo. Em seguida veio o grande
e arenoso deserto, que separa a Terra de Oz do restante do mundo, e antes do meio dia eles
viram as casas com o teto em forma de cúpula, que provava que eles estavam novamente dentro
dos limites de sua terra natal.

“Mas as casas e cercas são azuis,” disse o Homem de Lata “e isto indica que nós estamos na
terra dos Munchkins, e portanto, muito longe de Glinda a Bondosa.

“O que devemos fazer?” perguntou o menino, dirigindo-se ao seu guia.

“Eu não sei” respondeu o Espantalho com sinceridade. “Se estivéssemos na Cidade das
Esmeraldas nós poderíamos seguir diretamente para o Sul, e então chegar ao nosso destino. Mas
não nos atrevemos a ir para a Cidade das Esmeraldas, e a Coisa está provavelmente nos levando
na direção errada a cada batida de suas asas.”

“Então o Besourão deve tomar outra pílula” disse Tip decididamente, “e desejar que sigamos na
direção certa.”

“Muito bem” respondeu o Enormemente Crescido; “estou disposto”.

Mas quando o Espantalho procurou no bolso, pela latinha de pimenta que continha as duas
Pílulas do Desejo que restavam, ela não foi encontrada.

Cheios de ansiedade os viajantes procuraram em cada centímetro da Coisa pela preciosa latinha,
mas ela havia desaparecido completamente.

E o animal continuava voando em frente, levando-os para onde eles não sabiam. “Eu devo ter
deixado a latinha de pimenta no ninho das Gralhas” disse o Espantalho por fim.

“É um grande desastre” declarou o Homem de Lata. “Mas não estamos pior do que antes de
descobrir as Pílulas do Desejo.”

“Nós estamos numa situação melhor” respondeu Tip “porque uma pílula nos permitiu escapar
daquele ninho horrível.”

“E a perda das outras duas é algo sério, e eu desejo uma boa bronca pelo meu descuido.” Disse o
Espantalho se recriminando. “Pois num grupo tão incomum como este, os acidentes são passíveis
de acontecer a qualquer momento, e até mesmo agora podemos estar nos aproximando de um
novo perigo.”

Ninguém ousou contradizer isso, a um silêncio sóbrio caiu sobre eles.

A Coisa continuou voando sempre em frente.


De repente Tip soltou uma exclamação de surpresa. “Devemos ter chegado ao País do Sul” ele
disse “pois abaixo de nós tudo é vermelho!”

Imediatamente todos eles subiram sobre as costas dos sofás para olhar – todos exceto Jack, que
era muito cuidadoso com sua cabeça de abóbora para arriscar que ela escorregasse fora do
pescoço. Era mesmo verdade; as casas vermelhas e cercas e árvores indicavam que eles
estavam dentro dos domínios de Glinda a Bondosa; e conforme eles iam voando sempre em
frente, o Homem de Lata pôde reconhecer as estradas e edifícios pelos quais já havia passado, e
alterou um pouco o rumo da Coisa, para que eles pudessem chegar ao palácio da famosa
Feiticeira.

“Bom!” exclamou o Espantalho com alegria. “Não precisamos das Pílulas do Desejo perdidas
agora, pois chegamos ao nosso destino.”

Gradualmente a Coisa foi descendo mais e mais baixo, próximo do chão, até que parou nos belos
jardins de Glinda, pousando sobre o gramado aveludado e verde, próximo de uma fonte que
jorrava brilhantes para o alto, ao invés de água, elas caíam com um tilintar suave na base cavada
em mármore.

Tudo era muito deslumbrante nos jardins de Glinda, e enquanto nossos viajantes espiavam com
olhos de admiração, uma companhia de soldados apareceu silenciosamente e os cercou. Mas
estes soldados da grande Feiticeira eram totalmente diferentes daqueles do Exército da Revolta
de Jinjur, embora também houvesse garotas. Pois os soldados de Glinda usavam belos uniformes
e espadas afiadas; e eles marchavam com uma habilidade e precisão que mostrava que eles
eram bem treinados nas artes da guerra.

O Capitão que comandava esta tropa (e que era guarda-costas pessoal de Glinda) reconheceu o
Espantalho e o Homem de Lata de outros tempos, e os cumprimentou com respeitáveis
saudações.

“Bom dia!” disse o Espantalho, tirando o chapéu elegantemente, enquanto o Homem de Lata fazia
uma continência militar. “Nós viemos para requisitar uma audiência com sua bondosa
governanta.”

“Glinda está agora em seu palácio esperando por vocês” respondeu o Capitão; “Pois ela viu
vocês chegando muito antes de terem chegado”.

“Isto é estranho!” disse Tip maravilhado.

“Nem tanto” respondeu o Espantalho, “pois Glinda a Bondosa é uma poderosa Feiticeira, e nada
que acontece na Terra de Oz lhe passa despercebido. Eu suponho que ela sabe o motivo de
termos vindo tão bem quanto nós mesmos.”

“Então porque foi necessário que viéssemos?” perguntou Jack de modo bobo.

“Para provar que você é um Cabeça-de-Abóbora!” respondeu o Espantalho. “Mas se a Feiticeira


nos espera, não devemos deixa-la esperando.”

Então eles desceram dos sofás e seguiram o Capitão em direção do palácio – com o Cavalete os
acompanhando nesta estranha procissão.
Em seu trono de ouro finamente trabalhado, estava Glinda e ela mal pôde conter um sorriso
quando seus curiosos visitantes entraram e se curvaram diante dela. O Espantalho e o Homem de
Lata ela já conhecia e amava; mas o estranho Cabeça-de-Abóbora e o Enormemente Crescido
Besourão eram criaturas que ela nunca tinha visto antes, e eles se mostravam tão curiosos quanto
os outros. Quanto ao Cavalete, ele parecia ser nada mais que um tronco de madeira animado; e
ele se curvou tanto que sua cabeça bateu contra o chão, causando uma onda de riso entre os
soldados, na qual Glinda francamente se juntou.

“Eu venho anunciar à sua gloriosa majestade” começou o Espantalho, em uma voz solene “que
minha Cidade das Esmeraldas foi invadida por uma multidão de meninas insolentes armadas com
agulhas de tricô, que escravizaram todos os homens, roubaram as esmeraldas de todas as ruas e
edifícios públicos, e usurparam meu trono.”

“Sei disto” disse Glinda

“Elas também tentaram me destruir, assim como aos meus bons amigos e aliados que estão aqui
diante de você” continuou o Espantalho “e se não tivéssemos conseguido escapar de suas garras,
nossos dias já teriam a muito terminado.”

“Sei disto” repetiu Glinda.

“Portanto eu vim para implorar sua ajuda” resumiu o Espantalho, “pois acredito que você está
sempre disposta a ajudar os desafortunados e oprimidos.”

“Isto é verdade” respondeu a Feiticeira, falando devagar. “Mas a Cidade das Esmeraldas agora
está sendo governada pela General Jinjur, que se auto proclamou Rainha. Por que eu deveria me
opor a ela?”

“Por que ela roubou o trono de mim” disse o Espantalho.

“E como você passou a possuir o trono?” perguntou Glinda

“Eu ganhei do Mágico de Oz, e através da escolha do povo” respondeu o Espantalho, inquieto
com esse questionamento.

“E onde o Mágico o obteve?” ela continuou gravemente.

“Ouvi dizer que ele tomou de Pastória, o ex-rei” disse o Espantalho, ficando confuso diante do
olhar atento da Feiticeira.

“Então” declarou Glinda, “o trono da Cidade das Esmeraldas não pertence a você nem a Jinjur,
mas a Pastória, de quem o Mágico usurpou.”

“É verdade” concordou o Espantalho humildemente; “mas Pastória está morto e enterrado agora,
e alguém deve governar em seu lugar.”

“Pastória tinha uma filha, que é herdeira de direito do trono da Cidade das Esmeraldas. Você
sabia disto?” perguntou a Feiticeira.

“Não” respondeu o Espantalho. “Mas, se a garota ainda está viva eu não ficarei em seu caminho.
Isto me satisfaria tão bem quanto tirar fora Jinjir como impostora e reobter o trono eu mesmo. De
fato não é muito divertido ser Rei, especialmente se você tem bons miolos. Acho a algum tempo
que eu deveria ocupar uma posição mais exaltada. Mas onde está a garota a quem pertence o
trono, e qual e o nome dela?

“O nome dela é Ozma” respondeu Glinda. “Mas eu tentei em vão descobrir onde ela está. Pois o
Mágico de Oz, quando tomou o trono do pai de Ozma, escondeu a menina em algum lugar
secreto; por meio de algum truque mágico que eu desconheço ele também a preveniu de ser
descoberta – mesmo para uma Feiticeira experiente como eu.”

“Isto é estranho” interrompeu o Besourão, pomposamente. “Fui informado de que o Maravilhoso


Mágico de Oz não passava de um farsante!”

“Isto é sem sentido!” exclamou o Espantalho, muito provocado por esta declaração. “Ele não me
deu um maravilhoso conjunto de cérebros?”

“Não há farsa quanto ao meu coração” anunciou o Homem de Lata, claramente indignado com o
Besourão.

“Talvez eu esteja desinformado” estremeceu o inseto, voltando atrás, “Eu nunca conheci a pessoa
do Mágico.”

“Bem, nós conhecemos” respondeu o Espantalho, “e ele era um grandioso Mágico, eu lhe
asseguro. É verdade que ele era culpado de algumas pequenas imposturas, mas a menos que ele
fosse um grande Mágico, como – eu pergunto – ele poderia ter escondido a garota Ozma tão
seguramente que ninguém a pudesse encontrar?”

“Eu – Eu tinha esquecido disto!” respondeu o Besourão pacificamente.

“Está foi a coisa mais sensível que você disse” falou o Homem de Lata.

“Eu preciso realmente fazer um outro esforço para descobrir onde a garota está escondida”
resumiu a Feiticeira, pensativa. “Eu tenho em minha biblioteca um livro no qual estão escritas
todas as ações do Mágico enquanto ele estava em nossa terra de Oz – ou, pelo menos, todas as
ações que puderam ser observadas por meus espiões. Este livro eu irei ler cuidadosamente esta
noite, e tentar compreender os atos que possam nos guiar em descobrir a perdida Ozma. Neste
meio tempo, fiquem à vontade em meu palácio e ordenem meus servos como se fossem seus. Eu
irei lhes conceder uma outra reunião amanhã.”

Com estas graciosas palavras Glinda despediu-se dos aventureiros, e eles foram passear pelos
belos jardins onde eles passaram algumas horas desfrutando todas as maravilhosas coisas com
as quais a Rainha das Terras do Sul havia cercado seu palácio real.

Na manhã seguinte eles vieram outra vez diante de Glinda que lhes disse:

“ Eu procurei cuidadosamente nos registros das ações do Mágico, e no meio deles eu pude
encontrar três ações que me pareceram suspeitas. Ele comia feijões com uma faca, fez três
visitas secretas à velha Mombi, e mancava um pouco do pé esquerdo.”

“Oh! Esta última coisa é realmente suspeita!” exclamou o Cabeça-de-Abóbora.

“Não necessariamente” disse o Espantalho. “Ele poderia ter calos. Agora, me parece que comer
feijões com uma faca é muito mais suspeito.”
“Talvez isto seja um costume cultural em Omaha, que é o grande lugar de onde o Mágico veio
originalmente.” Sugeriu o Homem de Lata.

“Pode ser” admitiu o Espantalho.

“Mas porquê” perguntou Glinda “ele fez três visitas à velha Mombi?”

“Ah! Por quê? Realmente!” falou o Besourão bem expressivo.

“Sabemos que o Mágico ensinou à velha muitos de seus truques de mágica” continuou Glinda; “e
ele não teria feito isto se ela não o tivesse ajudado de algum modo. Então nós devemos suspeitar,
com boas razões, que Mombi o ajudou a esconder a garota Ozma, que era a real herdeira do
trono da Cidade das Esmeraldas, e um constante perigo em usurpar. Pois, se o povo soubesse
que ela estava viva, eles iriam rapidamente fazer dela Rainha e restaurá-la ao seu lugar de direito.

“Um ótimo argumento!” exclamou o Espantalho. “Não tenho dúvida de que Mombi está metida
neste negócio perverso. Mas como poderia este conhecimento nos ajudar?”

“Devemos encontrar Mombi” respondeu Glinda “e força-la a nos contar onde a garota está
escondida.”

“Mombi está agora com a Rainha Jinjur, na Cidade das Esmeraldas” disse Tip. “Foi ela quem
colocou tantos obstáculos em nosso caminho, e fez Jinjur tentar destruir meus amigos e me fazer
voltar para a velha bruxa.”

“Então” decidiu Glinda, “eu irei marchar com meu exército para a Cidade das Esmeraldas, e
aprisionar Mombi. Depois nós poderemos, talvez, força-la a nos contar a verdade sobre Ozma.

Ela é uma velha terrível!” lembrou Tip, lembrando da chaleira preta de Mombi “e obstinada
também”.

“Também sou obstinada” respondeu a Feiticeira, com um sorriso doce. “então não temo Mombi no
fim das contas. Hoje faremos todos os preparativos necessários e marcharemos para a Cidade
das Esmeraldas amanhã pela manhã.”
21
O Homem de Lata colhe uma Rosa

O Exército de Glinda a Bondosa parecia muito grande e imponente quando se reuniu ao nascer do
dia diante dos portões do palácio. Os uniformes das garotas-soldado eram bonitos e de cores
alegres, e suas lanças com pontas prateadas eram brilhantes e cintilantes, as longas hastes
sendo incrustradas com pérolas. Todos os oficiais tinham espadas afiadas e escudos enfeitados
com penas de pavão; e realmente parecia que nenhum inimigo teria qualquer chance de se
defender de um exército tão brilhante.

A Feiticeira subiu em um belo palanquin que parecia uma carruagem, com portas e janelas com
cortinas de seda; mas invés de rodas, como uma carruagem teria, o palanquin repousava sobre
duas longas barras horizontais que eram carregadas por doze funcionários.

O Espantalho e seus companheiros decidiram viajar na Coisa, a fim de poder acompanhar a


marcha rápida do exército; então, assim que Glinda deu a ordem e seus soldados começaram a
marchar ao som da música inspiradora tocada pela banda real, nossos amigos subiram nos sofás
e seguiram. A Coisa voou lentamente ficando num ponto diretamente sobre o palanquin em que
estava a Feiticeira.

“Tenha cuidado” disse o Homem de Lata ao Espantalho, que estava muito inclinado para olhar
para o exército lá embaixo. “Você pode cair.”

“Isso não importa” respondeu o educado Besourão. “Ele não pode ficar ‘quebrado’ pois está
estufado de dinheiro.”

“Eu pedi que você não começasse” disse Tip em tom de reprovação.

“Sim, você fez!” disse o Besourão prontamente. “ E eu imploro seu perdão. Eu realmente vou
tentar me conter.”

“É melhor mesmo” disse o menino “se quiser continuar em nossa companhia.”

“Oh, eu não poderia suportar me separar de vocês agora” murmurou o Inseto, arrependido; então
Tip deixou o assunto de lado.

O exército se movia constantemente, mas a noite chegou antes que eles chegassem aos
muros da Cidade das Esmeraldas. No entanto, na pouca luminosidade da lua nova, as forças de
Glinda silenciosamente cercaram a cidade e armaram suas tendas de seda vermelha sobre o
gramado. A tenda da Feiticeira era maior que as outras e era feita de pura seda branca, com
bandeiras vermelhas tremulando sobre ela. Uma tenda também foi armada para o grupo do
Espantalho; e quando estas coisas foram preparadas com rapidez e precisão militares, o exército
se retirou para descansar.

Foi grande o espanto da Rainha Jinjur na manhã seguinte, quando seus soldados vieram correndo
para informa-la do vasto exército em torno deles. Ela subiu para uma alta torre do palácio real e
viu as bandeiras tremulando em todas as direções e a grandiosa tenda branca de Glinda colocada
diretamente diante dos portões.
“Com certeza estamos perdidos!” gemeu Jinjur em desespero “pois como poderiam nossas
agulhas de tricô ter chance contra estas longas lanças e espadas de nossos inimigos?”

“A melhor coisa que podemos fazer” disse uma das meninas “é se render o mais rápido possível,
antes que nos machuquem.”

“Ainda não” respondeu Jinjur mais corajosamente. “O inimigo ainda está fora de nossos muros,
então podemos tentar ganhar tempo criando uma negociação. Vá com uma bandeira de trégua
até Glinda e pergunte a ela porque ela se atreveu a invadir meus domínios e quais são as
exigências dela.”

Então a garota passou pelos portões carregando uma bandeira branca para mostrar que estava
em uma missão de paz, e veio até a tenda de Glinda. “Diga à sua Rainha”, disse a Feiticeira para
a menina “que ela deve entregar a velha Mombi para ser minha prisioneira. Se isto for feito eu não
irei mais incomodá-la.”

Quando esta mensagem foi entregue, Jinjur ficou muito preocupada, pois Mombi era sua
conselheira-chefe e Jinjur tinha um medo terrível da velha bruxa. Mas ela pediu que dissessem a
Mombi a mensagem de glinda.

“Eu vejo problemas para todos nós” murmurou a velha bruxa, depois de ter olhado em um espelho
mágico que trazia em sua bolsa. “Mas ainda podemos escapar se enganarmos esta Feiticeira, ela
se acha muito inteligente.”

“Você não acha que seria mais seguro para mim entregar você para ela?” perguntou Jinjur
nervosamente.

“Se fizer assim, irá perder o trono da Cidade das Esmeraldas!” respondeu a bruxa
categoricamente. “Mas se você me deixar fazer do meu jeito, eu posso salvar nós duas
facilmente,”

“Então faça como deseja” respondeu Jinjur, “pois é tão chique ser uma Rainha que eu não quero
ser obrigada a voltar para casa novamente, para forrar camas e lavar pratos para minha mãe.”

Então Mombi chamou Jellia Jamb para perto dela, e fez um certo ritual mágico com o qual estava
familiarizada. Como resultado do encantamento, Jellia adquiriu a forma e aparência de Mombi,
enquanto a velha bruxa tomou a aparência da menina de modo tão perfeito que seria impossível
descobrir o engano.

“Agora” disse a velha Mombi para a Rainha “faça seus soldados entregarem esta garota para
Glinda. Ela irá pensar que é a verdadeira Mombi que conseguiu prender, e voltará imediatamente
para sua própria cidade no Sul.”

E Jellia, mancando como uma mulher idosa, foi levada pelos portões da cidade e colocada diante
de Glinda.

“Aqui está a pessoa que você exigiu” disse uma das meninas-soldado “e nossa Rainha agora
implora que você vá embora como prometeu, e nos deixe em paz.”
“É o que eu irei fazer com certeza” respondeu Glinda satisfeita; “se esta for realmente a pessoa
que aparenta ser.”

“Esta é com certeza a velha Mombi” disse o guarda, que acreditava que ela estava falando a
verdade; e então as meninas-soldado de Jinjur entraram novamente pelos portões da cidade.

A Feiticeira logo convocou o Espantalho e seus amigos para a sua tenda, e começou a questionar
a suposta Mombi sobre a menina perdida Ozma. Mas Jellia não sabia nada sobre este assunto, e
ficou tão nervosa com esta situação que não aguentou mais e começou a chorar, para grande
espanto de Glinda.

“Aqui estão alguns truques tolos!” disse a Feiticeira, com os olhos faiscando de raiva. “Esta não é
Mombi, mas alguma outra pessoa que foi enfeitiçada para parecer-se com ela! Diga-me” ela
exigiu, voltando-se para a garota que tremia “qual o seu nome?”

Isto Jellia não se atrevia a dizer, pois foi ameaçada de morte pela bruxa se confessasse a fraude.
Mas Glinda, doce e justa como era, entendia magia melhor do que qualquer pessoa na Terra de
Oz. Então, pronunciando algumas palavras poderosas e fazendo alguns gestos, rapidamente fez a
menina voltar à sua forma original, enquanto ao mesmo tempo a velha Mombi, lá no palácio de
Jinjur, de repente voltou à sua forma antiga, de características malignas.

“Oh, mas esta é Jellia Jamb!” gemeu o Espantalho, reconhecendo-a como uma antiga amiga.

“É a nossa intérprete!” disse o Cabeça-de-Abóbora, sorrindo com prazer.

Então Jellia foi forçada a contar o truque que Mombi tinha planejado e implorou pela proteção de
Glinda, que a Feiticeira prontamente assegurou. Mas Glinda estava realmente zangada, e mandou
dizer a Jinjur que a fraude havia sido descoberta e que ela deveria entregar a verdadeira Mombi
ou sofrer terríveis consequências. Jinjur estava preparada para esta mensagem, como a bruxa
bem sabia, que quando a forma natural dela voltou, Glinda havia descoberto o truque. Mas a
maldosa velha criatura tinha preparado uma nova investida e tinha feito Jinjur prometer colaborar.
Então Jinjur disse ao mensageiro de Glinda:

“Diga a sua senhora que eu não pude encontrar Mombi em lugar nenhum, mas que Glinda é bem
vinda para entrar na cidade e procurar ela mesma a velha mulher. Ela também pode trazer seus
amigos junto com ela se for de seu agrado; mas se ela não encontrar Mombi até o por-do-sol, a
Feiticeira deve prometer ir embora pacificamente não nos incomodar mais.”

Glinda concordou com esses termos, por saber que Mombi estava em algum lugar dentro dos
muros da cidade. Então Jinjur fez com que os portões fossem abertos, e Glinda se dirigiu para
dentro seguida por sua companhia de soldados, acompanhados pelo Espantalho e o Homem de
Lata, enquanto Jack Cabeça-de-Abóbora montou no Cavalete e o Educado e Enormemente
Crescido Besourão desfilava atrás de modo elegante. Tip caminhava ao lado da Feiticeira, pois
Glinda tinha adquirido muito gosto pelo menino.

É claro que Mombi não tinha intenção de ser encontrada por Glinda; então, enquanto seus
inimigos estavam marchando pela rua, a bruxa transformou-se em uma rosa vermelha, crescendo
sobre uma moita no jardim do palácio. Era uma ótima ideia, e um truque do qual Glinda não
suspeitaria; e assim várias horas preciosas foram gastas em vão procurando por Mombi.
Quando o por-do-sol se aproximou a Feiticeira percebeu que havia sido derrotada pela astúcia
superior da bruxa velha; então ela deu ordens ao seu povo para marchar para fora dos portões da
cidade e voltar para suas tendas.

O Espantalho e seus companheiros estavam procurando no jardim do palácio naquele momento,


e eles se voltaram desapontados ao comando de Glinda. Mas antes que eles deixassem o jardim,
o Homem de Lata, que gostava de flores, percebeu uma grande rosa que crescia sobre um
arbusto; então ele colheu a flor e a prendeu seguramente em um buraco no peitoral de sua lataria.

Enquanto estava prendendo ouviu um pequeno gemido proveniente da rosa, mas ele não prestou
atenção ao som, e Mombi foi então carregada para fora da cidade ao acampamento de Glinda,
sem que ninguém suspeitasse o que lhe tinha acontecido na busca.
22
A Transformação da Velha Mombi

A Bruxa primeiro ficou com medo, por ter sido capturada pelo inimigo; mas logo ela decidiu que
estava perfeitamente salva no peitoral do Homem de Lata como quando estava crescendo sobre a
moita. Pois ninguém sabia que a rosa e Mombi eram a mesma coisa, e agora que ela estava sem
a proteção da Cidade, suas chances de escapar completamente de Glinda eram muito
improváveis.

“Mas não há pressa” pensou Mombi. “Eu vou esperar um pouco e desfrutar a humilhação desta
Feiticeira quando ela descobrir que eu a enganei.” Então durante toda a noite a rosa esteve
quieta no peito do Homem de Lata, e ao amanhecer, quando Glinda reuniu seus amigos para um
conselho, Nick Lenhador levou sua bela flor com ele para a tenda branca de seda.

“Por algum motivo” disse Glinda, “Nós falhamos em encontrar esta astuta velha Mombi; então,
temo que nossa expedição tenha sido um fracasso. E por isso eu sinto muito, porque sem nossa
ajuda a pequena Ozma jamais será resgatada e restaurada a seu lugar de direito como Rainha da
Cidade das Esmeraldas.”

“Não devemos desistir tão facilmente” disse o Cabeça-de-Abóbora. “Devemos fazer alguma outra
coisa.”

“Alguma outra coisa realmente precisa ser feita” respondeu Glinda, com um sorriso. “Ainda não
consigo entender como eu fui enganada tão facilmente por uma Bruxa velha que sabe bem menos
de magia do que eu.”

“Enquanto estamos por baixo acredito que seria sensato agora conquistar a Cidade das
Esmeraldas para a Princesa Ozma, e encontrar a menina depois,” disse o Espantalho. “E
enquanto a menina permanece escondida eu irei governar grandemente em seu lugar, pois
entendo dos assuntos de governo muito melhor do que Jinjur.”

“Acho que vocês todos devem voltar comigo ao meu reino – ou melhor - império.” Disse o
Homem de Lata, educadamente incluindo todo o grupo ao acenar com o braço. “Me daria grande
prazer recebe-los em meu castelo, onde tem espaço suficiente e de sobra. E se algum de vocês
quiser ser polido e lustrado, meu valete fará isto livre de qualquer despesa.

Enquanto o Lenhador falava, os olhos de Glinda perceberam a rosa em seu peitoral, e agora ela
imaginou ter visto as grandes pétalas vermelhas tremerem ligeiramente. Isto rapidamente lhe
despertou suspeitas, e num instante a Feiticeira tinha entendido que aquela rosa era nada mais do
que uma transformação da velha Mombi. No mesmo instante Mombi soube que ela tinha sido
descoberta e deveria rapidamente bolar um jeito de escapar, e como transformar-se era fácil para
ela, ela rapidamente assumiu a forma de uma Sombra e deslizou pela parede da tenda dirigindo-
se à entrada, pensando assim em desaparecer.
Mas Glinda era muito esperta e muito mais experiente que a Bruxa. Então a Feiticeira bloqueou a
abertura da tenda antes da Sombra, e com um aceno de sua mão, fechou a entrada tão
seguramente que Mombi não conseguiu encontrar sequer uma rachadura por onde escapar. O
Espantalho e seus amigos ficaram muito surpresos com esta ação de Glinda; pois nenhum deles
tinha percebido a Sombra. Mas a Feiticeira lhes disse: “Permaneçam totalmente quietos, todos
vocês! Pois a velha Bruxa está exatamente agora conosco nesta tenda, e eu desejo captura-la.”

Estas palavras alarmaram tanto Mombi que ela rapidamente mudou de sombra para uma
Formiguinha Preta, e ela andou pelo chão, buscando uma brecha ou buraco pelo qual pudesse
passar seu pequeno corpo.

Por sorte o chão da tenda era duro e liso, por ser exatamente diante dos portões da cidade, e
enquanto a formiga procurava, Glinda descobriu isso e rapidamente correu para captura-la. Mas
quando sua mão ia descendo sobre ela, a bruxa agora bastante frenética de medo, fez sua última
transformação, e na forma de um enorme Grifo rasgou as paredes de seda da tenda e a jogou
longe tão veloz quanto um redemoinho.

Glinda não perdeu tempo em segui-la. Ela montou sobre as costas do Cavalete e comandou:

“Agora você vai provar que você tem o direito de estar vivo! Corra – Corra – Corra!”

O Cavalete correu. Ele seguiu veloz como um relâmpago perseguindo o Grifo, suas pernas de
madeira se movendo tão rápido que pareciam brilhar como os raios de uma estrela. E antes que
nossos amigos tivessem se recobrado do susto, o Grifo e o Cavalete já estavam fora de vista.

“Vamos! Vamos segui-los!” gritou o Espantalho.

Eles correram para o lugar onde estava a Coisa, e rapidamente pularam para dentro.

“Voe!” comandou Tip nervosamente.

“Para onde?” perguntou a Coisa, numa voz calma.

“Eu não sei” respondeu Tip, que estava muito nervoso com o atraso; “mas se você subir no ar,
acho que poderemos descobrir para qual caminho Glinda foi.”

“Muito bem” respondeu o veado calmamente, e bateu suas longas asas e subiu alto no ar.

Longe dali, no meio dos campos, ele podiam agora ver dois pequenos pontos seguindo um após o
outro; e eles sabiam que aqueles pontos deveriam ser o Grifo e o Cavalete. Então Tip chamou a
atenção da Coisa para eles e para tentarem ultrapassar a Bruxa e a Feiticeira. Mas quanto mais
rápido era o voo da Coisa, mais rápido ainda eram os movimentos do perseguidor e do
perseguido, e em poucos momentos eles passaram o horizonte.

“Vamos continuar perseguindo de qualquer modo” disse o Espantalho. “Pois a Terra de Oz tem
pouco extensão, e mais cedo ou mais tarde eles devem chegar numa parada.”

A velha Mombi se achou muito esperta por ter escolhido a forma de um Grifo, pois suas pernas
eram extremamente fortes e mais rápidas do que a dos outros animais. Mas ela não tinha contado
com a energia do Cavalete, cujas pernas de madeira poderiam correr por vários dias sem diminuir
a velocidade. Portanto, depois de horas de dura corrida, a respiração do Grifo começou a falhar, e
ele arfava e suspirava dolorosamente, e passou a correr mais devagar.
Então ela atingiu a fronteira do deserto e começou a correr sobre a areia fofa. Mas suas pernas
cansadas afundavam na areia, e em poucos minutos o Grifo caiu para a frente, completamente
exausto, e ficou deitado na poeira do deserto.

Glinda veio um momento depois, ainda cavalgando o vigoroso Cavalete; e desenrolando um fio de
ouro fino do seu cinto, jogou sobre a cabeça do cansado e exausto Grifo, e assim destruiu o poder
mágico de transformação de Mombi.

Então o animal, com um arrepio feroz, sumiu de vista, enquanto em seu lugar aparecia a forma da
velha Bruxa, olhando ferozmente para o rosto tranquilo da Feiticeira.
23
A Princesa Ozma de Oz

“Você é minha prisioneira, e é inútil que você tente lutar por mais tempo,” disse Glinda, em sua
calma e doce voz. “Descanse um pouco e eu irei leva-la de volta para minha tenda”.

“Porque você esteve me procurando?” perguntou Mombi, ainda sem conseguir falar direito pela
falta de ar. “O que eu fiz a você para ser tão perseguida?”

“Você não fez nada a mim” respondeu a Feiticeira; “mas eu suspeito que você é culpada de várias
ações perversas; e se eu descobrir que isto é verdade e que você abusou de seu conhecimento
mágico, eu pretendo lhe disciplinar severamente.”

“Eu desafio você!” resmungou a velha Bruxa. “você não terá coragem de me castigar!”

Neste momento a Coisa desceu até eles e pousou nas areias do deserto ao lado de Glinda.
Nossos amigos estavam felizes por ver que a velha Mombi tinha finalmente sido capturada, e
depois de uma rápida consulta eles decidiram que todos deveriam voltar ao acampamento dentro
da Coisa. Então o Cavalete foi colocado a bordo, e Glinda, ainda segurando o fio de ouro que
estava em volta do pescoço de Mombi, forçou a prisioneira a subir para os sofás. Os outros
também seguiram e Tip deu ordem ao Veado para retornarem.

A jornada foi feita em segurança, Mombi sentada em seu lugar com um ar sombrio, pois estava
totalmente impotente enquanto o fio mágico estava em volta do seu pescoço. O exército saudou o
retorno de Glinda com gritos de alegria, e o grupo de amigos foi logo conduzido outra vez para
dentro da tenda real, que havia sido perfeitamente reparada durante a ausência.

“Agora” disse a Feiticeira para Mombi “quero que você nos diga porque o Maravilhoso Mágico de
Oz lhe fez três visitas, e o que aconteceu com a criança, Ozma, que desapereceu curiosamente.”

A Bruxa olhou para Glinda desafiadoramente, mas não disse uma única palavra.

“Responda-me!” gritou a Feiticeira. Mas Mombi permaneceu em silêncio.

“Talvez ela não saiba” interveio Jack.

“Por favor fique quieto,” disse Tip. “Você pode estragar tudo com sua tolice.”

“Ok querido pai!” respondeu o Cabeça-de-Abóbora humildemente.

“Como sou feliz por ser um besourão!” murmurou o Enormemente Crescido, suavemente.
“Ninguém pode esperar sabedoria de uma abóbora”.

“Bem,” disse o Espantalho, “O que deveremos fazer para que Mombi fale? Pois a menos que ela
nos fale o que queremos saber, sua captura não nos trará nenhum benefício.”

“Talvez devêssemos usar gentileza” sugeriu o Homem de Lata. “Ouvi dizer que qualquer pessoa
pode ser conquistada com gentileza, não importa quão feia ela possa ser.”
Com isto a Bruxa olhou para ele com um olhar tão horrível que o Homem de Lata se encolheu
amedrontado.

Glinda pensando cuidadosamente no que fazer, então voltou-se para Mombi e disse:

“Você não ganhará nada, eu lhe asseguro, ao tentar nos desafiar. Pois estou determinada a saber
a verdade sobre a menina Ozma, e a menos que você me diga tudo o que sabe, eu com certeza
lhe condenarei à morte.”

“Oh não! Não faça isto!” exclamou o Homem de Lata. “Seria uma coisa horrível matar uma pessoa
– mesmo que seja a velha Mombi.”

“Mas isto é meramente uma ameaça,” respondeu Glinda. “Eu não irei precisar eliminá-la, pois ela
irá preferir me contar a verdade.”

“Ah, entendo” disse o Homem de Lata bastante aliviado.

“Suponhamos que eu lhe conte tudo o que você queira saber,” disse Mombi, falando tão de
repente que assustou a todos. “O que você fará comigo então?”

“Neste caso,” respondeu Glinda, “Eu irei meramente lhe pedir para beber uma poção mágica que
lhe fará esquecer toda a mágica que você tenha aprendido.”

“Então eu irei me tornar uma velha indefesa!”

“Mas você poderá ficar viva,” sugeriu o Cabeça-de-Abóbora, consolando-a.

“Tente manter silêncio!” disse Tip nervosamente.

“Vou tentar” respondeu Jack; “mas você deve admitir que é uma boa coisa estar vivo.”

“Especialmente se acontecer de você ser Completamente Educado” acrescentou o Besourão


acenando com a cabeça em aprovação”.

“Você pode fazer sua escolha” disse Glinda para Mombi, “entre a morte se você permanecer em
silêncio, e a perda de seus poderes mágicos se você me contar a verdade. Mas acho que você vai
preferir viver.”

Mombi lançou um olhar inquieto para a Feiticeira e percebeu que ela estava falando sério e não
estava para brincadeiras. Então ela respondeu lentamente:

“Eu irei responder suas perguntas.”

“Era o que eu esperava,” disse Glinda com prazer. “Você escolheu sabiamente, eu lhe asseguro.”

Então ela chamou um de seus Capitães, que lhe trouxe um lindo baú de ouro. Dele a Feiticeira
tirou uma grande pérola branca presa num grosso colar e o prendeu em seu próprio pescoço, de
modo a ficar diretamente sobre o coração.

“Agora” ela disse, “vou lhe fazer a primeira pergunta: Porque o Mágico lhe fez três visitas?”

“Porque eu não podia ir até ele” respondeu Mombi.

“Isto não é resposta” disse Glinda severamente. “Conte me a verdade.”


“Bem” respondeu Mombi, olhando para baixo, “ele me visitou para aprender minha receita de
biscoitos de chá.”

“Olhe para mim!” ordenou a Feiticeira.

Mombi obedeceu.

“Qual é a cor da minha pérola?” exigiu Glinda.

“Porque? – ela é preta!” respondeu a velha Bruxa, num tom de espanto.

“Então você me contou uma mentira!” falou Glinda irritadamente. “Apenas quando a verdade for
falada minha pérola se tornará em branco puro novamente.”

Mombi agora percebeu agora que seria inútil tentar enganar a Feiticeira; então ela disse em sua
carrancuda voz:

“O Mágico trouxe para mim a menina Ozma, que era nada mais que um bebê, e me pediu para
esconder a criança.”

“Foi o que eu pensei” declarou Glinda calmamente. “O que ele lhe deu por servi-lo desta forma?”

“Ele me ensinou todos os truques mágicos que ele conhecia. Alguns eram bons truques, e outros
eram apenas fraudes; mas eu permaneci fiel à minha promessa.”

“O que você fez com a menina?” perguntou Glinda; e nesta pergunta todos se inclinaram um
pouco à frente para ouvir melhor a resposta.

“Eu a transformei em algo” respondeu Mombi.

“Em quê?”

“Eu a transformei em... Em...”

“Em quê?” ordenava Glinda, enquanto a Bruxa hesitava.

“Em um menino!” disse Mombi numa voz baixa.

“Um menino!?!?” repetiram todas as vozes; e então, por saberem que a velha mulher tinha criado
Tip desde a infância, todos os olhos se voltaram para onde o menino estava.

“Sim,” disse a velha Bruxa afirmando com a cabeça; “esta é a Princesa Ozma – a criança trazida a
mim pelo Mágico que roubou o trono de seu pai. E que governante por direito da Cidade das
Esmeraldas!” e ela apontou seu longo dedo ossudo para o garoto.

“Eu?” gemeu Tip surpreso. “Mas como? Eu não sou a Princesa Ozma – eu não sou uma menina!”

Glinda sorriu, e indo até Tip, pegou sua pequena mão bronzeada, enquanto sorria graciosamente.

“Você não é uma menina agora” disse ela gentilmente, “porque Mombi lhe transformou em um
menino. Mas você nasceu como menina, e também como Princesa; então você deve voltar à sua
própria forma, pois você irá ser Rainha da Cidade das Esmeraldas.”
“Ah, deixe Jinjur ser Rainha!” exclamou Tip, pronto para chorar. “Eu quero ser um menino, e viajar
com o Espantalho e o Homem de Lata, e o Besourão, e Jack – sim! E meu amigo o Cavalete – e a
Coisa! Eu não quero ser uma menina!”

“Não se preocupe camarada,” disse o Homem de Lata calmamente; “não dói ser uma menina, eu
lhe garanto; e nós iremos continuar seus amigos do mesmo jeito. E, para ser honesto com você,
eu sempre achei garotas mais agradáveis do que garotos.”

“Elas são realmente muito agradáveis” acrescentou o Espantalho, batendo carinhosamente na


cabeça de Tip.

“E são boas estudantes da mesma maneira,” proclamou o Besourão. “Eu gostaria de ser seu
professor particular quando você voltar a ser uma menina novamente.”

“Mas – olhe só!” disse Jack Cabeça-de-Abóbora com um suspiro: “se você se tornar uma menina,
você não vai poder ser meu querido pai nunca mais!”

“Não” respondeu Tip, gargalhando apesar de sua tensão. “mas não seria desculpa para não
termos o carinho.” Em seguida ele acrescentou hesitante olhando para Glinda: “Eu posso tentar
por um tempo – apenas para ver como é, você sabe. Mas se eu não gostar de ser uma menina
você deve prometer me transformar em menino novamente.”

“Sinceramente,” disse a Feiticeira, “isto está além do meu poder. Eu nunca lidei com
transformações, pois elas não são honestas, e nenhuma feiticeira de respeito gosta de fazer as
coisas parecer o que não são. Apenas bruxas inescrupulosas usam a arte, portanto vou pedir a
Mombi que lhe livre do encanto e lhe restaure à sua própria forma. Esta vai ser a última vez que
ela poderá praticar magia.”

Agora que a verdade sobre a Princesa Ozma havia sido descoberta, Mombi não se importava com
o que fazer com Tip; mas ela temia a fúria de Glinda, e o garoto generosamente prometeu
sustentar Mombi em sua velhice se ele se tornasse o governante da Cidade das Esmeraldas.
Então a Bruxa consentiu em realizar a transformação, e os preparativos para isto foram feitos logo
de uma vez.

Glinda ordenou que seu próprio sofá real fosse colocado no centro da tenda. Ele estava repleto de
almofadas cobertas de seda cor-de-rosa, e em uma grade dourada pendurada acima estavam
muitas dobras de seda rosa que encobriam completamente o assento do sofá.

O primeiro ato da Bruxa foi fazer o menino beber uma poção que o fez rapidamente cair num sono
profundo e sem sonhos. Então o Homem de Lata e o Besourão o colocaram gentilmente deitado
no sofá, sobre as macias almofadas e fecharam as cortinas de seda, para impedir qualquer visão
do mundo exterior.

A Bruxa agachou-se no chão e acendeu um pequeno fogo de ervas secas, que ela tirou de suas
vestes. Quando a chama subiu e queimava claramente, a velha Mombi espalhou sobre o fogo um
punhado de pó mágico, que espalhou uma fumaça roxa grossa, enchendo toda a tenda e que fez
o Cavalete espirrar, embora o tivessem mandado ficar quieto.

Então, enquanto os outros olhavam para ela curiosamente, a bruxa cantou uns versos, numa
linguagem que ninguém entendia, e inclinou seu corpo para frente e para trás sete vezes sobre o
fogo. E o encantamento parecia completo, pois a Bruxa ficou em pé e gemeu a palavra “Yeowa!”
em alta voz.

A fumaça sumiu; o ar se tornou claro outra vez; uma lufada de ar fresco encheu toda a tenda, e as
cortinas sobre o sofá tremeram um pouco, como se agitadas por dentro.

Glinda foi até o meio e separou as cortinas de seda. Então ela se inclinou sobre as almofadas,
estendendo os braços e levantando do sofá a forma de uma jovem garota, linda e bela como uma
manhã de verão. Seus olhos brilhavam como dois pequenos diamantes, e seus lábios eram
vermelhos como um rubi. E descendo por suas costas haviam tranças ruivas, e uma tiara de jóias
finas sobre sua testa. Suas vestes de fina seda lhe vestindo como uma nuvem, e sandálias de
cetim delicadas em seus pés.

Diante desta estranha visão, os velhos amigos de Tip olharam com espanto por cerca de um
minuto, e em seguida todas as cabeças se abaixaram para admirar a bela Princesa Ozma. A
menina lançou um olhar para o rosto radiante de Glinda, que brilhava de prazer e satisfação, e
então olhou para os outros. Falando as palavras com uma desconfiança doce ela disse:

“Eu espero que nenhum de vocês se importe menos comigo do que antes. Eu sou ainda o mesmo
Tip, vocês sabem; apenas... apenas...”

“Você apenas está diferente!” disse o Cabeça-de-Abóbora; e todos ao seu redor acharam que era
a fala mais inteligente que ele já tinha dito.
24
A Riqueza de Conteúdo

Quando a surpreendente notícia chegou aos ouvidos da Rainha Jinjur – de como a Bruxa Mombi
tinha sido capturada; como havia confessado seu crime a Glinda; e como a princesa Ozma,
perdida a tanto tempo, havia sido reencontrada como sendo ninguém menos que o menino Tip –
ela chorou lágrimas de tristeza e desespero.

“E pensar” ela choramingava “que depois de ter sido Rainha, e viver num palácio, eu terei que
voltar a esfregar o chão e bater manteiga novamente! Isto é tão horrível de se pensar! Eu nunca
irei permitir!”

Então, quando seus soldados meninas, que passavam o maior tempo na cozinha do palácio
fazendo lanches, aconselharam Jinjur a resistir, ela deu ouvidos a esta tagarelice tola e desafiou
ousadamente Glinda a Bondosa e a Princesa Ozma. O resultado foi uma declaração de guerra, e
no dia seguinte Glinda marchou para a Cidade das Esmeraldas com bandeiras tremulando ao
vento e bandas tocando, e uma floresta de lanças brilhando sob os raios do sol.

Mas, quando chegaram às muralhas, nosso bravo grupo fez uma parada repentina; pois Jinjur
tinha fechado e trancado todos os portões, e as muralhas da Cidade das Esmeraldas eram
construídas altas e grossas, com muitos blocos de mármore verde. Tendo seu avanço contrariado
desta forma, Glinda franziu as sobrancelhas pensativa, enquanto o Besourão disse em seu tom
mais positivo:

“Nós devemos cercar a cidade e fazê-los morrer de fome em submissão. É a única coisa que
podemos fazer.”

“Nem tanto” respondeu o Espantalho. “Nós ainda temos a Coisa, e o veado ainda pode voar.”

A Feiticeira voltou-se rápida ao ouvir isto, e seu rosto agora tinha um brilhante sorriso.

“Você está certo” ela exclamou, “e certamente tem razão em colocar seu cérebro à prova. Vamos
para a Coisa de uma vez!”

Então eles passaram pelas fileiras de soldados e chegaram ao lugar perto da tenda do
Espantalho, onde a Coisa estava. Glinda e a Princesa Ozma subiram primeiro e se acomodaram
nos sofás. Então o Espantalho e seus amigos subiram a bordo, e ainda houve espaço para um
capitão e três soldados, que Glinda achou suficiente para guarda-los.

Agora, com uma palavra da Princesa, a Coisa bateu suas asas de folhas de palmeira e subiu no
ar, carregando a turma de aventureiros alto sobre a muralha. Eles sobrevoaram sobre o palácio, e
logo perceberam Jinjur deitada numa rede no pátio, confortavelmente lendo um romance de capa
verde e comendo chocolates verdes; confiante de que as muralhas a protegeriam dos inimigos.
Obedecendo a um rápido comando, a Coisa pousou com segurança neste mesmo pátio, e antes
que Jinjur tivesse tempo de fazer outra coisa além de gritar, o Capitão e os três soldados pularam
fora e fizeram a ex-rainha de prisioneira, trancando grossas algemas em seus pulsos.
Este ato realmente acabou com a guerra, pois o Exército da Revolta se rendeu assim que soube
que Jinjur havia sido presa, e o Capitão marchou em segurança pelas ruas e abriu os portões da
cidade. Então as bandas tocaram sua música mais animada enquanto o Exército de Glinda
marchava cidade adentro e os mesageiros proclamavam a prisão da audaciosa Jinjur e a
ascensão da bela Princesa Ozma ao trono de seus ancestrais reais.

Ao mesmo tempo os homens da Cidade das Esmeraldas arrancaram seus aventais. E disseram
que as mulheres estavam enjoadas de comer a comida feita por seus maridos e todos eles
celebraram a captura de Jinjur com alegria. E certo é, que na cozinha de suas casas, as boas
esposas prepararam comidas deliciosas para os maridos cansados e a harmonia foi
imediatamente restaurada em cada família.

O primeiro ato de Ozma foi obrigar o Exército da Revolta a devolver cada esmeralda ou pedra
preciosa retirada das ruas e prédios; e era tão grande a quantidade de pedras arrancadas por
essas meninas perversas, que cada joalheiro real trabalhou constantemente por mais de um mês
para recoloca-los no lugar.

Enquanto isso o Exército da Revolta foi desfeito e as meninas mandadas de volta para suas
mães. E com a promessa de manter um bom comportamento, Jinjur também foi libertada.

Ozma tornou-se a mais amável rainha que a Cidade das Esmeraldas jamais conheceu; e apesar
de ser tão jovem e inexperiente, ela governou seu povo com sabedoria e justiça. Pois Glinda deu
a ela bons conselhos em todas as ocasiões; e o Besourão, que foi indicado para o importante
cargo de Educador Público, era sempre útil para Ozma enquanto seu conhecimento real deixava a
todos perplexos.

A garota em sua gratidão para a Coisa, por seus serviços, ofereceu à criatura qualquer
recompensa que ele pudesse pensar.

“Então” respondeu o Veado, “Por favor me desmontem todas as partes. Eu não queria ter sido
trazido à vida, e eu estou grandemente envergonhado de minha condição aglomerada. Uma vez
eu já fui um rei das florestas, como provam os meus chifre; mas agora, em minha presente
condição estofada de servidão, eu sou obrigado a voar pelo ar – minhas pernas não servindo mais
para nada. Portanto imploro para ser desfeito.”

Então Ozma ordenou que a Coisa fosse desmontada. A cabeça com chifres foi novamente
pendurada sobre o portal do corredor, e os sofás foram desamarrados e colocados nos salões da
recepção. A vassoura cauda voltou para as suas atividades habituais na cozinha, e finalmente o
Espantalho recolocou todos os varais e cordas nos ganchos dos quais ele havia arrancado no dia
agitado em que a Coisa foi construída.

Você deve pensar que foi o fim da Coisa; e realmente foi, como máquina voadora. Mas a cabeça
sobre o portal continuou a conversar sempre que tinha vontade de fazê-lo, e frequentemente
assustava, com perguntas repentinas, as pessoas que esperavam no salão para ter uma
audiência com a Rainha.

O Cavalete, sendo propriedade pessoal de Ozma, foi cuidado com carinho; e de vez em quando
ela passeava montada sobre ele pelas ruas da Cidade das Esmeraldas. Ela fez com que as
pernas de madeira fossem calçadas com ouro, para evitar o desgaste, e o barulho destes cascos
de ouro sobre o pavimento, sempre enchia de assombro os que aguardavam a Rainha e era uma
forte evidencia de seus poderes mágicos.
“O Maravilhoso Mágico nunca foi tão maravilhoso quanto a Rainha Ozma” as pessoas diziam
umas para as outras, sussurrando; “Pois ele dizia fazer muitas coisas que não pôde fazer;
enquanto nossa nova Rainha faz muitas coisas que ninguém esperava que ela fosse fazer.”

Jack Cabeça-de-Abóbora permaneceu com Ozma até o fim de seus dias; e ele não apodreceu
logo como ele sempre temia, entretanto ele permaneceu tão bobo como sempre. O Besourão
tentou ensiná-lo muitas artes e ciência; mas Jack era um estudante tão precário que qualquer
tentativa ensiná-lo foi logo abandonada.

Depois que o Exército de Glinda marchou de volta para casa, e a paz foi restaurada à Cidade das
Esmeraldas, o Homem de Lata anunciou sua intenção de voltar para seu próprio Reino dos
Winkies.

“Não é um Reino muito grande” ele disse para Ozma, “mas por este mesmo motivo é fácil de
governar; e eu tenho chamado a mim mesmo de Imperador, pois sou um Monarca Absoluto, e
ninguém interfere de forma alguma com minha maneira de resolver assuntos públicos ou
pessoais. Quando eu voltar para casa eu colocarei uma nova camada de níquel de prata; pois me
arranhei um pouco ultimamente; e então eu ficarei feliz se você for me visitar.”

“Obrigada” respondeu Ozma. “Algum dia irei aceitar o convite. Mas o que faremos para o
Espantalho?”

“Eu desejo voltar com meu amigo o Homem de Lata” disse o estufado, de forma séria. “Nós
decidimos nunca mais nos separar no futuro.”

“E eu nomeei o Espantalho como meu Tesoureiro Real”, explicou o Homem de Lata. “Pois percebi
que é uma coisa boa ter um Tesoureiro Real que é feito de dinheiro. O que você acha?”

“Eu acho” disse a pequena Rainha, sorridente, “que seu amigo deve ser o homem mais rico de
todo o mundo.”

“Eu sou” respondeu o Espantalho. “Mas não por causa do meu dinheiro. Pois considero os
cérebros superiores ao dinheiro de qualquer modo. Você já deve ter ouvido dizer que se alguém
tem dinheiro e não tem cérebro, ele não pode usar isso para se beneficiar; mas se alguém tem
cérebro e não tem dinheiro, o cérebro o permitirá viver bem até o fim de seus dias.”

“Ao mesmo tempo” declarou o Homem de Lata, “você deve reconhecer que um bom coração é
algo que o cérebro não pode fazer e o dinheiro não pode comprar. Talvez, no fim das contas, sou
eu quem sou o homem mais rico do mundo.”

“Vocês dois são ricos, meus amigos” disse Ozma gentilmente; “e suas riquezas são as únicas
riquezas que vale a pena ter – riqueza de conteúdo!”

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