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PERIFERIA FLUMINENSE
MARCOS THIMOTEO DOMINGUEZ*
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Escola Nacional de Saúde Pública/Fiocruz, Sociólogo e Mestre em Saúde Pública;
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O Arco Metropolitano, via de extensão regional; o Comperj, complexo petroquímico em Itaborai; o
Porto de Sepetiba, em Itaguaí; porto e minérioduto do grupo X em Macaé, entre outros. Ao todo,
representam investimentos acima de 100 bilhões de reais (Firjan, 2012).
inúmeros projetos de cidade convivem concomitantemente, produzindo conflitos,
vulnerabilidades e expressões de solidariedade (Porto, 2005, 2007).
Perceberemos que no espaço das cidades “os tempos” diversos se cruzam, pois,
somente no urbano há esta capacidade de absorção de fluxos, de intensidades e
movimentos variados. Na periferia metropolitana é possível ver que os sujeitos se
“encontram” e experimentam seu tempo na cidade, conseguem, mesmo que
precariamente ou parcialmente, reinventar seu tempo histórico frente a predominância
hegemônica da temporalidade e conhecimento linear, pautados pela curva de
crescimento econômico necessária ao capital e ao modelo de desenvolvimento hoje em
curso. A proposta deste artigo passa sobre as estas questões, apresentando uma
experiência de metodologia desenvolvida em conjunto com grupos populares de uma
periferia da periferia, construída no bairro de Jardim Catarina, antigo loteamento
urbano do município de São Gonçalo, que ainda vive à margem da cidade do Rio de
Janeiro.
Caminhos Metodológicos
A fim de discutir as questões aqui provocadas, optamos por um caminho que deu
acesso aos modos de produção e reprodução coletiva da vida nas periferias da região
metropolitana do Rio de Janeiro. Buscou-se dialogar com moradores envolvidos em
organizações ou ações comunitárias, concebidos aqui como atores chaves (Becker,
1994). Compreende-se neste estudo que tais agentes possuem um horizonte particular
de experiência e percepção dos problemas de saúde e ambiente do território. Tais como
os trabalhadores sociais aos quais se refere Bourdieu, eles:
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O Rio Guaxindiba, assim como o Rio Alcântara, são alguns dos principais rios de drenagem de esgoto
São Gonçalo. Ambos cortam as extremidades do Jardim Cataira e se unem no manguezal da APA de
Guapimirim antes de desaguar na Baía de Guanabara.
se tornaram territórios vulneráveis e precários em termos de condições matérias de vida
(Ascerald, 2008; Porto, 2007).
Veremos que as intervenções públicas de urbanização (ou a falta delas) foram
ocasionando mudanças dramáticas nos cenários das cidades em curto espaço de tempo.
Em poucos anos, territórios foram surgindo e se extinguindo simultaneamente. Áreas
homogêneas e agrárias, dispersas até então na RMRJ, foram se transformando em
extremamente heterogêneas e fragmentadas. Articuladas com grupos locais -
primeiramente com as imobiliárias loteadoras e, posteriormente, com lideranças e
grupos de poder -, as políticas públicas contribuíram para o desenvolvimento de novas
territorialidades e conflitos entre a cidade e os lugares do Jardim Catarina.
O processo de produção do espaço social no âmbito das cidades ganhou um fator
central, a “naturalização das desigualdades” (Ribeiro, 1999). Ou seja, de um lado áreas
de elevada concentração e acumulação de capital, de promoção de direitos e, periferias,
com serviços públicos escassos, responsáveis pela mínima condição material para a
reprodução social das camadas populares.
A cidade de São Gonçalo passa então, a ser dividida por territórios distintos,
onde os loteamentos apresentarão micro-áreas (Alvito, 2001) diferenciadas,
“microcosmos onde regem normas e relações sociais particulares, atravessando o
conceito de cidadania amplo, característico de cidades de regimes democráticos”
(Burgos, 2005). Instituições locais estabelecerão interações particularizadas com
instituições supra-locais. Ou seja, haverá uma “transcendência” do território de
periferia, saindo do aspecto espacial, chegando às dimensões culturais e psicológicas,
com uma subjetividade por parte do morador, carente de referências da cidade cidadã
(Burgos, 2005).
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