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Sociedade
Violência no Campo

O Estado, a Justiça, a pistolagem e


aqueles que devem morrer
por Felipe Milanez — publicado 08/06/2018 10h30, última modificação 08/06/2018
10h58

Relatório da Comissão Pastoral da Terra aponta para a participação


direta do Estado e cumplicidade da Justiça na crescente violência no
campo
Lunaé Parracho/Repórter Brasil

Há um ano dez trabalhadores rurais foram assassinados em Pau D’Arco, no Pará

Foi só no século passado que se matou tanta


gente no Brasil que defende a terra e a
floresta como no ano passado. Nunca antes nesse milênio o sangue rolou de forma tão
bem selecionada para ceifar lideranças e espalhar o terror.

A Comissão Pastoral da Terra (CPT) lançou na segunda-feira 4 o relatório completo


sobre conflitos no campo, onde aponta o assustador número de 71 assassinados em
conflitos, uma crescente onda que aumenta continuadamente desde 2015.

O relatório, que tradicionalmente é lançado no dia internacional da luta pela terra, 17 de


abril, foi atrasado em razão de ataques cibernéticos que a pastoral tem sofrido por
ruralistas. Uma prévia já havia sido divulgada em 23 de maio.

Dessas 71 pessoas, segundo os dados da CPT, 23 eram lideranças. São portanto crimes
políticos. Violência covarde do novo fascismo social ruralista. São violências praticadas

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mais chacinas, que tem por objetivo espalhar o terror no campo.

O número de 70 assassinatos identificados pela CPT só é menor do que os 73 em 2003,


nesse milênio. No entanto, a CPT não contabilizou os pelo menos dez indígenas do povo
flecheiro, que vive em isolamento voluntário, assassinados por garimpeiros em agosto
do ano passado, no Vale do Javari, conforme noticiou em primeira mão esta coluna.

É possível, segundo levantamento extra oficial feito a partir de minhas pesquisas junto
de lideranças indígenas, que 70 indígenas isolados tenham sido assassinados no Vale do
Javari nos últimos 3 anos. É definitivamente o fim da falida política de “não contato”
gestada em Brasília, financiada pela cooperação internacional neoliberal para ONGs de
São Paulo e “especialistas” da elite sudestina.

O MPF iniciou uma investigação, conforme noticiei, mas que esbarrou na pífia
investigação da polícia. A Funai, ao invés de defender os direitos dos povos indígenas, se
mobilizou para abafar a denúncia, inclusive com uma expedição feita na área de forma
quixotesca, sem nenhuma metodologia de investigação de crimes (o que usurpa a
função da Funai).

A pressa da Funai em abafar a denuncia que veio da própria Funai foi desmontada
como uma farsa pela liderança do movimento indígena do Vale do Javari, Paulo
Marubo. 

Leia também: Os índios isolados foram massacrados, mas Funai diz que não há provas”

Portanto, foram massacres de camponeses em Colniza (nove assassinatos), massacre de


sem-terra em Pau D’’Arco, no Para (dez assassinatos), massacre de quilombolas na
Bahia, massacres de indígenas isolados na Amazônia. Uma tragédia humanitária sem
proporção, e que choca ainda mais diante do silêncio ensurdecedor da sociedade
brasileira que se faz cúmplice dessa barbárie.

As 22 pessoas assassinadas no Pará compõem um quadro de terror no cenário de


maior violência e terror no Brasil hoje, tendo em vista que, nas duas ultimas semanas,
apenas no assentamento onde Dorothy Stang foi morta, em 2005, já ocorreram duas
mortes por encomenda.

Nesses assassinatos seletivos de lideranças camponesas, indígenas, quilombolas e sem


terra e massacres coletivos, o principal objetivo é promover o terror no campo, e
consolidar a virada reacionária contra os direitos sociais, impondo uma única concepção
possível de ocupação da terra no Brasil: o latifúndio. Fora desse espectro, todas as
formas coletivas de acesso ao território foram, no último ano, sistematicamente,
aniquiladas.

Nas análises do relatório da CPT destaca-se o artigo de autoria de José Batista Afonso,
advogado da CPT, e Airton Pereira, ex-colaborador da CPT e professor na Universidade
do estado do Pará. Lá do front por onde avança o sanguinário agronegócio, em um
brilhante artigo do “coração das trevas” do Brasil, eles assinalam o recuo da política de
reforma agrária e a ascendência das forças conservadoras que emergiram com o golpe
de 2016.

Escrevem Batista e Pereira: “Nos casos de assassinatos de trabalhadores rurais na


Amazônia, em 2017, sobretudo com relação aos massacres, é possível identificar o grau
de brutalidade, crueldade e punição pela dor, uma verdadeira arte de fazer morrer,

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Cadáveres degolados, carbonizados, ensanguentados, desfigurados. São práticas que


têm como propósito fazer com que as pessoas saibam, mas também vejam, elas
mesmas, com seus próprios olhos os recados dos grandes proprietários rurais escritos
com caligrafias sangrentas. Avisos de morte. Por essa razão se pode entender porque os
corpos foram expostos para que fossem vistos. São práticas que procuram explicitar o
poder sobre os corpos, não só dos mortos, mas também dos vivos.”

Eles destacam como a ação da polícia militar do Pará demonstra a articulação entre
empresários rurais, proprietários, com as instituições do Estado, o judiciário e a polícia,
para manter o status quo. O terror de um novo colonialismo em marcha, onde os
maiores vilões, os infames colonizadores, estão aqui dentro, lado a lado.

Esse massacre de sangue também tem seu lado no plano das ideias, no massacre
epistêmico. Nos últimos dias, o Pará foi palco de lutas por memórias de mártires dos
movimentos sociais, e novas agressões da pistolagem e da barbárie jurídica que assola
o país.

Na romaria em memória dos mártires José Claudio e Maria, assassinados em 24 de maio


de 2011, veio à tona a revolta pela impunidade: José Rodrigues Moreira, fazendeiro e
mandante, está foragido desde que foi absolvido por um tribunal suspeito na primeira
instância, em abril de 2013; seu irmão, o assassino Lindon Jonson Silva, foragido desde
que teve sua fuga facilitada do presídio de Marabá, em caso de corrupção que levou a
queda do diretor, em 2016.

Nessa mesma semana, o ministro Marco Aurelio de Mello, do STF, soltou o vulgo
Taradão, um dos mandantes do assassinato de Dorothy Stang. Ele estava preso no
mesmo presidio onde há dois meses, de forma ilegal e criminosa, a justiça mantém
sequestrado Padre Amaro, através de uma absurda prisão preventiva e arbitrária, sem
nenhuma acusação formal além da criminalização de suas ações sociais em favor da
reforma agrária e mantendo a luta pelo legado de Dorothy Stang.

A justiça das togas da Casa Grande no Brasil solta os assassinos, senhores e feitores, e
prende aqueles que lutam na senzala e nas matas. A Justiça executa, e manda a polícia
executar, a necropolítica do Executivo e do Legislativo, dominados pelos senhores
piratas do latifúndio e do capital internacional. Constituição virou uma fabula diante do
terror do estado de exceção em marcha, da força do poder da exceção às regras, ao
sistema.

Leia também: Violência e intimidação impedem debate sobre mineração no Pará

A participação do Judiciário no processo de destruição e saque do Brasil deve ser vista


além de sua influência política no golpe de 2016 e no submundo de Brasília. De lá vem
as mensagens codificadas que incitam a morte, algo como se o Judiciário em Brasília
mandasse um “salve”, tal como os chefes do PCC, para que os juízes da primeira
instância e os capitães do mato da polícia se ligassem que é hora de partir para cima
para os massacres.

É uma violência cotidiana praticada pelo Judiciário contra todos aqueles e aquelas que
lutam por justiça no Brasil, no campo e nas cidades e das aldeias, nas florestas e nos
rios.

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