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O direito Agrário no Brasil e sua evolução

histórica
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A
Publicado por Andre Rodrigueslima
há 3 anos
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Por André Rodrigues Lima e Nayara Nardelly M. Santos

RESUMO

O presente artigo se propõe a pesquisar o direito agrário brasileiro, remontando a sua


origem, seu conceito, suas fontes e seus princípios, além da relação do direito agrário com
outros ramos do direito. Ademais, outros temas relacionados com Direito Agrário serão
analisados, tal como a função social da propriedade, além do Estatuto da Terra, previsto na
lei 4.504/64. Contextualizou-se também as fontes e os institutos do Direito Agrário. Por
fim, não pode deixar de mencionar o Direito agrário, relacionando-o com as constantes
disputas pelos conflitos de terra existentes até os dias atuais

Palavras-chave: Direito Agrário. Estatuto da Terra Propriedade

Sumário: 1. Breves considerações iniciais: origem do direito agrário. 2. Conceito de


direito agrário. 3. Alguns princípios do direito Agrário brasileiro 4. Fontes do Direito
Agrário brasileiro. 5. Relação do direito agrário com outros ramos do direito. 6. Breves
considerações de alguns institutos do Direito agrário brasileiro 7. Conflitos agrários no
Brasil. Referências.

1 Breves considerações iniciais: origem do direito agrário

O direito agrário remonta a tempos antigos, pois o homem desde antes precisava retirar seu
alimento da terra para sua sobrevivência. O cultivo, a criação de animais e os agricultores
já se faziam presentes no tempo antigo e união de grupos era necessário para sobreviver.

Nos ensinamentos de Alcir Gursen de Miranda, citado por Benedito Ferreira Marques trata
acerca:

As primeiras normas reguladoras dos povos antigos foram normas diferenciadas e que a
relação do homem com a terra excedia os limites do jurídico, chegou à conclusão de que “o
Código de Hammurabi, (...) (século XVII a. C.), organizado em 280 parágrafos, continha
nada menos do que 65 temas específicos de conteúdo marcadamente agrarista, podendo-se
destacar, entre eles, os seguintes: o Cap. V, que tratava da locação e cultivo dos fundos
rústicos; o Cap. XII, que cuidava do empréstimo e locação de bois; o Cap. XIV, que se
referia à tipificação delituosa da morte humana pela chifrada de um boi; o Cap. XVI, que
regia a situação dos agricultores; e o Cap. XVII, que tratava dos pastores.” (Alcir Gursen,
apud BENEDITO F. MARQUES, 2014, p. 02).
Importante considerar o quanto o direito grego infuenciou na formação do direito agrário,
pois uma noção de economia foi inserida no direito agrário. Assim assevera Silvia Optiz:

Porém não se pode esquecer aqui a valiosa contribuição do costume e do direito grego,
principalmente tendo-se em vista que foram eles que transmitiram aos romanos a noção de
economia, inclusive a agrária, onde aparece em sua infância o uso da terra, mediante o
pagamento de um cânon ou aluguel. Alguns institutos jurídicos ainda em vigor são
produtos das circunstâncias econômico-sociais que herdamos dos gregos. Os gregos eram
mais teóricos do direito que os romanos, que eram práticos. Uma série de contribuições
jurídicas privadas encontra sua explicação nessa contribuição helênica” (OPTIZ, 2014, p.
48).

No Brasil a história do direito agrário se inicia a partir do Tratado de Tordesilhas, em que


após a chegada de Colombo a América já havia uma preocupação em proteger as leis pela
corte espanhola.

A partir deste momento surgiriam os primeiros latifúndios e que posteriormente, com a


colonização criou as léguas das sesmarias, onde se percebia o privilégio dos próprios
portugueses em latifundiar as terras. Essa léguas durou até o ano de 1822.

Com o desrespeito ao tratado de Tordesilhas houve uma desenfreada ocupação no território


brasileiro. Nesse contexto firmou se a “ Lei das Terras”, tendo em vista que uma das
finalidades era a de legitimar a posse de terras devolutas.

Como essa Lei de Terras não satisfez os anseios da época, igualmente nos dias de hoje, em
que existe inúmeras e vastas áreas de terras com um pequeno número de pessoas,
posteriormente as Constituições vinham regulando tal assunto, como o texto constitucional
de 1891, que regulamentava áreas destinadas à defesa de fronteiras.

Para Benedito Ferreira Marques a Constituição de 1946 que mais progrediu sobre o Direito
agrário:

A Constituição Federal de 1946, entretanto, pode ser considerada a que impregnou avanços
mais significativos, tendentes à institucionalização do nascente ramo jurídico. Em primeiro
lugar, porque manteve as normas de conteúdo agrarista inseridas na Constituição anterior.
Em segundo lugar, porque ampliou o raio de abrangência de situações ligadas diretamente
ao setor rural, podendo-se destacar a criação da desapropriação por interesse social que,
mais tarde, viria a ser adaptada para fins de reforma agrária. Em função dessa Carta
Política, nasceu o Instituto Nacional de Imigração e Colonização (INIC) através da Lei no
2.163, de 1954, seguramente o embrião do atual INCRA. A criação desse órgão federal foi
de fundamental importância, na medida em que começaram a ser elaborados os planos de
reforma agrária, sendo os dois primeiros o de Coutinho Cavalcanti, em 1954, e o de Nelson
Duarte, em 1955.(MARQUES, 2015, p.57)

Ademias, importante também foi a EC/10 que consagrou a União para legislar sobre tal
matéria.

2 Conceito de direito agrário


O direito agrário está inicialmente disciplinado no Constituição da Republica Federativa do
Brasil de 1988, no art. 22, inciso I, em que “compete a União legislar sobre: I (...) direito
agrário”.

Direito agrário é o conjunto de normas jurídicas concernentes ao aproveitamento do imóvel


rural. (SILVIA, 2014, p. 60).

Para Fabrício Gaspar Rodrigues (2014) o “direito agrário é o conjunto sistemático de


normas jurídicas que visam disciplinar as relações do homem com a terra, tendo em vista o
progresso social e econômico do rurícola e o enriquecimento da comunidade.

A regulação do direito agrário, bem como a função social a terra, sempre estará presente no
conceito da disciplina.

Para Raymundo Laranjeira o “direito Agrário é o conjunto de princípios e normas que,


visando a imprimir função social à terra, regulam relações afeitas à sua pertença e uso, e
disciplinam a prática das explorações agrárias e da conservação dos recursos naturais.”

O progresso social e econômico também fazem presentes no direito agrário, haja vista que
os conflitos oriundos do acesso a terra se fazem até os dias atuais. Tal assunto será
abordado em um tópico específico.

Por fim cumpre ainda dizer da natureza jurídica do direito agrário, que é para a maioria dos
autores híbrida, de maneira que é composto por normas públicas e privadas. Nesse sentido
assevera Benedito Ferreira Marques:

Sabe-se que essa dicotomia já não goza do prestígio de outrora, na medida em que o direito
privado está impregnado de normas de ordem pública, e viceversa. A tendência atual é
considerar essas normas classificadas como imperativas (ou cogentes), que não podem ser
ilididas pela vontade das partes envolvidas na relação jurídica; ou supletivas (ou
dispositivas), que se amoldam aos interesses privados.(MARQUES, p.48, 2015)

3 Alguns princípios do direito Agrário brasileiro

A palavra princípio, que deriva do verbete latino principum, significa origem, início,
primeiro momento em que algo ou alguém começa a existir.

Os princípios podem ser conceituados como valores fundamentais que regem um


determinado sistema jurídico, que além de orientar a compreensão, integram um arcabouço
normativo.

Na concepção de Celso Antônio Bandeira de Mello:

Princípio, etimologicamente, significa causa primária, momento em que algo tem origem,
elemento predominante na constituição de um corpo orgânico, preceito, regra, fonte de
uma ação. Em Direito, princípio jurídico quer dizer uma ordenação que se irradia e imanta
os sistemas de normas. (MELLO, 2001, p. 771-772).
Um importante princípio do direito agrário está o da União legislar sobre tal matéria,
conforme assevera o art. 22, I da CRFB/88, onde há o monopólio de legislar pertencente a
União.

Igualmente relevante está o princípio da função social da propriedade, previsto no art. 5º,
inciso XXIII, que dispõe que “ a propriedade atenderá a sua função social”.

A função social da propriedade deve atingir uma finalidade coletiva, atendendo sempre os
ditames da lei e nesse sentido está o art. 2º da Lei 4.504/64 que dispõe que “ é assegurada a
todos a oportunidade de acesso à propriedade da terra, condicionada pela sua função social,
na forma prevista nesta Lei”.

Para Fabrício Gaspar Rodrigues, do princípio da função social decorre todos os outros:

É preciso que o Estado preveja, de uma maneira geral, condições de seu funcionamento
que atendam ou propiciem essas condições mínimas de sobrevivência. Atendidas essas
condições, terá o Estado atendido a este princípio, que no Direito Agrário é fundamento
para a permanência na terra daquele que a tornar produtiva com o seu trabalho m para
acesso a propriedade da terra e para a assistência do Estado ao produtor agrícola e para
propiciar o aumento da produção. Desse princípio decorrem todos os
demais.(RODRIGUES, p.10, 2014)

Não obstante o CC/02, em seu art. 1.228 dê ao “proprietário a faculdade de usar, gozar e
dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua
ou detenha”, “o direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas
finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com
o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e
o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas”.

A propriedade deve resguardar o exercício em prol do interesse público, não deixando de


se observar os valores fundamentais, como a dignidade da pessoa humana.

A função social, para sua ascensão deve se respeitar o art. 186 da CRFB/88:

Art. 186. A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente,
segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos:I -
aproveitamento racional e adequado; II - utilização adequada dos recursos naturais
disponíveis e preservação do meio ambiente; III - observância das disposições que regulam
as relações de trabalho; IV - exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos
trabalhadores.

Além do mais, deve considerar o princípio da preservação dos recursos naturais e do meio
ambiente em que se faz necessário a conservação da natureza, buscando sempre
harmonizar o avanço econômico com esse cuidado de preservação.

O princípio da proteção à propriedade familiar em que se respeita a pequena propriedade e


o poder público deve incentivar essa produção, sem deixar de proteger esse núcleo familiar
rural.
Nesse sentido está o art. 2º, § 2º do Estatuto da Terra:

§ 2º É dever do Poder Público: a) promover e criar as condições de acesso do trabalhador


rural à propriedade da terra economicamente útil, de preferência nas regiões onde habita,
ou, quando as circunstâncias regionais, o aconselhem em zonas previamente ajustadas na
forma do disposto na regulamentação desta Lei;

Intimamente ligado a esse princípio está a permanência na terra que tem o fim de proteção
a família que cuidou e tornou produtiva a terra.

Não menos importante está o princípio do aumento da produção em que o uso de


tecnologias se torna indispensável, uma vez que com o aumento da população no mundo é
necessário produzir em grandes escalas, lógico que sempre obedecendo a preservação dos
recursos naturais, até porque da onde se tira, busca se restaurar, para novamente produzir.

4 Fontes do Direito Agrário brasileiro

Como qualquer fonte no direito existem as fontes imediatas ou diretas, além das fontes
mediatas ou indiretas.

As fontes formais são: a lei, os costumes, a doutrina e a jurisprudência. No direito agrário


as fontes são a Constituição, que estabelece princípios para a matéria agrária, além do
Estatuto da Terra, importante fonte que estrutura o direito agrário.

Os costumes também tem sua importância, como regras sancionadas pelos próprios
membros de uma determinada sociedade.

Já a jurisprudências também é importante para se compreender o direito agrário, de modo


que as decisões de juízes e 1º grau e tribunais tomaram decisões que poderão ser utilizadas
para novos conflitos de interesses.

5 Relação do direito agrário com outros ramos do direito

Os doutrinadores entendem que a principal fonte do direito agrário é o direito civil, mas
outras fontes não deixam de ser igualmente importantes para a composição do direito
agrário.

Importante o direito civil, pois a propriedade, a posse está regulamentada em títulos


específicos.

Não menos importante está a relação do direito agrário com o direito mercantil,
principalmente no que se refere ao empresário rural que se inscrever no registro público de
empresas mercantis, conforme consta no art. 971 e no art. 984, todos do Código Civil de
2002, no livro II, do Direito de Empresa, do título I do empresário.

Art. 971. O empresário, cuja atividade rural constitua sua principal profissão, pode,
observadas as formalidades de que tratam o art. 968 e seus parágrafos, requerer inscrição
no Registro Público de Empresas Mercantis da respectiva sede, caso em que, depois de
inscrito, ficará equiparado, para todos os efeitos, ao empresário sujeito a registro.
Art. 984. A sociedade que tenha por objeto o exercício de atividade própria de empresário
rural e seja constituída, ou transformada, de acordo com um dos tipos de sociedade
empresária, pode, com as formalidades do art. 968, requerer inscrição no Registro Público
de Empresas Mercantis da sua sede, caso em que, depois de inscrita, ficará equiparada,
para todos os efeitos, à sociedade empresária.

Há ainda a relação do direito agrário com outros importantes ramos, tal como o Direito
administrativo e o direito processual civil, onde naquele existem matérias relativas a
desapropriação e importantes órgãos reguladores e este, conforme consta o art. 275, II, do
CPC que dispõe que “observar-se-á o procedimento sumário: II nas causas qualquer que
seja o valor a) de arrendamento rural e de parceria agrícola”.

Importante também frisar o procedimento das ações possessórias, conforme o art. 920 a
923 do CPC.

No direito Penal está por exemplo o crime de dano previsto no art. 163 do CP em que se
considera dano “ destruir, inutilizar ou deteriorar coisa alheia”. Há também a ocorrência do
crimes como o furto e o roubo.

No direito tributário destaca-se a fixação do imposto sobre a propriedade territorial rural,


previsto no art. 49 do Estatuto da Terra:

Art. 49. As normas gerais para a fixação do imposto sobre a propriedade territorial rural
obedecerão a critérios de progressividade e regressividade, levando-se em conta os
seguintes fatores: (Redação dada pela Lei nº 6.746, de 1979); I - o valor da terra nua;
(Redação dada pela Lei nº 6.746, de 1979) II - a área do imóvel rural; (Redação dada pela
Lei nº 6.746, de 1979); III - o grau de utilização da terra na exploração agrícola, pecuária e
florestal; (Redação dada pela Lei nº 6.746, de 1979) IV - o grau de eficiência obtido nas
diferentes explorações; V - a área total, no País, do conjunto de imóveis rurais de um
mesmo proprietário. (Redação dada pela Lei nº 6.746, de 1979).

6 Breves considerações de alguns institutos do Direito agrário brasileiro

O direito agrário no Brasil pode ser visto sob aspectos, onde a terra é o objeto, a produção
deverá ser respeitada, sendo de grande importância a preservação dos recursos extraídos da
natureza e todas essas atividades devem estar relacionadas e intimamente ligadas. Nesse
sentido está o entendimento de Emílio Alberto Maya:

A atividade agrária, é o resultado da atuação humana sobre a natureza, em participação


funcional, condicionante do processo produtivo”. O autor aduz, ainda, que a mencionada
atividade agrária pode ser considerada em três aspectos fundamentais, a saber: 1. Atividade
imediata, tendo por objeto a terra, considerada em sentido lato, abrangendo a atuação
humana em relação a todos os recursos da natureza. 2. Os objetivos e os instrumentos
dessa atividade, compreendendo a preservação de recursos naturais; a atividade extrativa
de produtos inorgânicos e orgânicos; a captura de seres orgânicos (caça e pesca) e a
produtiva (agricultura e pecuária). 3. Atividades conexas, como o transporte de produtos
agrícolas, os processos industriais e as atividades lucrativas, ou seja, o comércio
propriamente dito. (MAYA, p., 36)
Alguns institutos do direito agrário estão previstos no Estatuto da Terra, quanto na lei
11.952/09.

Fabrício Gaspar Rodrigues, em sua obra cita importantes institutos do Direito agrário tais
como: imóvel rural, propriedade familiar, módulo rural, minifúndio, latifúndio, empresa
rural, parceleiro, cooperativa integral da reforma agrária, além da colonização. Alguns
desses institutos serão tratados neste presente artigo.

Merece destaque a propriedade familiar que está prevista no Estatuto da Terra, no art. 4º,
II:

Art. 4º Para os efeitos desta Lei, definem-se:II-"Propriedade Familiar"como o imóvel rural


que, direta e pessoalmente explorado pelo agricultor e sua família, lhes absorva toda a
força de trabalho, garantindo-lhes a subsistência e o progresso social e econômico, com
área máxima fixada para cada região e tipo de exploração, e eventualmente trabalho com a
ajuda de terceiros.

Alguns elementos se fazem presentes no conceito, tal como a existência do título do


imóvel, além da exploração direta e pessoal pelo agricultor e sua família. Além do mais,
convém destacar que a possibilidade de eventual ajuda de terceiros não desclassifica tal
propriedade, desde que provada a real necessidade, se tendo como exemplo a o auxílio em
plantios ou colheitas.

Já o latifúndio é definido pelo Estatuto da Terra como:

Art. 4º Para os efeitos desta Lei, definem-se V - "Latifúndio", o imóvel rural que: a) exceda
a dimensão máxima fixada na forma do artigo 46, § 1º, alínea b, desta Lei, tendo-se em
vista as condições ecológicas, sistemas agrícolas regionais e o fim a que se destine.

Percebe-se aqui uma clara discrepância entre o latifúndio por extensão e o latifúndio por
exploração. No primeiro há o claro entendimento que latifúndios assim caracterizam maior
concentração de renda, se mostrando uma verdadeira exclusão dos pequenos produtores e
até a impossibilidade de produção, visto que esgota as chances de uso de tecnologia e
semelhantes. Quanto ao segundo significa o mau uso da terra, obviamente não se incluído
os lugares protegidos, que são contrários a exploração humana.

O Decreto 84.685/80 que regulamentou a lei 6.746/79, em seu art. 22 também conceitua o
latifúndio, como:

Art. 22. Para efeito do disposto no art. 4º, incisos IV e V, e no art. 46, § 1º, alínea b, da Lei
nº 4.504, de 30 de novembro de 1964, considera-se: II - latifúndio, o imóvel rural que: a)
exceda a 600 (seiscentas) vezes o módulo fiscal calculado na forma do art. 5º b) não
excedendo o limite referido no inciso anterior e tendo dimensão igual ou superior a um
módulo fiscal, seja mantido inexplorado em relação às possibilidades físicas, econômicas e
sociais do meio, com fins especulativos, ou seja, deficiente ou inadequadamente explorado,
de modo a vedar-lhe a inclusão no conceito da empresa rural.
Assim o latifúndio de mostra ineficaz em todos os sentidos, de modo que são áreas
deficientes em todos os sentidos, pois possuem uma baixíssima produtividade,
prejudicando a todos.

A empresa rural, também está previsto no Estatuto da Terra, conforme assevera o art. 4º,
VI:

VI - "Empresa Rural" é o empreendimento de pessoa física ou jurídica, pública ou privada,


que explore econômica e racionalmente imóvel rural, dentro de condição de rendimento
econômico... Vetado... Da região em que se situe e que explore área mínima agricultável
do imóvel segundo padrões fixados, pública e previamente, pelo Poder Executivo. Para
esse fim, equiparam-se às áreas cultivadas, as pastagens, as matas naturais e artificiais e as
áreas ocupadas com benfeitorias;(...)

O Decreto 84.685/80 especificou pontos importantes acerca da empresa rural, haja vista
que acrescentou valores que não estavam previstos, além de definição de sua natureza
como civil.

Quanto ao módulo rural, que é uma área ocupada pela propriedade familiar, variável
segundo critérios regionais específicos (RODRIGUES, p. 19, 2010), que é regulamentada
pelo Decreto 55.891/65, tendo como uma das suas finalidades primordiais estabelecer uma
unidade de medida que exprima e interdependência entre a dimensão.

Não menos importante está a Cooperativa Integral de Reforma Agrária que tem como sigla
C. I. R. A. E é conceituada como sociedade cooperativa mista, de natureza civil, onde se
conta com o poder público por tempo determinado para realizar algumas finalidades
previstas em lei.

7 Conflitos agrários no Brasil

Não se fala em direto agrário sem mencionar os conflitos agrários no país, que estão
intimamente ligados a uma reforma agrária que nunca funcionou no país. A lei que regula a
reforma agrária é 8.629/93.

A reforma agrária é conceituada como “o conjunto de medidas que visem a promover


melhor distribuição da terra, mediante modificações no regime de sua posse e uso, a fim de
atender aos princípios de justiça social e ao aumento da produtividade, de acordo com o
artigo 1º, § 1º, da Lei 4.504/64.

Importante o registro de conflitos agrários no Brasil, sendo o Pará o Estado em que se mais
mata no país.

Embora sempre marcado por crimes ligados a tais conflitos, cresce cada vez mais o
número de assassinatos, decorrente da violência, além da expansão do Agronegócio na
Amazônia.

Vê-se que ainda a falta ou o excesso de acesso à terra gera conflitos, em que o poder
público não consegue efetivar esse acesso. Cumpre ressaltar ainda que embora a farta
legislação sobre o tema, o Estado não conseguiu aplicar e popularizar esse acesso.
Referências

BRASIL. Código Processo Civil Brasileiro. lei no5.869, de 11 de janeiro de 1973..


Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L5869compilada.htm >.
Acesso em 18.11.2015.

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da Republica Federativa do Brasil de 1988.


Disponívelem<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituição/constituicaocompilado.
Htm>. Acesso em 18.11.2015.

BRASIL. Código Tributário Nacional. Lei 5.172 de 25 de Outubro de 1966. Disponível


em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L5172.htm>. Acesso em 18.11.2015.

BRASIL. Código Penal. Decreto lei no2848 de 7 de Dezembro de 1940. Disponível em:
< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del2848compilado.htm>. Acesso em
20.11.2015.

BRASIL. Estatuto da Terra. Lei no4.504 de 30 de Novembro de 1964. Disponível em: <
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L4504.htm>. Acesso em 19.11.2015.

BRASIL. Lei 11.952 de 25 de Junho de 2009. Disponível em: <


http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2009/lei/l11952.htm>. Acesso em
21.11.2015.

MARQUES, Benedito Ferreira. Direito Agrário Brasileiro. 11ª. Ed Editora Atlas: São
Paulo, 2015.

RODRIGUES, Gaspar Rodrigues. Direito Agrário. 2ª ed. Rio de Janeiro: Editora jus
Podivim, 2010.

OPITZ, Sílvia C. B. Curso Completo de Direito Agrário. 8ª. Ed. Editora Saraiva: São
Paulo, 2014.

Resumo: Concepção é um modo de ver, de sentir ou de compreender algo. Este artigo


apresenta uma abordagem do conceito de Direito agrário, bem como sua natureza jurídica,
dando ênfase aos seus próprios princípios jurídicos.*

Palavras-chave: Princípios jurídicos – Função social – Justiça social – Direito agrário.

Sumário: 1. Introdução; 2. Princípios do Direito agrário; 3. A função social da


propriedade; 4. A justiça social no meio rural; 5. A prevalência do interesse público; 6.
Considerações finais; 7. Referências bibliográficas.

1. INTRODUÇÃO.

O Direito agrário é considerado um novo ramo do direito, possuindo inúmeros conceitos,


alguns de forma mais técnica, mais formal e outros de maneira mais singela e um tanto
objetiva. Entrementes, elencamos alguns conceitos, para melhor elucidar pedagogicamente
a definição de Direito agrário. Dentre os conceitos citamos primeiramente, Paulo Torminn
Borges:

“É o conjunto de normas jurídicas que visam disciplinar as relações do homem com a terra,
tendo em vista o progresso social e econômico do rurícola e o enriquecimento da
comunidade.” (BORGES, 1994, pág. 17).

Vê-se que na visão de Paulo Torminn Borges o Direito agrário é alimentado por normas
jurídicas autônomas, visando as relações do homem com a terra.

Pensando assim, acreditamos que o Direito agrário é ramo autônomo do direito, com
princípios próprios e que não podemos negar sua importância e seu peso nas relações
jurídicas entre o ser humano e o campo. Além disto, também é possível compreender que
no mesmo Direito agrário existam regras que enfatizam o interesse coletivo em detrimento
do particular, uma vez que é no Direito agrário que as relações entre o homem e o campo,
absorvem a produção agrícola, pecuária, leiteira, florestal e daí, sem dúvida a produção
alimentar que assegura a sobrevivência da humanidade.

2. PRINCÍPIOS DO DIREITO AGRÁRIO

Na seara do Direito agrário existe uma sólida doutrina que cuida da pesquisa e da
publicação de textos voltados para a atividade agrária e seus reflexos. Daí segundo
MARQUES (2010, pág. 21), “a autonomia científica deste ramo do direito construiu
princípios próprios, que se diferenciam dos princípios gerais do direito. Em sua obra,
Benedito Ferreira Marques transcreve vários destes princípios específicos”.

Mas, com o devido respeito que o autor acima merece, também compulsamos outros
doutrinadores e identificamos inúmeros outros princípios norteadores do Direito agrário.
Assim, para fins objetivos neste texto, vamos apresentar alguns doutrinadores que fazem
menção de princípios gerais de Direito agrário em suas obras e após iremos enfatizar três
princípios agrários, de forma específica, nos tópicos seguintes.

Mas antes, também é interessante compreender que da análise dos princípios do Direito
agrário, não há enlace uníssono com os princípios do Direito civil, cujas regras são mais
individuais, dando uma autonomia de vontade mais larga, muito embora, o Código Civil de
2002 trate da questão intitulada função social do contrato.

Além disto, também precisamos reforçar a compreensão do que significa o vocábulo


“princípio”. Segundo OLIVEIRA (2010, pág. 79), “esta palavra é derivada do latim
principium, em sentido comum dá a entender o início da vida, ou então, aquele primeiro
instante da existência. É, assim, uma acepção aberta, indicativo de origem, começo de
alguma coisa”.

De outro lado, na acepção jurídica do termo, princípio significa normas elementares, ou


então requisitos primordiais, necessários como fundamento ou base, ou mesmo alicerce
para algum ramo do Direito.
Ainda bebendo na sabedoria o ilustre professor Umberto Machado de Oliveira,
compreendemos que “em Vicente Ráo, a ignorância dos princípios, quando não induz ao
erro, nos caminha à criação de rábulas em vez de juristas”. (OLIVEIRA, 2010, pág. 95).

Vê-se que o estudo dos princípios e sua perfeita compreensão, facilita o exercício da
pesquisa e da efetivação do direito na sociedade civil. Em decorrência disto, reforçamos a
compreensão de que os princípios de direito possuem funções fundamentadoras da ordem
jurídica, funções interpretativas ou hermenêuticas e funções supletivas e limitadoras da
discricionariedade judicial.

Em Umberto Machado de Oliveira a função fundamentadora dos princípios é apresentada


de forma pedagógica e extremante compreensível. Vejamos:

“Eficácia derrogatória e diretiva. Por ela, segundo Espínola, as normas que confrontem os
centros de irradiação normativa assentados nos princípios (constitucionais), perdem sua
validade (no caso da eficácia diretiva) e/ou sua vigência (em se tratando da eficácia
derrogatória), tudo isso em face do contraste normativo com normas de estalão
constitucional”. (OLIVEIRA, 2010, pág. 96).

Extra-se deste fragmento da obra do festejado professor a importância do estudo dos


princípios jurídicos. De outro lado, a função interpretativa ou hermenêutica dos princípios
também cumprem papel relevante no Direito. Segundo o mesmo professor, temos que:

“O papel de orientarem as soluções jurídicas a serem aplicadas em situações concretas


submetidas à apreciação do intérprete. São, desse modo, vetores de sentido jurídico às
demais normas, em face dos fatos e atos que exijam compreensão normativa. Assim, os
princípios jurídicos desempenham o papel de guiamento do momento cognoscitivo do
responsável pela aplicação das regras jurídicas, diante de um caso em que lhe é solicitada
uma solução”. (OLIVEIRA, 2010, pág. 97).

Neste intuito, o estudo dos princípios de direito se mostra relevante, bem como, úteis na
construção de uma solução para dúvidas interpretativas com o esclarecimento do sentido
de determinada disposição legal.

Pois bem, após este reforço dado à importância dos princípios de direito, retomamos nossa
trajetória para a seara específica do Direito agrário e seu núcleo que é a atividade agrária.
Nela encontramos o assunto desta dissertação, que são os contratos agrários, ponto de
destaque laborado ao longo destas linhas.

Firmando nesta idéia, enfatizamos que a formação dos princípios de Direito agrário
nascem ou pelo menos tem uma íntima relação com a Política Agrária praticada pelo
sistema brasileiro e esta com os dados que a sociologia rural, a agronomia e todas as outras
ciências vinculadas ao Direito agrário propiciam. Não é possível, enxergar uma visão neo-
agrária, com a ausência destes outros conhecimentos.

Pois bem, compreendendo isto, o saudoso professor da faculdade de Direito da


Universidade Federal de Goiás, Paulo Torminn Borges, fazia uma apresentação daquilo
que ele considerava como princípio fundamental no Direito agrário. Vejamos:
“1º) a função social da propriedade; 2º) o progresso econômico do rurícola; 3º) o progresso
social do rurícola; 4º) o fortalecimento da economia nacional, pelo aumento da
produtividade; 5º) o fortalecimento do espírito comunitário, mormente da família; 6º) o
desenvolvimento do sentimento de liberdade (pela propriedade) e de igualdade (pela oferta
de oportunidade concretas); 7º) a implantação da justiça distributiva; 8º) eliminação das
injustiças sociais no campo; 9º) o povoamento da zona rural, de maneira ordenada; 10º)
combate ao minifúndio; 11º) combate ao latifúndio; 12º) combate a qualquer tipo de
propriedade rural ociosa; 13º) combate à exploração predatória ou incorreta da terra; 14º)
combate aos mercenários da terra”.

Na realidade, o emérito professor não comentada cada qual, apenas citava-os. De forma
mais simples, Oswaldo Opitz e Sílvia C. B. Opitz apresentaram exemplos de princípios de
Direito agrário, dentre os quais citaram:

“a) Princípio da justiça social; b) princípio do aumento da produtividade; c) princípio da


função social da propriedade.” (OPITZ & OPITZ, 1970, pág.57).

Abordando os dois primeiros princípios estes autores, compreendem que a justiça social e
o aumento da produtividade precisam ser enxergados sob o enfoque da desapropriação,
defendendo o raciocínio de que este é o principal instrumento para lhe propiciar
efetividade. Vejamos:

“A desapropriação afeta sobremodo o direito agrário, não somente por necessidade ou


utilidade pública, mas principalmente quando é por interesse social, para que possa realizar
sua função social, preconizada no Estatuto da Terra. [...] é por ela que se visa promover
melhor a distribuição da terra improdutiva, mediante modificações no regime de sua posse
e uso, a fim de atender aos princípios da justiça social e do aumento da produtividade”
(arts. 1º, § 1º, e 18 do Estatuto da Terra).

Já em relação ao terceiro princípio enfatizado, percebemos que sua compreensão sobre o


assunto transmite-se o pensamento de que não é possível confundir função social da
propriedade com a ideia de socialização das terras rurais. Vejamos:

“Mantém o direito subjetivo da propriedade, embora em caráter relativo. O princípio da


função social da propriedade não é o caminho aberto, como vimos, para a socialização das
terras rurais, por parte do Estado, porque há necessidade de justificativa da venda forçada,
sempre mediante a indenização devida, como preço dela, embora este se concretize em
dinheiro e títulos públicos. É a forma legal encontrada, pela Lei Maior, para realizar a
reforma agrária, sem ferir o princípio do artigo 153, em seu parágrafo segundo.” (OPITZ &
OPITZ, 1970, pág. 60).

O direito brasileiro assegura o direito à propriedade, porém de forma abrandada. Com isto,
apresentamos a visão dos autores sulistas acima identificados. Neles, a função social da
propriedade surge apenas na ficção. Acreditam os diletos autores que a terra em si nada
vale, até porque precisa do trabalho do ser humano e do dinheiro para manejo e produção
de riquezas. Assim, as regras de Direito agrário podem afetar a propriedade rural, mas não
afetarão sua essência ou substância. Para eles, o que ocorre é apenas uma amplitude do
conceito econômico de propriedade.
Assim, defendem a tese de que trata-se de uma questão econômica e jurídica, isto é, o
Direito freia a economia com o propósito de permitir o desempenho social na propriedade,
gerando bem estar para trabalhadores, propriedade, meio ambiente, enfim, assegurando um
equilíbrio plausível nestas relações.

Outro festejado doutrinador que teceu estudos sobre a função social da propriedade, como
princípio elementar do Direito agrário foi Raymundo Laranjeira. Em suas pesquisas e
trabalhos publicados este doutrinador agrarista expunha seu pensamento da seguinte forma:

“É dele que se abrem todas as implicações socioeconômicas que cimentam o ordenamento


jurídico agrário.” (LARANJEIRA, 1975, pág. 116).

O mesmo doutrinador defendia que a noção de função social na terra foi sendo
desenvolvida a partir dos debates originários sobre o instituto da posse, dos escritos de
Frederic Savigny e Rudolf Von Ihering. Raymundo Laranjeira argumentava que neste
debate se compõem a gênese do conceito de função social da terra, quais sejam, a
produtividade e a justiça distributiva.

Ele esclarecia que na teoria subjetiva, abria-se o campo da realidade social, mesmo
estreitada pelo pensamento do animus domini. Considera legítimo o interesse na posse sem
a dependência de um titulo formal, e daí se antevêem, pela proteção que lhe deveria
corresponder.

Já na teoria objetiva, em Ihering, evidenciava-se o direito absoluto do ser humano sobre a


coisa, com o alicerce no conceito de propriedade, justificando o apossamento pelo uso
econômico efetivo.

O desenvolvimento da idéia de função social também foi cunhado em Karl Marx e outros
pensadores europeus, que proclamavam a necessidade do afastamento do caráter privado
na propriedade, sem nenhuma produção social.

Outro doutrinador que aprofundou estudos sobre os princípios do Direito agrário foi
Vicente Gonçalves de Araújo Júnior. Em sua obra vemos os princípios que ele enfatizou:

“1º) função social da propriedade; 2º) progresso econômico do rurícola; 3º) progresso
social do rurícola; 4º) fortalecimento da economia nacional, pelo aumento da
produtividade; 5º) fortalecimento do espírito comunitário, mormente de família; 6º)
desenvolvimento do sentimento de liberdade (pela propriedade) e de igualdade (pela oferta
de oportunidades concretas); 7º) implantação da Justiça distributiva; 8º) eliminação das
injustiças sociais no campo; 9º) povoamento da zona rural, de maneira ordenada; 10º)
combate ao minifúndio 11º) combate ao latifúndio 12º) combate a qualquer tipo de
propriedade rural ociosa, sendo aproveitável e cultivável; 13º) combate à exploração
predatória ou incorreta da terra.” (JÚNIOR, 2002)

Desse modo, vemos também uma apresentação enfática dos princípios de Direito agrário,
pelo autor, dando reforço a autonomia deste ramo jurídico. Também não poderia ser
esquecida a visão do ilustre professor da faculdade de Direito da UFG, Benedito Ferreira
Marques constrói os seguintes princípios em sua obra:
“1º) o monopólio legislativo da União, conforme o artigo 22, inciso I da atual Constituição
Federal; 2º) a utilização da terra se sobrepõe à titulação dominial; 3º) a propriedade da terra
é garantida, mas condicionada ao cumprimento da função social; 4º) o Direito agrário é
dicotômico: compreende política de reforma (Reforma Agrária) e política de
desenvolvimento (Política Agrícola); 5º) as normas jurídicas primam pela prevalência do
interesse público sobre o individual; 6º) a reformulação da estrutura fundiária é uma
necessidade constante; 7º) o fortalecimento do espírito comunitário, através de
cooperativas e associações; 8º) o combate ao latifúndio, ao minifúndio, ao êxodo rural, à
exploração predatória e aos mercenários da terra; 9º) a privatização dos imóveis rurais
públicos; 10º) a proteção à propriedade familiar, à pequena e à média propriedade; 11º) o
fortalecimento da empresa agrária; 12º) a proteção da propriedade consorcial indígena;
13º) o dimensionamento eficaz das áreas exploráveis; 14º) a proteção do trabalhador rural;
15º) a conservação e preservação dos recursos naturais e a proteção do meio-ambiente.”
(MARQUES 2010, pág. 22)

Jônathas Silva, outro brilhante professor da faculdade de Direito da UFG, em sua obra
apresenta sua reflexão enaltecendo os princípios agrários, vejamos:

“A autonomia legislativa, científica e didática do Direito agrário tem, sem dúvida, como
um de seus pressupostos fundamentais, a existência de princípios próprios desse ramo do
Direito. Entre tais princípios, apontados pelos jus-agraristas, podem ser enumerados o da
preservação dos recursos naturais renováveis, o do aumento da produção, o do bem-estar e
condições de progresso social e econômico àqueles que exercem a atividade agrária, o da
justiça social e o da função social da propriedade. Com efeito, esses e outros princípios,
bem como a autonomia, levam o Direito Agrário e o Direito Constitucional a firmar uma
parceria científica de natureza interdisciplinar. NO caso da função social da propriedade,
essa interdisciplinaridade é também estabelecida com outras ciências sociais afins aos dois
ramos do Direito.” (SILVA, 1996, pág. 35).

Destacamos ainda um dos mais eminentes doutrinadores agraristas da Espanha. Juan Jose
Sanz Jarque comunga da idéia de que os princípios de Direito agrário são fundamentais
para valorizar a autonomia deste ramo jurídico. Para ele, o aprofundamento no
conhecimento dos princípios agrários transcende ao acadêmico e o científico, pois
encontramos debates em assembléia sindicais, congressos e outros encontros.

Em sua obra, JARQUE (1985, pág. 57) o ilustre mestre espanhol indica como princípios do
Direito agrário:

“En nuestro pensamiento, La enumeración que podemos hacer de los principios que
caraterizan el Derecho Agrario es la siguiente: 1) Carácter continuadamente renovador y
finalista de La normativa agraria; 2) La funcionalidad de La propriedad y tenencia de lat
tierra como objetivo em los múltiplos fines de ésta; 3) Professionalización de La actividad
agrária; 4) Organización empresaria de la agricultura, libre y racionalmente organizada,
sobre el más amplio âmbito de las actividades agrarias y de la materia agraria; 5) Acción
coordenada de La actividad y legislación agraria com la ordenación del território; 6)
Creación de la normativa y de las intituciones agrárias sobre la realidad sociológica de
cada comunidad; 7) Universalidad y universalización de los mismos”. (JARQUE, 1985,
pág.57)
Desta forma, Juan Jose Sanz Jarque apresenta princípios bem distintos, enaltecendo o
Direito agrário como ramo autônomo do conhecimento jurídico. E para continuar a
enaltecer o Direito agrário, esclarecemos que o primeiro princípio enumerado pelo
doutrinador espanhol compreende que o estudo da normativa agrária deflui do caráter
continuadamente renovador deste ramo jurídico, em três sentidos, o primeiro para que a
terra continue servindo às necessidades dos agricultores, os proprietários da terra, do
agronegócio, do mercado; e segundo, para que a propriedade agrária satisfaça de forma
plausível e saudável as relações jurídicas dos trabalhadores rurais e os proprietários e
terceiro para o equilíbrio ecológico.

O segundo princípio, Jarque sustenta uma visão mais ampla do que apenas a visão social.
Para ele estão inseridas neste princípio funções inerentes à propriedade da terra e da
empresa agrária, a saber, produção agrícola, a estabilidade e desenvolvimento harmônico
dos serviços. Ele procura também, relacionar este princípio com a reforma agrária,
reconhecendo ser ambicioso tal proposta.

O terceiro princípio amplia a compreensão da profissionalização do agricultor. Este


trabalhador não pode mais ser considerado como somente aquela pessoa que trabalha e
reside no campo. Para Jarque, a pessoa que incorpora no seu exercício profissional uma
empresa agrária. Embora todo o respeito deva oferecido ao ínclito doutrinador, pensamos
que o ser humano que trabalha a atividade agrária, poderá desenvolvê-la quer seja no roça
ou na zona urbana, bastando que a finalidade agrária seja comprovada.

O quarto princípio exposto por Juan Jarque apresenta a organização empresarial na


agricultura. Segundo o doutrinador, o planejamento empresarial no campo, permite uma
produtividade melhor, gerando renda muito mais satisfatória.

Neste intuito, Jarque faz uma afirmação estrondosa que nos leva a pensar se realmente
estamos caminhando para isto. O doutrinador espanhol argumenta que a organização
empresarial é o caminho para a produção agrícola e que a produção agrícola familiar está
fadada à extinção. Na teoria de Juan Jarque a produção em pequena escala, isto é, através
do agricultor familiar esta é fase de extinção, ainda que de forma incipiente, mas está em
fase de extinção.

O quinto princípio traduz a ordenação do imóvel rural, objetivando a utilização da terra de


acordo com a sua vocação e características. Aqui, o aproveitamento racional dos recursos
naturais encontra guarida, pois nele percebemos que determinadas culturas devem ser
plantadas em solos propícios, adequados não ensejando a degradação do terreno e outros
problemas.

O sexto princípio traduz os fracassos dos projetos legislativos que abrangem o tema Direito
agrário. Segundo Jarque deveria existir uma coerência ou uma participação maior das
pessoas afetadas diretamente e das comunidades políticas em que cada grupo dele se
integra. A omissão das pessoas que irão absorver diretamente os efeitos da lei, gera um
desastre social, econômico, ambiental e jurídico bastante desagradável.

Por último, o sétimo princípio exposto pelo espanhol entende que as características do
Direito agrário podem ser compreendidas como comuns às demais legislações dos outros
países. Podem ser considerados fenômenos universais do conhecimento jurídico agrário e
da importância deste ramo jurídico.

A contribuição jurídica trazida por Juan Jose Sanz Jarque é notória e merece destaque neste
texto, vez que nela conseguimos aperfeiçoar o nosso estudo, abordando seu pensamento
diferente. Outrossim, ultrapassando os exemplos dos princípios gerais de Direito agrário
conforme acima transcritos, abordaremos com ênfase três princípios agrários, de modo a
criar um enlace com a problemática trabalhada neste texto.

3. A FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE

No campo do Direito agrário temos uma inúmera relação de princípios jurídicos


estritamente específicos que influenciam na confecção dos contratos agrários. O assunto é
tão envolvente que nos absorve de tal forma, que mesmo tendo tecido o texto acima, ainda
precisamos incorporar a esta dissertação detalhes sobre alguns princípios em especial.

São nestes princípios que visualizamos uma diferença entre os contratos agrários descritos
no Estatuto da Terra e nos contratos atípicos formulados no embasamento do Direito Civil,
com princípios peculiares do ramo civilista. São situações diferentes, que fazem nascer
problemáticas que são discutidas no decorrer deste texto.

Outra observação que se faz necessária é aquela inerente à origem histórica da função
social. Em León Duguit, ínclito estudioso francês, abordou-se a função social inserindo-a
no mundo jurídico, a partir do século XIX. Podemos considerá-lo um teórico de escol no
que tange à doutrina sociológica do Direito e do Estado, sofrendo influência significativa
de Augusto Comte e Émile Durkheim.

É bom registrar, que no pensamento de Duguit, existia um questionamento acerca da


concepção da propriedade prevista no Código Civil de Napoleão. No texto do Código, o
direito de gozar e dispor da propriedade era absoluto. Mas em Duguit isto não era
absorvido plenamente. Ele pregava a inexistência de direitos subjetivos, propondo a ruína
do individualismo impregnado no sistema civilista francês. Isto, sem sombra de dúvidas
influenciou o legislador brasileiro ao registrado no texto lei nacional a função social.

Já na visão constitucional brasileira, Uadi Lâmmegos Bulos diz que o direito à propriedade
não se reveste de caráter absoluto. Vejamos:

“Trata-se, pois, de um direito nodular à fisiologia do Estado e, conseqüentemente, de toda


a base jurídica da sociedade. Daí seu status constitucional, porque ele não é mero direito
individual, de natureza privada, e sim uma instituição jurídica que encontra amparo num
complexo de normas constitucionais relativas à propriedade. [...] seu objetivo é otimizar o
uso da propriedade, de sorte que não possa ser utilizada em detrimento do progresso e da
satisfação da comunidade.” (BULOS.2011, pág. 336)

No cenário agrarista brasileiro, o princípio da função social da propriedade é registrado por


Benedito Ferreira Marques, citado na obra de Umberto M. De Oliveira:

“É o centro em torno do qual gravita toda a doutrina do Direito agrário”. (apud


OLIVEIRA.2010 pág.162).
Jônathas Silva outro mestre da faculdade de Direito da UFG, diz que:

“Impõe-se uma indagação: seria mais próprio falar-se de uma função social da propriedade
ou da terra? Existe entre estas duas expressões uma variação de significado, como se viu
existir entre rural e agrário, ou são expressões que se equivalem? Alguns doutrinadores
referem-se à função social da terra, porém a grande maioria prefere falar na função social
da propriedade. A lei n.º 4.504, de 30 de novembro de 1964, denominada Estatuto da
Terra, registra: “a propriedade da terra, condicionada pela sua função social”, conforme a
dicção do art. 2º, reiterada pelo § 1º, assim averbada: “a propriedade da terra desempenha
integralmente a sua função social...” (SILVA, 1996).

A problemática perquirida por Jônathas Silva ainda permanece. Seria viável continuar
falando em função social da propriedade, conforme encontra-se inserido no texto
constitucional vigente, ou seria melhor e mais moderno, numa visão neo-agrária, falarmos
em função social da terra?

Pensamos, particularmente, que a expressão constitucional não está equivocada. O


legislador constituinte de 1988 ultrapassou as fronteiras que engessavam o sistema jurídico
nacional daquela época. Até hoje colhemos bons frutos desta constituição vanguardista.

Ousamos expor que acreditamos na função social da terra inserida ou casada na função
social da propriedade rural. É nela que se pode desenvolver uma atividade agrária
sustentável e ao mesmo tempo necessária para a produção de alimentos, respeito ao meio
ambiente ecologicamente equilibrado e ao bem estar entre os trabalhadores da terra.

Portanto, fica notório que este princípio pode ser considerado com um dos princípios mais
importantes do Direito agrário, fazendo gravitar em torno de sua órbita outros princípios
elementares do mundo jus-agrarista. É oportuno registrar o pensamento de Miguel Reale
acerca dos princípios e sua importância:

“Uma enunciação normativa de valor genérico, que condiciona ou orienta a compreensão


do ordenamento jurídico, quer para a sua aplicação e integração, quer para a elaboração de
novas normas. [...], desse modo, tanto o campo da pesquisa pura do Direito quanto o de sua
atualização prática.” (REALE, 1976, pág.300).

Seu pensamento novamente reforça a argumentação que está sendo lavrada nesta
dissertação, enaltecendo a problemática lançada desde o início. O posicionamento de Reale
é reforçado no pensamento de um jurista uruguaio Afonso Gelse Bidart:

“Tanto na eleição do princípio [...] quanto nas modalidades que assume, a ciência jurídica
tem um amplo campo de desenvolvimento que significa, igualmente, uma possibilidade de
elaboração das normas positivas do futuro. Aqui o homem da ciência enfrenta o problema
de interpretar e sistematizar o ordenamento jurídico com o qual trabalha e elaborar a partir
do mesmo, orientações diferentes para encarar esse setor do Direito e sua futura possível
renovação.” (BIDART, 1983, pág. 05 e 06)

Com esta posição teórica, Bidart reforça a idéia de que não se pode colocar em xeque-mate
a função social da propriedade. Ela é núcleo importante da temática agrária e enaltece a
posição de direito público que o Direito agrário precisa manter, principalmente na
formulação de seus próprios contratos, quer sejam típicos, isto é, aqueles definidos no
Estatuto da Terra, ou então outros tipos de contratos, que embora não estejam na legislação
agrária especial, mas que também possuam finalidade agrária.

Reforçamos o pensamento, dizendo que não se colocar de lado a importância deste


princípio e para abrilhantar ainda mais a exposição neste trecho, ainda citamos novamente
o pensamento de Jônathas Silva, que sua magnífica obra dizia:

“Não se pode pôr em dúvida que a função social da propriedade se inclui entre os
princípios gerais do Direito agrário. A identificação e o estudo desses princípios conferem
a esse ainda novo ramo do Direito dignidade científica, isenta de obstáculos
epistemológicos, pelo reconhecimento de objeto e métodos próprios do Direito Agrário.”
(SILVA, 1996, pág. 37).

Retornando ao cenário brasileiro e fazendo um enlace do pensamento de Bidart com o


constitucionalismo nacional, invocamos o magistério de José Afonso da Silva acerca da
natureza pública da função social da propriedade. Nele temos:

“Os juristas brasileiros, privatistas e publicistas concebem o regime jurídico da propriedade


privada como subordinado ao Direito Civil, considerado direito real fundamental. [...] essa
é uma perspectiva dominada pela atmosfera civilista, que não levou em conta as profundas
transformações impostas às relações de propriedade privada, sujeita hoje, à estreita
disciplina do Direito Público, que tem sua sede fundamental nas normas constitucionais.”
(SILVA, 1992 pág. 246)

Em outra passagem, o mesmo autor constitucionalista, insere o princípio da função social


da propriedade na seara da ordem econômica. Isto enaltece o princípio colocando-o como
ponto de destaque e como elemento construtor e transformador social.

Afastar a idéia individualista impregnada no proprietário rural e transformá-la em idéia


social, onde a terra é capaz de gerar renda, alimentos e bem estar é o resultado que este
princípio pode produzir. Afonso da Silva ainda dizia que:

“Já destacamos antes a importância desse fato, porque então embora também prevista entre
os direitos individuais, ela não mais poderá ser considerada puro direito individual,
relativizando-se seu conceito e significado, especialmente porque os princípios da ordem
econômica são preordenados à vista da realização de seu fim: assegurar a todos existência
digna, conforme os ditames da justiça social.” (SILVA, 1992 pág. 690).

Assim, a contribuição deste princípio é afastar o individualista tão marcante nestes séculos
de latifúndio no Brasil e provocar a mudança de comportamento e pensamento acerca da
propriedade rural, permitindo gerar um novo conceito de propriedade agrária. Numa visão
neo-agrarista, a propriedade não pode mais ser enxergada como objetivo absoluto e
individualista. A propriedade precisa ser vista com algo social, produtivo, equilibrado e
altamente sustentável.

4. A JUSTIÇA SOCIAL NO MEIO RURAL


A efetividade do princípio da função social no cenário brasileiro ainda permite construir
outro princípio extremamente importante em razão da dimensão social, na riqueza formada
pelos bens originários da terra.

Este outro princípio chamamos de justiça social e pode integrar uma idéia bastante
interessante formulada por Darcy Walmor Zibetti, em sua obra Teoria tridimensional da
função social da terra no espaço rural. Vejamos:

“A dimensão social, na riqueza formada pelos bens originados e propiciados pela terra que
transcendem o aspecto pessoal, individual e particular para abranger o social, o coletivo e
as necessidades de toda a população universal, mais a dimensão ecológica, que são as leis
da natureza, em constante descoberta, obedecidas e aplicadas asseguram a vida e
sobrevivência planetária, vegetal, animal e do homem que a integra.” (ZIBETTI. 2005,
pág. 17).

Esta visão tridimensional no Direito agrário propicia uma reflexão sobre o que significa
satisfação, bem estar e até mesmo uma proteção do homem no campo, diante de algumas
investidas agressivas do agronegócio.

Gostaríamos de pedir venia para registrar que não concentramos esforços no sentido de
criticar e denegrir a imagem do agronegócio nacional, até porque temos consciência de que
o agronegócio movimenta a balança comercial brasileira num sentido favorável.

Outrossim, o que realmente procuramos oferecer na trajetória desta dissertação é uma


reflexão no sentido de se encontrar um equilíbrio entre o que se deseja no mercado
consumidor, com a produção agrícola, pecuária e outras e ao mesmo tempo, o que se pode
enxergar de correto na dignidade humana na entabulação e efetivação dos contratos
agrários.

Acreditamos que os contratos agrários favorecem o manejo da terra alcançando


produtividade e renda. Neste intuito, os contratos agrários constituem, em nossa visão,
podem constituir mecanismos indiretos de intervenção do Estado brasileiro e do Direito
público, na busca pela função social na propriedade e consequentemente na justiça social
no meio rural. Os contratos agrários, quer sejam de arrendamento ou de parceria ou então
atípicos, como os de comodato, pastoreio ou invernagem podem criar condições favoráveis
de plantio, colheita e renda para suas partes.

Nossa problemática absorve a idéia da aplicação dos princípios agraristas nos contratos
agrários atípicos, mas com tamanha exclusividade que possam afastar e prejudicar a
aplicação dos princípios contratuais cíveis. Isto seria possível? A visão neo-agrária
resolveria tal problema? Estas indagações ainda permanecem e provocam o estudioso do
assunto e até mesmo ou o simples leitor deste texto a dar continuidade na leitura visando
alcançar uma resposta coerente nesta dissertação.

5. A PREVALÊNCIA DO INTERESSE PÚBLICO.

Ao discorrer sobre este princípio trazemos à baila uma problemática interessante aplicada
aos contratos agrários. O legislador brasileiro ao confeccionar o Estatuto da Terra e demais
regulamentos, marcou o texto legal com uma boa dose de caráter protetivo e publicístico,
ressaltando em diversos aspectos tais situações. A título de exemplo citamos os prazos
mínimos, as cláusulas obrigatórias, as redações legais, o direito de preferência, o
informalismo contratual e outros pontos.

Analisando o Estatuto da Terra, no artigo 92 e seguintes, bem como no Decreto 56.566


enxergamos um informalismo contratual. Admite-se o nascimento do contrato agrário até
mesmo na maneira verbalizada. Até aí, tudo bem, até porque geralmente, o homem do
campo ou a mulher do campo são pessoas afastadas das letras escolares, quanto mais das
letras jurídicas, não tendo condições de elaborar um contrato com todo o teor e formação
exigidas. Em razão disto, percebemos que existe um certo sentido protetivo das pessoas
envolvidas no negócio agrário.

Além do informalismo também está presente o prazo mínimo. Isto é uma problemática
interessante. Os prazos mínimos estão previstos para os contratos de arrendamento rural e
de parceria rural descritos no Estatuto da Terra. Ocorre que no meio rural, outros contratos
podem nascer. Não há como impedir. A livre iniciativa prevista na CF/88 e ainda, o ideal
de justiça social e função social na propriedade alimentam o manejo da terra e são
extremamente essenciais para a produção de renda e alimentos.

A sobrevivência do homem e da mulher do campo depende destas novas fórmulas


contratuais. Ocorre que o Estatuto da Terra surgiu na década de 1960 e não conseguiu
acompanhar as modernizações e atualizações da tecnologia agrária ou até mesmo das
necessidades modernas no ser humano que trabalha a terra.

Além dos arrendamentos e das parcerias, vemos nos dias atuais, contratos de comodato
rural. No campo não há impedimento para tal contrato. Porém, o dirigismo contratual
existente nos contratos típicos e ainda a determinação do Estatuto da Terra ao dizer que os
princípios agrários devem obrigatoriamente estar inseridos nas negociações, sob pena de
nulidade contratual ou de cláusulas contratuais gera polêmica na doutrina.

É um problema a ser solucionado. Como já mencionado a Lei n.º 4.504/65 e o seu Decreto
regulamentador fazem menção de apenas dois tipos contratuais: o arrendamento e a
parceria rural. Estes são os denominados contratos agrários típicos definidos nas referidas
leis, mencionando apenas de forma genérica a existência de outros contratos, na redação do
artigo 39 (trinta e nove) do Decreto.

Mas com o avanço das práticas rurais, o dirigismo contratual presente no Estatuto da Terra
e no seu regulamento começou a ser enfrentado, pois se tornaram estranhos e até mesmo
insuficientes para regular as complexas relações sociais modernas e os diversos novos
contratos agrários que decorrem destas relações. Isto trouxe à tona nossa problemática.

Um exemplo pedagógico de como princípio agrário do interesse público é enfrentado nos


novos contratos agrários pode ser enxergado no contrato de pastoreio ou de invernagem.
Neste tipo de contrato agrário, que não está descrito no Estatuto da Terra, o proprietário da
terra recebe animais para engorda, em troca de um pagamento mensal. É utilizado
normalmente nos períodos entre safras e tem como característica sua exígua duração, não
ultrapassando o período de 01 (um) ano. Deste modo, como poderá ser aplicado o prazo
mínimo de 03 (três), 05 (cinco) ou 07 (sete) anos, obrigatórios nos contratos agrários?
A lei exige o respeito aos prazos mínimos, como regra protetiva, enaltecendo o caráter
publicístico do Direito agrário, no sentido de deixar bastante claro que o interesse público
prevalece sobre o interesse particular. Porém, como fica a solução deste problema?

Uma visão neo-agrária nos contratos agrários permitiria ampliar a reflexão, trazendo à
baila a dignidade humana, como nos ensina Rizzatto Nunes ao dizer que “é ela, a
dignidade, o primeiro fundamento de todo o sistema constitucional posto e o último
arcabouço da guarida dos direitos individuais” (NUNES, 2010, pág.59). Continuaremos a
abordar este assunto, nos tópicos seguintes. Vemos, portanto, que o caráter publicístico
presente nos contratos agrários tem origem no princípio da supremacia do interesse público
em detrimento do particular. São necessárias cláusulas obrigatórias que limitam a liberdade
contratual, dando proteção à parte hipossuficiente na relação contratual. O problema na
atualidade é descobrir quem será o mais frágil na relação contratual?

O princípio que agora comentamos forma uma teia de proteção que elide a exploração das
partes, diminuindo a autonomia da vontade, promovendo a ingerência do Estado brasileiro,
para construir a função social no meio rural, evitando mazelas e deslindes desagradáveis
que prejudicarão a produção de alimentos para a sobrevivência humana.

Enfim, temos princípios que expõem claramente o caráter publicístico do Direito agrário
nos contratos agrários, dando a tonalidade protetiva afastando o caráter privado oriundo do
Direito civil aplicável nos contratos em geral.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Concluindo nossa exposição, compreendemos que o Direito agrário pode ser considerado
um novo ramo do direito, com conceito e técnica própria, visando apresentar um conjunto
de normas jurídicas agrárias que disciplinam as relações do ser humano com a terra,
almejando o progresso social, econômico da comunidade.

No campo do Direito agrário foi construído uma sólida estrutura doutrinária e


principiológica, que se diferenciam dos princípios gerais do direito. Mas inicialmente,
precisamos compreender o que significa o vocábulo “princípio”. Segundo os doutrinadores
anteriormente expostos, a palavra é derivada do latim dando sentido comum ao início da
vida, ou então, aquilo que provém como primeiro instante da existência. É, assim, numa
acepção aberta, indicativo de origem, começo de alguma coisa.

E dentre os diversos princípios citamos o princípio da função social da propriedade; o


progresso econômico do rurícola; o progresso social do rurícola; o fortalecimento da
economia nacional, pelo aumento da produtividade; o fortalecimento do espírito
comunitário, mormente de família; o desenvolvimento do sentimento de liberdade (pela
propriedade) e de igualdade (pela oferta de oportunidades concretas); a implantação da
Justiça distributiva; a eliminação das injustiças sociais no campo; o povoamento da zona
rural, de maneira ordenada; o combate ao minifúndio; o combate ao latifúndio; o combate
a qualquer tipo de propriedade rural ociosa, sendo aproveitável e cultivável e o combate à
exploração predatória ou incorreta da terra.

Entretanto, dentre todos os princípios acima citados enfatizamos o princípio da função


social da propriedade. Nele está refletido todo o propósito do ordenamento jurídico agrário
para com a propriedade rural brasileira, afastando a idéia individualista impregnada no
proprietário rural e transformando-o naquela pessoa que absorve a idéia de que terra é
capaz de gerar renda, alimentos e toda a espécie de bem estar, não somente para o seu
proprietário, como também para outras pessoas.

Enfim, a efetividade do princípio da função social no cenário brasileiro permite construir


uma dimensão social mais larga, onde a riqueza formada pelos bens originários da terra
pode ser usufruída por todos, como interesse comum.

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