You are on page 1of 107

UNIVERSIDADE FEDERAL DE OURO PRETO

ESCOLA DE DIREITO, TURISMO E MUSEOLOGIA


DEPARTAMENTO DE DIREITO

ROBERTO WAGNER DE CARVALHO JÚNIOR

A FALÁCIA DA FLEXIBILIZAÇÃO E A REFORMA TRABALHISTA:


necessidade ou conceito anético econômico?

Ouro Preto
2017
ROBERTO WAGNER DE CARVALHO JÚNIOR

A FALÁCIA DA FLEXIBILIZAÇÃO E A REFORMA TRABALHISTA:


necessidade ou conceito anético econômico?

Trabalho de Conclusão de Curso


apresentado ao curso de Direito, da
Universidade Federal de Ouro Preto,
como requisito parcial para a obtenção do
grau de Bacharel em Direito, sob a
orientação da Professora Dra. Flávia
Souza Máximo Pereira.

Ouro Preto
2017
ROBERTO WAGNER DE CARVALHO JÚNIOR

A FALÁCIA DA FLEXIBILIZAÇÃO E REFORMA TRABALHISTA:


necessidade ou conceito anético econômico?

Trabalho de Conclusão de Curso


apresentado ao curso de Direito, da
Universidade Federal de Ouro Preto,
como requisito parcial para a obtenção do
grau de Bacharel em Direito.

Ouro Preto - Minas Gerais – Brasil, 04 de agosto de 2017

BANCA EXAMINADORA

Profa. Dra. Flávia Souza Máximo Pereira (orientadora)


Universidade Federal de Ouro Preto

Prof. Me. Carlos Randel Crepalde Mafra


Faculdade Presidente Antônio Carlos

Prof. Me. Rômulo Soares Valentini


Centro Universitário de Sete Lagoas e Faculdade Pedro Leopoldo
Dedico este trabalho a minha mãe, Maria da
Conceição dos Santos Carvalho, pela educação,
cuidado e amor, ao meu pai, Roberto Wagner de
Carvalho, pelo desenvolvimento de meu pensamento
crítico e por nunca deixar nada faltar a nossa família,
a meu irmão, grande parceiro e pessoa de minha mais
alta confiança, a meu sobrinho Isaac, a minha esposa
e parceira, Luiza Moreira de Carvalho, que muito
contribuiu com este trabalho com sua paciência e
ajuda no aperfeiçoamento técnico das discussões, a
minha sogra, Maristela Moreira de Carvalho, à minha
família e meus amigos, em especial, Lucas Ribeiro de
Souza Guerra e Dan Ribeiro de Assis Paiva, que
sempre me apoiaram. Pessoas que levarei por toda a
vida.

Em memória de meus avós, Francisco Quirino dos


Santos, Efigênia Teixera dos Santos, José Sobrinho
Carvalho e Eunice Martins de Carvalho.
AGRADECIMENTOS

Reservo este espaço para agradecer à Dra. Flávia Souza Máximo Pereira pelo apoio e exímia
orientação, sem a qual a polidez deste trabalho jamais seria alcançada. Agradeço também aos
meus mentores no Departamento de Filosofia, Dr. Mário Nogueira de Oliveira, pela orientação
sobre o liberalismo e pelas aulas de ética, história da filosofia e filosofia política, e prof.
Desidério Murcho, pelas instruções em lógica. Aos professores Edvaldo Pereira e Fabiano
Guzzo, cujos laços de amizade transcendem à sala de aula. Aos demais professores
Departamento de Direito, em especial a Alexandre Bahia, Amauri Alves, Beatriz Schettini,
Bruno Camilloto, Federico Nunes de Matos, Flaviane de Magalhães Barros e Roberto Pôrto,
cujas lições carregarei para o resto de minha vida.

Agradeço pela disponibilidade dos senhores Prof. Me. Carlos Randel Crepalde Mafra e Prof.
Me. Rômulo Soares Valentini de participar da banca de examinadora, que promoverá a
discussão o aprimoramento deste trabalho.

À Dra. Iara Antunes, que foi capaz de me ENSINAR quando as salas de aula de pouco me
serviam, meu especial carinho e sincero agradecimento.
"Quem sabe apenas sua parte sobre uma questão,
nada sabe sobre ela." (John Stuart Mill)
RESUMO

Este estudo diz respeito ao trabalho humano enquanto ação conformadora da civilização e sua
precarização, em sentido lato e em relação ao Projeto de Lei (PL) 6.787/2016 – Reforma
Trabalhista, convertido na Lei Ordinária 13.467/2017. Pretendemos, aqui, refutar a falácia
economicista de que a diminuição de direitos trabalhistas desonera os custos das pessoas
jurídicas de direito privado e promove, consequentemente, aumento de seus investimentos no
país. Para isso, defenderemos a tese de que o aumento de direitos trabalhistas e a correção das
instituições injustas, como as condições indignas de trabalho, implicam no aumento da
circulação de recursos e no fortalecimento do mercado nacional e que esta é uma estratégia
desejável, tanto do ponto de vista econômico quanto do ponto de vista da ética, que garante
estabilidade e progresso social.

Palavras-chave: Trabalho. Ética. Flexibilização. Precarização do trabalho.

ABSTRACT

This essay concerns human labour as an action that shapes civilization and its precariousness,
in the lato sensu and related to the Law Project (LP) 6.787 / 2016 - Labour Reform, converted
to the Ordinary Law 13.467/2017. We intend to refute the fallacy that the reduction of labour
rights decreases the production cost from legal entities under private law and, consequently,
promotes an increase in its investments in the country. Therefore, we will defend the thesis that
the increase of labour rights and the correction of unjust institutions, such as the unworthy work
conditions, implies in the increase of the circulation of resources and the strengthening of the
national market and that this is a desirable strategy, both from an economic as well from an
ethical point of view, which guarantees stability and social progress.

Keywords: Labour. Ethic. Flexibility. Precarious work.


SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ................................................................................................................................. 9
2. TRABALHO .................................................................................................................................... 10
2.1. SENTIDO ETIMOLÓGICO DE "TRABALHO" E NOÇÕES INICIAIS .................................... 10
2.2. CONCEITO E CARACTERÍSTICAS DO TRABALHO ............................................................. 15
2.3. HISTÓRIA E EVOLUÇÃO MUNDIAL ....................................................................................... 16
2.4. O CAPITALISMO E A ERA DAS REVOLUÇÕES .................................................................... 21
3. LIBERALISMO .............................................................................................................................. 24
3.1. LOCKE .......................................................................................................................................... 29
3.1.2. PROPRIEDADE ......................................................................................................................... 29
3.1.3. LIBERDADE E IGUALDADE .................................................................................................. 30
3.2. O ESTADO LIBERAL E OS PRIMÓRDIOS DO LIBERALISMO ECONÔMICO.................... 32
3.2.1. CRISE DO ESTADO LIBERAL ................................................................................................ 36
3.3. NEOLIBERALISMO ECONÔMICO............................................................................................ 37
4. LIBERALISMO IGUALITÁRIO ................................................................................................. 40
4.1. A TEORIA RAWLSIANA ............................................................................................................ 40
4.1.1. LIBERDADE INDIVIDUAL X SOCIEDADE COOPERATIVA ............................................. 40
5. O ARGUMENTO DE HAYEK CONTRA A CONCEPÇÃO DE JUSTIÇA SOCIAL OU
JUSTIÇA DISTRIBUTIVA ............................................................................................................... 41
6. PRECARIZAÇÃO E FLEXIBILIZAÇÃO: RELAÇÃO INDISSOCIÁVEL ........................... 49
7. LEI 13.467/2017 – REFORMA TRABALHISTA ........................................................................ 51
7.1. O ARGUMENTO PRÓ-FLEXIBILIZAÇÃO PROVENIENTE DE PREMISSAS
ESTRUTURADAS NO NEOLIBERALISMO ECONÔMICO ........................................................... 83
7.2. O ARGUMENTO CONTRA A FLEXIBILIZAÇÃO USUALMENTE UTILIZADO PELOS
MARXISTAS E A FUNÇÃO CONCILIATÓRIA DO DIREITO DO TRABALHO .......................... 91
7.3. O ARGUMENTO DE AMARTYA SEN A FAVOR DA CONCEPÇÃO DE JUSTIÇA SOCIAL
OU JUSTIÇA DISTRIBUTIVA ........................................................................................................... 93
8. A APLICAÇÃO DO ARGUMENTO DE SEN COMO SOLUÇÃO AO PROBLEMA DA
FLEXIBILIZAÇÃO ............................................................................................................................ 97
9. CONCLUSÃO ................................................................................................................................. 98
10. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................................ 99
9

1. INTRODUÇÃO

A relevância deste estudo está na demonstração de que a defesa e ampliação de direitos


dos trabalhadores não implica, necessariamente, um maior custo de operação para a instalação
e funcionamento das pessoas jurídicas de direito privado. Implica, ao revés, em maior
circulação de recursos no mercado e na promoção de um modo de produção mais ético, que
valoriza a função social da empresa, mas, antes, a dignidade da pessoa humana.
Há algo de falacioso no reducionismo dos argumentos econômicos que frequentemente
são utilizados na defesa de um menor custo de operação que implique diminuição dos direitos
trabalhistas. O argumento econômico da flexibilização mascara a falsidade de suas premissas
em numerários exorbitantes que se tornam abstratos ante as reais necessidades humanas e se
fundamenta em falácias sobre como as liberdades clássicas, a flexibilização e a não ingerência
Estatal gera empregos e crescimento econômico.
Pretendemos demonstrar, ao longo desse estudo, que o argumento pró flexibilização não
é juridicamente válido nem cogente e, que, tampouco o argumento econômico em favor da
flexibilização sob o pretexto de redução de custos e geração de empregos se sustenta.
Os direitos trabalhistas são direitos fundamentais, que visam salvaguardar o que há de
mais precioso no homem: sua dignidade pessoal, profissional e de cidadão. Por essa razão, a
Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) constitui patamar mínimo, abaixo do qual não pode
haver, validamente, pactuação de contratação de emprego.
Para entendermos por que o argumento da flexibilização e o argumento econômico são
falaciosos, exploraremos as premissas liberais clássicas que os sustentam. Faremos, assim, uma
digressão histórica sobre o liberalismo, o trabalho e suas inter-relações. Esta digressão nos
permitirá observar nitidamente como o fracasso do caráter ultra abrangente de alguns direitos
levou ao desenvolvimento de um novo modo de produção desumano, que viabilizou um dos
piores períodos de exploração do homem pelo homem.
Esta é uma pesquisa jurídico-teórica, de caráter interdisciplinar, havendo articulação entre
a Ciência do Direito e outros ramos de estudos conexos, como a Sociologia, a Economia e a
Filosofia. Nela, nos utilizaremos das metodologias analítico-sintética, indutivo-dedutiva e
comparativa, alternadamente, sempre nos orientando pelo caminho traçado pela sociedade
ocidental.
10

Desta maneira, colocaremos em evidência a evolução e os limites do poder do Estado e


os riscos da expansão de um pensamento que prioriza o mercado, que cada vez mais avança por
campos outrora governados pela da ética e pela equidade.
Entretanto, não retomaremos argumentos reproduzidos pela doutrina marxista, que
insiste propor por solução o abandono do modelo capitalista. Compararemos estes autores a
John Rawls, filósofo norte-americano, que ofertou um modelo utópico de reinício da sociedade
pelo “véu da ignorância”, mas, que implica, inevitavelmente, formação de novas desigualdades.
A maioria dos autores marxistas compartilham a mesma utopia de Rawls, ao criticarem o
sistema capitalista como observadores externos utilizando como paradigma o sistema socialista,
idealizado por Karl Marx – o que não nos parece o mais adequado. Também criticaremos a
posição majoritária dos autores em Direito do Trabalho, que tenta estabelecer uma função
conciliatória entre a proteção trabalhista e o capitalismo – o que nos parece apenas uma
permissividade exploratória minimante ética, ao revés de uma funcionalidade progressivo-
distributiva.
Proporemos como solução ao nosso problema a crítica do observador interno, ou
partícipe, que, ciente de que, como qualquer outro modelo, seu modelo possui erros, tenta
identificá-los e corrigir suas instituições injustas (o que está errado).
Nos aproximaremos, aqui, do modelo pensado por Amartya Sen de correção das
instituições injustas para a promoção de um modelo de produção de pretensão real, concreta e
ética, que identifica suas instituições injustas e tenta corrigi-las.
No capítulo sobre a lei 13.467/2017, Reforma Trabalhista, faremos breves comentários,
sobre a maioria dos tópicos elencados no novo dispositivo legal, demonostrando que a novel
legislação é muito prejuidicial para o trabalhador, para só então explicarmos como o modelo
proposto por Amartya Sen pode se alinhar ao princípio da vedação do retrocesso como
auxiliador permanente de correções de instituições injustas, especialmente as trabalhistas.

2. TRABALHO
2.1. SENTIDO ETIMOLÓGICO DE “TRABALHO” E NOÇÕES INICIAIS

Inicialmente, cumpre estabelecer que o trabalho é algo natural ao homem. Para Hannah
Arendt, existem três atividades humanas fundamentais: (i) o labor, atividade que corresponde
ao processo biológico do corpo humano, cujos crescimento espontâneo, metabolismo e eventual
declínio têm a ver com as necessidades vitais produzidas e introduzidas pelo labor no processo
11

da vida; (ii) o trabalho1, que corresponde ao que é artificial e efêmero à condição humana
(qualquer produção / derivação do meio natural) e (iii) a ação, atividade que se exerce
diretamente entre os homens sem a mediação da matéria, corresponde à condição humana da
pluralidade2.
Não obstante Arendt considerar labor, trabalho e ação como “atividades fundamentais
porque cada uma delas corresponde a uma das condições básicas mediante as quais a vida foi
dada ao homem na Terra”3, dá sobremaneira relevância à ação, na tentativa de resgatar o que
pensa ser um verdadeiro espaço público, plural e autônomo, de deliberação e de iniciativa.
No entanto, para este estudo, consideraremos “labor” e “trabalho” como sinônimos.
Aliás, não só sinônimos, mas conditio sine qua non e conditio per quam da existência humana.
Nos aliamos, assim, a Friedrich Engels, em que “até certo ponto, podemos afirmar que o
trabalho criou o próprio homem”4.
Isso porque, para nós, respeitada a pesquisa e classificação de Arendt, consideraremos
“trabalho” não só como processo biológico (labor na classificação de Arendt), como o corpo
que trabalha, e as atividades artificiais do homem (trabalho, na supra classificação), mas,
também, como atividade intelectiva ou, nos termos de René Descartes, “pensamento”. Algo
inerente e inexorável ao trabalho.
Nos termos de Marx:

Pressupomos o trabalho numa forma em que ele diz respeito unicamente ao homem.
Uma aranha executa operações semelhantes às do tecelão, e uma abelha envergonha
muitos arquitetos com a estrutura de sua colmeia. Porém, o que desde o início
distingue o pior arquiteto da melhor abelha é o fato de que o primeiro tem a colmeia
em sua mente antes de construí-la com a cera. No final do processo de trabalho,
chega-se a um resultado que já estava presente na representação do trabalhador
no início do processo, portanto, um resultado que já existia idealmente.5

Já que o pensamento pode ser tanto natural e espontâneo como artificial e induzido,
não podemos classificá-lo, por obviedade, como processo biológico puro e simples, e como se
dá tanto na relação individualidade, como demonstrado por Descartes em sua premissa secular

1
Em alguns textos nossa utilização de labor é traduzida como “trabalho” e nossa utilização de trabalho é traduzida
como “obra” ou “fabricação”.
2
ARENDT, Hannah. A condição Humana. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2007, p. 15.
3
Ibid.
4
ENGELS, Friedrich. Sobre o papel do trabalho na transformação do macaco em homem. Tradução: UTL, Edição
eletrônica, Ed. Ridendo Castigat Mores. Disponível em: < http://www.ebooksbrasil.org/adobeebook/macaco.pdf>.
Acesso em: 07 jul. 2017, p. 4.
5
MARX, Karl. Crítica da economia política. Livro I: O processo de produção do capital. São Paulo: Boitempo,
2014, p. 327. Grifos nossos.
12

cogito ergo sum ou “penso, logo existo”6, como na interação com o meio e na interação
intersubjetiva, não podemos classificá-lo como “ação”, nos termos de Arendt. 7
Por essas razões é que colocamos o trabalho como elemento central do plano social,
pois, acreditamos ser o trabalho razão última das práticas e da (con)formação de nossa
sociedade e do próprio homem.
Assim, mister que compreendamos o conceito de trabalho, que nos dizeres de Evaristo
Moraes Filho “é assunto discutido e obscuro até hoje”8. Para isso, lançaremos mão de suas
raízes etimológicas e históricas.
O trabalho, em sua origem remota, foi concebido como um castigo e como uma dor, por
essa razão um dos termos em grego que significa trabalho πόνος origina-se do mesmo radical
da palavra pena, do latim “Poena” - grego “Poinê” (Ποινή) ou “Poines” (Ποιναί)9.
A força desta associação se justifica, na medida em que a base laborativa da estrutura
econômica grega era o trabalho escravo. Na Grécia, a condição de escravo estava ligada, por
oposição, à ideia de “ócio” – o tempo livre de que o cidadão deveria dispor para participar dos
anseios políticos-administrativos das cidades-estados – e, por origem, principalmente, à guerra
ou às dívidas, sendo a última abolida na Grécia por volta do século V a.C.
Aristóteles defendeu a tese de que a escravidão grega se baseava na “natureza humana”.
Dizia o filósofo que a “ciência política não faz homens, mas têm que aceitá-los tal como vêm
da natureza”10. E, “Desde a hora do nascimento, alguns são destinados à sujeição, e outros ao
comando”11:

6
DESCARTES, René. Discurso do Método. Tradução de Jacob Guinsburg e Bento Prado Jr. 2ª ed. São Paulo:
Abril, 1979, p. 23.
7
Os conceitos trazidos por Hanna Arendt não compreendem a ideia de pensamento, isso porque pensamento não
pode ser pura e simplesmente processo biológico, o cérebro “pensa” e trabalha de forma automática e biológica,
por exemplo quando ele quando ele controla as funções do corpo, ou induzida, sejam por fatores internos ao corpo
humano como os estados físicos e emocionais, seja pela experiência e contato com mundo exterior, como na
relação dialógica entre percepção e a interpretação que dela fazemos. Também o pensamento não pode ser
enquadrado no conceito de trabalho, pois, o trabalho, como argumentamos através da citação “5”, é o resultado do
pensamento, não se confundindo com o mesmo. Por fim, o pensamento pode se dar tanto no trato intersubjetivo,
quanto isoladamente, em filosofia isto pode ser provado pela experiência do cérebro em uma cuba, proposta por
Putnam, um argumento ceticista extremo, que aduz que só podemos ter certeza de que pensamos, logo existimos.
A este respeito, cf. Reason, Truth, and History, chapter 1, pp. 1-21 - Brains in a vat by Hilary Putnam - Cambridge
University Press (1982).
8
MORAES FILHO, Evaristo de. Introdução ao direito do trabalho. 1º vol. Rio de Janeiro: Revista Forense, 1956,
pp. 59-62.
9
Como observa Hannah Arendt “a língua grega diferencia entre poenin e ergazesthai”, segundo a classificação da
autora poenin estaria para labor, bem como ergazesthai para trabalho. Op. Cit. p. 90.
10
ARISTÓTELES, 1885. Politics. Traduzido por Jowett (1817–1893). Vol. I. London: Oxford at the Clarendon
Press. p. 10.
11
Ibid. I, p.5.
13

Porque aquele que pode prever com a mente é destinado pela natureza a ser senhor e
mestre, e aquele que só pode trabalhar com o corpo é, por natureza um escravo. O
escravo é para o mestre o que o corpo é para a mente; e como o corpo deve ser sujeito
à mente, é melhor, para todos os inferiores, ficar sob o domínio de um senhor. O
escravo é uma ferramenta dotada de vida, a ferramenta é um escravo inanimado.12

A mulher grega era, neste momento histórico, equiparada ao escravo. Para Aristóteles,
“A mulher está para o homem assim como o escravo está para o senhor, o trabalho manual para
o mental, o bárbaro para o grego. A mulher é um homem inacabado, deixada de pé num degrau
inferior da escala de desenvolvimento.”13
A grande maioria dos escravos destinava-se ao trabalho agrário, que é aquele
estritamente manual, sustentáculo das necessidades básicas de alimentação do homem. No
entanto, os escravos realizavam todo o tipo de trabalho, seja nas minas, nas oficinas, nas
residências, etc.
Ademais, ser escravo na pólis significava não poder participar da vida política, ser
excluído de parte das festividades religiosas, ser desprovido de direitos e da educação para
jovens cidadãos - em suma e em regra, restava ao escravo o trabalho manual.
Dado o viés alienador da escravidão da força produtiva, Lucien Febvre, e a maioria dos
filólogos e linguistas14, estabelecem que a origem da palavra trabalho tem como significado
“tortura – tripaliare15, torturar com o tripalium16, máquina de três pontas”17:

A quase totalidade dessas hipóteses já se encontra ultrapassada. Merece ser fixada


unicamente a primeira, assim como admitida no século passado por poucos
etimologistas. O mais credenciado é E. Littrê, que aponta trabs como a raiz originária,
lembrando igualmente que trabalhar teve o sentido de viajar, sentido que se liga ao de
pena, de fadiga. É dessa acepção que deriva o inglês to travel. A origem certa, porém,
e neste sentido se inclina a maioria dos filólogos e linguistas, é das palavras tripalium
e tripaliare.18

12
DURANT, Wil. A história da filosofia. 2ª ed. Rio de Janeiro: Record, 1996. p. 79-80.
13
Ibid. p. 81
14
Além de Febvre, podem ser lembrados, Bloch e Wartburg, Benoist e Goelzer, Larrousse, Dauzat, Grandsaignes
D´hauterive e Magne.
15
Alguns admitem que tripallium teria variado posteriormente para trepallium, sendo possível que no latim vulgar
tenha se desenvolvido o infinitivo tripaliare, depois trapaliare, superando em uso laborare e operare (OLIVEIRA,
José César de. Formação histórica do direito do trabalho. In: BARROS, Alice Monteiro (coord.). Curso de direito
do Trabalho. v. 1, 3. ed. São Paulo: LTr, 1997. p. 30).
16
Tripallium designava um instrumento feito de três paus (tres “três” + palu “pau”) aguçados, algumas vezes
munidos de pontas de ferro, usado pelos agricultores para debulhar as espigas de milho ou de trigo ou para esfiar
o linho. Foi também utilizado, dada sua estrutura, para sujeitar cavalos e controlá-los para a fixação das ferraduras
e como instrumento de tortura.
17
MORAES FILHO, Evaristo de. Introdução ao direito do trabalho. 1º vol. Rio de Janeiro: Revista Forense, 1956.
p. 59-62
18
Ibid.
14

Interessante transcrição encontrada na obra de Evaristo de Moraes Filho é a do padre


Magne, que escreveu perpetrante página sobre a etimologia da palavra trabalho, demonstrando
que, mais que indicar as origens etimológicas das palavras, é necessária a descrição, ao menos
que sumária, de sua história e evolução:

Com respeito à etimologia, é impressionante a pobreza de nossos dicionários. Sem


falarmos em fantasias mais ou menos ridículas, é de notar que, mesmo quando exata,
é apresentada em termos tão concisos ou antes enigmáticos, que praticamente torna
inútil a referência ao étimo. Nada ou bem pouco adianta à maioria dos mortais saber,
por exemplo, que êxcetra é o latim excetra, que apoiar é o latim appodiare, que
trabalhar é o latim tripalliare. Ao étimo é indispensável que o dicionário acrescente a
descrição sumária da sua história e evolução. Assim diremos quanto basta se
informarmos o latim excetra é nome de serpente de origem desconhecida; que
appodiare provém do prefixo ad - , “para”, “em direção a”, e uma derivação verbal do
substantivo neutro podium, transliteração, por sua vez, do diminutivo grego pódion
“pezinho”, aplicado a designar toda construção que serve de base e suporte,
significando, pois, apoiar, à letra, “dar suporte a alguma coisa”; que trabalhar se
prende ao neutro latim palum, fonte do português pau, através de um adjetivo tripallis,
“composto de três paus”, de que se deduziu um neutro tripallium, apenas atestado em
variante trepallium, “ecúleo”, cavalete de três paus, usado para sujeitar os cavalos no
ato de se lhes aplicar a ferradura”: desta concepção passou tripaliare, alterado por
assimilação em trapaliare, a dizer-se de toda e qualquer atividade, mesmo
intelectual.19

Paulatinamente, com a diminuição, e, hoje, boa supressão do trabalho escravo, que deixa
de ser a principal força de produção, passando a uma atividade/condição ilegal e desumana, o
conceito de trabalho vem sendo revisitado a partir de um viés utilitarista de pretensão
capitalista, que alça o trabalho a uma ação economicamente desejável e pretende funcionalizá-
lo às necessidades do capitalismo moderno, tendo em vista o homem em razão de sua
capacidade criadora.
Exemplo da mudança pode ser sentida se compararmos a concepção grega e os escritos
contemporâneos, aqui representados por Lygia Cavalcanti. O filósofo grego Aristóteles olhava
o trabalho
com desprezo do alto da filosofia, como próprio de homens sem inteligência, como
indicado apenas para escravos e como apenas preparador de homens para a
escravidão. O trabalho manual, acredita ele, entorpece e deteriora a mente, não
deixando tempo nem energia para a inteligência, para a política.20

Já para Cavalcanti,

o trabalho, como principal atividade cotidiana do homem, desperta o gosto pelo agir
não apenas em razão da contraprestação financeira, mas sobretudo para sentir-se útil,

19
MAGNE, Augusto. Dicionário da Língua Portuguêsa, Rio de Janeiro: INL, 1950. VIII–IX pp. In: MORAES
FILHO, Evaristo de. Introdução ao Direito do Trabalho. V.1. Rio de Janeiro: Forense, 1956. pp. 63-64.
20
DURANT, Wil. A história da filosofia. 2ª ed. Rio de Janeiro: Record, 1996. p. 80.
15

necessário, partícipe de uma obra que está sendo executada individualmente ou por
uma equipe.21

No segundo sentido apresentado, passa-se conceituar o trabalho como uma necessidade


vital, um exercício libertador, em seu aspecto individual e social. Assim, se justifica a assertiva
de Henri Bergson, de que: “o trabalho humano consiste em criar utilidade e, enquanto o trabalho
não está feito, não há nada, nada daquilo que se queria obter”22.
No entanto, contemporaneamente, essa concepção só atende aos vieses utilitaristas das
pretensões capitalistas. O trabalho é o que, de fato, define o ser humano. Entretanto, aquilo que
deveria servir de plataforma social e de realização de potencialidades individuais, na sociedade
capitalista, torna-se a mortificação do homem, promove seu adestramento, sua escravidão, pois
a inclusão das operações de mais valia nessas atividades e a divisão social do trabalho pelo
modelo produtivo capitalista alienam o que há de humano no trabalho.

2.2. CONCEITO E CARACTERÍSTICAS DO TRABALHO

Entendido o sentido etimológico de trabalho, passemos a sua conceituação pela


discriminação de suas características.
Neste estudo, o conceito que adotamos para trabalho (trabalho em sentido estrito ou
técnico) não se confunde com o conceito de trabalho em física (medida da energia transferida
pela aplicação de uma força ao longo de um deslocamento), nem com o conceito genérico
trabalho (como o realizado por máquinas, animais, etc.).
Para nós, então, terá validade o conceito de trabalho em sentido estrito, que consiste em
a) uma ação ou antes uma obra; b) desempenhada por seres humanos; c) que supõe determinado
dispêndio de energia; d) dirigida para um fim determinado e conscientemente desejado; e)
executada sempre mediante uma participação de energia física e de inteligência; f)
acompanhada geralmente de um auxílio instrumental; g) que de algum modo produz efeitos
sobre a condição do agente.23

21
CAVALCANTI, Lygia Maria de Godoy Batista. São Paulo: LTr, 2008. p. 22
22
BERGSON, H. L`Évoution Créative, Paris: PUF, 1948. p 297.
23
FUNDAÇÃO GETÚLIO VARGAS. Dicionário de Ciências Sociais, Rio de Janeiro, 1998. In Ferrari, I.,
Nascimento, A., Martins Filho, I. e Costa, A. História do trabalho, do direito do trabalho e da justiça do trabalho.
3 ed. São Paulo: Editora LTr, 2011. Edição Digital Kindle, posição 189-196.
16

2.3. HISTÓRIA E EVOLUÇÃO MUNDIAL

Nada obstante a nosso estudo etimológico, a origem do trabalho se confunde com o surgimento
do próprio homem, por essa razão, os paradigmas de produção do homem ao longo da história
nos servirão de base referencial para definir e orientar nossa digressão sobre a história do
trabalho.

Sendo o trabalho inseparável do homem, da pessoa humana que planeja, pensa, age e
trabalha, êle se confunde com a própria personalidade, em qualquer de suas
manifestações. Pode-se dizer dêle, como já lembrou alguém, a mesma coisa que dizia
BOSSUET da religião em seu aspecto moral: “É o todo do homem”. Identifica-se,
pois, a ciência do trabalho com a própria antropologia, isto é, com o estudo do homem,
encarado como um todo indivisível e inteiriço, como uma mônada de valor.24

Para atender às suas necessidades básicas de sobrevivência, nos primórdios, o homem


lançou mão de diversos procedimentos, isto é, de uma série de atos concatenados dirigidos ao
atendimento de suas finalidades (necessidades).
Com o decorrer do tempo, a partir de sua capacidade de racionalizar, o homem,
paulatinamente, aprimorou esses procedimentos, desenvolvendo etapas racionais e ferramentas
que lhe facilitaram a execução de tarefas - e consequentemente a vida.
Nas palavras de Ives Gandra:

Nos primórdios da humanidade, a atividade humana dirigiu-se ao extrativismo vegetal


(coleta dos frutos que a terra dava espontaneamente), seguido da caça e da pesca, com
o auxílio de instrumentos que eram fabricados especialmente para esse fim. A
revolução neolítica supôs o assentamento das populações nômades, mediante o
desenvolvimento da agricultura e da domesticação de animais (pecuária). Desde esses
primeiros tempos, o trabalho foi elemento de cooperação entre os homens, para a
consecução dos objetivos comuns. Com o aumento da complexidade das tarefas a
serem desenvolvidas, dá-se início à divisão social do trabalho, em que cada grupo
passa a se ocupar de um determinado conjunto de tarefas (mediante especialização),
conduzindo à crescente interdependência dos homens. 25

De início, todo o trabalho destinava-se às necessidades de sobrevivência do homem.


Era ele quem determinava, conforme suas necessidades e, posteriormente, as necessidades do
grupo, a duração e a intensidade de suas atividades. Podemos, entretanto, observar que, neste
primeiro momento histórico, já havia uma divisão sexual do trabalho, ou seja, tarefas distintas

24
MORAES FILHO, Evaristo de. Introdução ao Direito do Trabalho. V.1. Rio de Janeiro: Forense, 1956. p. 69.
25
MARTINS FILHO, Ives Gandra da Silva. Manual esquemático de direito e processo do trabalho. São Paulo:
Saraiva, 2016. p. 22.
17

entre homens e mulheres, mas em geral as relações de trabalho se davam de forma igual,
cooperativa. Tratava-se de uma forma rudimentar de comunitarismo, em que cada indivíduo
exercia um papel fundamental na manutenção do grupo.

O trabalho, destaca Evaristo de Moraes Filho, caracterizava-se por uma cooperação


simples, sem divisão ou profissionalização das atividades realizadas. Todos sabiam
fazer de tudo e cada um era capaz de executar a mesma operação econômica dos
outros. Às vezes, o trabalho se tornava coletivo, como, por exemplo, a caça a um
grande animal ou a remoção de um obstáculo maior, pois, nesta hipótese, o interesse
era grupal.26

Sobre o rudimentar comunitarismo, destaca Evaristo que,

Deixa o trabalho, desde os tempos primitivos, desde a formação dos primeiros grupos
humanos, de ser um esfôrço meramente individual e auto-suficiente. Todo o trabalho
humano é desde o início e por definição um fato coletivo, sendo a cooperação a sua
nota característica e essencial. Uns dependem dos outros, as tarefas se realizam através
da armação de um mosaico, fragmentário a princípio. Esta dependência pode ser direta
ou indireta, mas todos se encontram no mesmo estado de precisão de trabalho alheio,
levado a efeito em outros lugares e em outros tempos. 27

A formação dos primeiros grupos e a revolução neolítica não só culminaram, como


destacou Grandra, no desenvolvimento da agricultura e da pecuária, mas deu início a novas
formas de estocagem. Este é o fator evolutivo que nos levou ao sedentarismo e, por conseguinte,
ao aumento da complexidade dos grupos e de suas tarefas. A divisão social do trabalho e o
incremento das complexidades das relações de poder que se deram com o assentamento do
homem criaram, ainda, uma primeira noção de propriedade.
O surgimento dos diversos agrupamentos sedentários e a noção de propriedade não só
deram azo aos conflitos internos, mas a conflitos externos entre essas diferentes comunidades,
que expostas permanentemente à fome, às feras, às mais diversas moléstias e aos flagelos das
guerras, viviam em uma condição em que era praticamente impossível desenvolver quaisquer
padrões morais consistentes e minimamente compatíveis com os que caracterizam a vida nas
futuras civilizações.

26
MORAES FILHO, Evaristo. Tratado Elementar de Direito do Trabalho. Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1960.
pp. 231-234.
27
MORAES FILHO, Evaristo de. Introdução ao Direito do Trabalho. V.1. Rio de Janeiro: Forense, 1956. pp.76.
18

Em um primeiro momento, inclusive, entre os métodos pré-históricos de obtenção de


comida estava a antropofagia, que seria uma das principais causas das permanentes guerras
entre os selvagens.28
Entretanto, essas comunidades começaram a observar certas conveniências em não
matar.

a servidão escravidão29 foi possível em uma fase já avançada da economia, a partir do


momento em que os homens puderam ver a conveniência de não matar o vencido, de
não eliminar-lhe como consumidor concorrente. A servidão escravidão substituiu a
antropofagia, ao mesmo tempo em que a criação de gado substituía a caça. O devedor
insolvente, o inimigo em desgraça, o faminto, vinham unir-se ao rebanho do dono.
Nele achavam os meios de produção necessários para sobreviver.30

Assim, surge nosso segundo paradigma de produção, o escravismo.


Escravismo é a prática da escravidão como meio de produção, e a escravidão — seja no
período Antigo ou no Moderno — constitui a “desigualdade radical” por excelência31, em que
priva-se a pessoa humana de sua liberdade - sobre sua vontade, sobre o meio físico, sobre seu
trabalho e sobre seu próprio corpo - para que funcione como escravo, como uma ferramenta
para alguém.
Já a noção de escravo é definida, por oposição, à de “homem livre”, assim, “escravo”
pode ser definido como a pessoa que perdeu seus direitos sobre si, sobre seu trabalho ou sobre
sua capacidade de oferecer-se ou recusar-se ao trabalho.32 Em termos jurídicos e sociais, a
condição de escravo significa a morte do indivíduo e, consequentemente, a legitimação de seu
seu tratamento como res, coisa.
Este modo de produção apareceu em momentos diversos e de formas diversas na história
humana, faremos aqui uma simples distinção entre escravidão antiga e escravidão moderna, que
serve unicamente como referencial à nossa digressão histórica. Entretanto, ressalte-se que a

28
VALERI, R. Fome In: ROMANO, R. Enciclopédia Einaudi. Lisboa: Imprensa Nacional/Casa da Moeda, 1989.
v. 16, p. 169-190 In: GONÇALVES, José Henrique Rollo. O surgimento da escravidão: notas críticas sobre um
modelo biossociológico de explicação histórica. Revista Acta Scientiarum, 2013. Vol. 35, nº 2. pp. 237-247.
29
A leitura deve ser feita como “a escravidão”; a tradução possivelmente considerou servidão como gênero que
comporta a servidão a alguém (o que consideramos escravidão), sendo a servidão em sentido estrito aquela ligada
ao vínculo com a terra.
30
LENGELLÉ, M. Esclavitud. Barcelona, 1971. In: ROMEUF, J. (Dir.). Diccionario de ciencias económicas.
Barcelona: Labor, 1966a. p. 415-416. APUD GONÇALVES, José Henrique Rollo. O surgimento da escravidão:
notas críticas sobre um modelo biossociológico de explicação histórica. Revista Acta Scientiarum, 2013. Vol. 35,
nº 2. pp. 237-247. Grifos nossos.
31
BARROS, José D'Assunção. Escravidão Clássica e Escravidão Moderna. Desigualdade e Diferença no
pensamento Escravista: uma comparação entre os antigos e os modernos. Ágora, AVEIRO (PORTUGAL), n. 15,
pp. 171-194, out. 2012. Disponível em: <http://revistas.ua.pt/index.php/agora/article/view/2232>. Acesso em: 05
jul. 2017.
32
Ibid.
19

escravidão, de toda a sorte, é uma forma de violência extrema à dignidade da pessoa humana,
independentemente de suas formas ou possíveis abrandamentos.
A distinção clássica entre a escravidão antiga e a escravidão moderna é que a primeira
se constituiu ou como modo de dominação de vencidos nas guerras ou como forma de
pagamento pelas dívidas. A escravidão antiga era, ainda, base laborativo-econômica daquelas
sociedades, por isso a chamamos, aqui, de modo de produção. Não se tinha neste primeiro
momento a noção de superioridade racial como legitimador da escravidão, nem a incipiência
do sistema capitalista. E, justamente, estas são as grandes características da escravidão
moderna. Os antigos já tinham contato com populações fenotipicamente diversas, inclusive, as
campanhas no norte da África já os haviam colocado frente aos negros, mas sua escravidão
corria independentemente da cor da pele do homem.
Antes, porém, de adentrarmos à escravidão moderna, é necessário que perpassemos,
brevemente, pelo seu sistema de transição, a servidão, modelo de produção utilizado nas
sociedades pré-modernas ou feudais.33
Instituto fundamental do feudalismo, a servidão tem sua origem associada ao instituto
romano chamado “colonato”, uma forma de trabalho compulsório onde o colono arrenda uma
porção de terra sob a condição de assegurar parte de sua produção ao pagamento do proprietário
e parte a sua subsistência. Em Roma, o colonato fora implementado por volta do século III, por
conta da escassez da mão de obra escrava. Grandes proprietários arrendavam faixas de terras a
pessoas pobres e alguns escravos eram convertidos à condição de colono, porque seus
proprietários não mais podiam “sustentá-los”.
O trabalho servil era uma derivação do trabalho escravo mudando apenas o eixo do
domínio, eis que enquanto no trabalho escravo era o senhor seu dono, no trabalho servil, o
trabalhador era o servo da gleba34.
O panorama de crise do império romano paulatinamente se agrava, de modo que a lógica
dos colonatos se repete e vêm a substituir e subverter a regra da escravidão. Esse processo, nos

33
Importante destacar que na América Latina tais formas de controle do trabalho não emergiram nesta sequência
histórica unilinear. A escravidão foi estabelecida como mercadoria para produzir para o mercado mundial,
simultaneamente com a servidão indígena e a produção mercantil independente. Assim, todas essas formas de
trabalho na América Latina não só atuavam concomitantemente, mas também foram todas articuladas em torno do
eixo do capital e do mercado mundial. Além de serem simultâneas, tais formas de trabalho na América Latina
foram associadas à ideia de raça para outorgar legitimidade às relações de dominação entre colonizador e
colonizado, assim como para a naturalização das funções superiores e inferiores na divisão do trabalho. Desse
modo, impôs-se uma sistemática divisão racial do trabalho, em que índios foram confinados na estrutura da
servidão e os negros foram reduzidos à escravidão. Os espanhóis e os portugueses, como raça branca dominante,
podiam receber salários, ser comerciantes, artesãos e agricultores independentes
34
Ferrari, I., Nascimento, A., Martins Filho, I. and Costa, A. (2011). História do trabalho, do direito do trabalho e
da justiça do trabalho. 3rd ed. São Paulo: Editora LTr. Edição Digital Kindle, posição 634.
20

leva à predominância da servidão desde esta época até todo o período conhecido como
feudalismo.
A partir do século XV, as expansões marítimas e o mercantilismo reaquecem a
economia mundial, que volta a se valer dos escravos. Entretanto, as sucessivas condenações
desta prática pela Igreja Católica limitavam cada vez mais os grupos de pessoas a quem se podia
escravizar:
Nas diversas épocas da história, sempre os pensadores da Igreja abordaram a questão
social com um alto espírito de humanidade e, em todos eles, quer em Santo Agostinho,
São Gregório Magno ou São Tomás, as doutrinas expostas continham valiosos
ensinamentos. Se a encíclica do Papa Leão XIII, conhecida com o nome ‘Rerum
Novarum’, marca o ponto culminante da participação da Igreja na solução do
problema social, é certo, entretanto, que em todo o século XIX, através das figuras
mais representativas, o catolicismo cuidou do interesse do proletariado.35 36

Foi só com a eclosão da Revolução Francesa, do Iluminismo, do Constitucionalismo,


com a propulsão dos ideais liberais de igualdade e liberdade, em que a escravidão foi
considerada uma violenta coerção da liberdade individual, e com as teses de Adam Smith, que
incorporadas ao liberalismo político, demonstravam que o custo benefício de um escravo é
menor que o de um trabalhador assalariado, que a escravidão foi paulatinamente desestruturada.

De acordo com Adam Smith, os encargos com o escravo são mais dispendiosos que
os com o servo livre, posto que enquanto aquele é administrado por um “patrão
negligente ou um capataz desleixado”, este se auto-administra. Assim sendo, “os
desregramentos que geralmente se verificam na administração dos ricos, introduzem-
se na gestão dos primeiros; a estrita frugalidade e parcimônia dos pobres refletem-se
de modo igualmente natural nos segundos”.37Ao comparar os diferentes graus de
despesas com trabalhadores livres e escravos, Adam Smith concluiu que a
“experiência de todas as épocas (mostra que é) mais barato o trabalho realizado por
homens livres que o realizado por escravos”. A abrangência desta conclusão é de tal
ordem que assume o caráter de um princípio, adequado a qualquer circunstância
histórica, que contém a primeira objeção de Adam Smith à escravidão; sua enunciação
é bastante clara: em consequência da maneira pela qual é administrado, onde quer que
o trabalho escravo seja empregado, ele é mais caro que o trabalho livre. 38

O gradual desmonte da escravidão moderna, faz com que o trabalhado assalariado ganhe
destaque no mercado de força de trabalho e propulsiona o sistema que predomina até os dias de

35
SEGADAS VIANA, José de et al. Instituições de direito do trabalho. São Paulo: LTr, 1999. pp. 97-98.
36
Há divergência quanto à efetiva participação da Igreja Católica neste processo, entretanto esta é a posição
majoritariamente adotada dentro de nosso referencial teórico, talvez pela grande influência que a doutrina católica
exerceu no mundo ocidental.
37
Adam Smith - Riqueza das Nações (1776). Lisboa, Fundação Calouste Gulbekian, 1981, v.1, p. 199. In:
ROCHA, Antonio Penalves. A Escravidão em "A Riqueza das Nações" de Adam Smith. CLIO: Revista de
Pesquisa Histórica, Pernambuco, v. 1, n. 14, pp. 173-185, jul. 1993. Disponível em:
<http://www.revista.ufpe.br/revistaclio/index.php/revista/article/viewFile/829/677>. Acesso em: 05 jul. 2017.
38
ROCHA, Antonio Penalves. A Escravidão em "A Riqueza das Nações" de Adam Smith. CLIO: Revista de
Pesquisa Histórica, Pernambuco, v. 1, n. 14, pp. 173-185, jul. 1993. Disponível em:
<http://www.revista.ufpe.br/revistaclio/index.php/revista/article/viewFile/829/677>. Acesso em: 05 jul. 2017.
21

hoje, o capitalismo, com a nova lógica de circulação de capitais e a formação de um amplo


mercado de consumo.

2.4. O CAPITALISMO E A ERA DAS REVOLUÇÕES

O capitalismo, em seu processo incipiente, não conhecia a industrialização e, tampouco,


a formação dos grandes centros urbanos. A economia, neste primeiro momento, era
essencialmente movimentada pelas trocas comerciais, onde buscava-se a manutenção de uma
“balança comercial favorável” por meio do acúmulo de matérias primas, especiarias, metais
preciosos (metalismo) e a exploração marítima de novas rotas para a diminuição dos custos.
Por essa razão, no período estimado entre o século XVI e meados do século XVIII a forma de
acumulação de riquezas foi designada por Capitalismo Comercial ou Capitalismo Mercantil.
Historicamente, entretanto, este modelo econômico foi denominado “Mercantilismo”.
Suas principais características, além das supramencionadas, são o fortalecimento dos Estados
Nacionais e a massiva intervenção estatal na economia.
O papel do Estado era assegurar a acumulação de lucros por parte da burguesia e da
aristocracia, bem como disputar os mercados internacionais e o melhor acesso a matérias-
primas.
Ao final do século XVIII, a conhecida “era das revoluções” altera este cenário. Se antes
os Estados Nacionais buscavam centralizar o poder, o fortalecimento da burguesia e da
aristocracia fizeram ruir a centralização, e a estabilização do poder nas mãos da burguesia
desloca a economia para as principais atividades desenvolvidas por esta classe: o comércio e a
indústria.
A nobreza e o clero, embora detivessem poder e os privilégios sociais, constituíam
apenas 2% da população. Viviam, portanto, da riqueza que era produzida pela burguesia.
Assim, em um cenário de crises e transformações na Europa dos séculos XVII e XVIII,
o capitalismo comercial ou mercantil se viu estimulado por razões tecnológicas, econômicas,
sociais e políticas, como a Revolução Inglesa (1640 a 1660) e a Revolução Francesa (1789 a
1799).
A princípio, a introdução da maquinaria foi muito gradual. Realizaram-se melhorias
na construção dos teares e produção de tecidos aumentou. O passo vital foi o
aperfeiçoamento da máquina a vapor, que forneceu fonte de energia ilimitada para
impulsionar as máquinas das oficinas que surgiram em grande número. A maneira
mais eficiente de produzir vapor era por meio de caldeiras a carvão. Assim, houve um
grande desenvolvimento da mineração de carvão, muitas vezes em circunstâncias
22

extraordinariamente árduas e revoltantes. Na verdade, do ponto de vista humano, os


primeiros dias do industrialismo foram um período medonho. 39

Em meados do século XVIII, na Inglaterra, a consolidação das grandes propriedades e


o domínio político dos grandes proprietários deram início aos enclosure acts, em que os grandes
proprietários, valendo-se de seu poder junto ao Parlamento Inglês e aos Juízes de Paz, deram
azo a uma redistribuição de terras em seu favor.
Assim, a eles foram atribuídas as melhores porções de terra e aos camponeses ingleses
foi distribuído o campesino marginal, a terra pobre e distante das estradas ou do abastecimento
de águas. Com o acesso à terra sistematicamente negado, restaram a eles três alternativas
básicas: (a) trabalhar de forma servil na agricultura latifundiária; (b) imigração para as colônias
inglesas; ou, (c) êxodo rural, isto é, despejar-se para os centros urbanos já lotados, onde a grande
oferta de empregados empurraria os salários para baixo e causaria grande competição.

Os cercamentos criaram uma nova organização de classes. O, então, camponês, com


seus direitos e status, que participava da sorte e do governo do vilarejo, em trapos,
mas de pé, abre caminho para o trabalhador, sem corporações para defender seus
direitos, sem qualquer instituição para invocar em seu favor, sem propriedade para
cuidar, sem ambição a perseguir, curvando-se por medo de seus mestres, com o peso
de um futuro sem esperança. Nenhuma classe, na história do mundo, foi tão castigada
e submissa40.41

Na agricultura, as relações de vassalagem foram substituídas pelo trabalho assalariado,


que transformou a mão-de-obra em mercadoria e iniciou uma nova classe social: o proletariado.

Somente algumas áreas levaram o desenvolvimento agrário mais adiante, rumo a uma
agricultura puramente capitalista. A Inglaterra era a principal delas. Lá a propriedade
de terras era extremamente concentrada, mas o agricultor típico era o arrendatário com
um empreendimento comercial médio, operado por mão-de-obra contratada. Uma
grande quantidade de pequenos proprietários, aldeões, etc. ainda obscurecia esse fato.
Mas quando tudo se tornou claro, aproximadamente entre 1760 e 1830, o que apareceu
não foi uma agricultura camponesa, mas sim uma classe de empresários agrícolas, os
fazendeiros, e um enorme proletariado rural.42

39
RUSSELL, Bertrand, 1872-1970. História do pensamento ocidental. Tradução Laura Alves e Aurélio Rebello.
Rio de Janeiro: Nova Fronteira. 2013. p. 404.
40
The enclosures created a new organization of classes. The peasant with rights and a status, with a share in the
fortunes and government of his village, standing in rags, but standing on his feet, makes way for the labourer with
no corporate rights to defend, no corporate power to invoke, no property to cherish, no ambition to pursue, bent
beneath the fear of his masters, and the weight of a future without hope. No class in the world has so beaten and
crouching a history
41
HAMMOND, J. L. and HAMMOND, Barbara. The Village Labourer. London: Longmans, Green and Co., 1920.
p. 81, tradução nossa.
42
HOBSBAWM, Eric J. A Era das revoluções: Europa 1789-1848. São Paulo: Paz e Terra S.A., 1997. p. 33.
23

A política de cercamentos, o êxodo rural e nova conformação social inglesa, em que o


superávit de mão de obra urbana dá impulso à uma rápida expansão de sua planta industrial,
colocaram a Inglaterra em posição hegemônica durante todo o século XVIII.

Qualquer que fosse seu status, as atividades comerciais e manufatureiras floresciam


de forma exuberante. O Estado mais bem-sucedido da Europa no século XVIII, a Grã-
Bretanha, devia plenamente seu poderio ao progresso econômico, e por volta da
década de 1780 todos os governos continentais com qualquer pretensão a uma política
racional estavam conseqüentemente fomentando o crescimento econômico, e
especialmente o desenvolvimento industrial, embora com sucesso muito variável.43

As cidades começam a ter maior concentração populacional que os campos e o modelo


de produção que passa a predominar é o capitalismo industrial que, impulsionado pelos ideais
liberais econômicos, faz com que os Estados Nacionais absolutistas comecem a ruir e ceder seu
lugar ao Estado Liberal, nosso primeiro paradigma de Estado de Direito, em que os governantes
e o próprio Estado conhecem a limitação de seu poder. Nas palavras de Goetz Briefs:

O capitalismo empenhou-se em uma grande aventura social quando associou a


liberdade cívica e autonomia jurídica do homem que trabalha à condição de não-
proprietário, que é a das massas operárias, que crescem de forma incessante. Antes da
era pré-capitalista, nenhum sistema econômico tinha ousado nada semelhante. Nos
sistemas anteriores, ou havia associação do trabalho e da propriedade – neste caso o
trabalhador gozava de liberdade cívica -, ou o trabalhador não era proprietário, mas
então não era também um cidadão livre. A alternativa era bem clara na era pré-
capitalista. Mas o capitalismo empreendeu grande aventura ao associar, nas massas
de homens sempre crescentes, a ausência de propriedade a uma completa liberdade
pessoal e uma completa igualdade política.44 45

O Estado Liberal é uma forma de Estado de Direito estruturado a partir das teses
políticas e econômicas liberais clássicas, uma tentativa de limitação da intervenção estatal na
vida privada, que preconizava grande abrangência às liberdades individuais, à propriedade
privada, à ordem espontânea através do livre mercado (laissez faire, laissez aller, laissez passer)
e à igualdade formal, ou negativa. Esta configuração, ou paradigma, de Estado, eleva o sentido
jurídico destas liberdades negativas e do contrato, manifesto absoluto da “legítima” vontade das
partes, que são, não obstante suas diferenças de fato, tratadas como iguais em condição e
capacidade.

43
HOBSBAWM, Eric J. A Era das revoluções: Europa 1789-1848. São Paulo: Paz e Terra S.A., 1997. p. 36.
44
BRIEFS, Goetz. Le Prolétariat Industriel, trad. Yves Simon. Paris: Desclée de Brouwer et Cie (La Lumière
ouvrière), 1936. pp. 2-3.
45
Observe-se a tradução foi infeliz quanto a verdadeira amplitude das palavras, já que por “completa liberdade
pessoal” e “completa igualdade política”, no contexto do Estado Liberal, quer-se referir à liberdade e igualdade no
sentido liberal clássico, ou seja liberdade individual e igualdade formal.
24

Do prisma jurídico, o Estado liberal preconizou também a liberdade formal,


decorrendo, por tanto, a máxima valorização do contrato, expressão própria da
autonomia da vontade, com regulação dos interesses particulares segundo
consentimento próprio dos obrigados. Todavia, do aprofundamento das práticas
liberais e o consequente agravamento das condições de exploração do trabalho,
emergiu a consciência coletiva obreira, com a coordenação das ações reivindicativas
de progresso das condições sociais. 46

Passemos, então, a um estudo mais aprofundado do Liberalismo e do Estado Liberal.

3. LIBERALISMO

O processo de transformação industrial das sociedades ocidentais, especialmente na


Europa, com a transição para o trabalho assalariado e para o modo capitalista de produção, já
fazia da subcontratação uma prática comum.47 No cenário pós Revolução Industrial, o trabalho
nas fábricas era realizado sob condição de semiescravidão. Mulheres e crianças eram
participantes ativos de uma rotina de jornadas de trabalho superiores a 15 horas por dia, salários
miseráveis, ambientes insalubres e a pressão de supervisores que exigiam produção e
produtividade.

A duração da jornada de trabalho varia de acordo com o tipo de fábrica e a depender


da localidade. Em Mulhouse, Dornach, uma fábrica de fiação e tecelagem geralmente
abre às 5hs da manhã e encerra suas atividades entre as 8 e 9 da noite. No inverno, a
entrada é frequentemente adiada até o dia, mas os trabalhadores não ganham nem um
minuto a mais de trabalho por isso. Nesse período eles têm meia hora para almoço e
uma hora para o jantar; esse é todo o intervalo que lhes é dado. Dessa forma, eles
jamais trabalham menos de treze horas e meia por dia.48 49

Essa condição se espalhou por toda a Europa e se deve a um momento de total


implemento do pensamento liberal econômico e da teoria smithiana de auto regulação do
mercado. As populações rurais que migraram para as cidades aumentaram sobremaneira a

46
REIS, Daniela Muradas. O princípio da vedação do retrocesso no direito do trabalho. São Paulo: LTr, 2010. p.
26.
47
THÉBAUD-MONY, Annie; DRUCK, Graça. Terceirização: A erosão dos direitos dos trabalhadores na França
e no Brasil. In: DRUKE, Graça; FRANCO, Tânia (Org.). A perda da razão social do trabalho. São Paulo:
Boitempo, 2012. cap. 2. p. 23-58.
48
La durée journalière du travail varie selon l'espèce de manufactures et même un peu selon les localités.À
Mulhouse, à Dornach, etc., les filatures et les tissages mécaniques s'ouvrent généralement le matin à cinq heures,
et se ferment le soir à huit, quelquefois à neuf. En hiver, l'entrée en est fréquemment retardée jusqu'au jour, mais
les ouvriers n'y gagnent pas pour cela une minute. Ainsi, leur journée est au moins de quinze heures. Sur ce temps,
ils ont une demiheure pour le déjeuner et une heure pour le dîner; c'est là tout le repos qu'on leur accorde. Par
conséquent, ils ne fournissent jamais moins de treize heures et demie de travail par jour.
49
VILLERMÉ, Louis-René. Tableau de l’état physique et moral des ouvriers employés dans les manufactures de
coton, de laine et de soie. Textes choisis et présentés par Yves TYL. Paris: Union générale d'Éditions, 1971, p. 32
Collection: 10-18, n° 582, tradução nossa.
25

oferta de mão de obra, o que reduziu seu valor e possibilitou um dos períodos de maior
precariedade, na verdade, um dos maiores períodos de exploração do homem pelo homem.
Na ânsia de lucrar por lucrar, num mundo onde as coisas ficam defasadas muito
rapidamente, o industrial acaba gerando, em direção diametralmente oposta, um excedente de
produtos, uma superprodução, que não será plenamente absorvida pelo mercado e dá origem a
uma nova crise, agora generalizada.

Trabalhem, trabalhem, proletários, para aumentar a fortuna social e as vossas misérias


individuais, trabalhem, trabalhem, para que, tornando-vos mais pobres, tenham mais
razão para trabalhar e para serem miseráveis. Eis a lei inexorável da produção
capitalista. Porque, ao prestarem atenção, às insidiosas palavras dos economistas, os
proletários se entregaram de corpo e alma ao vício do trabalho, precipitam toda a
sociedade numa destas crises de superprodução que convulsionam o organismo social.
Então, porque há superabundância de mercadorias e penúrias de compradores, as
oficinas encerram e a fome fustiga as populações operárias com o seu chicote com mil
loro. Os proletários, embrutecidos pelo dogma do trabalho, não compreendem que é
o supertrabalho que infligiram a si próprios durante o tempo da pretensa prosperidade
a causa da sua miséria presente, em vez de correrem ao celeiro de trigo e de gritarem:
“Temos fome e queremos comer!... Sim, não temos nem uma moeda, mas, pobres
como estamos, fomos nós quem ceifou o trigo e vindimou a uva...” — Em vez de
cercarem os armazéns do Sr. Bonnet de Jujureux, o inventor dos conventos industriais,
e de clamar: “Sr. Bonnet, aqui estão as vossas operárias ovalistas (operárias que
tornam as sedas ovais), moulineuses (operárias que fiam e torcem mecanicamente os
fios de seda crua), fiandeiras, tecedeiras, elas tremem de frio nos seus tecidos de
algodão passajados de modo a condoer os olhos de um judeu e, no entanto, foram elas
que fiaram e teceram os vestidos de seda das cocotes de toda a cristandade. As
desgraçadas, trabalhando treze horas por dia, não tinham tempo de pensar na
“toilette”, agora, elas estão desempregadas e podem ostentar um grande luxo com as
sedas que trabalharam. Mal perderam os dentes de leite, dedicaram-se à sua fortuna e
viveram na abstinência; agora elas têm tempos de lazer e querem gozar um pouco dos
frutos do seu trabalho. Vamos, Sr. Bonnet, entregue as suas sedas, o Sr. Harmel
fornecerá as suas musselinas, o Sr. Pouyer-Quertier os seus paninhos, o Sr. Pinet as
suas botinas para os seus queridos pezinhos frios e úmidos... Vestidas dos pés à
cabeça, dar-vos-á prazer contemplá-las. Vamos, nada de hesitações — o Sr. É amigo
da humanidade, não é verdade? E cristão ainda por cima! — Ponha a disposição das
suas operárias a fortuna que estas lhe construíram com a carne da sua carne. — É
amigo do comércio? — Facilite a circulação das mercadorias; eis consumidores
acabados de encontrar; abra-lhes créditos ilimitados. É obrigado a fazê-lo a
negociantes que não conhece de parte nenhuma, que não lhe deram nada, nem sequer
um copo de água. As suas operárias pagarão como puderem: se, no dia do vencimento,
elas fogem e deixam protestar a letra, levá-las-á à falência e, se elas não tiverem nada
para penhorar, exigirá que elas lhe paguem em orações: elas enviá-lo-ão ao paraíso,
melhor do que os seus sacos negros com o nariz cheio de tabaco.”50

E aqui, neste momento, alcançamos o Direito do Trabalho, que surge como uma
tentativa de amenização deste terrível problema, que coloca em perigo a paz social e vida das
pessoas. O Direito do Trabalho busca amenizar a submissão extrema do trabalho ao capital. No
entanto, ao mesmo tempo, o Direito do Trabalho efetua uma conciliação entre trabalho e capital,

50
LAFARGUE, Paul. O Direito à Preguiça e Outros Textos. Lisboa: Estampa/São Paulo: Mandacaru, 1977. pp.
26-27.
26

ao legitimar juridicamente o modo de prestação laboral capitalista e sua expansão mediante a


generalização do contrato de trabalho.
Assim, o Direito do Trabalho começa a aparecer em normas esparsas e posteriormente
se assentará nas Constituições de alguns países. O que nos importa saber, neste momento, é que
os direitos trabalhistas são direitos sociais, que surgem das lutas proletárias, que se
desenrolaram durante todo o século XIX, e que vão inaugurar nosso segundo paradigma de
Estado de Direito, o paradigma do Estado Social.

Os ludistas, os cartistas, na Inglaterra; as revoluções de 1848 e 1871, na França; a


revolução, de 1848, na Alemanha, representaram muito no despertar do Estado para a
intervenção e regulação do Estado na vida econômica. Não se limitavam mais os
operários a assistir de braços cruzados à sua própria desagregação e ao seu extermínio
biológico e econômico. Reuniam-se, protestavam, reivindicavam. E dessas
reinvindicações, dessas agitações sociais, ressentia-se todo o corpo social, com
prejuízo para a produção capitalista. Era preciso dar côbro a tal situação. Como?
Tornando menos injustas as relações entre empregados e empregadores.51

Ressalte-se também inegável influência do socialismo científico ou Marxismo neste


processo, especialmente após a publicação do Manifesto Comunista, de 1848, que deu forma a
uma crítica profunda das condições de trabalho existentes na Europa.
O embate entre as teorias liberais clássicas e as socialistas polarizaram a discussão sobre
os limites da intervenção estatal, colocando em lados opostos “liberais” e “socialistas”.
Mas, será que não há uma alternativa à essa polarização? Um pensamento que se
constitua como meio termo relativo, e componha adequadamente os anseios capitalistas e os
direitos sociais?
Pretendemos demonstrar que há uma alternativa possível entre estes extremos para
compor a conquista de direitos trabalhistas, a vedação do retrocesso e a ampliação de direitos
trabalhistas com o crescimento e o lucro, que passará a atender a uma função social.
Nossa proposta pretende se exsurgir de uma grande confusão associada a palavra
“liberalismo”. Assim, importante esclarecer, desde já, que após John Locke houve uma cisão
do núcleo normativo do termo, que originou correntes políticas de diferentes lados do espectro
político e econômico e que não devem ser confundidas.
Há liberais como Friedrich von Hayek, reconhecido como o fundador do neoliberalismo
econômico, que defendem a liberdade individual de modo intransigente na questão do campo
econômico contra ingerências do poder estatal.

51
MORAES FILHO, Evaristo de. Introdução ao direito do trabalho. 1º vol. Rio de Janeiro: Revista Forense, 1956.
p. 346.
27

A esta vertente afiliam-se os liberais clássicos, aos quais os autores de Direito do


Trabalho usualmente se referem ao usar os termos “liberal” e “liberalismo”.
Entretanto, há também liberais como John Rawls e Amartya Sen que não defendem uma
“doutrina abrangente” por parte do Estado que oriente a vida intelectual, moral ou religiosa do
indivíduo. Designamos a perspectiva desse segundo grupo de liberalismo igualitarista, porque
defende-se a liberdade do indivíduo nas hipóteses em que minorias podem ser desrespeitadas
ou violadas por uma maioria – justamente o que ocorreu em nosso primeiro paradigma de
Estado. E o mais importante e menos compreendido no debate filosófico-jurídico
contemporâneo é que esta corrente aceita a ingerência do poder estatal para a realização da
justiça no âmbito socioeconômico.
Neste sentido, pretendemos contrapor essas duas ideias. A primeira, como um ideal que
deve ser rechaçado, sob pena de permitirmos um novo período tendente à exploração do homem
pelo homem, sob o pretexto de crise econômica, que não pode servir de justificativa para a
destruição de direitos sociais.
A segunda, como um modo de pensar socialmente desejável, em que o indivíduo é visto
em seu viés humano, em que seja possível a conciliação entre mercado e ética, para que a
atividade econômica atenda a uma função social, nomeadamente, a de promover
desenvolvimento social global e a diminuição de desigualdades, e não o acúmulo de capital
como fim em si mesmo.
Como dissemos, o termo “liberalismo” remota ao pensamento de John Locke (1632-
1704) e desenvolveu-se em duas vertentes antagônicas e necessariamente excludentes. Por um
lado, evoluiu como um meio de defesa da liberdade individual de modo intransigente frente à
soberania estatal, em outro, passou a caracterizar um pensamento que preconiza a justiça social
e a liberdade de cada indivíduo quando minorias podem ser violadas ou desrespeitadas
por uma maioria. A análise deste antagonismo que permeia o termo “liberalismo” não só nos
possibilitará evidenciar todo o desenvolvimento da sociedade ocidental, mas, também,
permitirá observar, nitidamente, como o fracasso do caráter absoluto de alguns direitos (direitos
liberais clássicos ou direitos de 1ª geração) levou ao desenvolvimento de um novo modo de
pensar a sociedade e a relação entre o Estado e cidadãos, na qual o princípio da igualdade
transcende sua negatividade para constituir-se como escudo das minorias.
Os direitos sociais, e especialmente, os direitos trabalhistas, devem ser preservados de
forma a se evitar àquela barbárie que, no âmbito laborativo pós revolução industrial, foi
responsável por um dos piores períodos de exploração do homem pelo homem vistos em nossa
sociedade.
28

Em toda a Europa a exploração do trabalho se verificou de forma excessiva,


desumana, como regra geral. O contratante estabelecia a duração de jornada e a
remuneração pelo trabalho, sem que houvesse a possibilidade de questionamento pelo
trabalhador. Era comum a exploração do trabalho de homens, mulheres e crianças,
estas a partir de 4 (quatro!!!) anos de idade, durante jornadas de 14, 16, 18 horas.52

As ideias liberais clássicas e as teses sociais devem encontrar um equilíbrio que preserve
as conquistas sociais que se consolidaram historicamente e carregam o peso do sangue de tantos
indivíduos, que sofreram ante aos anseios capitalistas. Temos a responsabilidade jurídica e
humana de pôr às claras as premissas de um capitalismo selvagem, que busca o lucro pelo lucro,
e rechaçá-las. Para isso, devemos dar maior valor normativo ao princípio da dignidade da pessoa
humana, que sempre deve ser observado para estabelecermos um standart, ou seja, o que é o
mínimo para a preservação de uma vida humana digna. Para isso, será necessário, inclusive,
dividir-se a responsabilidade social pelas crises mundiais também com os ricos. Se nenhuma
nação sujeitar a dignidade de seus cidadãos aos anseios precarizantes do capitalista, não haverá
oferta de trabalho precário, de trabalho indigno.
Como bem observa Hobsbawn,

o desenvolvimento urbano foi um gigantesco processo de segregação de classes, que


empurrava os novos trabalhadores pobres para as grandes concentrações de miséria
alijadas dos centros de governo e dos negócios, e das novas áreas residenciais da
burguesia. A divisão das grandes cidades européias, de caráter quase universal, em
zonas ricas localizadas a oeste e zonas pobres localizadas a leste se desenvolveu nesse
período. E que instituições sociais, exceto a taverna e talvez a capela, foram criadas
nestas novas aglomerações de trabalhadores, a não ser pela própria iniciativa dos
trabalhadores? Só depois de 1848, quando as novas epidemias nascidas nos cortiços
começaram a matar também os ricos, e as massas desesperadas que aí cresciam tinham
assustado os poderosos com a revolução social, foram tomadas providências para um
aperfeiçoamento e uma revolução urbana sistemática.53

Só ao imputarmos responsabilidade pela miséria social aos ricos, mudaremos as


condições dos pobres. É necessário que criemos mecanismos que impeçam a segregação física
entre ricos e pobres, no âmbito nacional e internacional. Afinal, o que se distancia de nossas
vistas pouco nos sensibiliza.

52
ALVES, Amauri Cesar. Direito do trabalho essencial: doutrina, legislação, jurisprudência, exercícios. 1. ed. São
Paulo: LTr, 2012. p. 22.
53
HOBSBAWM, Eric J. A Era das revoluções: Europa 1789-1848. São Paulo: Paz e Terra S.A., 1997. pp. 224-
225.
29

Todo nosso discurso perpassa a questão da justiça distributiva e a obrigação ou não


que os Estados têm de promovê-la. Para melhor compreendermos essa obrigação, voltemos ao
estudo do liberalismo, começando com Locke, precursor do liberalismo político.

3.1. JOHN LOCKE

John Locke, quando começou a se interessar por questões políticas, defendera a


necessidade de uma estrutura governamental centralizada que impedisse a desordem no interior
da sociedade. Uma visão conservadora e autoritária que se estendia também no que tange à
religiosidade – intervenção do monarca nas opções religiosas de seus súditos. Entretanto, suas
opiniões, paulatinamente, se modificaram à medida em que Locke se aprofundou na filosofia,
e uma mudança mais radical pôde ser observada quando debateu sobre a justificação do direito
divino dos reis.
Em 1689, publicou a obra em que efetivamente trata do assunto, Dois Tratados Sobre
Governo, inaugurando um novo modo de pensar que fixava as bases do que foi conhecido e
reconhecido como liberalismo político. Por conseguinte, estabeleceu um sistema que criou as
condições para a conciliação da liberdade dos cidadãos com a manutenção da ordem política.

No primeiro tratado, refutou a doutrina do direito divino dos reis e do absolutismo régio
tal como apresentada no livro de Robert Filmer, Patriarcha. No segundo, desenvolveu as
teorias que se consolidaram como base da filosofia política e social durante gerações. Locke é,
por isso, marco da tradição que hoje conhecemos por liberalismo, e forneceu a tríade de direitos
individuais centralmente basilares a essa corrente: Liberdade, Igualdade e Propriedade.
Da tensão essencial e do espectro de abrangência desses três direitos surgem os vários
tipos de liberalismo. E, a partir desse ponto, trataremos o liberalismo segundo essa tríade.

3.1.2. PROPRIEDADE

Partindo da premissa de que o homem é seu próprio proprietário, Locke conclui que
aquilo que o homem trabalhou é também sua propriedade. Mais especificamente, o fundamento
da propriedade está no próprio homem, em sua capacidade de transformar em seu benefício o
mundo externo com sua energia pessoal (trabalho).
30

o trabalho de seu corpo e a obra produzida por suas mãos são propriedade sua. Sempre
que ele tira um objeto do estado em que a natureza o colocou e deixou, mistura nisso
o seu trabalho e a isso acrescenta algo que lhe pertence, por isso o tornando sua
propriedade. Ao remover este objeto do estado comum em que a natureza o colocou,
através do seu trabalho adiciona-lhe algo que excluiu o direito comum dos outros
homens. Sendo este trabalho uma propriedade inquestionável do trabalhador, nenhum
homem, exceto ele, pode ter o direito ao que o trabalho lhe acrescentou, pelo menos
quando o que resta é suficiente aos outros, em quantidade e em qualidade.54 O
trabalho, então, cria a propriedade, e o mesmo princípio se aplica à terra e aos bens
móveis; a terra se torna propriedade de um homem quando ele a cercou e a cultivou.
Além disso, o trabalho “estabelece a diferença de valor em tudo”: a diferença no valor
entre um acre de terra cultivada e um acre “em comum e sem qualquer cultivo” é
devida quase inteiramente à melhoria realizada pelo trabalho.55

O argumento de Locke é digno de objeções, já que o ponto que lhe preocupava era
propriedade no “estado de natureza”. O homem primitivo poderia apropriar-se da forma descrita
por Locke, mas isso não estabelece um direito de propriedade. O cerne do conceito de
propriedade aqui é que ela é um direito natural, ou seja, já existia no estado de natureza. Para
Locke a natureza é um “bem comum” e o trabalho causa seu fracionamento para o desígnio de
um bem particular, de uma propriedade. Assim, tratava-se de um direito absoluto e oponível a
todos os homens, que deveria ser garantido contra a expropriação arbitrária, seja de qualquer
outro homem, seja do soberano (ao contrário do que era defendido por Thomas Hobbes).

3.1.3. LIBERDADE E IGUALDADE

Quanto à liberdade e à igualdade, Locke defende a tese de que os seres humanos são
naturalmente livres e iguais. A igualdade deriva de todos sermos filhos de um mesmo criador e
a liberdade não se trata de um bem outorgado, mas decorrente de sua relação com o poder.
À medida que se amplia o poder de um indivíduo, diminui-se a liberdade de outros. Ou
seja, todos são iguais na condição em que ninguém se sujeita a qualquer poder e jurisdição, sem
subordinação ou sujeição56. Desse modo, na ausência de governo reinam a liberdade e a
igualdade, pois a lei da natureza é extensiva a todos os seres humanos.
Somente quando se deixa de observar esta lei, a saber, quando os homens comportam-
se contra os próprios “ditames da razão”, violam-se igualdade e liberdade.

54
LOCK, John, 1632-1704. Segundo tratado sobre o governo civil: ensaio sobre a origem, os limites e os fins
verdadeiros do governo civil / John Locke; introdução de J.W. Gough; tradução de Magda Lopes e Marisa Lobo
da Costa. – Petrópolis, RJ: Vozes, 1994. p. 98. – (Coleção clássicos do pensamento político).
55
LOCK, John, 1632-1704. Segundo tratado sobre o governo civil: ensaio sobre a origem, os limites e os fins
verdadeiros do governo civil / John Locke; introdução de J.W. Gough; tradução de Magda Lopes e Marisa Lobo
da Costa. – Petrópolis, RJ: Vozes, 1994. p.19. – (Coleção clássicos do pensamento político).
56
Ibid. p. 83.
31

Assim, para Locke, o “estado de natureza” é a condição em que reina a liberdade e a


igualdade e não, como entendia Hobbes, guerra de todos contra todos. Portanto, liberdade e
igualdade são expressos sob a forma de direitos individuais básicos inalienáveis e invioláveis
derivados do direito à vida, que é o reconhecimento de que cada um é proprietário único e
inquestionável de seu próprio corpo e da própria mente. Logo, a propriedade básica do ser
humano é a propriedade de si mesmo.
Entretanto, ante aos perigos do estado de natureza, os homens se associaram originando
a sociedade política. Eles não abriram, com isto, mão de seus direitos naturais de liberdade e
igualdade, mas transferiram-os, em parte, a um terceiro, como reconhecimento de que na
ausência de governo, a liberdade de alguns — exatamente dos mais fracos ou menos poderosos
— não pode ser garantida ou protegida em face dos mais fortes ou mais poderosos.
Assim, a existência do Estado é preferível ao “estado de natureza” desde que o Estado
tenha como finalidade precípua a garantia da liberdade de todos e a defesa dos direitos naturais
básicos que todo indivíduo possui contra a arbitrariedade da força e da violência.
A existência de um governo — ou de uma autoridade civil — depende essencialmente
do consentimento daqueles que pactuam ou contratam para criar tal governo. O fator
“consentimento” origina o elemento “soberania popular”, que surge como instrumento
constitucional que, à primeira vista, garante a defesa e a proteção dos direitos individuais.
Para um estágio inaugural da sociedade, a teoria de Locke parece fazer sentido, mas, o
aumento da população e a organização das instituições sociais criaram, desde muito, a divisão
de trabalho na relação entre os homens. Ademais, pensamos que a divisão social do trabalho
sempre existiu, seja do ponto de vista biológico, na qual sexo, idade e vigor corporal
condicionam-na, seja de forma institucionalizada, onde pretensos proprietários impunham-na
aos demais, pela força ou pelo direito, seja de forma hierarquizada.

Esta forma de divisão do trabalho ficou bem caracterizada na estrutura dos ofícios da
Idade Média. Os artesãos organizados nas guildas, ou corporações de artífices,
constituíam uma unidade de produção, de capacitação para o ofício e de
comercialização dos produtos. Apesar de existir, entre mestres-companheiros-
aprendizes, divisão do trabalho, hierarquia e também atividades de coordenação e
gerenciamento do processo de produção, estas eram diferentes da divisão parcelar do
trabalho e da hierarquia verificada na emergência das fábricas e do modo de produção
capitalista. No artesanato, os produtores eram donos dos instrumentos necessários ao
seu trabalho, tinham domínio sobre o processo de produção, sobre o ritmo do trabalho
e sobre o produto, e também, quase certamente, havia ascensão a companheiro e muito
provavelmente a mestre.57

57
MARGLIN, Stephen. Origem e funções do parcelamento das tarefas. Para que servem os patrões? In: GORZ,
André (Org.). Crítica da divisão do trabalho. São Paulo: Martins Fontes, 1996. pp. 37-77.
32

Ademais disso, John Locke é considerado o primeiro filósofo iluminista. Além dele,
Voltaire58 (1694-1778), Jean-Jacques Rousseau59 (1712-1778), e Montesquieu60 (1689-1755),
influenciaram enormemente o pensamento político daquela época (Séculos XVII e XVIII).
Assim, ainda no século XVIII, ganha força, por influência liberalismo político, o liberalismo
econômico, não tão substancialmente e diretamente desenvolvido por aqueles autores quanto o
fez Adam Smith.
Smith, pode ser considerado pioneiro do que tecnicamente conhecemos como
liberalismo econômico. A grande influência de suas ideias, em um processo de industrialização
que se desenvolvia, firmaram de forma definitiva os pilares liberais clássicos do liberalismo
político e econômico na Europa, e fizeram com que os regimes absolutistas e os modos de
produção antigos, definitivamente, fossem caindo um a um.

3.2. O ESTADO LIBERAL E OS PRIMÓRDIOS DO LIBERALISMO ECONÔMICO

Com a eclosão do Iluminismo e, especialmente, da Revolução Francesa, em 1789, numa


tentativa de se romper com o medievo, surge, definitivamente, o que designamos anteriormente
como paradigma do Estado liberal. Como já dissemos, o Estado liberal é o primeiro paradigma
constitucional da modernidade, que se consolida sobre a releitura dos três direitos fundamentais
postos por Locke, que adquirem um caráter universalista baseado no aspecto inclusivo da razão.
Entretanto, o temor frente à intervenção autoritária e às expropriações arbitrárias do
Estado fizeram com que esses direitos assumissem uma feição negativa, meramente formal, em
que unicamente restringissem a atuação do Estado ao mínimo necessário à garantia da maior
liberdade e segurança possível, especialmente nas relações individuais e interprivados.
Este primeiro paradigma liberal, ao reduzir o sentido da igualdade aos direitos civis e
políticos, deslocou o escopo de sua defesa da esfera social para a esfera individual, o que
acabou por justificar a existência das desigualdades socioeconômicas, seja entre

58
Voltaire, pseudônimo de François Marie Arouet, Rousseau e Montesquieu foram, somados a Locke, os grandes
propulsores do Iluminismo. Voltaire condenava o Absolutismo, mas defendia uma Monarquia centralizada em
que o monarca seria assessorado pelos filósofos, um resgate da ideia de Platão sobre um governo dos filósofos,
condenava intolerância religiosa e abraçava a liberdade de opinião e demais liberdades civis.
59
Rousseau, por seu turno, cria uma terceira via ao estado de natureza, propondo o Contrato Social como resultado
de uma vontade geral, que representa os interesses comuns (consensos) que, aqui, se confundirão com o interesse
público e representarão a soberania do povo, neste sentido um Estado Soberano é aquele que atua conforme a
vontade do povo.
60
Charles-Louis de Secondat, barão de La Brède e de Montesquieu, famoso por ter escrito “O Espírito das Leis”
(L'Esprit des lois, 1748), muito influenciado por Locke, propõe a teoria da separação dos poderes do Estado e
defende a supremacia do princípio da legalidade através da tese de que o juiz é a boca da lei (bouche de la loi).
33

indivíduos, seja entre nações. Já ao entender a liberdade como ausência de coerção intencional
por terceiros, ou seja, considerando-se que tanto mais livre é um indivíduo quanto menor for a
interferência de terceiros na sua esfera de decisão, abandona-o frente suas profundas
desigualdades contingenciais.
Do ponto de vista político, a ideia de liberdade em seu viés negativo supõe a existência
de um Estado limitado, que acaba por abster-se de legislar sobre muitos domínios, em especial
os das instituições que poderiam promover justiça social, sob o pretexto de garantir que a
liberdade de uns não interfira na liberdade de outros.

Durante muito tempo, o Estado sustentou ou foi omisso diante de tal realidade. Ao
Estado não cabia intervir nas relações entre particulares e, portanto, nas relações de
trabalho. Assim, cabia ao contratante da força produtiva ditar as regras do trabalho e
ao trabalhador o seu estrito cumprimento. Havia uma falsa e cruel relação de igualdade
na pactuação, posto que o trabalhador era (e ainda é) a parte mais fraca na relação
capital-trabalho.61

Assim, as tensões entre os três direitos fundamentais liberais (liberdade, igualdade e


propriedade) colocam em sobreposição propriedade e liberdade num primeiro momento, só
havendo sentido falar-se em igualdade em seu aspecto formal.
Adam Smith, em A riqueza das Nações, de 1776, ao propor a forma pela qual a riqueza,
produto do trabalho, é naturalmente distribuída entre as diferentes classes sociais, reforçou a
defesa de uma liberdade intransigente a qualquer valor que se pudesse atribuir à igualdade.
Em sua investigação sobre a natureza e as causas da riqueza das nações, Smith atribui à
desigualdade socioeconômica razões de ordem individual, tanto para o âmbito pessoal quanto
para o nacional, afastando aquelas que apontam para a relação de dominação entre os seres
humanos.
Surge assim, a primeira teoria de responsabilidade individual, de fundamento
aristotélico (meritocracia), que Hayek retomará e aperfeiçoará em seus escritos.
Inicialmente, o homem é rico ou pobre, dizia Smith, conforme o grau que pode suportar
ou desfrutar de necessidades, conveniências e dissabores da vida humana.
No entanto, após a consolidação da divisão do trabalho, é pequena a quantidade de
coisas que um homem sozinho pode produzir para si próprio. Assim, a grande maioria dessas
necessidades passa a ser suprida pelo trabalho de outras pessoas e o indivíduo será rico ou
pobre conforme sua capacidade de comandar, gerir e adquirir forças para o trabalho.

61
ALVES, Amauri Cesar. Direito do trabalho essencial: doutrina, legislação, jurisprudência, exercícios. 1. ed. São
Paulo: LTr, 2012. p. 23.
34

Todo homem é rico ou pobre, de acordo com o grau em que consegue desfrutar das
coisas necessárias, das coisas convenientes e dos prazeres da vida. Todavia, uma vez
implantada plenamente a divisão do trabalho, são muito poucas as necessidades que
o homem consegue atender com o produto de seu próprio trabalho. A maior parte
delas deverá ser atendida com o produto do trabalho de outros, e o homem será então
rico ou pobre, conforme a quantidade de serviço alheio que está em condições de
encomendar ou comprar. Portanto, o valor de qualquer mercadoria, para a pessoa que
a possui, mas não tenciona usá-la ou consumi-la ela própria, senão trocá-la por outros
bens, é igual à quantidade de trabalho que essa mercadoria lhe dá condições de
comprar ou comandar. Conseqüentemente, o trabalho é a medida real do valor de troca
de todas as mercadorias.62

Esse maior poder de compra ou de comando deriva do fato de um indivíduo produzir mais
do que outro e, portanto, ter mais produtos excedentes, o que lhe possibilita mais troca e, assim,
mais riqueza.
Não há, entretanto, diferenças inatas para Smith: ao nascerem, os seres humanos são
iguais. Os hábitos e a educação determinarão, posteriormente, os talentos de cada um que serão
desenvolvidos em maior ou menor grau segundo o interesse e a dedicação pessoal.
Adam Smith aceita que o desenvolvimento dos talentos individuais e da capacidade de
produzir estejam vinculados não apenas à educação, mas também ao cultivo e ao
aperfeiçoamento pessoal de uma habilidade específica na divisão do trabalho.
O pensamento liberal-econômico de Smith limita-se, sobremaneira, às fronteiras da
individualidade, apontando como responsabilidade subjetiva as causas das desigualdades
socioeconômicas.
É o indivíduo que é concretamente “sujeito” do aperfeiçoamento dos talentos que a
educação lhe creditou e, portanto, o responsável por sua riqueza ou pobreza. Alguém é rico
porque consegue, devido a seus talentos, produzir mais e melhores produtos para trocar.
Assim, escreveu Smith:

cada homem terá então maior interesse em cultivar aquele talento que sua educação e seu
hábito lhe conferiram, aplicando-o do melhor modo possível, posto que quanto mais consiga
produzir, graças a seu gênio, mais excedentes terá para trocar por outras coisas que necessite
para a subsistência.63

Também as desigualdades entre as nações são explicadas como fruto de conquistas


individuais. O desenvolvimento de uma nação se dá por uma maior e melhor produtividade
decorrente do aperfeiçoamento das habilidades específicas na divisão do trabalho.

62
SMITH, Adam. A riqueza das nações. Livro 1 – 1ª parte; Trad. Márcio Pugliese Global Editora: São
Paulo, 1980. p. 87. (Coleções Base – Economia 25).
63
SMITH, Adam. A riqueza das nações. Livro 1 – 1ª parte; Trad. Márcio Pugliese Global Editora: São
Paulo, 1980. p. 17. (Coleções Base – Economia 25).
35

Isso é determinado pela força das trocas, ou seja, pela extensão do comércio. Assim, ao
contrário dos núcleos rurais, as grandes cidades, localizadas à beira do mar ou de rios, tiveram
grande desenvolvimento industrial devido ao forte comércio. Além de mais populosos, a maior
produtividade desses centros se deve principalmente à facilidade de escoamento de seus
produtos para mercados mais distantes, pelas vantajosas e econômicas vias marítimas ou
fluviais.
Por isso, assevera Smith, segundo fontes dignas de crédito da história mundial, as nações
que primeiro atingiram um estágio que pode ser chamado civilizado, foram as que circundavam
o Mar Mediterrâneo.64 E, continua:

[Entretanto] todas as regiões interiores da África e toda parte da Ásia que fica a uma
considerável distância do Mar Cáspio, a antiga Scytia, a moderna Tartária e a Sibéria,
parecem ter, em todas as idades do mundo se mantido no mesmo estado bárbaro e
incivilizado no qual se encontram ainda hoje.65

Esses argumentos de ordem geográfica demonstram uma leitura reducionista da origem


da riqueza ou pobreza das nações, buscando justificar as desigualdades entre os povos como
um processo natural. Além dos fatores de ordem física, facilitadores do comércio, os grandes
centros urbanos litorâneos da Europa enriqueceram-se com por expropriação das riquezas
naturais de outras regiões e a mercantilização dos povos dominados como escravos. Mas, para
justificar as desigualdades, conclui Smith, a igualdade social somente poderá ocorrer como
conquista pessoal dos indivíduos em situação de pobreza, não sendo responsabilidade da nação.
O dever da nação é garantir a igualdade dos direitos fundamentais de forma a permitir o livre
desenvolvimento do indivíduo.
Mas, se é verdade que a riqueza é sempre fruto da dedicação e, a pobreza, em
contrapartida, também tem sua causa no próprio indivíduo, então a maior parte das
desigualdades socioeconômicas seriam consequências das diferenças de talentos desenvolvidos
pelo caráter e esforço pessoal.
Entretanto, isso não parece corresponder ao que o ocorre na realidade. Podemos nos
indagar: que tipo de educação cada indivíduo recebeu? Quais as circunstâncias sociais em que
cada um foi educado? A todos e a cada um foi oferecido o mesmo tempo e condições para o
cultivo de seus talentos e habilidades? Todos nasceram com a mesma condição física e
psíquica?

64
Ibid. p. 22.
65
Ibid. p. 23.
36

O breve percurso feito pelo pensamento liberal-econômico parece suficiente para seu
propósito: demonstrar os fundamentos do sentido liberal dado ao valor ético-político da
liberdade e de como dele decorre, necessariamente, um significado específico do valor
igualdade.
Este é o mesmo argumento hoje utilizado para justificar as limitações em direitos
sociais, especialmente os trabalhistas e previdenciários. Transfere-se a responsabilidade pelas
grandes retiradas de capital que promovem o desequilíbrio do mercado, pela crise política, pela
desigualdade e pela suposta crise da previdência para o sujeito mais vulnerável na história,
nomeadamente, o trabalhador, enquanto destinatário da responsabilidade individual. O gestor
de mão de obra é louvado, mas sobre sua responsabilidade, nos momentos críticos, responde:
os direitos do trabalhador nos custam muito caro. Ou seja, mais uma vez as classes menos
valorizadas na divisão do trabalho arcam com rombos que não criaram.
Em síntese, para a vertente liberalismo clássico e econômico, a realidade é observada
unicamente do ponto de vista do indivíduo; a liberdade é um direito natural e individual de
expressão, autodeterminação, associação; e igualdade implica acesso de todos aos direitos civis
e políticos e por isso nunca devem ser limitados para propiciar maior justiça econômica.
Entretanto, para quantas pessoas essa liberdade e essa igualdade valem?

3.2.1. CRISE DO ESTADO LIBERAL

Por certo, a vivência prática das ideias basilares do paradigma do Estado liberal, em que
o exercício das liberdades e igualdades traduzia-se apenas na esfera formal para a maioria dos
indivíduos, bem como a prevalência ultra abrangente do direito à propriedade e da auto-
regulamentação do mercado, culminaram na fundamentação de ideias e práticas sociais que
caracterizaram um dos maiores períodos históricos de exploração do homem pelo homem.
Assim, se por um lado, o homem alcançou um ideal de liberdade que nem as
arbitrariedades do Estado poderiam tocar, por outro, essa garantia reduzia-se ao campo
meramente formal, negativo, já que, não obstante a decadência dos estratos sociais, a condição
humana não melhorou muito em relação à noção pré-moderna.
A ordem liberal é posta em xeque com o surgimento de ideias socialistas, comunistas e
anarquistas, que a um só tempo erguem movimentos de massas e neles travam a luta pelos
direitos coletivos e sociais. Assim, o sistema liberal sofre diversas transformações numa
tentativa de se ajustar às novas exigências sociais. No âmbito laborativo, estes movimentos
fazem surgir os primeiros direitos trabalhistas.
37

Os governantes, preocupados com o que poderia resultar da mobilização proletária


incipiente, tiveram que ceder e regulamentar, ainda que parcialmente, a relação básica
de entrega da força produtiva. A organização sindical, as ideias marxistas e o
desenvolvimento de uma ideologia social cada vez mais crescente influenciaram
positivamente os legisladores do final do século XIX e início do século XX. Foram
criadas leis que regulamentaram o trabalho do menor, limitaram a jornada e fixaram
repousos semanais e anuais. Posteriormente, importantes textos constitucionais
contemplaram os direitos basilares dos trabalhadores, com destaque para a
Constituição do México (1917) e para a Alemanha (1919).66

Esta legislação protetiva incipiente, de grande influência social, melhorou


significativamente a condição humana, seja do ponto de vista puramente social, seja do ponto
de vista específico do trabalho. Entretanto, veio em um momento de grande tensão entre as
nações europeias, que divergiam em termos de conformação estatal (imperialismo x
constitucionalismo), competiam pela ampliação de seu mercado de consumo e de matéria
prima, e que investiam cada vez mais na produção armamentista.

3.3. NEOLIBERALISMO ECONÔMICO

O desenvolvimento do movimento democrático, o surgimento de um capitalismo


monopolista, as revoluções operárias e o aumento das demandas sociais e políticas, somados à
eclosão da Primeira Guerra Mundial, culminaram no fim do Estado liberal e possibilitaram o
surgimento de uma nova fase do constitucionalismo, inaugurando o paradigma do Estado
social.
A mudança paradigmática e a “consequente” formação de diversos regimes totalitários
exigiram do liberalismo econômico, principal corrente política de oposição ao Estado Social ou
Estado do Bem-Estar Social, mudança e adequação à nova situação. Assim, há uma redefinição
daquele “liberalismo clássico” que agora, influenciado pelas teorias econômicas neoclássicas,
reveste-se da nomenclatura “neoliberalismo econômico” e tenta atacar e alertar,
veementemente, sobre os riscos do socialismo. É nesse contexto que, em 1944, o livro O
Caminho da Servidão de Hayek é publicado. Um livro considerado uma ofensa ao Estado de
Bem-Estar, já que reagia duramente contra o keynesianismo67 e o assistencialismo do Estado,
fortemente defendidos naquele momento.

66
ALVES, Amauri Cesar. Direito do trabalho essencial: doutrina, legislação, jurisprudência, exercícios. 1. ed. São
Paulo: LTr, 2012. p. 23.
67
Doutrina econômica consolidada pelo economista inglês John Maynard Keynes, em “General Theory of
Employment, Interest and Money” (1936), traduzido pelas editoras brasileiras como “Teoria Geral do Emprego,
do Juro e da Moeda”, que propôs uma nova abordagem para a determinação do nível de atividade economica, dos
38

Hayek argumenta que os totalitarismos emergentes ao século XX são consequências


necessárias de um pensamento socialista e que os acontecimentos e pensamentos que
originaram àquele totalitarismo ainda permeavam a cabeça dos intelectuais nesse momento
final da 2ª Grande Guerra. A única maneira de evitar novas formas de totalitarismo seria retomar
o pensamento setecentista e oitocentista que deu origem, ao que os neoliberais consideram,
“toda sociedade livre que conhecemos e lutamos para defender”.
Assim, contrariando toda a doutrina do Estado de Bem-Estar, Hayek e outros teóricos
como Milton Friedman apoiam-se nos horrores da 2ª Guerra mundial para propor um Estado
que tivesse funções em menor quantidade, menos autoritárias e menos paternalistas.
Para Hayek, mais especificamente, uma das funções principais do Estado é auxiliar na difusão
de conhecimentos e informação, permitindo maior mobilidade econômica sem que houvesse,
no entanto, centralização de decisões (planificação) que determinasse de alguma forma a vida
e as escolhas dos indivíduos.
A esse Estado (designado por mínimo), restaria manter a ordem, elaborar leis de
proteção à propriedade privada e da liberdade de expressão, manutenção dos cárceres e a defesa
das fronteiras, além de zelar pelo bom funcionamento de um único sistema autônomo:
o mercado.
Em outras palavras, o Estado deveria passar a intervir apenas para consolidar um
sistema eficaz de “livre concorrência”. Para tanto, deveria atuar em áreas ou setores pouco
atrativos para a iniciativa privada além de criar toda uma eficiente infraestrutura de transportes,
hospitais, polícia, tribunais, escolas fundamentais e exército, ou seja, tudo que facilitasse a vida
dos empreendedores. Dessa forma, todas as atividades do governo deveriam estar voltadas para
mercantilização da sociedade, consolidando a hegemonia do capital enquanto potência social.
Não obstante suprir minimamente as necessidades básicas da sociedade, e dispor de
pouco ou nenhum controle direto dos indivíduos, esse Estado não é classificado como
“interventor”, pois a atitude de minimizar a atuação do Estado deve ser compreendida também
enquanto projeto político-ideológico, tendo como objetivo a promoção da liberdade de
produção e comercialização, ou seja, da sociedade competitiva.
Hayek usa do princípio da liberdade como argumento contra a planificação, defendendo
uma pseudoconcepção de Estado de Direito. Para ele, cada indivíduo, dentro de certos
limites, poderia buscar seus próprios objetivos, de forma que os objetivos individuais
sejam sempre prioritários a qualquer “objetivo comum”. Assim, o Estado de

problemas do emprego e das causas da inflação, opondo-se ao liberalismo econômico, e postulando que a
intervenção estatal na vida econômica poderia conduzi-la a um regime de pleno emprego.
39

Direito estabeleceria as “regras do jogo” em que as ações do governo seriam regidas por normas
previamente estabelecidas, fato que garantiria não só a estabilidade do governo, mas também
uma segurança jurídica que possibilitasse a cada um planejar, com factibilidade, seu “projeto
de vida”.
Mas, podemos afirmar categoricamente que mesmo com todas essas condições ideais
para empreendedores, a lógica do lucro pelo lucro promoveria barganha de direitos trabalhistas
com a perspectiva de que um menor custo de produção traz mais lucro. Haveria uma barganha
generalizada por mixarias, em que as nações competiriam para ver quem está mais inclinado a
se submeter aos desejos do empreendedor. E, nessa disputa, quem estiver disposto a sangrar e
sofrer mais, será escolhida (explorada).
Por essa razão, a lógica da acumulação pela acumulação não faz sentido. Nesta
perspectiva de mercado, são produzidos mais produtos que o mercado pode absorver o que,
além de uma contradição à eficiência e eficácia da administração da produção, causa um
desequilíbrio econômico por excedente de produtos.
Em A condição da classe trabalhadora na Inglaterra, Engels argumenta que, não
obstante conhecer quanto cada país necessita de um produto, o capitalista não pode precisar
quanto existe em estoque e quanto seus concorrentes ofertarão. Assim, cada capitalista procura
tirar vantagem de situações favoráveis, fato que leva à saturação do mercado. No começo, essas
crises se limitavam a alguns ramos, mas à medida em que a centralização de capitais foi se
generalizando em todos os ramos, essas crises parciais foram se tornando crises recorrentes68:

Essas crises reaparecem a cada cinco anos após um breve período de prosperidade; o
mercado doméstico, assim como os mercados externos, fica saturado de produtos
ingleses, que não podem ser absorvidos senão muito lentamente; o movimento
industrial estanca em quase todos os ramos.69

Por esta razão, defendemos que os modos de produção devam atender à função social
de promover desenvolvimento social global e se atinar para a diminuição de desigualdades ao
invés de trabalhar o acúmulo de capital como fim em si mesmo.

68
CIPOLLA, Francisco Paulo. A evolução da teoria da crise de superprodução na obra econômica de Marx. Crítica
Marxista, São Paulo, Brasiliense, n. 37. pp. 67-90, out. 2013. Disponível em: <
https://www.ifch.unicamp.br/criticamarxista/arquivos_biblioteca/artigo298Artigo4.pdf>. Acesso em: 05 jul.
2017.
69
MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. Collected Works. New York: International Publishers, 1975, v.4. p. 382. (A
condição da classe trabalhadora na Inglaterra)
40

4. LIBERALISMO IGUALITÁRIO

O debate em torno do liberalismo ganha nova dimensão em 1971, quando John Rawls
publica Uma Teoria da Justiça e defende a adoção da justiça como equidade enquanto norte da
estrutura básica da sociedade. Ao tratar da justiça social ou distributiva e do pluralismo de
valores, visa um ideal positivo que possibilite condições socioeconômicas para que os
indivíduos desfrutem efetivamente dos benefícios de uma sociedade cooperativa, na qual
ninguém possa auferir benefício que piore a situação dos que já estão em uma situação
inferior.
Na vertente contratualista, Rawls, inova tentando conciliar dois conceitos dificilmente
compatíveis: liberdade individual e justiça social (ou distributiva). Trazendo ao debate uma
nova perspectiva para avaliarmos as instituições sociais onde uma sociedade bem ordenada
compartilha de uma concepção pública de justiça que regule sua estrutura básica.
Podemos dividir a teoria rawlsiana em três partes. Na primeira, Rawls defende a ideia
de “justiça como equidade” (justice as fairness) e argumenta sobre os princípios de justiça que
seriam escolhidos pelos indivíduos na “posição original” (situação em que desconhecem qual
“papel” assumiriam na sociedade, isto é, suas características físicas, psíquicas, intelectuais e
socioeconômicas). Na segunda parte, disserta sobre a necessidade da democracia constitucional
como pano de fundo que possibilite a aplicação das ideias apresentadas na primeira parte. Na
terceira, estabelece uma relação entre a teoria da justiça, os valores da sociedade e o bem
comum.

4.1. A TEORIA RAWLSIANA


4.1.1. LIBERDADE INDIVIDUAL X SOCIEDADE COOPERATIVA

O cerne da discussão desdobra-se na seguinte questão: a sociedade tem responsabilidade


nas situações desiguais e dever de promover justiça social (distributiva) ou o que cada um
possui é fruto de um processo meritório em que as desigualdades se originam da
competitividade natural na qual cada indivíduo é responsável pelos resultados perante uma
estrutura de mercado?
Hayek e os demais neoliberais argumentam contra a primeira posição. Para eles, a
economia é um sistema demasiado complexo para ser planejado por uma instituição central de
forma a promover “justiça social” e deve evoluir espontaneamente, por meio do livre mercado.
41

Já os autores que endossam teorias sobre justiça distributiva consideram a existência de


três princípios possíveis segundo os quais a distribuição dos benefícios sociais e econômicos
pode ser regulada ou aferida: a liberdade natural, a igualdade liberal e a igualdade democrática.
Sendo o princípio da igualdade democrática fator que visa minimizar as injustiças da
liberdade natural, indo além da igualdade meramente formal de oportunidades e corrigindo,
sempre que possível, as desvantagens sociais e culturais.
Como, então, encarar a questão da justiça social ou distributiva?

5. O ARGUMENTO DE HAYEK CONTRA A CONCEPÇÃO DE JUSTIÇA SOCIAL


OU JUSTIÇA DISTRIBUTIVA

Na obra Direito, legislação e liberdade, Hayek escreve o segundo volume dedicado à


“miragem da justiça social”, tratando da justiça distributiva. Segundo ele, o conceito de justiça
deve ser entendido como fundamento e limitação indispensável de qualquer lei70. Mas, devemos
ter cuidado com o “abuso do termo” sob pena de destruirmos o conceito de lei como
sustentáculo da liberdade individual. Nesse sentido, ocorre um uso “errado” do termo justiça
quando escapamos da esfera de garantias da liberdade individual para o âmbito de uma
sociedade cooperativa. O conceito de justiça que os homens tinham em relação ao
comportamento dos indivíduos para com seus semelhantes passou equivocadamente a ser
aplicado aos efeitos conjuntos das ações de muitas pessoas, mesmo quando esses nunca eram
previstos ou desejados. Isso fez com que a “justiça social” (por vezes denominada “justiça
econômica”) passasse a ser vista como um atributo que as “ações” da sociedade devem possuir
ou que fosse percebida como o “tratamento” dado pela sociedade aos indivíduos ou grupos.

Frequentemente se pensa que a fórmula clássica segundo a qual o objetivo das normas
de conduta justa é atribuir a cada um o que lhe é devido (suum cuique íribuere)
significa que o direito por si mesmo atribui a cada indivíduo determinadas coisas.
Obviamente isso não é verdade. O direito simplesmente fornece normas pelas quais é
possível averiguar, a partir de fatos particulares, a quem pertencem determinadas
coisas. Não tem por objetivo estipular as pessoas a quem deverão pertencer coisas
específicas; pretende apenas tornar possível averiguar os limites que foram fixados
pelas ações praticadas pelos indivíduos no âmbito demarcado pelas normas jurídicas,
mas que, em seus conteúdos particulares, resultam de muitas outras circunstâncias.
Tampouco se deve considerar, como às vezes ocorre, que a fórmula clássica se refere
à chamada 'justiça distributiva' ou que visa a uma condição ou distribuição de bens
que, independentemente de como tenha sido produzida, pode ser qualificada de justa
ou injusta. O objetivo das normas jurídicas é simplesmente impedir tanto quanto

70
HAYEK, Friedrich August von. Direito, legislação e liberdade: uma nova formulação dos princípios liberais de
justiça e economia política. Vol. II A Miragem da Justiça Social. Tradução de Maria Luiza X. de A. Borges. Editora
Visão: São Paulo, 1985. p. 97.
42

possível, traçando limites, que as ações de diferentes indivíduos interfiram umas nas
outras; elas por si mesmas não podem determinar o resultado que diferentes
indivíduos obterão, e portanto tampouco o podem ter por objeto. 71

A esse tipo de pensamento Hayek chama “primitivo” porque tende a considerar que
processos regulares que são resultados da ordem espontânea do mercado sejam interpretados
como se fossem dirigidos por uma mente racional, ou como se os benefícios ou os danos
particulares que pessoas diversas recebiam dessa ordem fossem determinados por atos de
vontade e, portanto, pudessem ser guiados por regras morais. Ou seja, seria um erro primitivo
aplicar regras éticas que interfiram nos resultados do mercado econômico. Isso aponta para uma
distinção crucial entre a posição ética e política do neoliberalismo econômico e as teorias de
justiça do igualitarismo político que sustentam princípios políticos que possuem uma
formalidade ética razoavelmente impeditiva para práticas de injustiça.
Para Hayek, conceber a “justiça social” como resultante de um processo que ordena a si
próprio é, pois, um “sinal da nossa imaturidade” uma vez que tentamos “adaptar os preceitos
morais que os homens desenvolveram como orientação de suas ações individuais” para algo
que extrapola a esfera da liberdade individual.72 Portanto, associar explicitamente “justiça
social e distributiva”73 ao “tratamento” que a sociedade dá aos indivíduos, evidencia, com muito
mais clareza, a diferença para a “simples justiça” (que é a garantia das liberdades individuais)
e, ao mesmo tempo, leva à vagueza do conceito. A exigência de “justiça social” não é
endereçada ao indivíduo, mas à sociedade – assim, a sociedade em sentido restrito (ou seja,
distinta do aparato governamental) fica incapaz de agir por um objetivo específico; logo a
exigência de “justiça social” torna-se um pretexto imposto aos membros da sociedade para que
se organizem de modo a poder atribuir cotas específicas da produção social aos vários
indivíduos ou grupos.

71
HAYEK, Friedrich August von. Direito, legislação e liberdade: uma nova formulação dos princípios liberais de
justiça e economia política. Vol. I Normas e Ordem. Tradução de Maria Luiza X. de A. Borges. Editora Visão:
São Paulo, 1985. p. 244.
72
HAYEK, Friedrich August von. Direito, legislação e liberdade: uma nova formulação dos princípios liberais de
justiça e economia política. Vol. I Normas e Ordem. Tradução de Maria Luiza X. de A. Borges. Editora Visão:
São Paulo, 1985. p. 231.
73
Hayek atribui a Stuart Mill o uso da expressão “justiça social” como sinônimo de “justiça distributiva” e acusa
John Rawls, referencial maior do liberalismo político igualitarista, que exerceu enorme influência em Amartya
Sen, de fazer o mesmo. Mill denomina de “justiça social” ou “justiça distributiva” o tratamento igualitário a todos
os indivíduos que o merecem, e para o bom sucesso deste “tratamento igualitário”, na leitura que Hayek faz de
Stuart Mill, a sociedade deveria convergir os esforços de todos os cidadãos virtuosos. HAYEK, Friedrich August
von. Direito, legislação e liberdade: uma nova formulação dos princípios liberais de justiça e economia política.
Vol. II A Miragem da Justiça Social. Tradução de Maria Luiza X. de A. Borges. Editora Visão: São Paulo, 1985.
p. 97.
43

A questão fundamental passa a ser a seguinte: existe o dever moral de submeter-se a um


poder que possa coordenar os esforços dos membros da sociedade objetivando obter um
modelo de distribuição específico, considerado como justo?74
A resposta de Hayek é negativa. Para ele, nossa imaturidade faz do apelo à “justiça
social” um meio argumentativo bastante eficaz nas discussões políticas. Assim, quase toda
exigência de uma “ação governamental” em favor de determinados grupos é apresentada em
nome da “justiça social”, resultando no enfraquecimento dos que se opõem a ela. Raramente
coloca-se em xeque saber se esse é o padrão que deveria guiar qualquer ação política e se a
expressão tem um significado preciso. Por conseguinte, é provável que hoje não existam
movimentos e personalidades políticas que não apelem prontamente para a “justiça social” de
forma a sustentar determinadas medidas por eles patrocinadas. Além disso, não se pode negar
que a exigência de “justiça social” já transformou de maneira considerável a ordem social e
continua a fazê-lo numa direção que nem mesmo aqueles que a apresentaram poderiam
imaginar. E, esse caminho, de modo algum, leva a uma sociedade cooperativa, mas ao caminho
da servidão.
A expressão “justiça social ou distributiva” descreveu, desde o início, as aspirações
relativas à base do socialismo75. Ainda que, de modo geral, o socialismo clássico tenha sido
definido como tal devido à sua exigência de socialização dos meios de produção que foi,
principalmente, meio considerado essencial para levar-se adiante uma “justa” distribuição da
riqueza. E, uma vez que, posteriormente, os socialistas descobriram que essa redistribuição
podia ocorrer, em grande parte e com uma menor resistência, por intermédio da taxação (e dos
serviços financiados por ela), na prática, abandonaram suas exigências originais e sua promessa
principal realizou-se sob a forma de “justiça social”. Portanto, pode-se dizer a esse respeito que
a principal diferença entre a ordem da sociedade a qual o liberalismo clássico pensado por
Hayek aspirava e a nova sociedade é que a primeira deveria ser governada por princípios de
justa conduta individual, enquanto a nova sociedade (igualitária e com Estado atuante, tal como
pensada por Rawls e Sen) deve satisfazer às exigências de uma “justiça social” - ou, nas palavras
de Hayek - a primeira exigia ação justa dos indivíduos, enquanto a segunda atribui cada vez
mais o dever de fazer justiça a autoridades dotadas do poder de ordenar às pessoas o que fazer.76

74
HAYEK, Friedrich August von. Direito, legislação e liberdade: uma nova formulação dos princípios liberais de
justiça e economia política. Vol. II A Miragem da Justiça Social. Tradução de Maria Luiza X. de A. Borges. Editora
Visão: São Paulo, 1985. p. 98.
75
Ibid. p. 99.
76
Ibid. p. 101.
44

No entanto, Hayek deixa de perceber que mesmo as autoridades de uma sociedade


igualitária estariam submetidas aos princípios de justiça na teoria de Rawls e, hoje, da teoria
contemporânea de Amartya Sen. Essas teorias dão ênfase aos indivíduos que devem ser
capacitados para “funcionar” melhor em uma sociedade cooperativa. A capacitação de tais
indivíduos é que propiciará a efetivação da justiça em um determinado contexto político.
Entretanto, segundo Hayek, a “justiça social” foi adotada por socialistas de diferentes
matizes, dado seu apelo social. Diversos governos autoritários e ditatoriais proclamaram a
“justiça social” como seu principal objetivo.77 Da voz de governantes da antiga União Soviética,
soube-se que milhões de homens na Rússia foram vítimas de um terror que tenta esconder-se
por trás do slogan da justiça social78. Mas, a aceitação quase universal de uma crença não é
condição de sua validade nem, tampouco, dá a ela significado (“não mais do que a crença
comum nos fantasmas e nas bruxas provava a validade dessas ideias”79). No caso da “justiça
social”, Hayek afirma que se trata simplesmente de uma superstição quase religiosa, que
deveríamos deixar de lado enquanto serve apenas para satisfazer quem a detém, mas que se
deve combater no momento em que se torna um pretexto para forçar os outros.80
A crença na “justiça social” é a grande ameaça ao que ele considera como “à maioria
dos valores de uma civilização livre”81. Parece crença comum o fato de a “justiça social” ser
simplesmente um novo valor moral a ser acrescentado àqueles reconhecidos no passado e de
poder ser inserida na estrutura existente de regras morais. No entanto, afirma, não é
suficientemente reconhecido o fato de que, para poder dar significado a essa expressão, seria
necessário mudar radicalmente todo o caráter da ordem social e sacrificar alguns dos valores
que serviram para governá-lo. Em Direito, legislação e liberdade, essa transformação da
sociedade em outra de tipo fundamentalmente diferente ocorre de modo fragmentado e sem a
consciência do resultado a que deve conduzir. E foi também a crença de poder alcançar a
chamada “justiça social” que levou as pessoas a confiarem ao governo os poderes que ele não
pode recusar-se a usar para satisfazer as reivindicações de um número sempre crescente de
interesses particulares que aprenderam a usar a fórmula mágica de “justiça social” para se
mascararem como interesses coletivos.

77
Ibid.
78
Ibid.
79
Ibid. p. 102
80
Ibid.
81
Ibid.
45

Hayek expressa seu desejo de ver a “justiça social” reconhecida como um fogo fátuo 82,
que levou os homens a abandonar muitos dos valores que, no passado, promoveram o
desenvolvimento da civilização – “justiça social” é uma tentativa de satisfazer um anseio
herdado das tradições do pequeno grupo, que é, no entanto, desprovida de significado na Grande
Sociedade de homens livres83. O equivocado desejo por “justiça social ou distributiva”, que se
tornou um dos vínculos mais fortes que incita as pessoas de boa vontade à ação, seria não apenas
frustrante, mas, como a maior parte das tentativas para alcançar uma meta – inacessível. O
esforço em favor da “justiça social” também produziria, inevitavelmente, outras consequências
indesejadas e, sobretudo, levaria à destruição daquele ambiente que é indispensável para o
desenvolvimento dos valores morais tradicionais, ou seja, a liberdade pessoal84.
Hayek estabelece uma distinção entre dois problemas diferentes que emergem de uma
ordem de mercado onde há exigências de “justiça social”. (i) O primeiro é visualizar, de modo
criterioso, se há, dentro de uma ordem econômica baseada no mercado, no conceito de “justiça
social”, um significado ou, apenas, um conteúdo qualquer. (ii) O segundo é estabelecer se é
possível manter uma ordem de mercado consoante à imposição (em nome da “justiça social”
ou de qualquer outro pretexto) de um modelo de remuneração baseado numa avaliação dos
resultados e nas necessidades dos vários indivíduos ou grupos por parte de uma autoridade que
tenha o poder de fazer com que esse modelo seja aplicado.85
A resposta de Hayek a cada uma dessas questões é negativa. Todavia, acrescenta ele, a
crença errônea e já comum da validade do conceito de “justiça social” leva todas as sociedades
contemporâneas a esforços cada vez maiores do segundo tipo onde surge uma tendência
particular a auto aceleração: quanto mais se verifica que a posição dos indivíduos ou grupos se
torna dependente das ações do governo, tanto mais eles insistirão em que os governos visem a
algum esquema reconhecível de justiça distributiva 86. Quanto mais aqueles que governam
buscam realizar modelos predeterminados de distribuição desejável, tanto mais eles devem
sujeitar ao próprio controle a posição dos vários indivíduos ou grupos. Enquanto o credo na
“justiça social” governar a ação política, esse processo deverá conduzir progressivamente a um
sistema totalitário.
Hayek argumenta que, antes de tudo, devemos nos concentrar no problema da falta de
significado da expressão “justiça social”, e somente mais adiante considerar os efeitos que os

82
Ibid. p. 136.
83
Ibid. p. 103.
84
Ibid. p. 112.
85
Ibid. p. 103-104
86
Ibid. p. 104.
46

esforços envidados para impor um modelo qualquer de distribuição predeterminado devem ter
sobre a estrutura da sociedade. A opinião de que, numa sociedade de homens livres (distinta de
toda organização obrigatória), o conceito de justiça social é vazio e sem sentido parecerá
totalmente inacreditável para a maior parte das pessoas. Por acaso não é perturbador ver que a
vida trata injustamente tantas pessoas, ver sofrer as que são merecedoras e prosperar as que são
indignas? E será que não se tem a sensação de que as coisas são apropriadas, bem como um
sentimento de satisfação, quando se reconhece que uma determinada recompensa corresponde
a um esforço ou a um sacrifício?
Aquilo que, desde a primeira abordagem, deveria enfraquecer essa certeza é o fato de
termos os mesmos sentimentos inclusive em relação às diferenças que ocorrem entre os vários
destinos do homem na vida socioeconômica, para os quais, obviamente, não há nenhum agente
humano responsável, e que, portanto, seria absurdo definir como injustos. Apesar disso,
protesta-se contra a injustiça quando uma série de calamidades atinge uma família, enquanto
outra prospera, ou quando um esforço merecedor é frustrado por um incidente imprevisível e,
particularmente, se dentre tantas pessoas, cujos esforços parecem da mesma importância,
algumas têm um brilhante êxito enquanto outras, um completo fracasso. Esse ponto é
extremamente contrastante com a abordagem de Amartya Sen. Os dois pensadores
possuem perspectivas fortemente antagônicas quando tratam especificamente destes itens que
envolvem sucesso e fracasso não merecidos.
Para Hayek, assim como é trágico assistir ao fracasso dos esforços mais merecedores
dos pais para criar os próprios filhos, ou de jovens para construir a própria carreira, ou de um
explorador ou de um cientista na tentativa de realizar uma ideia brilhante - e se protesta diante
de semelhante destino, embora não se conheça o culpado e não seja possível evitar tais
desilusões - assim também ocorre em relação ao sentimento geral de injustiça no caso da
distribuição de bens materiais numa sociedade de homens livres87. Mesmo que, nesse caso, não
estejamos tão prontos para admiti-lo,

nossas queixas de que o resultado do mercado é injusto não implicam realmente que
alguém tenha sido injusto; e não há resposta para a questão de saber quem foi injusto.
A sociedade simplesmente tornou-se a nova deusa a quem nos queixamos e clamamos
por reparação, se ela não satisfaz as expectativas que criou. Não há um indivíduo nem
um grupo organizado de pessoas contra os quais o sofredor teria uma queixa justa, e
não há normas concebíveis de conduta individual justa capazes, ao mesmo tempo, de
assegurar uma ordem viável e de evitar tais frustrações. 88

87
Ibid. p. 105.
88
Ibid.
47

Segundo o autor, a única acusação implícita nessas queixas é que toleramos um sistema
em que a cada um é permitido escolher a própria ocupação, e, portanto, ninguém pode ter o
poder e o dever de verificar que os resultados correspondem aos nossos desejos:

Num tal sistema, em que todos têm o direito de usar seu conhecimento com vistas a
seus propósitos, o conceito de 'justiça social' é necessariamente vazio e sem
significado porque nele nenhuma vontade é capaz de determinar as rendas relativas
das diferentes pessoas ou impedir que elas dependam, em parte, do acaso.89

Portanto, para Hayek, pode-se dar um significado à expressão “justiça social” somente
no caso de uma economia administrada ou submetida a “comandos” (como no exército), em
que se ordena aos indivíduos o que devem fazer. Uma concepção qualquer de “justiça social”
só pode ser realizada num sistema centralizado desse tipo. Tudo isso pressupõe que as pessoas
sejam orientadas por ordens específicas, e não por normas de mera conduta individual. Assim,
nenhum sistema de normas de mera conduta individual e, portanto, nenhuma ação livre dos
indivíduos poderia produzir resultados que correspondessem a qualquer princípio de justiça
distributiva.90
Hayek, como mestre do pensamento político neoliberal, afirma que não é incorreta a
percepção segundo a qual os efeitos dos processos de uma sociedade livre sobre os destinos dos
indivíduos não são distribuídos conforme princípios de justiça que possam ser individualizados.
No entanto, seria incorreto se, a partir disso, concluíssemos que são injustos e que alguém deve
ser criticado por isso. Para ele, numa sociedade livre na qual a posição dos vários indivíduos e
grupos não é o resultado da vontade consciente de ninguém (ou não poderia ser alterada de
acordo com um princípio genericamente aplicável) as diferenças de remuneração não podem
ser significativamente definidas como justas ou injustas. E conclui que, embora haja muitos
tipos de ações individuais que visam a condicionar remunerações específicas e que poderiam
ser definidos como justos ou injustos, não existem princípios de conduta individual capazes de
produzir um modelo de distribuição que, como tal, pudesse ser definido como justo, tampouco
alguma possibilidade para que o indivíduo soubesse o que deveria fazer para garantir a justa
remuneração dos seus semelhantes.
Entretanto, das premissas de que não existem princípios de conduta individual capazes
de produzir um modelo justo de distribuição e de que não existe possibilidade de que o
indivíduo soubesse o que deveria fazer para garantir a justa remuneração dos seus semelhantes,

89
Ibid.
90
Ibid.
48

não decorre que não se deve buscar a justiça social ou distributiva. Hayek parece incorrer em
uma argumentação em Reductio ad Absurdum, isto é, tenta inferir de uma conclusão que, para
ele, é inaceitável um esquema argumentativo formal que independe da plausibilidade do
conteúdo de suas premissas.
Isso porque, Hayek, ao entender a justiça como um conceito moral, uma forma de
garantia das liberdades individuais, e ao reduzir o sentido do Direito, ao defini-lo como meio
pelo qual é possível averiguar-se a quem pertence determinadas coisas e que objetiva, apenas,
impedir que as ações de determinados indivíduos interfiram umas nas outras, assume uma visão
de que o direito apenas tem validade enquanto ferramenta de manutenção de um status quo
ante, o que, em nosso entender, não é plausível.
Se os benefícios ou danos particulares que as pessoas recebem do mercado fossem
determinadas por atos de vontade, o mercado seria injusto no sentido moral, o que nos levaria
a uma imputação de condutas individuas decorrentes de costumes sociais. Entretanto, os
princípios de conduta individual capazes de produzir um modelo justo de distribuição não
decorrem da moral, mas do direito, mesmo que haja uma lacuna entre o positivado e o de fato
praticado. Também as desigualdades provenientes da ordem mercadológica são injustas do
ponto de vista jurídico, não moral.
O assento constitucional do dever de promover justiça distributiva não decorre de nossa
imaturidade política, mas de um amadurecimento histórico capaz de sentir e observar um
tratamento desumano conferido a determinados tipos de humanos – que tiveram sua vida, sua
saúde, sua liberdade e sua dignidade violadas por interesses puramente econômicos – que foi
positivado para que isso não mais ocorresse. Assim, o objetivo da “justiça social” não é
simplesmente atribuir cotas da produção social a vários indivíduos ou grupos, mas promover
igualdade e a dignidade, não em sentido moral, mas em sentido jurídico, como sinal de nossa
maturidade evolutiva do humano para com o humano, de forma que um justo modelo de
distribuição, que informa princípios individuas de condutas justas, só poderá advir validamente
de um ordenamento jurídico, e só poderá evoluir, validamente, em comparações objetivas entre
os sucessivos diplomas jurídicos que os informam.
49

6. PRECARIZAÇÃO E FLEXIBILIZAÇÃO: RELAÇÃO INDISSOCIÁVEL

A palavra precarização remete a adjetivo precário, que significa ‘difícil’, ‘escasso’,


‘insuficiente’91, logo, podemos falar em condições precárias de trabalho ou oferta precária de
trabalho. Temos, ainda, o sufixo “ação” ou “ção” que é usualmente utilizado na formação de
substantivos derivados do verbo “agir” que remete à ideia de ação ou processo. Então, ao
falarmos em precarização do trabalho, estamos nos referindo a um processo que torna as
condições de trabalho mais dificultosas. O processo de precarização do trabalho
contingencialmente se alinha com o processo produtivo e com os meios necessários para se
produzir.
Assim, falamos em trabalho precário quando as condições ou circunstâncias em que o
homem é exposto ante ao processo produtivo são penuriosas a ele ou à sua dignidade. A
economia política não conhece o homem desocupado, na medida em que ele se encontra fora
da relação de trabalho. Assim, só faz sentido em falar de precarização do trabalho dentro da
relação capital-trabalho.
Como formas resultantes da precarização do trabalho, podemos citar como exemplo o
trabalho informal, a terceirização, a perpetuação e generalização de condições prejudiciais ao
trabalhador (trabalho perigoso, insalubre, noturno, alienante), a pejotização 92, o trabalho a
tempo parcial, o trabalho intermitente e formas de escravidão contemporânea. Também
podemos entender o descumprimento sistemático e proposital da legislação protetiva como
modalidade de difusão da precarização, que estaria enquadrada em nosso plano de realidade.
Por seu turno, a desregulamentação e a flexibilização são estratégias jurídico-políticas que
resultam em formas precárias de trabalho.
Flexibilização é a possibilidade, inserida em uma determinada lei existente, de excetuar
alguns direitos trabalhistas, tornando-os maleáveis. A flexibilidade pode ser definida como
eliminação, diminuição, afrouxamento ou adaptação da proteção trabalhista clássica, com a
finalidade – real ou pretensa – de aumentar o investimento, o emprego ou a competividade da
empresa.93

91
CUNHA, Antônio Geraldo da. Dicionário etimológico Nova Fronteira da língua portuguesa. Rio de Janeiro:
Nova Fronteira. 1997. p. 629.
92
Trabalhadores “pejotizados” são aqueles que são obrigados pelas empresas a criarem uma pessoa jurídica para
efetuar prestação laboral, mesmo que todos requisitos para o reconhecimento de vínculo de emprego estejam
presentes. Desse modo, trata-se de uma fraude com o intuito de burlar o adimplemento de direitos trabalhistas
relacionados à relação de emprego, em que os trabalhadores são coagidos a criar uma pessoa jurídica.
93
URIARTE, Oscar Ermida. A Flexibilização no Direito do Trabalho - A Experiência Latino-Americana. In:
TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO (Org.). Flexibilização no direito do trabalho. 2. ed. São Paulo: IOB
Thomson, 2004. p. 217-252.
50

Para Antônio Álvares da Silva, a flexibilização se dá no interesse do empregador, pois


é diminuição, afrouxamento e adaptação da lei em função da empresa, para permitir-lhe
aumentar “la inversión, el empleo o la competitividad”.94 Há que se observar, entretanto, que a
flexibilidade não se dá em função do trabalhador, sempre favorecendo o empregado
E, nessa orientação flexibilizadora, pode-se tentar conceituar o que seja a
desregulamentação, como uma segunda etapa do projeto neoliberal, pois, neste caso, a
legislação trabalhista não sofre mais maleabilidade, e sim é descartada, em nome de formas
auto compositivas de solução de conflitos.
Apesar do argumento economicista apresentar a flexibilização e a desregulamentação
como institutos não prejudiciais, que objetivam dar maior maleabilidade à relação de trabalho
para que ela possa se adequar mais rapidamente às condições de fato que são atuais e como
promotora do progresso econômico, muitos autores jus trabalhistas, como Márcio Túlio Viana,
Baylos e Antônio Álvares da Silva, acreditam que ambos os conceitos serão sempre
prejudiciais, pois visam a priori a redução de direitos laborais, especialmente no que tange à
desregulamentação, que visa a total eliminação da legislação laboral protetiva.
Assim, têm sido uma estratégia economicista apresentar o modelo da flexisecurity como
uma forma menos agressiva e “bem-sucedida” de flexibilização, para melhorar a aceitabilidade
de tais institutos precarizantes, o que não lhes retira este caráter.
A desregulamentação tem sido utilizada para abandonar o trabalhador, que é
presumidamente hipossuficiente, frente aos anseios do empregador. E, a flexibilização, mesmo
nos países desenvolvidos, têm violado gravemente o princípio da vedação do retrocesso, ao não
observar um patamar mínimo abaixo do qual não pode haver, validamente, pactuação de
contratação de trabalho, permitindo a adoção de conjuntos normativos que em geral são
prejudiciais ao trabalhador, o que deveria ser vedado, também pelos princípios da proteção e da
norma mais favorável.
Especificamente no caso do Brasil, este patamar ou standart é (ou era?) a CLT. No
entanto, a própria CLT, considerada pouco protetiva no que tange à estabilidade do emprego,
já contemplava alguns instrumentos flexibilizadores como a adoção de banco de horas (art.
59), a dispensa imotivada, suspensão contratual negociada (art. 476-A), o trabalho a tempo
parcial (art. 58-A), entre outros.
No entanto, o atual governo do Brasil, para se adequar aos anseios dos grandes
financiadores internacionais e para instaurar o programa neoliberal econômico no país, não se

94
SILVA, Antônio Álvares da – Flexibilização das relações de trabalho – São Paulo: Ltr, 2002. p. 55.
51

viu satisfeito com estes instrumentos flexibilizadores e quis aumentá-los, sob aquele falacioso
pretexto de retomada do crescimento econômico e geração de empregos. Assim, enviou um
Projeto de Lei, de número 6.787/2016 ao Congresso Nacional, que pretendia diminuir o patamar
mínimo existencial dos trabalhadores. Este projeto ficou conhecido como Reforma Trabalhista,
hoje convertido na Lei 13.467/2017.

7. LEI 13.467/2017 – REFORMA TRABALHISTA

Ao falarmos aqui sobre reforma trabalhista estamos nos referindo àquele projeto de lei
de nº 6.787/2016, de inciativa do executivo, que se converteu na Lei 13.467/2017, sancionada
pelo presidente Michel Temer, aos 13 dias de julho de 2017, com vacatio legis de 120 dias,
contada do dia 14 de julho de 2017, data de sua publicação no Diário Oficial da União (DOU
Seção I - pág. 00001 e 00007), que traz diversas alterações à CLT.
De início, cumpre salientar que a supracitada lei carrega consigo vícios insanáveis de
inconstitucionalidade, formal e material, que serão adiante discutidos. Do ponto de vista
material, a novel legislação ofende o princípio constitucional da vedação do retrocesso, em que
não pode ser considerada juridicamente válida norma tendente a reduzir as dimensões dos
direitos sociais. Sendo os direitos trabalhistas direitos sociais, não pode ser considerada válida
a supramencionada legislação, seja pela interpretação usual do princípio, na qual o conjunto
normativo trazido pela lei 13.467/2017 é, em geral, prejudicial aos trabalhadores em relação à
CLT, seja na interpretação mais generalizada que demos a ele, na qual a ofensa mínima a
direitos sociais maculam de inconstitucionalidade uma determinada norma.
Ademais, a novel legislação fere princípios específicos do Direito do Trabalho como
como o princípio da proteção, da norma mais favorável e da hipossuficiência do empregado
frente ao empregador.
Nada obstante, há também violações formais ao processo legislativo, especialmente no
concerne às seguintes normas constitucionais:

Art. 64. A discussão e votação dos projetos de lei de iniciativa do Presidente da


República, do Supremo Tribunal Federal e dos Tribunais Superiores terão início na
Câmara dos Deputados. § 1º - O Presidente da República poderá solicitar urgência
para apreciação de projetos de sua iniciativa. § 2º Se, no caso do § 1º, a Câmara dos
Deputados e o Senado Federal não se manifestarem sobre a proposição, cada qual
sucessivamente, em até quarenta e cinco dias, sobrestar-se-ão todas as demais
deliberações legislativas da respectiva Casa, com exceção das que tenham prazo
constitucional determinado, até que se ultime a votação. (Redação dada pela Emenda
Constitucional nº 32, de 2001) § 3º A apreciação das emendas do Senado Federal pela
Câmara dos Deputados far-se-á no prazo de dez dias, observado quanto ao mais o
52

disposto no parágrafo anterior. § 4º Os prazos do § 2º não correm nos períodos de


recesso do Congresso Nacional, nem se aplicam aos projetos de código.95

No que concerne ao art. 64, não houve requerimento de urgência feito pelo presidente
no projeto de lei, que iniciou-se na Câmara dos Deputados em 23/12/2016. Entretanto, a
tramitação em regime de urgência foi apresentada em plenário, em 18/04/2017, por 21
deputados, com base no art. 15596 do regimento interno daquela casa.
Um projeto de lei pode tramitar de forma urgente de duas maneiras: ou nos termos do
art. 151 do Regimento da Câmara dos Deputados, o que não era possível, pois não se
enquadrava nas hipóteses de cabimento, que estão dispostas no capítulo IV, inciso I do
supracitado artigo. Havendo determinação expressa no inciso II, alínea “a”, do artigo 151 que,
quanto à natureza de tramitação, são, os projetos de iniciativa do Poder Executivo, prioritários.
Ou por requerimento de urgência (artigo 153 e seguintes do regimento) aprovado pelo plenário.
Como dissemos, aos 18 dias de abril de 2017, tal requerimento foi apresentado em
plenário e rejeitado por 230 votos contra 163 votos contrários à rejeição e uma abstenção,
totalizando 394 votos.
Entretanto, um dia após a rejeição, aos 19 dias de abril do mesmo ano, em uma manobra
ilegal efetuada pelo presidente da Câmara Rodrigo Maia, que ademais segurou a sessão por
mais de duas horas para obter quórum, o Requerimento de Urgência foi novamente apresentado
e apreciado, sendo aprovado por 287 votos a favor, 30 a mais que o mínimo necessário, contra
144 votos contrários, em frontal violação ao processo legislativo.
Na sequência, Comissão Especial destinada a avaliar o então Projeto de Lei nº 6787,
deu parecer pela constitucionalidade, pela juridicidade e pela boa técnica legislativa do projeto.
Justificando que o projeto “visava aprimorar as relações do trabalho no Brasil, por meio da
valorização da negociação coletiva entre trabalhadores e empregadores, atualizar os
mecanismos de combate à informalidade da mão-de-obra no país. ” 97 Aprovada a redação final
no dia 26 de abril de 2017, o projeto foi remetido ao Senado Federal que não aprovou nenhuma

95
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial da União, 5 out. 1988.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>. Acesso em: 27 jun. 2017.
96
Art. 155. Poderá ser incluída automaticamente na Ordem do Dia para discussão e votação imediata, ainda que
iniciada a sessão em que for apresentada, proposição que verse sobre matéria de relevante e inadiável interesse
nacional, a requerimento da maioria absoluta da composição da Câmara, ou de Líderes que representem esse
número, aprovado pela maioria absoluta dos Deputados, sem a restrição contida no § 2º do artigo antecedente.
97
Relatório da Comissão Especial destinada a proferir parecer ao Projeto de Lei nº 6.787, de 2016, do Poder
Executivo, que “altera o Decreto-lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943 – Consolidação das Leis do Trabalho, e a Lei
nº 6.019, de 3 de janeiro de 1974, para dispor sobre eleições de representantes dos trabalhadores no local de
trabalho e sobre trabalho temporário, e dá outras providências”. p. 2. Disponível em: <
http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?codteor=1544961&filename=Tramitacao-
PL+6787/2016>. Acesso em: 16/07/2017.
53

emenda, já que, para evitar mudanças, o Planalto comprometeu-se a editar uma medida
provisória com as modificações na legislação trabalhista sugeridas pelos senadores, o que nos
parece nova violação constitucional ao sistema de freios e contrapesos (Checks and Balances)
O Ministério Público do Trabalho, em documento assinado pelo seu Procurador Geral,
Ronaldo Fleury, aponta algumas outras questões que tornam a norma materialmente
inconstitucional.
Segundo a posição do MPT,

Ao atrelar a prestação de serviços e a remuneração dos empregados apenas e


exclusivamente às necessidades da empresa, o Projeto equipara os trabalhadores aos
demais insumos de produção. Assim, confere ao trabalhador a mesma natureza
tarifada, conforme o uso, a exemplo dos itens que compõe a planilha de custos das
empresas: energia elétrica; serviços telefônicos e máquinas locadas. Ou seja, não
haverá pagamento enquanto o trabalhador estiver à disposição do empregado sem que
haja produção.98

Além disso, ao atrelar a remuneração do trabalhador ao sucesso do empreendimento, o


projeto de lei põe em risco o suprimento das necessidades vitais básicas do trabalhador,
violando o princípio da alteridade e comprometendo seu mínimo existencial e, portanto, sua
dignidade. Ademais, viola-se o princípio da função social da propriedade, segundo o qual a
empresa não pode servir-se apenas à acumulação de lucro.
Especificamente sobre nossa argumentação de que o conjunto normativo da lei
13.467/2017 é prejudicial ao trabalhador em relação à CLT, e, por essa razão, materialmente
inconstitucional, passemos à uma análise genérica dos tópicos da Reforma. Esta análise não
almeja o aprofundamento da matéria, ou a profunda e exaustiva discussão do tema, mas apenas
demonstrar que a novel legislação é, praticamente em sua integralidade, prejudicial em relação
à CLT, colidindo, especialmente, com o princípio constitucional da vedação do retrocesso
social, razão pela qual passamos à quase totalidade das disposições.

1-
Art. 2º - §2º: Sempre que uma ou mais empresas, tendo, embora, cada uma delas,
personalidade jurídica própria, estiverem sob a direção, controle ou administração de
outra, ou ainda quando, mesmo guardando cada uma sua autonomia, integrem grupo
econômico, serão responsáveis solidariamente pelas obrigações decorrentes da
relação de emprego. § 3º Não caracteriza grupo econômico a mera identidade de
sócios, sendo necessárias, para a configuração do grupo, a demonstração do interesse

98
Nota técnica nº 1, de 23 de janeiro de 2017, da Secretaria de Relações Institucionais do Ministério Público do
Trabalho (MPT). Disponível em: < http://portal.mpt.mp.br/wps/wcm/connect/portal_mpt/894c860b-46fc-4d9b-
9854-41de3a8683af/Nota+T%C3%A9cnica+n%C2%BA+1-2017+-+PLS+218-2016+-
+Jornada+Intermitente.pdf?MOD=AJPERES&attachment=true&id=1485293121151>. Acesso em: 17 de julho de
2017.
54

integrado, a efetiva comunhão de interesses e a atuação conjunta das empresas dele


integrantes.99

O parágrafo 2º do art. 2º da CLT, que define o conceito de grupo econômico, foi


restringido pela inserção do novo parágrafo 2º, que limita as hipóteses de sua formação e,
portanto, da responsabilidade solidária das obrigações decorrentes da relação em emprego.
A proposta legislativa limita, para fins de solidariedade entre as empresas, os grupos
econômicos apenas aos grupos por subordinação, isto é, aqueles em que há uma empresa
controladora e empresas controladas, deixando de fora os grupos por coordenação geridos e
administrados pelos mesmos sócios com confusão de pessoal, patrimonial ou de serviços.
Impedir a solidariedade de grupos por coordenação quando houver gerência comum é medida
que importa retrocesso, já que a jurisprudência há muito reconhece a responsabilidade dos
grupos por coordenação em que há administração comum.
Assim, com a inserção do parágrafo 3º no art. 2º da CLT, torna-se ônus do empregado
a prova três requisitos para que se caracterize o grupo econômico: interesse integrado,
comunhão de interesses e a atuação conjunta. A mera identidade de sócios não o caracteriza. O
parágrafo 3º exclui expressamente a caracterização do grupo econômico pela mera identidade
de sócios, ou seja: não será fácil provar o interesse integrado ou a comunhão de interesses, pois
a indicação dos mesmos sócios não é aceita como única prova. A atuação conjunta é
substancialmente ainda mais complicada de se provar, especialmente quando os campos de
atuação das empresas são completamente diversos. Parece se tratar de uma prova diabólica, a
ônus da parte hipossuficiente da relação.

2-
Art. 4º ................................................................
§ 1º Computar-se-ão, na contagem de tempo de serviço, para efeito de indenização e
estabilidade, os períodos em que o empregado estiver afastado do trabalho prestando
serviço militar e por motivo de acidente do trabalho.
§ 2º Por não se considerar tempo à disposição do empregador, não será computado
como período extraordinário o que exceder a jornada normal, ainda que ultrapasse o
limite de cinco minutos previsto no § 1º do art. 58 desta Consolidação, quando o
empregado, por escolha própria, buscar proteção pessoal, em caso de insegurança nas
vias públicas ou más condições climáticas, bem como adentrar ou permanecer nas
dependências da empresa para exercer atividades particulares, entre outras:
I - práticas religiosas;
II - descanso;
III - lazer;
IV - estudo;
V - alimentação;
VI - atividades de relacionamento social;

99
BRASIL. Lei nº 13.467 de 13 de julho de 2017. Diário Oficial da União, 14 jul. 2017. Disponível em: <
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/L13467.htm>. Acesso em: 17 jun. 2017.
55

VII - higiene pessoal;


VIII - troca de roupa ou uniforme, quando não houver obrigatoriedade de realizar a
troca na empresa. 100

No caso do art. 4º, a redação anterior do parágrafo único foi transportada para o § 1º e a
redação do § 2º traz uma exceção ao caput do art. 4º, que assevera:

Art. 4º - Considera-se como de serviço efetivo o período em que o empregado esteja


à disposição do empregador, aguardando ou executando ordens, salvo disposição
especial expressamente consignada.101

Até então, era pacífico que o tempo que excedesse os 5 minutos consignados no § 1º do
art. 58 da CLT seria considerado tempo à disposição, denominados minutos residuais. A
redação conferida ao § 2º, em leitura combinada com o caput, informa que as disposições
especiais expressamente consignadas, que excluem a presunção de tempo à disposição, devem
ser as do supracitado parágrafo. Como o ônus probandi é do empregador, já que o art. 4º
estabeleceu uma presunção relativa de tempo à disposição, exceto no caso da alimentação,
higiene pessoal e troca de roupa, que de fato são incisos em prejuízo do empregado, na prática
será forçoso concluir que nas demais hipóteses, o empregado permanece na empresa por
vontade própria, senão por imposição explícita ou implícita do empregador.
Questões relevantes surgirão no que tange ao acidente de trabalho. Parece-nos que o
empregador estaria isento de responsabilidade em um acidente que ocorresse na empresa
enquanto o empregado está em sua circunscrição, mas não está à disposição do empregador. Já
quanto à possibilidade de o empregador chamar o empregado, que está na empresa, mas não
está à disposição, a serviço por necessidade excepcional, segundo a sistemática da reforma,
seria possível. Em todo o caso, acreditamos que se o empregado é forçado a continuar
uniformizado, podendo ser chamado a serviço, deve-se criar uma presunção de tempo à
disposição, com base no princípio da proteção, mesmo que na prática ele nunca tenha sido
chamado.

3-
Art. 8º .................................................................
§ 1º O direito comum será fonte subsidiária do direito do trabalho.
§ 2º Súmulas e outros enunciados de jurisprudência editados pelo Tribunal Superior
do Trabalho e pelos Tribunais Regionais do Trabalho não poderão restringir direitos
legalmente previstos nem criar obrigações que não estejam previstas em lei.

100
Ibid.
101
BRASIL. Decreto-Lei nº 5.452 de 01 de maio de 1943. Diário Oficial da União, 09 ago. 1943. Disponível em:
< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del5452.htm>. Acesso em: 17 jun. 2017.
56

§ 3º No exame de convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho, a Justiça do


Trabalho analisará exclusivamente a conformidade dos elementos essenciais do
negócio jurídico, respeitado o disposto no art. 104 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro
de 2002 (Código Civil), e balizará sua atuação pelo princípio da intervenção mínima
na autonomia da vontade coletiva. 102

No caso do art. 8º, o caput permanece com a redação original, dispondo que:

As autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de disposições legais


ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por
eqüidade e outros princípios e normas gerais de direito, principalmente do direito do
trabalho, e, ainda, de acordo com os usos e costumes, o direito comparado, mas
sempre de maneira que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o
interesse público.103

O antigo parágrafo único, foi transportado para o § 1º, com a supressão da expressão
“naquilo em que não for incompatível com os princípios fundamentais deste”104.
No entanto, normas gerais do direito comum não podem prevalecer sobre as normas
especiais do Direito do Trabalho e, os princípios são, como as regras, normas jurídicas.
Contudo, a nova redação revela o escuso interesse de diminuir-se a importância do Direito do
Trabalho, especialmente quando lidos os demais parágrafos.
O parágrafo 2º, em latente inconstitucionalidade, retira por completo a função das
súmulas, que deveriam servir para uniformizar a jurisprudência dos tribunais e dar interpretação
constitucional aos artigos. A própria redação do parágrafo é contraditória, uma vez que
determina que a súmula não poderia ser usada para restringir direitos (o que seria ótimo para o
empregado), mas, na sequência, estabelece que não pode criar obrigação não prevista em lei.
Parece uma tentativa malfeita de aplicação da pirâmide kelsiana no Direito do Trabalho, pois,
se a súmula é uma orientação interpretativa, ela necessariamente criará uma obrigação que
poderia não se depreender da redação da lei (texto legal). O legislador parece não saber
exatamente a diferença entre a redação de um artigo e a norma que dela se extrai.
Por fim, a redação do § 3º parece querer afastar o princípio da hipossuficiência. A
alteração do parágrafo 3º é inconstitucional e bem mais complexa, pois ao tentar estabelecer
como único parâmetro de validade da negociação coletiva os requisitos do Direito Civil, este
dispositivo legitima a negociação coletiva flexibilizadora, que não é pautada em valores éticos
e não é compatível com a realidade assimétrica das partes no Direito do Trabalho. Desse modo,

102
BRASIL. Lei nº 13.467 de 13 de julho de 2017. Diário Oficial da União, 14 jul. 2017. Disponível em: <
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/L13467.htm>. Acesso em: 17 jun. 2017.
103
Ibid.
104
BRASIL. Decreto-Lei nº 5.452 de 01 de maio de 1943. Diário Oficial da União, 09 ago. 1943. Disponível em:
< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del5452.htm>. Acesso em: 17 jun. 2017.
57

viola-se o princípio da adequação setorial negociada e o patamar mínimo civilizatório do


trabalhador, legitimando-se juridicamente a precarização.

4-
Art. 10-A. O sócio retirante responde subsidiariamente pelas obrigações trabalhistas
da sociedade relativas ao período em que figurou como sócio, somente em ações
ajuizadas até dois anos depois de averbada a modificação do contrato, observada a
seguinte ordem de preferência:
I - a empresa devedora;
II - os sócios atuais; e
III - os sócios retirantes.
Parágrafo único. O sócio retirante responderá solidariamente com os demais quando
ficar comprovada fraude na alteração societária decorrente da modificação do
contrato. Faltou referência bibliográfica
Art. 11. A pretensão quanto a créditos resultantes das relações de trabalho prescreve
em cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a
extinção do contrato de trabalho.
I - (revogado);
II - (revogado). 105

O artigo 10-A especifica os limites da responsabilidade do sócio retirante.


Anteriormente, havia divergência quanto ao período de responsabilidade. Há jurisprudência no
sentido de que o sócio retirante respondia pelas verbas trabalhistas, desde que provado que se
beneficiou do trabalho do Reclamante, pouco importando se, no momento do ajuizamento da
ação, o sócio não mais integrava a sociedade106. Entretanto, há posicionamento doutrinário
defendendo que, ante a anterior omissão da CLT, aplicavam-se os artigos 1.003, parágrafo
único e 1.032, ambos do Código Civil.

Art. 1003. (...)


Parágrafo único. Até 2 (dois) anos depois de averbada a modificação do contrato,
responde o cedente solidariamente com o cessionário, perante a sociedade e terceiros,
pelas obrigações que tinha como sócio.
Art. 1032. A retirada, exclusão ou morte de sócio, não o exime, ou a seus herdeiros,
da responsabilidade pelas obrigações sociais anteriores, até 2 (dois) anos após
averbada a resolução da sociedade; nem nos dois primeiros casos, pelas posteriores e
em igual prazo, enquanto não se requer a averbação.107

A inclusão do art. 10-A beneficia ainda mais o sócio retirante, estabelecendo


responsabilidade subsidiária, ao invés da responsabilidade solidária.

105
BRASIL. Lei nº 13.467 de 13 de julho de 2017. Diário Oficial da União, 14 jul. 2017. Disponível em: <
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/L13467.htm>. Acesso em: 17 jun. 2017.
106
Cf. BRASIL. Tribunal Regional do Trabalho da Quarta Região. Agravo de Petição n.50080.006/00.0. Quarta
Turma. Juiz Hugo Carlos Scheuermann, julgado em 20.06.2001. Disponível na Internet: https://www.trt4.gov.br.
Acesso em: 05 de maio de 2007.
107
BRASIL. Lei nº 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Diário Oficial da União, 11 jan. 2002. Disponível em: <
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406.htm>. Acesso em: 17 jun. 2017.
58

Já o artigo 11, traz simples norma específica prescricional prevista constitucionalmente


para o processo do trabalho. Observe: a norma jurídica do art. 11 da CLT e a norma jurídica do
artigo 11 da Reforma Trabalhista é a mesma. Isso porque, a Constituição de 1988 não permite
o tratamento desigual entre trabalhadores urbanos e rurais. Logo, desde 5 de outubro de 1988,
o que vale para o trabalhador urbano, vale para o trabalhador rural. O que faz a Reforma é
corrigir, adequadamente, a redação anterior do artigo, o que na prática não faz diferença, pois,
como dissemos, apesar de diferentes as redações, a norma que se extrai de ambas as redações é
a mesma.

5-

Art. 11. (...)


§ 2º Tratando-se de pretensão que envolva pedido de prestações sucessivas decorrente
de alteração ou descumprimento do pactuado, a prescrição é total, exceto quando o
direito à parcela esteja também assegurado por preceito de lei. § 3º A interrupção da
prescrição somente ocorrerá pelo ajuizamento de reclamação trabalhista, mesmo que
em juízo incompetente, ainda que venha a ser extinta sem resolução do mérito,
produzindo efeitos apenas em relação aos pedidos idênticos.
Art. 11-A. Ocorre a prescrição intercorrente no processo do trabalho no prazo de dois
anos.§ 1º A fluência do prazo prescricional intercorrente inicia-se quando o exequente
deixa de cumprir determinação judicial no curso da execução. § 2º A declaração da
prescrição intercorrente pode ser requerida ou declarada de ofício em qualquer grau
de jurisdição. 108

Houve ainda a inserção dos parágrafos 2º e 3º no artigo 11, estabelecendo que os pedidos
que envolvam prestações sucessivas, não decorrentes da lei, relativas a alteração ou
descumprimento do que foi pactuado, prescrevem integralmente. Ou seja, o início da prescrição
não corre de cada parcela, mas da primeira que foi alterada ou descumprida. Este era o
entendimento do TST, súmula 294, em prejuízo do trabalhador, agora, positivado.
O artigo 11-A, por sua vez, foi inserido para pôr fim a uma polêmica gigantesca – a
suposta contradição entre a súmula 114109 do TST e a súmula 327110 do STF. O atual
entendimento do TST é de que não há prescrição intercorrente (prescrição que ocorre durante
o curso do processo judicial) no Direito do Trabalho, exceto quando a execução é paralisada
por omissão ou descaso da própria parte interessada. Entretanto, havendo prescrição
intercorrente, a matéria era regida pela Súmula 150 do STF, que dizia “prescreve a execução

108
BRASIL. Lei nº 13.467 de 13 de julho de 2017. Diário Oficial da União, 14 jul. 2017. Disponível em: <
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/L13467.htm>. Acesso em: 17 jun. 2017.
109
Súmula nº 114 do TST. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE (mantida) - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003.
É inaplicável na Justiça do Trabalho a prescrição intercorrente.
110
Súmula nº 327 do STF. TRABALHISTA. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. ADMISSIBILIDADE NO
DIREITO TRABALHISTA. CLT, arts. 11, 765 e 791. O direito trabalhista admite a prescrição intercorrente.
59

no mesmo prazo de prescrição da ação”, ou seja, se ação foi ajuizada no curso do contrato de
trabalho ou emprego, 5 anos, se fosse ajuizada findo o contrato, 2 anos (art. 7º, XXIX, da
CRFB). A nova regra fixa prazo único de 2 anos e o § 1º estabelece o marco da fluência do
prazo, o que representa mais um retrocesso social para o trabalhador.

6-
Art. 47. O empregador que mantiver empregado não registrado nos termos do art. 41
desta Consolidação ficará sujeito a multa no valor de R$ 3.000,00 (três mil reais) por
empregado não registrado, acrescido de igual valor em cada reincidência. § 1º
Especificamente quanto à infração a que se refere o caput deste artigo, o valor final
da multa aplicada será de R$ 800,00 (oitocentos reais) por empregado não registrado,
quando se tratar de microempresa ou empresa de pequeno porte. § 2º A infração de
que trata o caput deste artigo constitui exceção ao critério da dupla visita. 111

A multa que hoje é de um salário mínimo por empregado, acrescido de igual valor para
cada reincidência, sobe para R$ 3.000,00 por empregado, acrescido de igual valor em cada
reincidência, exceto para a microempresa e empresa de pequeno porte, para quem o valor
estabelecido é de R$ 800,00. Excepcionou-se também o critério da dupla visita, inclusive para
a primeira visita nos estabelecimentos ou dos locais de trabalho, recentemente inaugurados ou
empreendidos para esta infração. Entretanto, a redação aprovada é prejudicial em relação à
redação original do projeto: A penalidade prevista no projeto original era de R$6.000,00, valor
obtido após profundos estudos apresentados pelos representantes do Ministério do Trabalho e
Emprego.

7-
Art. 47-A. Na hipótese de não serem informados os dados a que se refere o parágrafo
único do art. 41 desta Consolidação, o empregador ficará sujeito à multa de R$ 600,00
(seiscentos reais) por empregado prejudicado.112

Esta norma estava contida no parágrafo único do art. 47 da CLT, a multa anterior era de
meio salário mínimo, dobrado na reincidência, ou seja, houve leve aumento da penalidade para
a primeira infração e um abrandamento em relação à reincidência, que não contempla a dobra.

8-
Art. 58. ................................................................
§ 2º O tempo despendido pelo empregado desde a sua residência até a efetiva
ocupação do posto de trabalho e para o seu retorno, caminhando ou por qualquer meio

111
BRASIL. Lei nº 13.467 de 13 de julho de 2017. Diário Oficial da União, 14 jul. 2017. Disponível em: <
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/L13467.htm>. Acesso em: 17 jun. 2017.
112
Ibid.
60

de transporte, inclusive o fornecido pelo empregador, não será computado na jornada


de trabalho, por não ser tempo à disposição do empregador.
§ 3º (Revogado)113

Norma que regulava a jornada in itinere, o parágrafo 2º da CLT dispunha que

O tempo despendido pelo empregado até o local de trabalho e para o seu retorno, por
qualquer meio de transporte, não será computado na jornada de trabalho, salvo
quando, tratando-se de local de difícil acesso ou não servido por transporte
público, o empregador fornecer a condução.114

Com a redação atual, mesmo que o empregador forneça a condução, não se considera o
deslocamento como tempo à disposição (norma obviamente prejudicial).

9-
Art. 58-A. Considera-se trabalho em regime de tempo parcial aquele cuja duração
não exceda a trinta horas semanais, sem a possibilidade de horas suplementares
semanais, ou, ainda, aquele cuja duração não exceda a vinte e seis horas semanais,
com a possibilidade de acréscimo de até seis horas suplementares semanais. § 3º As
horas suplementares à duração do trabalho semanal normal serão pagas com o
acréscimo de 50% (cinquenta por cento) sobre o salário-hora normal. § 4º Na hipótese
de o contrato de trabalho em regime de tempo parcial ser estabelecido em número
inferior a vinte e seis horas semanais, as horas suplementares a este quantitativo serão
consideradas horas extras para fins do pagamento estipulado no § 3º , estando
também limitadas a seis horas suplementares semanais. § 5º As horas suplementares
da jornada de trabalho normal poderão ser compensadas diretamente até a semana
imediatamente posterior à da sua execução, devendo ser feita a sua quitação na folha
de pagamento do mês subsequente, caso não sejam compensadas. § 6º É facultado ao
empregado contratado sob regime de tempo parcial converter um terço do período de
férias a que tiver direito em abono pecuniário. § 7º As férias do regime de tempo
parcial são regidas pelo disposto no art. 130 desta Consolidação.115

Atualmente o trabalho a tempo parcial é aquele que não excede 25 horas semanais (art.
58-A, caput, CLT). A Reforma aumenta este teto para 30 horas, sem a possibilidade de horas
extraordinárias ou 26 horas com eventual exigência de até 6 horas extraordinárias, que serão
acrescidas em 50% sobre o salário-hora normal, consolidando a expansão precária de contratos
atípicos, que são mais vulneráveis em termos de proteção social.
Interessante a observação da Professora Vólia Bonfim: “A autorização de trabalho extra
de até 6 horas por semana pode, na prática, permitir que um empregado trabalhe 8 horas + 6

113
Ibid.
114
BRASIL. Decreto-Lei nº 5.452 de 01 de maio de 1943. Diário Oficial da União, 09 ago. 1943. Disponível em:
< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del5452.htm>. Acesso em: 17 jun. 2017. Grifos nossos.
115
BRASIL. Lei nº 13.467 de 13 de julho de 2017. Diário Oficial da União, 14 jul. 2017. Disponível em: <
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/L13467.htm>. Acesso em: 17 jun. 2017.
61

horas em um único dia. É comum garçons contratados para trabalharem apenas sábados e
domingos, sendo o sábado o dia mais intenso. Imaginem, então, um garçom contratado para 16
horas semanais. No sábado ele poderia trabalhar 8 horas mais 6horas extras = 14 horas? A
medida é absurda, pois leva à exaustão. Daí a necessidade de que se limite ao máximo de 2
horas extras ao dia”.116
O bizarro parágrafo 5º autoriza, ainda, a compensação das horas extras no contrato a
tempo parcial. Transformando o supracitado artigo em um completo instituto jurídico
flexibilizador, que impõe jornadas mais longas aos empregados, prejudicando a saúde do
obreiro e seus projetos de vida. O parágrafo 6º autoriza o empregado a vender 1/3 de suas férias,
o que era permitido apenas ao empregado de tempo integral e o parágrafo 7º é uma inovação
mais benéfica que equipara os períodos de férias ao do empregado por tempo integral.

10-
Art. 59. A duração diária do trabalho poderá ser acrescida de horas extras, em número
não excedente de duas, por acordo individual, convenção coletiva ou acordo coletivo
de trabalho. § 1º A remuneração da hora extra será, pelo menos, 50% (cinquenta por
cento) superior à da hora normal.§ 3º Na hipótese de rescisão do contrato de trabalho
sem que tenha havido a compensação integral da jornada extraordinária, na forma dos
§§ 2º e 5º deste artigo, o trabalhador terá direito ao pagamento das horas extras não
compensadas, calculadas sobre o valor da remuneração na data da rescisão. § 4º
(Revogado). § 5º O banco de horas de que trata o § 2º deste artigo poderá ser
pactuado por acordo individual escrito, desde que a compensação ocorra no período
máximo de seis meses. § 6º É lícito o regime de compensação de jornada estabelecido
por acordo individual, tácito ou escrito, para a compensação no mesmo mês. 117

No caput do art. 59, há uma mudança na redação para o implemento de horas extras pelo
acordo coletivo de trabalho. Em verdade, a expressão “contrato coletivo” já era interpretada por
parte da doutrina como gênero, que englobava o acordo coletivo e convenção coletiva, ou seja:
a alteração fixou apenas uma atualização na terminologia. No entanto, é importante ressaltar
que a expansão das horas extras é sempre um retrocesso. Horas extras são sempre prejudiciais
à saúde e à vida social do empregado.
Mantido o banco de horas no parágrafo 2º, o parágrafo 3º trouxe apenas mudanças na
redação, já o § 4º, que impedia os empregados a tempo parcial de prestar horas extras, foi
revogado, o que desconfigura a essência do contrato a tempo parcial.

116
BOMFIM, Vólia Cassar. REFORMA TRABALHISTA: COMENTÁRIOS AO SUBSTITUTIVO DO
PROJETO DE LEI 6787/16. Rio de Janeiro: Revista eletônica da OAB. 2017. p. 11. Disponível em: <
http://revistaeletronica.oabrj.org.br/wp-content/uploads/2017/05/V%C3%B3lia-Bomfim-Cassar.pdf>. Acesso
em: 30 de julho de 2017.
117
Ibid.
62

O parágrafo 5º permite o implemento do banco de horas por acordo individual, o que é


prejudicial dada a hipossuficiência do empregado frente ao empregador, ou seja: não há
possibilidade de uma livre negociação por ser o empregador dono dos meios de produção e o
empregado apenas um sujeito que necessita comercializar sua força de trabalho como meio de
subsistência.

11-
Art. 59-A. Em exceção ao disposto no art. 59 desta Consolidação, é facultado às
partes, mediante acordo individual escrito, convenção coletiva ou acordo coletivo de
trabalho, estabelecer horário de trabalho de doze horas seguidas por trinta e seis horas
ininterruptas de descanso, observados ou indenizados os intervalos para repouso e
alimentação. Parágrafo único. A remuneração mensal pactuada pelo horário previsto
no caput deste artigo abrange os pagamentos devidos pelo descanso semanal
remunerado e pelo descanso em feriados, e serão considerados compensados os
feriados e as prorrogações de trabalho noturno, quando houver, de que tratam o art.
70 e o § 5º do art. 73 desta Consolidação.118

Em flagrante inconstitucionalidade, permite-se o implemento da prejudicial jornada de


12 x 36 horas, onde mesmo que o dia de trabalho recaia sobre feriado não há dobra da
remuneração, por acordo individual, contra disposição expressa da CRFB, art. 7, XIII e XIV,
que prevê que as modificações na jornada devem ser feitas por negociação coletiva.

12 -
Art. 59-B. O não atendimento das exigências legais para compensação de jornada,
inclusive quando estabelecida mediante acordo tácito, não implica a repetição do
pagamento das horas excedentes à jornada normal diária se não ultrapassada a duração
máxima semanal, sendo devido apenas o respectivo adicional.
Parágrafo único. A prestação de horas extras habituais não descaracteriza o acordo
de compensação de jornada e o banco de horas. 119

Basicamente o artigo estabelece que a hora extra exigida em um dia, quando o cômputo
total de horas não excede a jornada máxima semanal do empregado, não deve ser paga duas
vezes. Apenas há o pagamento do adicional referente àquela hora que foi exigida naquele
determinado dia. Ou seja, se a jornada do empregado é, por exemplo 8 horas por dia e 40h
semanais, caso ele trabalhe 9 horas na segunda-feira e 7 horas na sexta-feira, por não se ter
excedido a jornada de 40h semanas só haverá o pagamento de 50% do valor da hora excedida
na segunda-feira e não da hora inteira mais 50%. A súmula 85 do TST já previa este

118
Ibid.
119
Ibid.
63

entendimento, entretanto, vedava as disposições nela cominadas a quem aplicava o regime


compensatório na modalidade “banco de horas”, que somente poderia ser instituído por
negociação coletiva.
O parágrafo único legitima a bizarra figura das horas extra habituais. Como uma
excepcionalidade pode ser habitual? Se é habitual é a regra, não a exceção.
Além disso, o acordo de compensação deve ser escrito. O ajuste não será válido quando
for tácito ou verbal, pois o parágrafo 2º do artigo 59 da CLT exige a forma escrita.

13-

Art. 60. ................................................................


Parágrafo único. Excetuam-se da exigência de licença prévia as jornadas de doze
horas de trabalho por trinta e seis horas ininterruptas de descanso. 120

Norma extremamente prejudicial, pois permite a jornada de 12 x 36 horas em atividades


insalubres sem licença prévia das autoridades competentes em matéria de higiene do trabalho,
as quais, para esse efeito, deviam proceder aos necessários exames locais e à verificação dos
métodos e processos de trabalho, quer diretamente, quer por intermédio de autoridades
sanitárias federais, estaduais e municipais, com quem entrariam em entendimento para tal fim.

14-
Art. 61. .................................................................
§ 1º O excesso, nos casos deste artigo, pode ser exigido independentemente de
convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho.121

Independentemente de previsão em negociação coletiva, pode ser exigida hora extra do


empregado por necessidade imperiosa do empregador, ficando este isento de comunicar, dentro
de 10 (dez) dias, à autoridade competente em matéria de trabalho, ou, antes desse prazo,
justificado no momento da fiscalização sem prejuízo dessa comunicação, a exigência.

15-
Art. 62. .................................................................
III - os empregados em regime de teletrabalho.122

120
Ibid.
121
Ibid.
122
Ibid.
64

De forma inconstitucional, o art. 62 exclui das normativas sobre a jornada de trabalho


os empregados em regime de teletrabalho. Isso significa que esses trabalhadores, mesmo que
controlados, passam a não ter direito às horas extras (não têm limite de jornada), intervalo
intrajornada, intervalo interjornada, hora noturna e adicional noturno. Ressalta-se que o projeto
(art. 75-B) expressamente afirma que o teletrabalhador não é trabalhador externo. No entanto,
o teletrabalho é espécie de trabalho à distância, executado fora do estabelecimento do patrão,
logo, trata-se de trabalho externo. Além disso, com as novas tecnologias é perfeitamente
possível o controle, a fiscalização e a mensuração do trabalho executado.

16-
Art. 71. .................................................................
§ 4º A não concessão ou a concessão parcial do intervalo intrajornada mínimo, para
repouso e alimentação, a empregados urbanos e rurais, implica o pagamento, de
natureza indenizatória, apenas do período suprimido, com acréscimo de 50%
(cinquenta por cento) sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho. 123

Anteriormente, a não concessão ou a concessão parcial do intervalo intrajornada mínimo


para repouso e alimentação, por se tratar de norma de saúde e segurança, implicava o pagamento
do período por completo, como se o empregado não o tivesse gozado, acrescido de no mínimo
50% do valor da hora de trabalho. Agora, o empregador apenas arca com o período suprimido
com o acréscimo de 50%. O acréscimo que era de no mínimo 50%, hoje é fixo em 50% sobre
o valor da remuneração da hora normal de trabalho.

17-
TÍTULO II
CAPÍTULO II-A
DO TELETRABALHO
Arts. 75-A a 134. 124

O título que trata do teletrabalho em seu artigo 75-D permite que, por ajuste, possam ser
transferidos ao empregado os gastos/riscos com a aquisição e fornecimento de equipamento e
material de trabalho, violando o princípio da alteridade, além da exclusão feita pelo art. 62, III,
das normativas sobre jornada de trabalho o que, na prática, permitirá jornadas de longa duração
sem a corresponde remuneração ao empregado em regime de teletrabalho.
18-
TÍTULO II-A
DO DANO EXTRAPATRIMONIAL

123
Ibid.
124
Ibid.
65

Arts. 223-A a 223-G.125

O título sobre o dano extrapatrimonial, se alguns outros podem ser definidos como
bizarros, é, em si, bizarríssimo. A proposta aprovada é inconstitucional. O legislador, aqui,
supondo saber medir a dor do ofendido, cria uma tarifação de sua dor através do artigo 223-G,
§1º, conforme a remuneração do empregado. Logo, se o empregado recebe menos, sua honra e
dignidade também são subalternas. Ressaltamos que o artigo 5º da CRFB de 1988, em seus
incisos V e X, assegura a indenização por dano material e moral sem prever a possibilidade de
qualquer limitação. Ademais, a reforma, ao estabelecer parâmetros para que o juiz avalie a
extensão do dano, retira seu livre convencimento motivado e impede a análise que deve ser feita
no caso concreto sobre a extensão do dano experimentado.
Além disso, o artigo 233-A propõe que o dano extrapatrimonial seja exclusivamente
regulado por esse Título da CLT, o que significa a exclusão das regras da Constituição e do
Código Civil e com isso, a possibilidade de exclusão da responsabilidade objetiva ou a
decorrente da atividade de risco. Além de inconstitucional, porque exclui a aplicação da
Constituição, a medida trata de forma diferente a reparação de danos de natureza civil da
reparação trabalhista.

19-
Art. 394-A. Sem prejuízo de sua remuneração, nesta incluído o valor do adicional de
insalubridade, a empregada deverá ser afastada de: I - atividades consideradas
insalubres em grau máximo, enquanto durar a gestação; II - atividades consideradas
insalubres em grau médio ou mínimo, quando apresentar atestado de saúde, emitido
por médico de confiança da mulher, que recomende o afastamento durante a gestação;
III - atividades consideradas insalubres em qualquer grau, quando apresentar atestado
de saúde, emitido por médico de confiança da mulher, que recomende o afastamento
durante a lactação. § 1º ...................................................................... § 2º Cabe à
empresa pagar o adicional de insalubridade à gestante ou à lactante, efetivando-se a
compensação, observado o disposto no art. 248 da Constituição Federal, por ocasião
do recolhimento das contribuições incidentes sobre a folha de salários e demais
rendimentos pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste
serviço.§ 3º Quando não for possível que a gestante ou a lactante afastada nos termos
do caput deste artigo exerça suas atividades em local salubre na empresa, a hipótese
será considerada como gravidez de risco e ensejará a percepção de salário-
maternidade, nos termos da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991, durante todo o
período de afastamento.126

A nova redação do art. 394-A, tem pontos positivos para a empregada gestante, como o
não prejuízo à remuneração, mas isto já era garantido por doutrina e jurisprudência, e pontos
negativos, já que se exige atestado de saúde emitido por médico que recomende o afastamento

125
Ibid.
126
Ibid.
66

para atividades insalubres de grau médio e mínimo. Ou seja, o legislador considera que a
gestante, a princípio, pode passar toda a sua gestação exposta a graus médios e mínimos de
insalubridade.

20-
Art. 396. .............................................................
§ 1o .......................................................................
§ 2o Os horários dos descansos previstos no caput deste artigo deverão ser definidos
em acordo individual entre a mulher e o empregador.127

Risível redação do parágrafo 2º, condiciona os intervalos para amamentação a acordo


individual entre a mulher e o empregador. Agora, o filho tem que ser alimentado na hora em
que o empregador deseja, não na hora em que tem fome. Além disso, a empregada que retorna
da licença-maternidade está tentando se restabelecer no ambiente profissional. A negociação de
intervalos é irreal, tendo em vista a aniquilação da liberdade de contratar da empregada, que
pode ser coagida psicologicamente, economicamente e socialmente pelo empregador, tendo em
vista a inexistência de garantia de emprego a tempo indeterminado.

21-
Art. 442-B. A contratação do autônomo, cumpridas por este todas as formalidades
legais, com ou sem exclusividade, de forma contínua ou não, afasta a qualidade de
empregado prevista no art. 3º desta Consolidação. 128

Subversão do princípio da primazia da realidade sobre a forma, o art. 442-B vem criar
a presunção de que a contratação do autônomo afasta a qualidade de empregado, restringindo
legalmente as possibilidades expansivas de subordinação já previstas pela doutrina e
jurisprudência (subordinação reticular, integrativa e estrutural). No entanto, como forma de
resistência a este dispositivo flexibilizatório, o empregado e o magistrado podem sempre alegar
fraude trabalhista prevista pelo art. 9º129 da CLT.

22-
Art. 443. O contrato individual de trabalho poderá ser acordado tácita ou
expressamente, verbalmente ou por escrito, por prazo determinado ou indeterminado,
ou para prestação de trabalho intermitente.§ 3º Considera-se como intermitente o
contrato de trabalho no qual a prestação de serviços, com subordinação, não é

127
Ibid.
128
Ibid.
129
Art. 9º - Serão nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a
aplicação dos preceitos contidos na presente Consolidação. BRASIL. Decreto-Lei nº 5.452 de 01 de maio de 1943.
Diário Oficial da União, 09 ago. 1943. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-
lei/Del5452.htm>. Acesso em: 17 jun. 2017.
67

contínua, ocorrendo com alternância de períodos de prestação de serviços e de


inatividade, determinados em horas, dias ou meses, independentemente do tipo de
atividade do empregado e do empregador, exceto para os aeronautas, regidos por
legislação própria.130

Aqui houve a inclusão da disposição sobre trabalho intermitente, no caput, e sua


definição no parágrafo terceiro. O trabalho intermitente não existia antes na CLT, pois é uma
modalidade de prestação laboral diversa e mais precária que o contrato a tempo determinado
No trabalho intermitente, são alternados períodos de prestação de serviços e de
inatividade, determinados em horas, dias ou meses. Nele, o trabalhador ficará à disposição do
empregador 24 horas por dia, mas só receberá pelos períodos efetivamente laborados. Mais que
isso, não há um mínimo de horas que devem ser exigidas do empregado. Ou seja, considerando
o salário mínimo hora de R$ 4,26, um trabalhador que for chamado para prestar uma hora de
trabalho em um mês receberá, ao final deste, R$ 4,26. Se ele não trabalhar dia nenhum, não
receberá nada. Ao receber a convocação do empregador, caso a aceite, a parte que a descumprir
sem justo motivo pagará à outra a remuneração de 50% do que seria devido. Ou seja, o
empregado ainda pode sair devendo o empregador.

23-
Art. 444. ...........................................................
Parágrafo único. A livre estipulação a que se refere o caput deste artigo aplica-se às
hipóteses previstas no art. 611-A desta Consolidação, com a mesma eficácia legal e
preponderância sobre os instrumentos coletivos, no caso de empregado portador de
diploma de nível superior e que perceba salário mensal igual ou superior a duas vezes
o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência Social.131

O tema será tratado no tópico do artigo 611-A, que mitiga o princípio da norma mais
favorável e faz preponderar o negociado sobre o legislado. O artigo 444 ressalta que a
disposição é aplicável para o empregado portador de diploma de nível superior e que perceba
salário mensal igual ou superior a duas vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral
de Previdência Social. Os direitos trabalhistas previstos em lei são indisponíveis, isto é, são
irrenunciáveis e intransacionáveis pela sua característica de direitos fundamentais. O valor do
salário recebido pelo empregado não altera a natureza jurídica do direito. Entender que os
empregados que recebem mais podem livremente dispor sobre os direitos trabalhistas
relacionados no artigo 611-A é negar a vulnerabilidade do trabalhador, que depende do emprego

130
BRASIL. Lei nº 13.467 de 13 de julho de 2017. Diário Oficial da União, 14 jul. 2017. Disponível em: <
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/L13467.htm>. Acesso em: 17 jun. 2017.
131
Ibid.
68

para sobreviver e será submetido a qualquer ajuste para manutenção do emprego. O valor do
salário do empregado não exclui a relação de emprego e não diminui a subordinação. O estado
de vulnerabilidade permanece independentemente do valor auferido.

24-
Art. 448-A. Caracterizada a sucessão empresarial ou de empregadores prevista nos
arts. 10 e 448 desta Consolidação, as obrigações trabalhistas, inclusive as contraídas
à época em que os empregados trabalhavam para a empresa sucedida, são de
responsabilidade do sucessor. Parágrafo único. A empresa sucedida responderá
solidariamente com a sucessora quando ficar comprovada fraude na transferência. 132

O artigo 448-A é uma norma mais favorável, tem uma redação mais abrangente
estabelecendo a responsabilidade solidária entre sucedida e sucessora.

25-

Art. 456-A. Cabe ao empregador definir o padrão de vestimenta no meio ambiente


laboral, sendo lícita a inclusão no uniforme de logomarcas da própria empresa ou de
empresas parceiras e de outros itens de identificação relacionados à atividade
desempenhada. Parágrafo único. A higienização do uniforme é de responsabilidade
do trabalhador, salvo nas hipóteses em que forem necessários procedimentos ou
produtos diferentes dos utilizados para a higienização das vestimentas de uso
comum.133

O art. 456-A legitima o uso do empregado “outdoor”, além de definir a vestimenta, o


empregador pode, por exemplo, vender espaços de publicidade no uniforme de seus
empregados, ou divulgar a marca de empresas parceiras ou fornecedores. O parágrafo único
estabelece a responsabilidade do trabalhador pela higiene do uniforme. Entretanto, esquece de
estabelecer a quem incumbe o fornecimento do uniforme e em que quantidade. Afinal, não se
pode exigir de um empregado que recebeu apenas uma camisa de uniforme, e que é obrigado a
usá-la durante todos os dias da semana, muita higiene deste acessório. Quando o uniforme
precisar de cuidados especiais para sua higienização, a obrigação será do empregador.

26-
Art. 457. ...........................................................
§ 1º Integram o salário a importância fixa estipulada, as gratificações legais e as
comissões pagas pelo empregador. § 2º As importâncias, ainda que habituais, pagas
a título de ajuda de custo, auxílio-alimentação, vedado seu pagamento em dinheiro,
diárias para viagem, prêmios e abonos não integram a remuneração do empregado,
não se incorporam ao contrato de trabalho e não constituem base de incidência de
qualquer encargo trabalhista e previdenciário.§ 4º Consideram-se prêmios as

132
Ibid.
133
Ibid.
69

liberalidades concedidas pelo empregador em forma de bens, serviços ou valor em


dinheiro a empregado ou a grupo de empregados, em razão de desempenho superior
ao ordinariamente esperado no exercício de suas atividades.134

A nova redação dada ao parágrafo 1º exclui da remuneração as percentagens, prêmios,


as diárias para a viagem e o abono, o que é reforçado pelo parágrafo 2º, logo o empregado perde
todas as implicações reflexas.

27-
Art. 458. ...........................................................
§ 5º O valor relativo à assistência prestada por serviço médico ou odontológico,
próprio ou não, inclusive o reembolso de despesas com medicamentos, óculos,
aparelhos ortopédicos, próteses, órteses, despesas médico-hospitalares e outras
similares, mesmo quando concedido em diferentes modalidades de planos e
coberturas, não integram o salário do empregado para qualquer efeito nem o salário
de contribuição, para efeitos do previsto na alínea q do § 9º do art. 28 da Lei no 8.212,
de 24 de julho de 1991.135

Completando-se as exclusões do artigo antecedente, o valor relativo à assistência por


serviço médico ou odontológico também sai do cálculo da remuneração, perdendo o empregado
as implicações em verbas reflexas.

28-
Art. 461. Sendo idêntica a função, a todo trabalho de igual valor, prestado ao mesmo
empregador, no mesmo estabelecimento empresarial, corresponderá igual salário, sem
distinção de sexo, etnia, nacionalidade ou idade. § 1º Trabalho de igual valor, para os
fins deste Capítulo, será o que for feito com igual produtividade e com a mesma
perfeição técnica, entre pessoas cuja diferença de tempo de serviço para o mesmo
empregador não seja superior a quatro anos e a diferença de tempo na função não seja
superior a dois anos. § 2º Os dispositivos deste artigo não prevalecerão quando o
empregador tiver pessoal organizado em quadro de carreira ou adotar, por meio de
norma interna da empresa ou de negociação coletiva, plano de cargos e salários,
dispensada qualquer forma de homologação ou registro em órgão público. § 3º No
caso do § 2º deste artigo, as promoções poderão ser feitas por merecimento e por
antiguidade, ou por apenas um destes critérios, dentro de cada categoria profissional.
§5ºA equiparação salarial só será possível entre empregados contemporâneos no cargo
ou na função, ficando vedada a indicação de paradigmas remotos, ainda que o
paradigma contemporâneo tenha obtido a vantagem em ação judicial própria. § 6º No
caso de comprovada discriminação por motivo de sexo ou etnia, o juízo determinará,
além do pagamento das diferenças salariais devidas, multa, em favor do empregado
discriminado, no valor de 50% (cinquenta por cento) do limite máximo dos benefícios
do Regime Geral de Previdência Social.136

O artigo 461 representa outro retrocesso, pois, o tempo de serviço mínimo no emprego
não era exigido, nos termos da súmula 6 do TST, para efeito de equiparação. Era apenas exigido

134
Ibid.
135
Ibid.
136
Ibid.
70

o tempo de serviço na função, logo a nova exigência dificultará a equiparação. Além disso, o
texto proposto pretende que a equiparação salarial fique limitada aos empregados do mesmo
estabelecimento, ou seja, da mesma unidade técnica produtiva, alterando a CLT que prevê a
possibilidade de equiparação para a mesma localidade (município ou região metropolitana).
O parágrafo 2º passa a dispensar o empregador do registro e homologação do plano de
cargos e salários em órgão público. A súmula 6 do TST exigia a homologação no Ministério do
Trabalho, excluindo-se, apenas, o quadro de carreira das entidades de direito público da
administração direta, autárquica e fundacional aprovado por ato administrativo da autoridade
competente. Uma facilidade para o empregador, que dificultará a possiblidade de equiparação,
já que na existência de plano de cargos e salários não pode haver equiparação.
O parágrafo 3º estabelece que as promoções podem ser feitas, alternativamente, por
antiguidade ou por merecimento e não, necessariamente, por ambos, cumulativamente.
O parágrafo 5º restringe hipóteses de equiparação salarial que eram previstas pelos
incisos IV da súmula 6 do TST (“É desnecessário que, ao tempo da reclamação sobre
equiparação salarial, reclamante e paradigma estejam a serviço do estabelecimento, desde que
o pedido se relacione com situação pretérita”), assim pelo inciso VI:

Presentes os pressupostos do art. 461 da CLT, é irrelevante a circunstância de que o


desnível salarial tenha origem em decisão judicial que beneficiou o paradigma,
exceto: a) se decorrente de vantagem pessoal ou de tese jurídica superada pela
jurisprudência de Corte Superior; b) na hipótese de equiparação salarial em cadeia,
suscitada em defesa, se o empregador produzir prova do alegado fato modificativo,
impeditivo ou extintivo do direito à equiparação salarial em relação ao paradigma
remoto, considerada irrelevante, para esse efeito, a existência de diferença de tempo
de serviço na função superior a dois anos entre o reclamante e os empregados
paradigmas componentes da cadeia equiparatória, à exceção do paradigma
imediato.137

Por fim, o parágrafo 6º do novo artigo 461 da CLT traz uma multa em benefício do
empregado que é tarifada, com o objetivo de reduzir o escopo do dano moral causado pela
discriminação experimentada.

29-
Art. 468. .............................................................
§ 1º .......................................................................
§ 2º A alteração de que trata o § 1º deste artigo, com ou sem justo motivo, não
assegura ao empregado o direito à manutenção do pagamento da gratificação

137
Súmula nº 6 do TST. EQUIPARAÇÃO SALARIAL. ART. 461 DA CLT (redação do item VI alterada) – Res.
198/2015, republicada em razão de erro material – DEJT divulgado em 12, 15 e 16.06.2015. Disponível em: <
http://www3.tst.jus.br/jurisprudencia/Sumulas_com_indice/Sumulas_Ind_1_50.html#SUM-6>
71

correspondente, que não será incorporada, independentemente do tempo de exercício


da respectiva função.138

No artigo 468, parágrafo 2º retira-se o direito à incorporação da gratificação por


exercício de função de confiança, mesmo para os que já estavam a exercê-la por período igual
ou superior a 10 anos.

30-
Art. 477. Na extinção do contrato de trabalho, o empregador deverá proceder à
anotação na Carteira de Trabalho e Previdência Social, comunicar a dispensa aos
órgãos competentes e realizar o pagamento das verbas rescisórias no prazo e na forma
estabelecidos neste artigo.139

O artigo 477 e seus parágrafos alteram disposições sobre a extinção do contrato de


trabalho, revogando importantes dispositivo protetivos, como o parágrafo 1º, do mesmo artigo,
da CLT, que dispõe que o pedido de demissão ou recibo de quitação de rescisão, do contrato de
trabalho, firmado por empregado com mais de 1 (um) ano de serviço, só será válido quando
feito com a assistência do respectivo Sindicato ou perante a autoridade do Ministério do
Trabalho e Previdência Social; e o parágrafo 2º, que exige que o instrumento de rescisão ou
recibo de quitação, qualquer que seja a causa ou forma de dissolução do contrato, deve ter
especificada a natureza de cada parcela paga ao empregado e discriminado o seu valor, sendo
válida a quitação, apenas, relativamente às mesmas parcelas.

31-
Art. 477-A. As dispensas imotivadas individuais, plúrimas ou coletivas equiparam-
se para todos os fins, não havendo necessidade de autorização prévia de entidade
sindical ou de celebração de convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho para
sua efetivação.140

Há aqui a retirada da participação do sindicato na dispensa do empregado com mais de


1 ano de serviço e a desobrigação da negociação coletiva para as dispensas imotivadas coletivas,
em violação direta ao art. 7º, I, da CRFB, que pode ser considerado regulamentado pela
Convenção 158 da Organização Internacional do Trabalho141 (OIT), que exige “real
necessidade para a dispensa” e “negociação coletiva”. Dispõe o art. 7º, I da Constituição:

138
BRASIL. Lei nº 13.467 de 13 de julho de 2017. Diário Oficial da União, 14 jul. 2017. Disponível em: <
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/L13467.htm>. Acesso em: 17 jun. 2017.
139
Ibid.
140
Ibid.
141
A convenção 158 da OIT, que dispõe sobre o término da relação de trabalho por iniciativa do empregador, foi
ratificada no Brasil pelo decreto legislativo no 68 de 1992. A Convenção estabelece em seu art. 4º a vedação da
72

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à
melhoria de sua condição social:
I - relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos
termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros
direitos.142

32-

Art. 477-B. Plano de Demissão Voluntária ou Incentivada, para dispensa individual,


plúrima ou coletiva, previsto em convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho,
enseja quitação plena e irrevogável dos direitos decorrentes da relação empregatícia,
salvo disposição em contrário estipulada entre as partes.143

O art. 477-B estabelece a cláusula de quitação geral irrevogável para a dispensa feita
por Plano de Demissão Voluntária ou Incentivada (PDVI). Este dispositivo é um retrocesso em
face do ordenamento jurídico atual, vez que a Seção de Dissídios Individuais (Subseção I) do
TST, por meio de Orientação Jurisprudencial de nº 270, entendia que “A transação extrajudicial
que importa rescisão do contrato de trabalho ante a adesão do empregado a plano de demissão
voluntária implica quitação exclusivamente das parcelas e valores constantes do recibo. ”

33-
Art. 482. .............................................................
m) perda da habilitação ou dos requisitos estabelecidos em lei para o exercício da
profissão, em decorrência de conduta dolosa do empregado.144

Nova hipótese para dispensa por justa causa. Como a justa causa é a punição mais grave
que um empregador pode dar ao empregado, onde aquele isenta-se de dar a este aviso prévio,
só ficando a seu encargo o pagamento de saldo de salário e férias vencidas, ampliar sua hipótese
de incidência é um prejuízo ao trabalhador.

dispensa sem justa causa pelo empregador, exigindo para tal conduta uma causa justificada relacionada com o
comportamento do empregado ou baseada nas necessidades de funcionamento da empresa, estabelecimento ou
serviço, fundadas em motivo técnico, econômico, estrutural ou análogo (art. 14). A referida Convenção
regulamentava o art. 7º, I da Constituição de 88, que preza pela proteção da relação de emprego contra despedida
arbitrária ou sem justa causa, nos termos de lei complementar, que nunca foi editada. Contudo, a Convenção foi
denunciada mediante decreto presidencial no 2100 de 1996, de constitucionalidade questionável, uma vez que a
competência relacionada a apreciação de tratados internacionais é exclusiva do Congresso Nacional, nos termos
do art. 49, I da Constituição. Além disso, a própria Convenção 158 OIT, em seu art. 17, I, estabelece que a denúncia
somente será permitida após dez anos da sua entrada em vigor no país signatário, o que não ocorreu no Brasil.
Aguarda-se o julgamento da Ação Direita de Inconstitucionalidade no 1625/97, que visa declarar inconstitucional
o decreto presidencial no 2100 de 1996, que denunciou a Convenção 158 da OIT no Brasil
142
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial da União, 5 out. 1988.
Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm>. Acesso em: 17 jun. 2017.
143
BRASIL. Lei nº 13.467 de 13 de julho de 2017. Diário Oficial da União, 14 jul. 2017. Disponível em: <
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/L13467.htm>. Acesso em: 17 jun. 2017.
144
Ibid.
73

34-
Art. 484-A. O contrato de trabalho poderá ser extinto por acordo entre empregado e
empregador, caso em que serão devidas as seguintes verbas trabalhistas:
I - por metade:
a) o aviso prévio, se indenizado; e
b) a indenização sobre o saldo do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço, prevista
no § 1º do art. 18 da Lei no 8.036, de 11 de maio de 1990;
II - na integralidade, as demais verbas trabalhistas.
§ 1º A extinção do contrato prevista no caput deste artigo permite a movimentação
da conta vinculada do trabalhador no Fundo de Garantia do Tempo de Serviço na
forma do inciso I-A do art. 20 da Lei no 8.036, de 11 de maio de 1990, limitada até
80% (oitenta por cento) do valor dos depósitos.
§ 2º A extinção do contrato por acordo prevista no caput deste artigo não autoriza o
ingresso no Programa de Seguro-Desemprego.145

O artigo inova ao criar hipótese de rescisão por vontade de ambas as partes,


estabelecendo a possibilidade de pagar metade do aviso prévio, se indenizado, caso ambas as
partes resolvam pôr fim ao vínculo.
Há, aqui uma redução de direitos sem qualquer necessidade de modernização que o
justifique. Em uma relação sabidamente assimétrica, uma disposição como essa equivalerá, na
prática, à redução dos direitos decorrentes da dispensa.

35-

Art. 507-A. Nos contratos individuais de trabalho cuja remuneração seja superior a
duas vezes o limite máximo estabelecido para os benefícios do Regime Geral de
Previdência Social, poderá ser pactuada cláusula compromissória de arbitragem,
desde que por iniciativa do empregado ou mediante a sua concordância expressa, nos
termos previstos na Lei no 9.307, de 23 de setembro de 1996.146

Possibilita que o empregador, quando seu empregado perceba remuneração superior a


duas vezes o teto do RGPS, estabeleça uma espécie de arbitragem obrigatória, o que vem sendo
rejeitada pela Justiça do Trabalho, em razão da indisponibilidade dos direitos laborais.

36-
Art. 507-B. É facultado a empregados e empregadores, na vigência ou não do contrato
de emprego, firmar o termo de quitação anual de obrigações trabalhistas, perante o
sindicato dos empregados da categoria.Parágrafo único. O termo discriminará as
obrigações de dar e fazer cumpridas mensalmente e dele constará a quitação anual
dada pelo empregado, com eficácia liberatória das parcelas nele especificadas. 147

145
Ibid.
146
Ibid.
147
Ibid.
74

Este artigo estabelece a faculdade do empregador “convidar” o empregado a ir ao


sindicato para que este dê quitação geral anual pelas obrigações trabalhistas, mesmo com o
término do contrato de emprego. Uma possível violação do acesso à justiça (art. 5º XXXV), já
que o termo de quitação pode ensejar o julgamento antecipado do mérito em relação aos pedidos
nele elencados, quando do ajuizamento da ação.

37-

TÍTULO IV-A
DA REPRESENTAÇÃO DOS EMPREGADOS
Art. 510-A. Nas empresas com mais de duzentos empregados, é assegurada a eleição
de uma comissão para representá-los, com a finalidade de promover-lhes o
entendimento direto com os empregadores.148

Neste primeiro artigo sobre representação, fica evidente a desconstrução dos sindicatos,
já que o legislador desconsidera a hipossuficiência do trabalhador e coloca-o para entender-se
diretamente com seu empregador. Importante ressaltar que este dispositivo é flagrantemente
inconstitucional, pois o Supremo Tribunal Federal (STF) já decidiu que toda e qualquer
comissão de trabalhadores organizada dentro da empresa deve contar com participação das
entidades sindicais (MC/ADI 1861).
Ademais disso, estabelece um intervalo para entre um mandato e outro de 2 anos, sendo
que o período de garantia provisória é de apenas um ano após o término do mandato. Ou seja,
se o empregado eleito lutar demais pelos seus direitos e os direitos dos colegas só ficará na
empresa por mais um ano e poderá ser dispensado (o que já ocorre com o dirigente sindical). O
ponto mais crítico é a possibilidade de dispensa do representante dos trabalhadores por motivo
“disciplinar, técnico, econômico ou financeiro” (art. 510-D, parágrafo terceiro). Ou seja, o
projeto de reforma cria uma representação sindical falaciosa e não lhe confere qualquer poder
efetivo de barganha, deslegitimando a representação sindical oficial.

38-
Art. 579. O desconto da contribuição sindical está condicionado à autorização prévia
e expressa dos que participarem de uma determinada categoria econômica ou
profissional, ou de uma profissão liberal, em favor do sindicato representativo da
mesma categoria ou profissão ou, inexistindo este, na conformidade do disposto no
art. 591 desta Consolidação.149

148
Ibid.
149
Ibid.
75

O artigo 579 torna a contribuição sindical facultativa, algumas pessoas defendem tratar-
se de mudança positiva, na medida em que o sindicato que quiser a contribuição terá que
oferecer um serviço decente ao empregado, mas, por outro lado, a ausência deste custeio poderá
desestruturá-los completamente.

39-
Art. 611-A. A convenção coletiva e o acordo coletivo de trabalho têm prevalência
sobre a lei quando, entre outros, dispuserem sobre:
I - pacto quanto à jornada de trabalho, observados os limites constitucionais;
II - banco de horas anual;
III - intervalo intrajornada, respeitado o limite mínimo de trinta minutos para jornadas
superiores a seis horas;
IV - adesão ao Programa Seguro-Emprego (PSE), de que trata a Lei no 13.189, de 19
de novembro de 2015;
V - plano de cargos, salários e funções compatíveis com a condição pessoal do
empregado, bem como identificação dos cargos que se enquadram como funções de
confiança;
VI - regulamento empresarial;
VII - representante dos trabalhadores no local de trabalho;
VIII - teletrabalho, regime de sobreaviso, e trabalho intermitente;
IX - remuneração por produtividade, incluídas as gorjetas percebidas pelo empregado,
e remuneração por desempenho individual;
X - modalidade de registro de jornada de trabalho;
XI - troca do dia de feriado;
XII - enquadramento do grau de insalubridade;
XIII - prorrogação de jornada em ambientes insalubres, sem licença prévia das
autoridades competentes do Ministério do Trabalho;
XIV - prêmios de incentivo em bens ou serviços, eventualmente concedidos em
programas de incentivo;
XV - participação nos lucros ou resultados da empresa.
§ 1º No exame da convenção coletiva ou do acordo coletivo de trabalho, a Justiça do
Trabalho observará o disposto no § 3º do art. 8º desta Consolidação.
§ 2º A inexistência de expressa indicação de contrapartidas recíprocas em convenção
coletiva ou acordo coletivo de trabalho não ensejará sua nulidade por não caracterizar
um vício do negócio jurídico.
§ 3º Se for pactuada cláusula que reduza o salário ou a jornada, a convenção coletiva
ou o acordo coletivo de trabalho deverão prever a proteção dos empregados contra
dispensa imotivada durante o prazo de vigência do instrumento coletivo.
§ 4º Na hipótese de procedência de ação anulatória de cláusula de convenção coletiva
ou de acordo coletivo de trabalho, quando houver a cláusula compensatória, esta
deverá ser igualmente anulada, sem repetição do indébito.
§ 5º Os sindicatos subscritores de convenção coletiva ou de acordo coletivo de
trabalho deverão participar, como litisconsortes necessários, em ação individual ou
coletiva, que tenha como objeto a anulação de cláusulas desses instrumentos. 150

O artigo traz as “famosas” disposições que estabelecem a prevalência do negociado


sobre o legislado. O dispositivo estabelece que até normas referentes à saúde e segurança do
trabalhador, como enquadramento do grau de insalubridade e intervalo intrajornada,
negociadas, prevalecem sobre o que foi legislado. A legislação protetiva perde o sentido em

150
Ibid.
76

qualquer hipótese ali elencada. Qualquer conjunto legislativo mais benéfico na proteção de
qualquer dos institutos ali elencados não poderá prevalecer, para efeito de norma mais
favorável, em face do negociado.

40-
Art. 611-B. Constituem objeto ilícito de convenção coletiva ou de acordo coletivo de
trabalho, exclusivamente, a supressão ou a redução dos seguintes direitos:

I - normas de identificação profissional, inclusive as anotações na Carteira de


Trabalho e Previdência Social;
II - seguro-desemprego, em caso de desemprego involuntário;
III - valor dos depósitos mensais e da indenização rescisória do Fundo de Garantia do
Tempo de Serviço (FGTS);
IV - salário mínimo;
V - valor nominal do décimo terceiro salário;
VI - remuneração do trabalho noturno superior à do diurno;
VII - proteção do salário na forma da lei, constituindo crime sua retenção dolosa;
VIII - salário-família;
IX - repouso semanal remunerado;
X - remuneração do serviço extraordinário superior, no mínimo, em 50% (cinquenta
por cento) à do normal;
XI - número de dias de férias devidas ao empregado;
XII - gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o
salário normal;
XIII - licença-maternidade com a duração mínima de cento e vinte dias;
XIV - licença-paternidade nos termos fixados em lei;
XV - proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos,
nos termos da lei;
XVI - aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, sendo no mínimo de trinta dias,
nos termos da lei;
XVII - normas de saúde, higiene e segurança do trabalho previstas em lei ou em
normas regulamentadoras do Ministério do Trabalho;
XVIII - adicional de remuneração para as atividades penosas, insalubres ou perigosas;
XIX - aposentadoria;
XX - seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador;
XXI - ação, quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho, com prazo
prescricional de cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois
anos após a extinção do contrato de trabalho;
XXII - proibição de qualquer discriminação no tocante a salário e critérios de
admissão do trabalhador com deficiência;
XXIII - proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre a menores de dezoito
anos e de qualquer trabalho a menores de dezesseis anos, salvo na condição de
aprendiz, a partir de quatorze anos;
XXIV - medidas de proteção legal de crianças e adolescentes;
XXV - igualdade de direitos entre o trabalhador com vínculo empregatício
permanente e o trabalhador avulso;
XXVI - liberdade de associação profissional ou sindical do trabalhador, inclusive o
direito de não sofrer, sem sua expressa e prévia anuência, qualquer cobrança ou
desconto salarial estabelecidos em convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho;
XXVII - direito de greve, competindo aos trabalhadores decidir sobre a oportunidade
de exercê-lo e sobre os interesses que devam por meio dele defender;
XXVIII - definição legal sobre os serviços ou atividades essenciais e disposições
legais sobre o atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade em caso de
greve;
XXIX - tributos e outros créditos de terceiros;
77

XXX - as disposições previstas nos arts. 373-A, 390, 392, 392-A, 394, 394-A, 395,
396 e 400 desta Consolidação.
Parágrafo único. Regras sobre duração do trabalho e intervalos não são consideradas
como normas de saúde, higiene e segurança do trabalho para os fins do disposto neste
artigo.151

O artigo estabelece proteções a direitos que foram violados pela própria reforma. Será
que o legislador consegue estabelecer um standart de direitos ainda menor?

41-
Art. 614. .............................................................
§ 3o Não será permitido estipular duração de convenção coletiva ou acordo coletivo
de trabalho superior a dois anos, sendo vedada a ultratividade.152

A partir de setembro de 2012, o TST deu novo entendimento à súmula 277, na qual
previa-se que as normas dos acordos coletivos e das convenções coletivas integravam o contrato
de trabalho e só poderiam ser alteradas ou suprimidas mediante negociação coletiva posterior.
Agora, o trabalhador fica novamente desamparado, já que as disposições coletivas não mais
terão eficácia após seu prazo de duração.

42-
Art. 620. As condições estabelecidas em acordo coletivo de trabalho sempre
prevalecerão sobre as estipuladas em convenção coletiva de trabalho.153

Mais uma vez podemos observar a caducidade do princípio da norma mais favorável.
Os acordos coletivos prevalecerão sobre as convenções coletivas, que prevalecerão sobre a lei,
deturpando-se a estrutura normativa baseada no princípio da proteção e da norma mais
favorável, que constituem o núcleo axiológico do Direito do Trabalho.

43-
Art. 634. .............................................................
§ 1º ......................................................................
§ 2º Os valores das multas administrativas expressos em moeda corrente serão
reajustados anualmente pela Taxa Referencial (TR), divulgada pelo Banco Central do
Brasil, ou pelo índice que vier a substituí-lo. (NR)154

O art. 634, parágrafo 2º, traz um fator de correção (Taxa Referencial) declarado
inconstitucional pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST), em 4 de agosto de 2015 (processo

151
Ibid.
152
Ibid.
153
Ibid.
154
Ibid.
78

ArgInc-479-60.2011.5.04.0231), em substituição à posição desde então adotada por este


tribunal do uso do IPCA-E (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo Especial) como
valor de correção das multas administrativos, o que representa uma diminuição progressiva do
valor correção destas multas, ou seja, agora o empregador para menos juros em multas
administrativas.

44-
Art. 652. Compete às Varas do Trabalho:
f) decidir quanto à homologação de acordo extrajudicial em matéria de competência
da Justiça do Trabalho. (NR)155

O artigo 652 substitui a antiga redação da CLT que falava em “Juntas de Conciliação e
Julgamento” e dá competência à Justiça do Trabalho para a homologação de acordo
extrajudicial em matérias de sua competência. Antes, os juízes do trabalho denegavam o pedido
por falta de competência. Agora, a homologação fará do acordo extrajudicial título executivo
judicial. Tal modificação incentiva e legitima a resolução extrajudicial de conflitos, atraindo a
Justiça do Trabalho para participar, institucionalmente, de acordos que podem representar uma
verdadeira renúncia de direitos laborais em razão da falta de autonomia da vontade do
empregado em face do empregador como consequência da desigualdade inerente das relações
de trabalho.

45-

Art. 702. ............................................................


I - .........................................................................
....................................................................................
f) estabelecer ou alterar súmulas e outros enunciados de jurisprudência uniforme, pelo
voto de pelo menos dois terços de seus membros, caso a mesma matéria já tenha sido
decidida de forma idêntica por unanimidade em, no mínimo, dois terços das turmas
em pelo menos dez sessões diferentes em cada uma delas, podendo, ainda, por maioria
de dois terços de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir
que ela só tenha eficácia a partir de sua publicação no Diário Oficial; § 3º As sessões
de julgamento sobre estabelecimento ou alteração de súmulas e outros enunciados de
jurisprudência deverão ser públicas, divulgadas com, no mínimo, trinta dias de
antecedência, e deverão possibilitar a sustentação oral pelo Procurador-Geral do
Trabalho, pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, pelo Advogado-
Geral da União e por confederações sindicais ou entidades de classe de âmbito
nacional.§ 4º O estabelecimento ou a alteração de súmulas e outros enunciados de
jurisprudência pelos Tribunais Regionais do Trabalho deverão observar o disposto na
alínea f do inciso I e no § 3o deste artigo, com rol equivalente de legitimados para
sustentação oral, observada a abrangência de sua circunscrição judiciária.156

155
Ibid.
156
Ibid.
79

O artigo cria uma burocracia adicional para a edição de súmulas e outros enunciados de
uniformização da jurisprudência, observação importante de Jorge Luiz Souto Maior é no
sentido de que o artigo:

tenta evitar a elaboração de súmulas e isso pode até parecer benéfico, para facilitar a
atuação jurisdicional de primeiro grau. A questão é que as alterações propostas, todas
elas, representam o acolhimento da jurisprudência vencida no âmbito do próprio do
TST. Assim, o que se quer é que essa jurisprudência vencida, uma vez integrada à lei,
não possa ser novamente alterada pelo próprio TST. É clara aqui a tentativa de
cristalização dos entendimentos, muitos deles minoritários, que foram construídos
pela jurisprudência e agora estão sendo incorporados ao texto de lei. A tentativa de
controle da criação judicial que se dá por meio de súmulas pode até ser válida, mas
certamente não ocorrerá por decreto, por inclusão de uma regra como esta, em texto
de lei. O que impressiona, porém, é que aqui sequer se trata efetivamente de tentar
combater um ativismo lesivo. Trata-se de esvaziar a função da Justiça do Trabalho,
por meio de uma tentativa - destinada ao fracasso - de mitigar o seu poder de
interpretação das normas legais.157

46-
Art. 775. Os prazos estabelecidos neste Título serão contados em dias úteis, com
exclusão do dia do começo e inclusão do dia do vencimento.
§ 1º Os prazos podem ser prorrogados, pelo tempo estritamente necessário, nas
seguintes hipóteses:
I - quando o juízo entender necessário;
II - em virtude de força maior, devidamente comprovada.
§ 2º Ao juízo incumbe dilatar os prazos processuais e alterar a ordem de produção
dos meios de prova, adequando-os às necessidades do conflito de modo a conferir
maior efetividade à tutela do direito.158

Em alinhamento à orientação do CPC/2015, os prazos serão contados em dias úteis,


podendo ser prorrogados nos casos acima elencados. Considerando a natureza protetiva do
Direito do Trabalho, é uma norma em prejuízo do trabalhador, vez que prolonga a duração da
lide.
47-
Art. 789. Nos dissídios individuais e nos dissídios coletivos do trabalho, nas ações e
procedimentos de competência da Justiça do Trabalho, bem como nas demandas
propostas perante a Justiça Estadual, no exercício da jurisdição trabalhista, as custas
relativas ao processo de conhecimento incidirão à base de 2% (dois por cento),

157
SOUTO MAIOR, Jorge Luiz. SEVERO, Valdete Souto. Os 201 ataques da "reforma" aos trabalhadores. 2017.
Disponível em: <http://www.jorgesoutomaior.com/blog/os-201-ataques-da-reforma-aos-trabalhadores>
158
BRASIL. Lei nº 13.467 de 13 de julho de 2017. Diário Oficial da União, 14 jul. 2017. Disponível em: <
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/L13467.htm>. Acesso em: 17 jun. 2017.
80

observado o mínimo de R$ 10,64 (dez reais e sessenta e quatro centavos) e o máximo


de quatro vezes o limite máximo dos benefícios do Regime Geral de Previdência
Social, e serão calculadas:159

Neste artigo o legislador estabeleceu um teto para as custas. Como na Justiça do


Trabalho quem mais sucumbe é o empregador, a norma visa, como todo o resto do diploma,
beneficiá-lo e incentivá-lo a promover longos embates judiciais com o empregado.

48-
Art. 790. .............................................................
§ 3o É facultado aos juízes, órgãos julgadores e presidentes dos tribunais do trabalho
de qualquer instância conceder, a requerimento ou de ofício, o benefício da justiça
gratuita, inclusive quanto a traslados e instrumentos, àqueles que perceberem salário
igual ou inferior a 40% (quarenta por cento) do limite máximo dos benefícios do
Regime Geral de Previdência Social.
§ 4o O benefício da justiça gratuita será concedido à parte que comprovar
insuficiência de recursos para o pagamento das custas do processo.160

Mais uma vez, no intento de prejudicar o trabalhador, a norma exige contornos


determinados para a declaração de hipossuficiência. Antes, a mera alegação concedia ao obreiro
a gratuidade da justiça. Hoje, apenas o trabalhador que ganha até R$ 2.212,52 (40% do teto do
RGPS atual - R$ 5.531,31) pode se valer da gratuidade, desde que comprove que seu salário se
encontra nesta baliza.

49-
Art. 790-B. A responsabilidade pelo pagamento dos honorários periciais é da parte
sucumbente na pretensão objeto da perícia, ainda que beneficiária da justiça gratuita.
§ 1º Ao fixar o valor dos honorários periciais, o juízo deverá respeitar o limite
máximo estabelecido pelo Conselho Superior da Justiça do Trabalho.
§ 2º O juízo poderá deferir parcelamento dos honorários periciais.
§ 3º O juízo não poderá exigir adiantamento de valores para realização de perícias.
§ 4º Somente no caso em que o beneficiário da justiça gratuita não tenha obtido em
juízo créditos capazes de suportar a despesa referida no caput, ainda que em outro
processo, a União responderá pelo encargo.161

Aqui, mais um abuso do legislador. Uma contradição ao art. 9º da lei 1.060/1950, que
estabelece que “Os benefícios da assistência judiciária compreendem todos os atos do processo
até decisão final do litígio, em todas as instâncias”162. Mais um prejuízo ao trabalhador que

159
Ibid.
160
Ibid.
161
Ibid.
162
BRASIL. Lei nº 1.060 de 05 de fevereiro de 1950. Diário Oficial da União, 13 fev. 1950. Disponível em: <
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L1060.htm>. Acesso em: 17 jun. 2017.
81

inclusive terá que arcar com honorários periciais, mesmo quando beneficiário de assistência
judiciária, nas perícias que sucumbir. Pretenso desestímulo ao pedido de prova pericial.

50-
Art. 791-A. Ao advogado, ainda que atue em causa própria, serão devidos honorários
de sucumbência, fixados entre o mínimo de 5% (cinco por cento) e o máximo de 15%
(quinze por cento) sobre o valor que resultar da liquidação da sentença, do proveito
econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo, sobre o valor atualizado da
causa.§ 1º Os honorários são devidos também nas ações contra a Fazenda Pública e
nas ações em que a parte estiver assistida ou substituída pelo sindicato de sua
categoria.§ 2º Ao fixar os honorários, o juízo observará:I - o grau de zelo do
profissional;II - o lugar de prestação do serviço;III - a natureza e a importância da
causa;IV - o trabalho realizado pelo advogado e o tempo exigido para o seu serviço.
§ 3º Na hipótese de procedência parcial, o juízo arbitrará honorários de sucumbência
recíproca, vedada a compensação entre os honorários.§ 4º Vencido o beneficiário da
justiça gratuita, desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo,
créditos capazes de suportar a despesa, as obrigações decorrentes de sua sucumbência
ficarão sob condição suspensiva de exigibilidade e somente poderão ser executadas
se, nos dois anos subsequentes ao trânsito em julgado da decisão que as certificou, o
credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que
justificou a concessão de gratuidade, extinguindo-se, passado esse prazo, tais
obrigações do beneficiário.§ 5º São devidos honorários de sucumbência na
reconvenção.163

A norma traz disposições sobre honorários de sucumbência, que agora serão plenamente
regulados pelo supracitado artigo. Anteriormente, a matéria era regulamentada pela súmula
219164 do TST, em que as hipóteses de cabimento dos honorários sucumbenciais eram limitadas.
Também o beneficiário da gratuidade da justiça terá que pagar honorários sucumbenciais,
ressalvada condição suspensiva e extinção da obrigação se no prazo de dois anos após o transito

163
BRASIL. Lei nº 13.467 de 13 de julho de 2017. Diário Oficial da União, 14 jul. 2017. Disponível em: <
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/L13467.htm>. Acesso em: 17 jun. 2017.
164
Súmula nº 219 do TST. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CABIMENTO (alterada a redação do item I e
acrescidos os itens IV a VI em decorrência do CPC de 2015) - Res. 204/2016, DEJT divulgado em 17, 18 e
21.03.2016.
I - Na Justiça do Trabalho, a condenação ao pagamento de honorários advocatícios não decorre pura e
simplesmente da sucumbência, devendo a parte, concomitantemente: a) estar assistida por sindicato da categoria
profissional; b) comprovar a percepção de salário inferior ao dobro do salário mínimo ou encontrar-se em situação
econômica que não lhe permita demandar sem prejuízo do próprio sustento ou da respectiva família. (art.14,§1º,
da Lei nº 5.584/1970). (ex-OJ nº 305da SBDI-I).
II - É cabível a condenação ao pagamento de honorários advocatícios em ação rescisória no processo trabalhista.
III – São devidos os honorários advocatícios nas causas em que o ente sindical figure como substituto processual
e nas lides que não derivem da relação de emprego.
IV – Na ação rescisória e nas lides que não derivem de relação de emprego, a responsabilidade pelo pagamento
dos honorários advocatícios da sucumbência submete-se à disciplina do Código de Processo Civil (arts. 85, 86, 87
e 90).
V - Em caso de assistência judiciária sindical ou de substituição processual sindical, excetuados os processos em
que a Fazenda Pública for parte, os honorários advocatícios são devidos entre o mínimo de dez e o máximo de
vinte por cento sobre o valor da condenação, do proveito econômico obtido ou, não sendo possível mensurá-lo,
sobre o valor atualizado da causa (CPC de 2015, art. 85, § 2º).
VI - Nas causas em que a Fazenda Pública for parte, aplicar-se-ão os percentuais específicos de honorários
advocatícios contemplados no Código de Processo Civil.
82

em julgado da decisão que a certificou persistir a situação de insuficiência de recursos que


justificou a concessão de gratuidade. Em todo o caso, as disposições sobre honorários de
sucumbência, pagamento de perícia e limitação da gratuidade à justiça são normas
inconstitucionais que visam afastar o trabalhador do acesso à justiça pelo risco de
endividamento com o decurso do processo.

51-

Art. 4º -A. Considera-se prestação de serviços a terceiros a transferência feita pela


contratante da execução de quaisquer de suas atividades, inclusive sua atividade
principal, à pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviços que possua
capacidade econômica compatível com a sua execução.165

Sobre este último tema, a principal alteração da reforma é a do artigo 4º-A, da Lei nº
6.019, de 3 de janeiro de 1974, que passa a permitir a terceirização de quaisquer atividades,
inclusive da atividade fim. A legislação pátria não mencionou a possibilidade de terceirização
geral da atividade fim, a interpretação que deve ser dada ao tema é aquela à luz do princípio da
proteção, do in dubio pro misero e da vedação do retrocesso social, ou seja: não é possível a
terceirização da atividade-fim das relações de trabalho em geral. Além disso, a lei 6.019/74,
quando quis, afirmou expressamente a possibilidade de terceirização da atividade-fim no caso
do trabalhador temporário e não o fez para as relações de trabalho em geral, e leis não contêm
palavras inúteis e a terceirização de atividade fim representa grande retrocesso social, que afasta
cada vez mais o empregado do tomador de serviços.

Como podemos notar, a lei 13.467/2017 é substancialmente prejudicial ao trabalhador.


Há um desmonte das instituições protetivas e da descaracterização da hipossuficiência do
trabalhador. O desmantelamento dos sindicatos e a prevalência do negociado sobre o legislado
colocam o trabalhador em uma situação de total desamparo. Em relação à terceirização,
promove a irrestrita desigualdade entre trabalhadores da tomadora e da terceirizada de forma
que, para um mesmo trabalho, diferentes serão as remunerações. Assim, flagrante sua
inconstitucionalidade material.

165
Ibid.
83

7.1. O ARGUMENTO PRÓ-FLEXIBILIZAÇÃO PROVENIENTE DE PREMISSAS


ESTRUTURADAS NO NEOLIBERALISMO ECONÔMICO

Argumentar não se trata apenas de falar por falar, mas de uma demonstração do porquê
uma ideia deve ceder em detrimento de outra ideia, que parece mais adequada.
Na lógica filosófica, trabalhamos com premissas, que podem ser verdadeiras ou falsas.
Premissas verdadeiras que nos levam a conclusões verdadeiras são também válidas. Se, ainda,
as premissas são mais plausíveis que a conclusão, temos um argumento cogente.
Assim, a arte de argumentar não é só um jogo de dizer e desdizer e as premissas não
são, em regra (ressalva que registro em prol da técnica em lógica), verdadeiras a priori.
Devemos, pois, demonstrar o seu valor de verdade.

Podemos resumir os argumentos pró-flexibilização da seguinte maneira:

1- As normas de proteção do trabalhador são economicamente “pesadas” e “inflexíveis”;


isto aumenta o “custo” da produção, o que inviabiliza a competitividade das empresas e a
própria manutenção de postos formais de trabalho, dada a “elevada” carga tributária. Em um
contexto de crise, as normas trabalhistas devem ser flexibilizadas para que o empreendedor
possa se reerguer, o que facilitaria a retomada do crescimento econômico, gerando mais
empregos.
2- A maioria dos países desenvolvidos, especialmente os europeus, já aderiu ao modelo
flexibilizado, com sucesso.
3 - Essas mudanças democratizam as relações de trabalho, uma vez que quem decidirá
os acordos serão os próprios trabalhadores e não o Estado.
4 – Cada pessoa é responsável pelo próprio sucesso ou insucesso pessoal, não podemos
transferir ao empreendedor a responsabilidade pela crise econômica que vivemos166.

As crises econômicas evidentemente podem reduzir o crescimento econômico e o


emprego, e os governos têm empreendido reformas que afetam os direitos trabalhistas de forma
direta, seja na tentativa de reduzir os gastos públicos, com reduções dos cargos, empregos e

166
Segundo um axioma da tradição liberal, a coerção de indivíduos só é permissível quando necessária à
consecução do bem-estar geral ou do bem comum. HAYEK, Friedrich August von. Direito, legislação e liberdade:
uma nova formulação dos princípios liberais de justiça e economia política. Vol. II A Miragem da Justiça Social.
Tradução de Maria Luiza X. de A. Borges. Editora Visão: São Paulo, 1985. p. 24.
84

funções públicas, seja na desregulamentação do mercado de trabalho do setor privado,


supostamente para elevar a competitividade, como forma de contê-la.
Entretanto, tais “reformas” podem desencadear um efeito em cadeia, aumentando ainda
mais o desemprego, debilitando sindicatos e reforçando a desigualdade através do
desmantelamento dos direitos trabalhistas e do incremento das dívidas pessoais. Piorar as
condições de trabalho e emprego pode criar um cenário de endividamento dos trabalhadores e
empregados, e também dos empresários, que pretendam manter seu padrão de vida e,
consequentemente, agravar a crise geral pela menor circulação de dinheiro no mercado e do
aumento dos juros por conta do inadimplemento e do cenário geral de desconfiança.167
Os argumentos pró-flexibilização perdem força quando a própria Organização das
Nações Unidas (ONU) coloca em evidência, em seu relatório anual do Conselho de Direitos
Humanos, que
As políticas de austeridade relacionadas ao trabalho foram abertamente impulsionadas
por vários credores-chave oficiais, entre eles o Banco Mundial e o Fundo Monetário
Internacional (FMI), juntando-se a eles, mais recentemente, a Comissão Européia e o
Banco Central Europeu – constituíndo a denominada Troika. Especialmente desde o
final da década de 1980, a imposição de condições relativas a aspectos trabalhistas
ocupam um lugar proeminente nos programas de assistência financeira do FMI. Tanto
é assim que, durante o período de 1994 a 2007, cerca de 50 por cento de todos os
programas de empréstimos contemplavam uma ou mais condições concernentes ao
trabalho. Desde então, o número de programas do FMI com condições acerca do
trabalho parece ter caído, mas ainda assim, entre 25 e 40 do percentual dos programas
do FMI adotados até 2014 continham condições relacionadas ao regime laboral no
setor público ou privado.168 169

Ou seja, os grandes financiadores da economia mundial subordinam seus acordos de


financiamento aos governos a políticas que visem a flexibilização das condições de trabalho.
Isso porque, do ponto de vista das tradições econômicas liberais, supostamente, a flexibilização
e a diminuição de direitos trabalhistas, aumenta proporcionalmente o resultado do lucro. Como
os novos paradigmas de exploração se dão não só nas relações nacionais, mas entre nações de

167
Cf. Simon Deakin y Aristea Koukiadaki, “The sovereign debt crisis and the evolution of labour law in Europe”,
IN Nicola Countouris e Mark Freedland, eds., Resocialising Europe in a Time of Crisis (Cambridge: Cambridge
University Press, 2013), págs. 163 a 188.
168
Labour-related austerity policies have been openly pushed by a number of oficial key creditors, including the
World Bank and the International Monetary Fund (IMF), together, more recently, with the European Commission
and the European Central Bank — the so-called Troika. Especially since the late 1980s, labour-related
conditionality has featured prominently in IMF financial assistance programmes. Indeed, around 50 per cent of all
lending programmes have involved one or more labour-related conditions over the period from 1994 to 2007.
Since then, the number of IMF programmes with labour conditionalities appears to have fallen, but still, between
25 to 40 per cent of IMF programmes adopted until 2014 contained labour-related conditions relating to the public
or the private sector.
169
United Nations. Report of the Independent Expert on the effects of foreign debt and other related international
financial obligations of States on the full enjoyment of all human rights, particularly economic, social and cultural
rights. Human Rights Council. 2017. p. 5, tradução nossa.
85

desenvolvidas e nações em desenvolvimento, “Nesse novo período, o Fundo vai expandindo


suas atividades, passando a cobrar dos países emergentes mais energia e velocidade na adoção
de reformas neoliberais”170.
Por essa razão, dada a influência econômica destes financiadores, reforçamos, mais uma
vez, que são necessários mecanismos internacionais que condicionem o lucro a uma função
social, para promover o desenvolvimento social global e a diminuição de desigualdades,
firmando-se o compromisso ético de não se obter o acúmulo de capital como fim em si mesmo
A política de flexibilização é, hoje, uma tendência mundial. Entre 2010 e 2015, nada
menos que 89 países, dentre os quais mais da metade (49) eram países em desenvolvimento,
promoveram alguma política de flexibilização.

171

Os países da zona do euro afetados pela crise que precisaram de algum financiamento,
sob a influência do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial, tiveram que
aprovar medidas para reduzir os gastos econômicos para dispensa trabalhadores, como a
redução das verbas indenizatórias, redução do tempo de aviso prévio, aumento de tipos legais
que motivam a dispensa por justa causa e flexibilização das normas de dispensa coletiva,
conforme dados demonstrados na tabela abaixo:

170
KUGELMAS, Eduardo. O fundo monetário aos sessenta anos: em busca de um novo papel? Economia Política
Internacional: Análise Estratégica, Campinas, n. 6, p. 26, jul.-set. 2005. Disponível em: <
http://www.eco.unicamp.br/docprod/downarq.php?id=83&tp=a>. Acesso em: 15 jul. 2017.
171
Ibid. p. 6.
86

172

Outras políticas de flexibilização adotadas são: aumento de contratos atípicos: parciais,


sem estabilidade, aumentos dos períodos do contrato de experiência; diminuição dos períodos
de aviso prévio; supressão do princípio de aplicação da norma mais favorável; fragilização da
negociação coletiva – diminuindo-se o tempo de duração das convenções coletivas; e
fragilização sindical.

172
Ibid. p. 7-8.
87

Outro estudo feito por Adascalitei e Morano173 mostra que um total de 642 mudanças
na regulamentação do trabalho foram aprovadas em 110 países estudados entre 2008 e 2014 e
que o desemprego, a mudança de governo e as crises propulsionaram essas reformas. Em 2008
haviam 62 intervenções aprovadas por ano, e este número cresceu para 147 intervenções por
ano em 2012. A partir de 2012, esses números tiveram uma baixa acompanhando as taxas de
desemprego. A maioria das reformas foi aprovada nos contratos por tempo indeterminado
(30%) e negociação coletiva (27%), seguidas de reformas nos contratos de trabalho temporário
(13%) e jornada de trabalho (12%). Enquanto as economias desenvolvidas se preocuparam
principalmente com a legislação em matéria do contrato por tempo indeterminado, a maioria
dos países em desenvolvimento se preocupava com reformas na negociação coletiva. Em
tempos de crise (contração da economia), os governos que implementaram reformas do
mercado de trabalho visando desregulamentar a proteção do trabalho tiveram um efeito
negativo a curto prazo.
As reformas vistas na zona do euro precarizaram as relações de trabalho e emprego e
diminuíram consideravelmente a capacidade dos sindicatos de proteger os trabalhadores e
empregados.
Além disso, a o argumento de que a proteção trabalhista prejudica o desenvolvimento
econômico pode ser refutada a nível teórico, bem como empiricamente. Isso porque há
pouquíssimos indícios de que as reformas trabalhistas, que piorem as condições do trabalho e
do trabalhador, contribuam para a recuperação de um país.

Há poucas evidências de que as reformas do mercado de trabalho relacionadas à


política de austeridade têm contribuído para a recuperação econômica após crises
causadas pela dívida. Por vezes, parece que as crises por dívida serviram de pretexto
para impulsionar as reformas do mercado de trabalho, favorecendo interesses
empresariais, ao invés de resolver os problemas econômicos. Portanto, não é
surpreendente que as crises por endividamento frequentemente exacerbem a
desigualdade econômica.174 175

A ideia de que a redução dos direitos trabalhistas pode retirar uma nação de uma crise
econômica tem sido refutada por várias frentes. Economistas têm indicado que a legislação

173
ADASCALITEI, Dragos; Morano, Clemente Pignatti. Drivers and effects of labour Market reforms: Evidence
from a novel policy compendium. IZA Journal of Labor Policy. 2016.
174
Evidence that austerity-related labour market reforms have contributed to economic recovery after debt-related
economic crises is weak. Sometimes it appears that debt crises have rather provided a pretext to push through
labour market reforms favouring business interests rather than addressing economic problems. It is therefore not
surprising that debt crises frequently exacerbate economic inequality.
175
Ibid. p. 14, tradução nossa.
88

trabalhista, ao revés, favorece a coordenação econômica, tanto na empresa como no mercado.176


Ademais, leis trabalhistas obrigam o empreendedor a produzir de forma mais eficiente e eficaz,
para evitar o aumento de seus custos. Por essa razão, reconhece-se com frequência que a
proteção do trabalho contribui para corrigir as falhas do mercado.177

Outros estudos identificaram efeitos positivos das normas trabalhistas sobre


produtividade e emprego. Existe uma corelação positiva de longo prazo entre a
legislação trabalhista, aí incluída a regulamentação que protege os trabalhadores
contra a dispensa, e a produtividade. Além disso, dados apontam que uma menor
jornada de trabalho diária correlaciona-se com uma maior produtividade por hora.
Houve descobertas semelhantes quanto ao impacto de certas leis trabalhistas na
inovação. Uma análise de quatro países da OCDE entre 1970 e 2002 constatou que
um elevado grau de proteção contra dispesa arbitrária fomentava as inovações
realizadas pelos empregados.178 179

No mesmo sentido:

No que diz respeito aos países em desenvolvimento, parecem fracas as evidencias que
apontam que normas trabalhistas têm um impacto negativo no desempenho
econômico de um país. Embora os dados relevantes sobre os países em
desenvolvimento sejam escassos, estudos sobre a Argentina, por exemplo, sugerem
que a desregulamentação do mercado de trabalho parece haver reducido a oferta de
emprego ao invés de aumentá-las. Enquanto isso, há evidencias de que no Chile “a re-
introdução gradual da regulação do mercado de trabalho apresentava um aparente
crescimento continuado do emprego, que durou até a eclosão da crise financeira
asiática” no final dos anos 90. Um estudo que analisou os dados de diversos países,
entre 1985 e 1994, apontou que padrões laborais mais elevados correlacionavam-se
com menores níveis de corrupção, dentre outros efeitos positivos. Por fim, um estudo
realizado sobre o BRICS - Brasil, Federação Russa, Índia, China e África do Sul -
indicou que as leis sobre greve não tiveram efeitos significativos no desemprego,

176
DEAKIN, Simon. “Labour law and development in the long run”, IN MARSHALL, Shelley e FENWICK,
Colin, eds., Labour Regulation and Development. Socio-Legal Perspectives (Cheltenham (UK), Edward Elgar,
2016), p. 41.
177
Cf. Alan Hyde, “What is labour law?” In Guy Davidov and Brian Langille, eds., Boundaries and Frontiers of
Labour Law: Goals and Means in the Regulation of Work (Oxford and Portland, Oregon, Hart Publishing, 2006),
pp. 54-60.
178
Other studies have identified positive effects of labour standards on productivity and employment. There is a
positive long-term relationship of labour legislation, including regulation protecting workers against dismissal
with productivity.Also, fewer working hours per day reportedly correlates with higher productivity per hour. There
have been similar findings regarding the impact of certain labour laws on innovation. An analysis of four OECD
countries between 1970 and 2002 found that higher dismissal protection standards had a positive effect on
innovations realized by employees.
179
United Nations. Report of the Independent Expert on the effects of foreign debt and other related international
financial obligations of States on the full enjoyment of all human rights, particularly economic, social and cultural
rights. Human Rights Council. 2017. p. 16, tradução nossa.
89

enquanto que as leis mais protetivas sobre a representação dos empregados guardava
relação, às vezes negativa, com o desemprego.180 181

Por fim, ressalte-se que em 2006 a OCDE182 realizou um estudo em que indicou que
não se observa “nenhuma incidência notável da legislação de proteção do emprego no
desemprego agregado” e que, ao contrário, “os sistemas de negociação salarial coletiva
altamente centralizados e/ou coordenados” apresentaram um índice de desemprego mais
baixo183.
Mas, enquanto os grandes financiadores mundiais como o FMI e o Banco Mundial
subordinarem seus acordos de financiamento a políticas que visem a flexibilização das
condições de trabalho, por acreditarem o crescimento econômico é uma consequência da
flexibilização dos direitos trabalhistas, forçando quem precisa de financiamento a diminuir
direitos dos trabalhadores não se promoverá desenvolvimento social nem econômico, pois
como pode um trabalhador que labora por longas jornadas e tem menos direitos ser mais
eficiente e promover a economia e o mercado de empregos? Como a desmotivação geral e o
stress congênito promoverão maior produtividade e estimularão a economia?
Parece-nos que estes grandes agentes econômicos, que representam a vontade dos países
de primeiro mundo, têm interesses escusos em que as diversas nações que deles se socorrem
permaneçam em crise para que dependam cada vez mais de seus financiamentos e fiquem
permanentemente endividadas; um cenário perfeito para que os grandes países se desenvolvam
ainda mais pela exploração da produção dos menos desenvolvidos e que os países em
desenvolvimento continuem em eterno desenvolvimento, através de crises econômicas e da
promoção do mercado de emprego, do mercado de emprego precário.

Como apontam com acerto Aglietta e Moatti (2000), o FMI torna-se um dos principais
gestores da crise, conjuntamente com o Tesouro americano e o Bank of International
Settlements (BIS). Assume então o papel de catalisador dos capitais privados e passa

180
With regard to developing countries, evidence of a negative impact of labour standards on a country’s economic
performance appears to be weak. While relevant data on developing countries is scarce, research on Argentina, for
example, suggests that labour market deregulation seems to have reduced employment elasticities instead of
increasing them. Meanwhile, evidence on Chile shows that “gradual re-regulation of the labour market was
consistent with continued employment growth up to the Asian Financial Crisis” in the late 1990s. A study
analysing data on various countries from 1985 to 1994 found that higher labour standards correlated with lower
levels of corruption, among other positive effects. Finally, a study on BRICS — Brazil, Russian Federation, India,
China and South Africa — suggested that relevant strike laws had no significant effects on unemployment, while
more protective employee representation laws were, in part, even negatively correlated with unemployment.
181
Ibid., tradução nossa.
182
Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico
183
Andrea Bassanini and Romain Duval. The determinants of unemployment across OECD countries: reassessing
the role of policies and institutions”, OECD Economic Studies, No. 42, 2006/1 (2006), p. 46.
90

a fazer empréstimos vultosos aos países em dificuldades, sendo o mediador entre estes
e os credores.184

A política adotada pelo FMI e pelo Banco mundial expressa toda a essência do
neoliberalismo. Eles sabem que um país que está em permanente crise pela adoção das ideias
liberais clássicas se endividará e ficará a mercê de seu crédito. Por essa razão:

Ao longo dos últimos anos, o FMI atravessou um período caracterizado por fortes
questionamentos a suas diretrizes e, ao mesmo tempo, por uma tímida e ainda
incipiente busca de redefinição de seu papel. Como já foi dito muitas vezes, a sucessão
de crises financeiras-Ásia (1997), Rússia (1998), Brasil (1998/1999), Turquia (2001)
e, coroando o processo, a Argentina a partir de 2001 abalou profundamente a imagem
da instituição. Sua abordagem foi questionada por economistas de distintas
orientações, seu logo se cristalizou como o alvo predileto dos movimentos críticos à
globalização, e sua reforma profunda foi colocada como condição indispensável nas
muitas propostas de reforma da arquitetura financeira internacional. 185

Se pegarmos tais políticas neoliberais e nos utilizarmos de um referenciador de


desenvolvimento humano, como por exemplo o IDH (Índice de Desenvolvimento Humano),
desenvolvido pelos economistas Amartya Sen e Mahbub ul Haq, e o IDHAD (Índice de
Desenvolvimento Humano Ajustado à Desigualdade), veremos nitidamente que a flexibilização
e a precarização do trabalho afastarão os países em desenvolvimento dos bons padrões,
estabelecidos pelos três critérios de avaliação de ambos os índices. Atualmente, esses três
pilares que constituem o IDH (saúde, educação e renda) são mensurados pelos indicadores de:
i) uma vida longa e saudável, ii) acesso ao conhecimento e iii) padrão de vida (renda). Os
processos de flexibilização e precarização do trabalho expõe o trabalhador a uma menor
proteção de seu labor, a longas jornadas e a menor contraprestação remuneratória pelo seu
trabalho e menor contrapartida indenizatória pelos riscos e acidentes a que exposto. Logo,
tenderá, em todo caso, a ter uma vida menos longa e saudável. Ademais, as longas jornadas
causam um dano existencial ao trabalhador, impedindo seu convívio social e diminui seu tempo
para a aquisição de novos conhecimentos, seja pela educação formal, seja pela informal. O
processo de especialização de tarefas e as longas jornadas transforma o trabalhador em uma
ferramenta, que faz e serve apenas a uma específica atividade. Por fim, o padrão de vida decente
é calculado pela Renda Nacional Bruta (RNC) per capta expressa pelo Poder de Paridade de

184
KUGELMAS, Eduardo. O fundo monetário aos sessenta anos: em busca de um novo papel? Economia Política
Internacional: Análise Estratégica, Campinas, n. 6, p. 25, jul.-set. 2005. Disponível em: <
http://www.eco.unicamp.br/docprod/downarq.php?id=83&tp=a>. Acesso em: 15 jul. 2017.
185
KUGELMAS, Eduardo. O fundo monetário aos sessenta anos: em busca de um novo papel? Economia Política
Internacional: Análise Estratégica, Campinas, n. 6, p. 24, jul.-set. 2005. Disponível em: <
http://www.eco.unicamp.br/docprod/downarq.php?id=83&tp=a>. Acesso em: 15 jul. 2017.
91

Compra (PPC), para que haja uma representação verossimilhante das diferenças de
prosperidade social e material entre os países, este cálculo usa o dólar como moeda
referencial.186 Entretanto, “Testes econométricos têm apresentado grandes divergências quanto
à validade do modelo de paridade de poder de compra em sua forma original ou no contexto de
um modelo monetário”187, de forma que, especialmente por este critério, e por tratar-se de uma
média, o IDH mascara a desigualdade na distribuição do desenvolvimento humano entre a
população “no nível de país”. Por essa razão, deve ser lido em complementação com o IDHAD
(Índice de Desenvolvimento Humano Ajustado à Desigualdade), que leva em consideração a
desigualdade em todas as três dimensões do IDH “descontando” o valor médio de cada
dimensão de acordo com seu nível de desigualdade188. Ou seja, pelas considerações acerca do
IDH e do IDHAD, haverá diminuição do desenvolvimento social no sentido de que a
flexibilização e a precarização ampliam substancialmente o nível de desigualdade por
imputarem os ônus pelo insucesso do mercado apenas à classe trabalhadora.

7.2. O ARGUMENTO CONTRA A FLEXIBILIZAÇÃO USUALMENTE UTILIZADO


PELOS MARXISTAS E A FUNÇÃO CONCILIATÓRIA DO DIREITO DO
TRABALHO

Os autores de marxistas tradicionalmente sustentam, em contra argumentação à tese


neoliberal, que o sistema capitalista é injusto por natureza, pois tende a acentuar a assimetrias
de um status quo ante já desigual. Assim, deveríamos abrir mão deste sistema, e adotar um
novo. A destruição do capitalismo é propagada por um ideal revolucionário comunista que pode
ou não estar presente na doutrina juslaboral, mas não vem dela. De toda a sorte, a mesma
acusação lançada a Rawls pode lhe ser lançada: ela é, em si utópica. Isto porque é praticamente
impossível pensar em termos revolucionários em um sistema tão totalizante e globalizado, ou
seja: a destruição do capitalismo, em termos pragmáticos, é irreal.
Por sua vez, autores de Direito do trabalho como Maurício Godinho Delgado, Everaldo
Gaspar Lopes, Daniela Muradas Reis, Jorge Luiz Souto Maior, entre tantos outros, sustentam
haver uma função conciliatória no Direito do Trabalho que leva à expansão da relação de

186
Cf.: Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento no Brasil. O que é IDH? Disponível em:<
http://www.br.undp.org/content/brazil/pt/home/idh0/conceitos/o-que-e-o-idh.html>
187
Holland, Márcio; Pedro L. Valls Pereira. Taxa de Câmbio Real e Paridade de Poder de Compra no Brasil. Rio
de Janeiro: RBE nº 53, jul.-set. 1999. p. 259. Disponível em: <
http://bibliotecadigital.fgv.br/ojs/index.php/rbe/article/viewFile/758/8111> Acesso em: 29 de julho de 2017.
188
Cf.: Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento no Brasil. O que é IDH? Disponível em:<
http://www.br.undp.org/content/brazil/pt/home/idh0/conceitos/o-que-e-o-idh.html>
92

trabalho subordinada, não podendo o próprio capitalismo se sustentar sem o Direito do


Trabalho.
Ocorre que, as instituições injustas que promovem a desigualdade ainda existem e
continuarão a existir, independentemente da existência do “Direito do Trabalho”. Assim, para
além do estabelecimento de um standart pelas normas trabalhistas, deve-se pensar um modelo
onde as instituições injsutas devem ser progressivamente corrigidas.
Nos países mais desenvolvidos, as sucessivas correções destas instituições fizeram-nas
recuar e se instalar nos países menos desenvolvidos. Por essa razão, devemos criar formas de
expurgar, principalmente as mais indignas e precarizantes de todos os países.

Contra a unidimensionalização individualista, egoísta e proprietária do liberalismo


[clássico], contra a proletarização crescente das classes trabalhadoras, o movimento
operário reclama justiça social e igualdade: segurança social, fim da ‘exploração do
homem pelo homem’. Isto é hoje indiscutivelmente considerado como o primeiro e
mais importante ‘background’ histórico-social do moderno princípio da democracia
económica e social.189

Assim, é necessária a criação de mecanismos nacionais e internacionais protetivos da


dignidade, do trabalho do emprego, de modo que as conquistas sociais não possam ser
suprimidas de forma a piorar a condição humana, e que nação alguma possa oferecer
oportunidades a empreendimentos em troca de trabalho, precário e insalubre, e da exploração
indigna qualquer povo.
Se não houver oferta de condições indignas, o empreendedor terá que racionalizar suas
opções de produção para racionalizar o trabalho, evitando o desperdício, planejando sua oferta,
estabelecendo sua demanda, fazendo com que seu custo de produção não fique maior. Isso, por
consequência, gerará um reequilíbrio distributivo e evitará crises de superprodução e
endividamento.
É necessário, ainda, que se incentive o mercado nacional e se adote uma política de
ampliação dos salários190, como forma de manter-se certa circulação de dinheiro no mercado
de consumo191 local para garantir-se a eficaz distribuição de riquezas e a diminuição das crises.

189
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional. 6. Ed. Coimbra: Almedina, 1993. p. 407.
190
Salários mais elevados induzidos pela proteção do emprego estimulam processos de substituição de capital em
que os aumentos de produtividade compensam o benefício salarial (tradução nossa). BACCARO, Luca; REI,
Diego. Institutional Determinants of Unemployment in OECD Countries: Does the Deregulatory View Hold
Water? International Organization, Fall 2007. p. 36. Disponível em: <https://www.unige.ch/sciences-
societe/socio/files/7414/0533/6295/unemployment-11-06.pdf> Acesso em 15 de jul. 2017.
191
A esse respeito veja-se a liberação de contas inativas do FGTS feita no governo Temer como medida de
impulsionar-se a economia.
93

7.3. O ARGUMENTO DE AMARTYA SEN A FAVOR DA CONCEPÇÃO DE JUSTIÇA


SOCIAL OU JUSTIÇA DISTRIBUTIVA

Embora a proposta de Amartya Sen não consista em apresentar uma sociedade


plenamente justa, tal como fez Rawls em Uma teoria da justiça e em outras obras, ele segue o
mesmo objetivo: visa à justiça social na distribuição de bens em uma sociedade. Os autores que
endossam teorias sobre justiça distributiva consideram a existência, como já dissemos, de três
princípios possíveis segundo os quais a distribuição dos benefícios sociais e econômicos pode
ser regulada ou aferida: a liberdade natural, a igualdade liberal e a igualdade democrática. O
sistema de liberdade natural define como justa qualquer distribuição que decorra de uma
economia de mercado eficiente na qual prevaleça uma igualdade de oportunidades formal
(jurídica), de modo tal que os postos sociais possam ser ocupados por aqueles que possuírem
os talentos relevantes para tal posição.
Contudo, para os filósofos que endossam o igualitarismo político, este princípio é
inadequado uma vez que a organização social sancionadora tende simplesmente a reproduzir a
distribuição inicial de talentos e de recursos. Aqueles que forem substancialmente mais dotados
arrecadarão porções maiores e aqueles que possuírem menores posses ou talentos menos
relevantes obterão resultados igualmente inferiores.
Nessa hipótese, onde os resultados tendam para a simples reprodução da distribuição
inicial, somente poderemos considerar justa tal situação, caso se verifique o pressuposto
adicional de a distribuição inicial de talentos foi, ela própria, justa. Entretanto, esse pressuposto
não pode ser estabelecido como princípio, porque independentemente do período de tempo a
que nos reportemos, a distribuição inicial de talentos e capacidades é fortemente influenciada
pelas contingências naturais e sociais. Desse modo, ela não será justa ou injusta, mas
simplesmente arbitrária.192
O princípio da igualdade liberal procura minimizar as injustiças da liberdade natural,
indo além da igualdade meramente formal de oportunidades e corrigindo, sempre que
possível, as desvantagens sociais e culturais. O objetivo é alcançar um tipo de equidade na
qual as desigualdades são mitigadas por iguais oportunidades educativas, políticas
redistributivas e outras reformas sociais. O ideal do princípio de igualdade liberal vincula-se
com a oferta a todos de um mesmo ponto de partida, para que aqueles com talentos e
capacidades semelhantes e com uma vontade também semelhante de exercê-los possam, então,

192
Cf. SANDEL, Michael. O liberalismo e os limites da justiça. Trad. Carlos Pacheco do Amaral. Lisboa:
Fundação Calouste Gulbenkian, 2005, p. 101.
94

ter as mesmas possibilidades de sucesso, sem que o seu lugar inicial no sistema social seja
determinante, ou seja, independentemente do rendimento auferido pela classe social em que
nasceram. Em todos os setores da sociedade deve haver aproximadamente as mesmas
possibilidades de cultura e de sucesso para todos aqueles que têm motivações e capacidades
semelhantes.193
Contudo, Rawls, como antecedente de Amartya Sen nos estudos sobre justiça e
equidade, alerta que o princípio da igualdade liberal é um ataque ainda fraco ao caráter arbitrário
da sorte (sorte de ter nascido em uma família rica ou sorte de ter nascido em um local com
saneamento básico, com boas escolas públicas, com bom serviço de saúde pública, com pais
formalmente educados, ou outros itens que podemos inserir como fazendo parte da “loteria do
nascimento”). Ações advindas desse princípio como uma educação compensatória e outras
reformas não podem suprir por completo, ou até mesmo de modo aproximado, as carências
sociais e culturais.
Rawls busca, então, um princípio para as ações políticas que anule os efeitos das
contingências (naturais e sociais), ao mesmo tempo em que reconhece sua inevitabilidade.
Chama a esse princípio de princípio da igualdade democrática e, em sua obra, apresenta-o como
o princípio da diferença.
Tal princípio não constitui uma mera versão aprimorada do princípio de igualdade de
oportunidades, já que ataca o problema da arbitrariedade de um modo fundamentalmente
diferente. Ao invés de transformar as condições nas quais exerço meus talentos, o princípio da
diferença transforma o fundamento moral com base no qual eu reivindico os benefícios que
dele decorrem. Deixo de ser considerado o único proprietário dos meus recursos, ou o
beneficiário privilegiado das vantagens que me trazem. O princípio da diferença representa um
acordo no sentido de se encarar a distribuição dos talentos naturais como um bem comum,
e de partilhar os benefícios dessa distribuição, qualquer que ela venha a ser. Deste modo, o
princípio da diferença reconhece o caráter arbitrário da sorte quando afirma que eu não sou
exatamente o proprietário, mas apenas o guardião ou o depositário, dos talentos e das
capacidades que venham a residir na minha pessoa e, como tal, não possuo qualquer direito
moral especial sobre os frutos do seu exercício.
Amartya Sen endossa a concepção democrática de justiça distributiva de Rawls e
também usa os conceitos de capacidade e exercício dessas capacidades (“funcionamentos”) nas
suas obras. Mas ele ressalta a diferença entre as duas teses. Para Sen, uma teoria da justiça que

193
Cf. Op. Cit. p. 102.
95

possa servir como base da argumentação racional no domínio prático precisa incluir modos de
julgar como reduzir a injustiça e promover a justiça, em vez de objetivar apenas a
caracterização das sociedades mais justas – exercício que marca, de forma bastante dominante,
muitas das teorias de justiça na filosofia política atual, como os trabalhos de Rawls e Dworkin.
As duas formas de implementar a justiça social, a saber, a identificação de arranjos
sociais perfeitamente justos como fazem os mencionados filósofos John Rawls e Ronald
Dworkin e a proposta de Sen para determinar se uma mudança social específica, melhoraria a
justiça, de fato têm conexões motivacionais, embora sejam analiticamente desconectadas. O
trabalho de Sen objetiva exatamente a questão das mudanças sociais que removem as injustiças
e, segundo ele, isso é central para que decisões sejam tomadas sobre as instituições, o
comportamento e outros determinantes da justiça.
Especificamente o modo como essas decisões são derivadas é crucial para uma teoria
da justiça que objetiva guiar a argumentação racional no domínio prático a respeito do que pode
ser feito. Ou seja, Sen aproxima-se mais de uma abordagem empiricista e afasta-se do
deontologismo ao modo kantiano. Ele não é motivado pela percepção de que o mundo está
longe de ser completamente justo, mas pelo fortalecimento da concepção de que somos
movidos por injustiças claramente remediáveis ao nosso redor que queremos eliminar, daí
sua total adesão à concepção de justiça social.
De início, Sen aceita a ideia do igualitarismo liberal de Rawls, mas discorda do modo
como a justiça distributiva Rawlsiana é realizada porque, para Sen, a distribuição de bens
primários leva a um novo problema: a conversão desses bens em liberdades e capacidades para
os cidadãos. Segundo Sen, a igual distribuição de bens primários não garante necessariamente
que as pessoas convertam os bens recebidos em liberdade real e efetiva, que são meios para que
consigam alcançar os projetos de vida que consideram bons.
Esses projetos de vida considerados bons são concretizados através da capacitação
(capacidades/capabilities) dos indivíduos de modo que possam “funcionar” coletivamente bem
(funcionamentos/functionings) e tornarem-se autônomos e possuidores de direitos
(entitelments). Assim, passam a viver em uma liberdade que antes da capacitação e da possessão
dos direitos não conheciam. A “ausência dessa liberdade” (unfreedom) é a marca da injustiça e
como tal deve ser removida por ações individuais e, principalmente, por políticas públicas.
A liberdade efetiva (freedom) é a finalidade buscada pela tese de Sen (conhecida como
abordagem das capacidades/capabilities approach). Essa liberdade é vista como o fim ao qual
a distribuição justa de riqueza em um arranjo político deve buscar realizar. A liberdade
“capacitante” propicia as condições para que o indivíduo possa escolher e traçar o plano de vida
96

que considera o melhor para si, e possibilita que ele tenha recursos pessoais, contextuais e
materiais para que possa de fato alcançá-lo. Ou seja, Sen considera a possibilidade de conversão
de bens em liberdade “capacitante” para o bom funcionamento social.
A conversão dos bens primários pode trazer problemas advindos das diferenças entre as
pessoas e suas diversas escolhas sobre o que deve ser feito em relação aos seus bens. De acordo
com Sen, uma teoria que busque ser justa deve ser sensível às condições nas quais a pessoa vive
no momento em que faz suas escolhas na vida: em uma sociedade justa, é preciso que cada
cidadão seja o único responsável por suas escolhas, e para isto, ele deve estar livre de fatores
arbitrários impostos pelos aspectos natural e social que limitam suas opções e suas
oportunidades.
Sen sustenta que devemos enfrentar os fatores arbitrários, que podem ser de ordem
natural, como certas restrições impostas pela natureza (que pode ser algo que obste a liberdade
do indivíduo, como ter nascido com doenças congênitas, ser nascido em regiões onde se está
sujeito a catástrofes naturais, endemias, por exemplo). Tampouco os fatores arbitrários
causados pelos fatos sociais podem ser negligenciados, tal como acasos que ocorrem desde o
nascimento: se alguém tiver a má sorte de nascer em uma família muito pobre, não terá muitas
chances de realizar uma vida que possa ser considerada boa, pois as condições básicas para o
desenvolvimento da sua liberdade estará obstado ou dificultado pelas privações que sofre desde
o útero materno (como, por exemplo, má nutrição da mãe durante a gestação. Mencionamos
isso anteriormente quando falamos da “loteria do nascimento”).
De modo diferente, uma pessoa que nasce em uma família abastada terá muitas
oportunidades para se desenvolver e se tornar responsável por suas próprias escolhas já que terá
diante de si os meios para que possa efetivamente escolher o que fizer em sua vida. No ponto
em que Hayek afirma que não há a quem recorrer em tal situação, Amartya Sen argumenta que
remover esse tipo de injustiça através de ações e políticas públicas que possam melhorar
a vida daquele que nasceu em um contexto que o coloca em posição muito menos
privilegiada é um dever do Estado.
Sen afirma que os bens primários de Rawls (que para este são os fatores que levam a
equidade) são somente meios para se alcançar a liberdade. Para Sen o que importa é enfocar a
liberdade como um fim em si mesmo, e que esta seja a finalidade buscada pela distribuição da
riqueza em um arranjo político. Desse modo, Sen muda a perspectiva da justiça distributiva: do
enfoque em bens, passa-se ao enfoque em pessoas e suas condições de vida. Sen trabalha com
as capacidades das pessoas em transformar os bens em liberdade efetiva para se buscar e se
concretizar sua própria concepção de vida boa.
97

Em sua obra, Sen aborda a perspectiva da capacidade sobre dois aspectos: o bem-estar
e a liberdade para realizar ou buscar o bem-estar.
No que diz respeito ao primeiro aspecto, Sen argumenta que o bem estar de uma pessoa
está ligado aos seus funcionamentos. E tais funcionamentos podem ser tanto mais simples como
estar nutrido adequadamente, gozar de boa saúde, estar livre de doenças que podem ser evitadas
e da morte prematura, até realizações mais complexas, tais como ser feliz, ter respeito próprio,
tomar parte na vida da comunidade, e assim por diante. Para que uma pessoa esteja apta a
realizar sua própria concepção de vida boa, é preciso que ela esteja funcionando bem em suas
mais variadas formas. Ela deve ter a capacidade de realizar os funcionamentos que achar
necessário em busca de seu bem-estar. Uma concepção justa da distribuição dos bens da
sociedade deve ser sensível a tais aspectos.
Sen argumenta que todas as pessoas devem ser capazes de ter liberdade efetiva para
escolher qual tipo de vida boa merece ser buscada e vivida. Quanto mais capacidade uma pessoa
possuir para realizar os mais diversos funcionamentos possíveis, maior será sua liberdade
efetiva de escolher como deve funcionar socialmente. As “capacidades básicas” devem
fundamentar a distribuição de bens em um determinado arranjo político que busque a justiça. E
é com base nas capacidades que ele aponta quem são os menos favorecidos da sociedade, ou
seja, aqueles que possuem menor capacidade para converter bens distribuídos em liberdade
efetiva para realização de funcionamentos devem ser auxiliados, ou seja, os fatores que
provocam a ausência de liberdade (os obstáculos ao desenvolvimento das capacidades que
levam à liberdade) devem ser removidos para que a justiça prevaleça.

8. A APLICAÇÃO DO ARGUMENTO DE SEN COMO SOLUÇÃO AO PROBLEMA


DA FLEXIBILIZAÇÃO

Os direitos sociais se incorporam ao patrimônio jurídico dos indivíduos e exigem uma


realização progressiva. Por conseguinte, essa progressiva incorporação de direitos expressará
um referencial substancial do nível geral de tutela, um standart mínimo de direitos, que só
provisória e excepcionalmente poderá ser suprimida. Desta forma, não pode ser considerada
juridicamente válida norma flexibilizadora, de pretensão permanente, tendente a reduzir as
dimensões dos direitos sociais, e, por conseguinte, dos direitos trabalhistas. Este, para nós, é o
verdadeiro conteúdo do princípio a que chamamos “vedação do retrocesso”.
Nada obstante, juristas do mundo inteiro têm admitido alterações na legislação social e,
por conseguinte, na legislação trabalhista, quando o conjunto geral normativo seja mais
98

favorável que o anterior. Entretanto, em uma perspectiva dinâmica, este entendimento permite
simultâneos retrocessos e simultâneos avanços que podem não se reverter efetivamente em um
progresso geral do patrimônio jurídico-social do trabalhador.
Devemos ter em mente que as relações de trabalho e emprego caracterizam-se pela
hipossuficiência do trabalhador frente ao empregador. Logo, considerando ser o empregador
dono dos meios de produção e da vontade mais influente no processo legislativo, não se pode
aprioristicamente definir se determinado conjunto normativo será, de fato, mais vantajoso ao
trabalhador. Em verdade, enquanto a vontade empresarial permear o processo legislativo, como
comprova a reforma trabalhista, pode-se afirmar antecipadamente que a legislação resultante
será prejudicial ao trabalhador.
Assim, nossa proposta é que, para além de standart mínimo, indissolúvel, de direitos,
se adote um sistema permanente de correção das instituições injustas, como o pensado por Sen,
para que se promova justiça distributiva no âmbito trabalhista. Este sistema perpassa os
fundamentos de nossa constituição, que se consubstanciará em escudo de proteção aos direitos
sociais e trabalhistas, que faz padecer, por inconstitucionalidade material, norma que piore a
condição do social do trabalhador, além de, permanentemente, identificar e tentar corrigir as
instituições injustas que permeiam a relação de trabalho.
Neste sentido, deve-se promover e incentivar permanentemente a proteção nacional e
internacional do trabalho como ordens complementares, e não concorrentes, em termos de
proteção jurídica do ser humano (princípio pro homine).

9. CONCLUSÃO

Não podemos admitir que o desiderato de “crise” promova encargos apenas ao


trabalhador. Os riscos sociais devem ser rateados proporcionalmente, assim, se alguém aufere
mais vantagens da sociedade cooperativa, deve, necessariamente, assumir maior porção dos
riscos nos momentos críticos.
Precisamos nos sensibilizar e usar o direito no lhe diferencia das ciências exatas: no
poder de ser humano, e de analisar o humano com sua capacidade de humanizar-se.
Pois o outro nos parte e nós partimos dele.
Em nossa proposta, quando o legislador sobrepõe os interesses do capital à dignidade
da pessoa do trabalhador e a esse patrimônio jurídico que definimos como “standart mínimo”,
sua norma só poderá produzir efeitos nos pontos em que beneficia o trabalhador.
99

Juridicamente, a funcionalidade deste sistema se dá da seguinte forma:

1) Retomada do sistema de estabilidade de empregos.


2) Normas atinentes à dignidade, saúde e segurança do trabalhador, e que estabeleçam
um standart mínimo de direitos que permitam ao trabalhador uma vida digna, devem
ser consideradas direitos fundamentais. Logo, não podem ser objeto de emenda ou
lei tendente a reduzir sua amplitude. O que já nos é proporcionado pela CRFB/88,
art. 60 § 4º, IV. Ademais, ampliado seu alcance, nova interpretação não mais poderá
retrocede-lo.
3) Aplicação de novo entendimento sobre vedação do retrocesso, delineado no tópico
anterior.
4) Normas que melhoram a condição geral do trabalhador, mas que estão acima deste
standart, podem ser suprimidas, desde que em situações excepcionais e por tempo
determinado – este é o único sentido constitucional para a flexibilidade.
5) Normas que no cotidiano se mostrem prejudiciais ao trabalhador devem submetidas
de forma urgente a controle de constitucionalidade, devendo, provado o prejuízo,
ser substituídas por regramentos mais benéficos, sejam eles acordos ou convenções
coletivas, súmulas, tratados internacionais, direito comum ou, na ausência destes
institutos, entendimento jurídico prolatado, que deverá regular a matéria até que o
legislador ofereça a correção desta instituição injusta.

Se é verdade que o trabalho ocupa posição tão central em nossa sociedade e exerce
relevante influência em nosso projeto de vida digna, a realização pessoal e a dignidade através
do exercício laboral deve ser permanentemente protegida e fiscalizada, para que possamos
identificar e corrigir as instituições que o precarizem. Não se pode permitir que a lógica do
lucro se estabeleça como um fim em si mesmo, explorando classes mais vulneráveis sob o
pretexto liberal clássico de ingerência estatal.

10. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ROCHA, Antonio Penalves. A Escravidão em "A Riqueza das Nações" de Adam Smith. CLIO:
Revista de Pesquisa Histórica, Pernambuco, v. 1, n. 14, jul. 1993.
100

DAVIDOV, Guy and LANGILLE, Brian eds., Boundaries and Frontiers of Labour Law: Goals
and Means in the Regulation of Work (Oxford and Portland, Oregon, Hart Publishing, 2006).
ADASCALITEI, Dragos; Morano, Clemente Pignatti. Drivers and effects of labour Market
reforms: Evidence from a novel policy compendium. IZA Journal of Labor Policy. 2016.
ALONSO OLEA, Manuel e CASAS BAAMONDE, Maria Emília. Derecho del trabajo.
Madrid: Universidad complutense de Madrid, 1995.
ALVES, Amauri Cesar. Direito do trabalho essencial: doutrina, legislação, jurisprudência,
exercícios. 1. ed. São Paulo: LTr, 2012.
ANDERSON, E., “Justifying the capabilities approach to justice”, in Brighouse and Robeyns
(eds.). 2010.
ANDRADE, Everaldo Gaspar Lopes de. Direito do Trabalho e pós-modernidade. Fundamentos
para uma teoria geral. São Paulo: LTr, 2005
ARENDT, Hannah. A condição Humana. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2007.
ARISTÓTELES, 1885. Politics. Traduzido por Jowett (1817–1893). Vol. I. London: Oxford at
the Clarendon Press.
BACCARO, Luca; REI, Diego. Institutional Determinants of Unemployment in OECD
Countries: Does the Deregulatory View Hold Water? International Organization, Fall 2007.
BARBAGELATA, Hector Hugo. El particularismo del derecho del trabajo.Montevideo:
Fundación de cultura universitaria, 1995.
BARROS, Alice Monteiro (coord.). Curso de direito do Trabalho. v. 1, 3. ed. São Paulo: LTr,
1997.
BARROS, José D'Assunção. Escravidão Clássica e Escravidão Moderna. Desigualdade e
Diferença no pensamento Escravista: uma comparação entre os antigos e os modernos. Ágora,
AVEIRO (PORTUGAL), n. 15, out. 2012.
BASSANINI, Andrea and DUVAL, Romain. The determinants of unemployment across OECD
countries: reassessing the role of policies and institutions”, OECD Economic Studies, No. 42,
2006/1 (2006).
BERGSON, H. L`Évoution Créative, Paris: PUF, 1948.
BIRD, Colin (1999). The Myth of Liberal Individualism, Cambridge: Cambridge University
Press.
BOMFIM, Vólia Cassar. REFORMA TRABALHISTA: COMENTÁRIOS AO
SUBSTITUTIVO DO PROJETO DE LEI 6787/16. Rio de Janeiro: Revista eletônica da OAB.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial da União, 5
out. 1988.
101

BRASIL. Decreto-Lei nº 5.452 de 01 de maio de 1943. Diário Oficial da União, 09 ago. 1943.
BRASIL. Lei nº 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Diário Oficial da União, 11 jan. 2002.
BRASIL. Lei nº 13.467 de 13 de julho de 2017. Diário Oficial da União, 14 jul. 2017. BRASIL.
Tribunal Regional do Trabalho da Quarta Região. Agravo de Petição n.50080.006/00.0. Quarta
Turma. Juiz Hugo Carlos Scheuermann, julgado em 20.06.2001.
BRIEFS, Goetz. Le Prolétariat Industriel, trad. Yves Simon. Paris: Desclée de Brouwer et Cie
(La Lumière ouvrière), 1936.
BRIGHOUSE, H. & ROBEYNS, I. (eds.), Measuring justice: primary goods and capabilities,
Cambridge: Cambridge University Press, 2010.
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional. 6. Ed. Coimbra: Almedina, 1993.
CARVALHO JÚNIOR, Roberto Wagner de.; OLIVEIRA, Mário Nogueira de. A QUESTÃO
DA JUSTIÇA E O LIBERALISMO POLÍTICO ALÉM DAS NOMENCLATURAS: A
JUSTIÇA DISTRIBUTIVA DE AMARTYA SEN COMO OPOSIÇÃO À TESE DE HAYEK
SOBRE A ILUSÃO DA JUSTIÇA SOCIAL. Ouro Preto: Anais do XXI SEIC. 2013.
CASSAR, Vólia Bomfim. Direito do Trabalho. Niterói: Impetus, 2010.
CATHARINO, José Martins. Tratado jurídico do salário. São Paulo: LTr, 1994.
CAVALCANTI, Lygia Maria de Godoy Batista. São Paulo: LTr, 2008.
CERNEV, Jorge. “Do liberalismo ao Neo Liberalismo”. Universidade Estadual de Londrina.
2012.
CIPOLLA, Francisco Paulo. A evolução da teoria da crise de superprodução na obra econômica
de Marx. Crítica Marxista, São Paulo, Brasiliense, out. 2013.
COLLIN, F.; DHOQUOIS, R.; GOUTIERRE, P. H.; JEAMMAUD, A.; LYONCAEN, G.;
ROUDIL, A Le droit capitaliste du travail. Grenoble: Presses universitaires de Grenoble, 1980.
CUNHA, Antônio Geraldo da. Dicionário etimológico Nova Fronteira da língua portuguesa.
Rio de Janeiro: Nova Fronteira. 1997.
DALLEGRAVE NETO, José Affonso. Contrato individual de trabalho: uma visão estrutural.
São Paulo: LTr, 1998.
MARSHALL, Shelley e FENWICK, Colin, eds., Labour Regulation and Development. Socio-
Legal Perspectives (Cheltenham (UK), Edward Elgar, 2016).
DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de Direito do Trabalho. São Paulo: LTr Editora, 2016.
DESCARTES, René. Discurso do Método. Tradução de Jacob Guinsburg e Bento Prado Jr. 2ª
ed. São Paulo: Abril, 1979.
DURANT, Wil. A história da filosofia. 2ª ed. Rio de Janeiro: Record, 1996.
102

DWORKIN, R. A virtude soberana: a teoria e a prática da igualdade. Trad. Jussara Simões.


Sãio Paulo: Martins Fontes, 2005.
ENGELS, Friedrich. Sobre o papel do trabalho na transformação do macaco em homem.
Tradução: UTL, Edição eletrônica, Ed. Ridendo Castigat Mores.
EPSTEIN, R.A. Principles for a Free Society: Reconciling Individual Liberty with the Common
Good, New York: Basic Books,1998.
FERRARI, I., Nascimento, A., Martins Filho, I. and Costa, A. (2011). História do trabalho, do
direito do trabalho e da justiça do trabalho. 3rd ed. Saõ Paulo: Editora LTr. Edição Digital
Kindle.
FISHKIN, James, Justice, Equal Opportunity, and the Family, New Haven: Yale University
Press, 1983.
FLEISCHACKER, S., Uma Breve História da Justiça Distributiva. Trad. Newton Eishemberg.
São Paulo: Martins Fontes, 2006.
FLEURBAEY, Marc, "Equal Opportunity or Equal Social Outcome?", Economics and
Philosophy 11, 1995.
GARGARELA, Roberto, As Teorias da Justiça Depois de Rawls. Trad. Alonso Reis Freire, São
Paulo: Martins Fontes, 2008.
GAUS, Gerald F. ‘The Diversity of Comprehensive Liberalisms ’ in The Handbook of Political
Theory, Gerald F. Gaus and Chandran Kukathas (eds.), London: Sage, 2004.
GOMES, Orlando e GOTTSCHALK, Elson. Curso de direito do trabalho. Rio de Janeiro:
Forense, 1998.
GONÇALVES, José Henrique Rollo. O surgimento da escravidão: notas críticas sobre um
modelo biossociológico de explicação histórica. Revista Acta Scientiarum, 2013. Vol. 35, nº 2.
HAMMOND, J. L. and HAMMOND, Barbara. The Village Labourer. London: Longmans,
Green and Co., 1920.
HAYEK, F.A. ‘Liberalism’ in Hayek, F.V. New Studies in Philosophy, Politics, Economics
and the History of Ideas, London: Routledge and Kegan Paul, 1978
HAYEK, F.A. The Constitution of Liberty, Chicago: University of Chicago Press, 1960.
HAYEK, F.A. The Mirage of Social Justice, Chicago: University of Chicago Press, 1976.
HAYEK, F.V. Direito, legislação e liberdade: uma nova formulação dos princípios liberais de
justiça e economia política. Vol II A Miragem da Justiça Social. Tradução de Maria Luiza X.
de A. Borges. São Paulo, Editora Visão: 1985.
HAYEK, F.V. O caminho da servidão. Tradução e revisão Anna Maria Capovilla, José Ítalo
Stellem e Liane de Morais Ribeiro. Rio de Janeiro, Editora Instituto Liberal:1990.
103

HOBSBAWM, Eric J. A Era das revoluções: Europa 1789-1848. São Paulo: Paz e Terra S.A.,
1997.
HOLLAND, Márcio; Pedro L. Valls Pereira. Taxa de Câmbio Real e Paridade de Poder de
Compra no Brasil. Rio de Janeiro: RBE nº 53, jul.-set. 1999.
JAVILLIER, Jean Claude. Droit du travail. Paris: Dalloz, 1978.
KAHN-FREUND, Otto. Il valoro e la legge. Milano: Giuffrê, 1974.
KROTOSCHIN, Ernesto. Manual de derecho del trabajo. Buenos Aires:Depalma, 1987.
KUGELMAS, Eduardo. O fundo monetário aos sessenta anos: em busca de um novo papel?.
Economia Política Internacional: Análise Estratégica, Campinas, n. 6, jul-set. 2005.
LAFARGUE, Paul. O Direito à Preguiça e Outros Textos. Lisboa: Estampa/São Paulo:
Mandacaru, 1977.
LEITE, Jorge. Direito do trabalho. Coimbra: Editora da Universidade de Coimbra, 1999. 3 ev.
LOCK, John, 1632-1704. Segundo tratado sobre o governo civil: ensaio sobre a origem, os
limites e os fins verdadeiros do governo civil / John Locke ; introdução de J.W. Gough ;
tradução de Magda Lopes e Marisa Lobo da Costa. – Petrópolis, RJ : Vozes, 1994. (Coleção
clássicos do pensamento político).
MAGANO, Octavio Bueno. Do poder diretivo na empresa. São Paulo: Saraiva, 1982.
MAGANO, Octavio Bueno. Manual de Direito do Trabalho. 2.ed. São Paulo: LTr, 1987.
MAGANO, Octávio Bueno. Manual de direito do trabalho. São Paulo: LTr,1972.
MANUS, Pedro Paulo Teixeira. Direito do Trabalho. São Paulo: Atlas, 2011.
MARANHÃO, Délio. Direito do trabalho. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1992.
MARGLIN, Stephen. Origem e funções do parcelamento das tarefas. Para que servem os
patrões? In: GORZ, André (Org.). Crítica da divisão do trabalho. São Paulo: Martins Fontes,
1996.
MARTINS FILHO, Ives Gandra da Silva. Manual esquemático de direito e processo do
trabalho. São Paulo: Saraiva, 2016.
MARX, Karl. Crítica da economia política. Livro I: O processo de produção do capital. São
Paulo: Boitempo, 2014.
MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. Collected Works. New York: International Publishers,
1975, v.4. (A condição da classe trabalhadora na Inglaterra)
MAZZONI, Giuliano. Manuale di diritto del lavoro. Milano: Giuffre, 1988. 2v.
MESQUITA, José Luiz de. Direito disciplinar do trabalho. São Paulo: Saraiva, 1950.
MONTOYA MELGAR, Alfredo. Derecho del trabajo. Madrid: Tecnos, 1996.
104

MORAES FILHO, Evaristo de. Introdução ao direito do trabalho. 1º vol. Rio de Janeiro:
Revista Forense, 1956
MORAES FILHO, Evaristo de. Introdução ao direito do trabalho. 2º vol. Rio de Janeiro:
Revista Forense, 1956.
MORAES FILHO, Evaristo. Do contrato de trabalho como elemento de empresa. São Paulo:
LTr, 1957.
MORAES FILHO, Evaristo. O direito e a ordem democrática. São Paulo: LTr, 1984.
MORAES FILHO, Evaristo. Tratado Elementar de Direito do Trabalho. Rio de Janeiro, Freitas
Bastos, 1960.
MORAES, R. “Hayek e a teoria política do neoliberalismo econômico”
http://reginaldomoraes.files.wordpress.com/2011/06/hayek.pdf
MORAES, R. Neoliberalismo – Uma Introdução Comparativa”
http://www.cefetsp.br/edu/eso/globalizacao/libneolibcompa.html
MORAIS FILHO, Evaristo. Apontamentos de direito operário. São Paulo: LTr, 1993.
MOREIRA, Vital. A ordem jurídica do capitalismo. Coimbra: Centelha, 1978.
NAGEL, Thomas, Equality and Partiality, Oxford: Oxford University Press, 1991.
NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de direito do trabalho. 16.ed. São Paulo: Saraiva,
1999.
NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação ao Direito do Trabalho. São Paulo: LTr Editora,
2012.
NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Teoria jurídica do salário. São Paulo: LTr, 1994.
Nota técnica nº 1, de 23 de Janeiro de 2017, da Secretaria de Relações Institucionais do
Ministério Público do Trabalho (MPT).
NUSSBAUM, M. e SEN, Amartya. The quality of life. Oxford: Oxford University Press, 1998.
PINTO MARTINS, Sérgio. Direito do trabalho. São Paulo: Atlas, 1998.
Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento no Brasil. O que é IDH?
RAWLS, J. O Liberalismo Político. Trad. Dinah de Abreu Azevedo. São Paulo: Ática, 2000.
RAWLS, J., Uma Teoria da Justiça. Edição revista. Trad. Almiro Pisetta e Lenita Esteves. São
Paulo: Martins Fontes, 2008.
REIS, Daniela Muradas. O princípio da vedação do retrocesso no direito do trabalho. São Paulo:
LTr, 2010.
Relatório da Comissão Especial destinada a proferir parecer ao Projeto de Lei nº 6.787, de 2016,
do Poder Executivo, que “altera o Decreto-lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943 – Consolidação
das Leis do Trabalho, e a Lei nº 6.019, de 3 de janeiro de 1974, para dispor sobre eleições de
105

representantes dos trabalhadores no local de trabalho e sobre trabalho temporário, e dá outras


providências”.
RIVERO, Jean e SAVATIER, Jean. Droit du travail. Paris: Presses universitaires de France,
1984.
ROCHA, Antonio Penalves. A Escravidão em "A Riqueza das Nações" de Adam Smith. CLIO:
Revista de Pesquisa Histórica, Pernambuco, v. 1, n. 14, jul. 1993.
RODRIGUEZ, Américo Plá, 3ª ed., São Paulo:LTR, 2000.
RODRIGUEZ, Américo Plá. Los principios del derecho del trabalho. Buenos Aires: Depalma,
1990.
RUPRECHET, Alfredo J., Os Princípios do Direito do Trabalho, São Paulo: LTR, 1995.
RUSSELL, Bertrand, 1872-1970. História do pensamento ocidental. Tradução Laura Alves e
Aurélio Rebello. Rio de Janeiro: Nova Fronteira. 2013.
RUSSOMANO, Mozart Victor. Curso de direito do trabalho. Curitiba: Juruá, 1997.
SACHS, Jeffrey. “The Social Welfare State, beyond Ideology”
http://www.scientificamerican.com/article.cfm?id=the-social-welfare-state
SANDEL, Michael. O liberalismo e os limites da justiça. Trad. Carlos Pacheco do Amaral.
Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2005.
SANTORO-PASSARELLI, Francesco, Nozioni di Diritto del Lavoro, 6ª ed., Nápolis, 1952.
SCHIAVI, Mauro. Manual de Direito Processual do Trabalho. 3.ed. São Paulo: LTr, 2012.
SCHMIDTZ, D. The Limits of Government, Boulder, CO: Westview, 1991.
SEGADAS VIANA, José de et al. Instituições de direito do trabalho. São Paulo: LTr, 1999.
SEN, Amartya. A ideia de justiça. Tradução Denise Bottman e Ricardo D. Mendes. São Paulo:
Companhia das Letras, 2011.
SEN, Amartya. Desenvolvimento como Liberdade. Tradução Laura Teixeira Mota. São Paulo:
Companhia das Letras, 2000.
SEN, Amartya. Desigualdade reexaminada. Tradução Ricardo D. Mendes. Rio de Janeiro:
Record, 1991.
SEN, Amartya. Inequality reexamined. Oxford: Clarendon Press, Cambridge: Harvard
University Press, 1992.
SEN, Amartya. The idea of justice. Harvard: Cambridge, Massachusets, 2009.
SEN, Amartya.“Human Rights and Capabilities”Journal of human development, 6(2):151–66,
2005.
SILVA, Antônio Álvares da – Flexibilização das relações de trabalho – São Paulo: Ltr, 2002.
106

Simon Deakin y Aristea Koukiadaki, “The sovereign debt crisis and the evolution of labour law
in Europe”, IN Nicola Countouris e Mark Freedland, eds., Resocialising Europe in a Time of
Crisis (Cambridge: Cambridge University Press, 2013).
SKINNER, Quentin. Liberty Before Liberalism, Cambridge: Cambridge University Press,
1998.
SMITH, Adam. A riqueza das nações. Livro 1 – 1ª parte; Trad. Márcio Pugliese Global Editora:
São Paulo, 1980. (Coleções Base – Economia 25).
SOUTO MAIOR, Jorge Luiz, COUTINHO, Grijalbo Fernandes, MELO FILHO, Hugo
Cavalcante & FAVA, Marcos Neves. O mundo do trabalho. Vol. I. Leituras críticas da
jurisprudência do TST: em defesa do direito do trabalho. Coordenadores: São Paulo: LTr, 2009.
SOUTO MAIOR, Jorge Luiz, GNATA, Noa Piatã Bassfeld. Trabalhos marginais. São Paulo:
Boitempo, 2014.
SOUTO MAIOR, Jorge Luiz, MOREIRA, Ranúlio Mendes, SEVERO, Valdete Souto.
Dumping social nas relações de trabalho. 2ª. ed. São Paulo: LTr, 2014.
SOUTO MAIOR, Jorge Luiz. Curso de Direito do Trabalho: a relação de emprego. Vol. II. São
Paulo: LTr, 2008.
SOUTO MAIOR, Jorge Luiz. Curso de Direito do Trabalho: teoria geral do direito do trabalho.
Vol. I – Parte I. São Paulo: LTr, 2011.
SOUTO MAIOR, Jorge Luiz. Direito processual do trabalho: efetividade, acesso à justiça e
procedimento oral.. São Paulo: LTr, 1998
SOUTO MAIOR, Jorge Luiz. O dano moral nas relações de trabalho. Coleção para Entender
Direito. São Paulo: Estúdio Editores, 2014.
SOUTO MAIOR, Jorge Luiz. O direito do trabalho como instrumento de justiça social. São
Paulo: LTr, 2000
SOUTO MAIOR, Jorge Luiz. Petição Inicial: no processo civil e no processo do trabalho. São
Paulo: LTr, 1996
SOUTO MAIOR, Jorge Luiz. SEVERO, Valdete Souto. Os 201 ataques da "reforma" aos
trabalhadores. 2017. Disponível em: <http://www.jorgesoutomaior.com/blog/os-201-ataques-
da-reforma-aos-trabalhadores>
SOUTO MAIOR, Jorge Luiz. Temas de processo do trabalho. São Paulo: LTr, 2000
STF. Súmulas nº 150 e 327.
SUSSEKIND, Arnaldo. Direito constitucional do trabalho. Rio de Janeiro: Renovar, 1999.
SUSSEKIND, Arnaldo; MARANHÃO, Délio; VIANA, Segadas; LIMA TEIXEIRA, João de
Lima. Instituições de direito do trabalho. 19.ed. São Paulo: LTr,2000. 2v.
107

SUSSEKIND, Arnaldo; MARANHÃO, Délio; VIANNA, Segadas. Instituições de Direito do


Trabalho. São Paulo: LTr, 2005. vol. 1 e 2.
TEIXEIRA, João Régis Fassbender e SIMM, Zeno. Teoria prática do direito do trabalho. São
Paulo: Revista dos tribunais, 1981.
THÉBAUD-MONY, Annie ; DRUCK, Graça. Terceirização: A erosão dos direitos dos
trabalhadores na França e no Brasil. In: DRUKE, Graça; FRANCO, Tânia (Org.). A perda da
razão social do trabalho. São Paulo: Boitempo, 2012.
TST. Súmulas nº 6, 85, 114, 219, 277 e 294.
UNITED NATIONS. Report of the Independent Expert on the effects of foreign debt and other
related international financial obligations of States on the full enjoyment of all human rights,
particularly economic, social and cultural rights. Human Rights Council. 2017.
URIARTE, Oscar Ermida. A Flexibilização no Direito do Trabalho - A Experiência Latino-
Americana. In: TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO (Org.). Flexibilização no direito do
trabalho. 2. ed. São Paulo: IOB Thomson, 2004.
VIANA, Márcio Túlio, Direito de Resistência, São Paulo: LTR, 1996.
VILLERMÉ, Louis-René. Tableau de l’état physique et moral des ouvriers employés dans les
manufactures de coton, de laine et de soie. Textes choisis et présentés par Yves TYL. Paris :
Union générale d'Éditions, 1971, Collection : 10-18, n° 582.

You might also like