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Superior Tribunal de Justiça

RECURSO ESPECIAL Nº 685.929 - RJ (2004/0117969-5)

RELATOR : MINISTRO HONILDO AMARAL DE MELLO CASTRO


(DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/AP)
RECORRENTE : COMPANHIA SIDERÚRGICA NACIONAL - CSN
ADVOGADO : CARLOS EDUARDO ABREU MARTINS E OUTRO(S)
RECORRIDO : PAULO CÉSAR DIAS
ADVOGADO : FUEDE NAMEN CURY

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO HONILDO AMARAL DE MELLO CASTRO


(DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/AP) (Relator):

Trata-se de ação indenizatória ajuizada PAULO CÉSAR


DIAS contra COMPANHIA SIDERÚRGICA NACIONAL - CSN, que busca o
pagamento de indenização por danos morais, materiais e estéticos, em razão
de alegado erro médico, provocado pelo atendimento incorreto no hospital da
Ré, o que teria resultado em paraplegia de seus membros inferiores.

O douto magistrado de primeiro grau julgou improcedentes


os pedidos, fls. 362/365, ao fundamento de que "a doença do autor -
mielopatia súbita sem história de trauma - infelizmente não tem tratamento
conhecido e a evolução do caso seria a mesma, com , sem ou apesar da
assistência médica (fls. 263). A cirurgia não foi a causa das sérias
dificuldades que o autor enfrenta ." (fls. 364 - grifos no original).

Irresignado, Paulo César Dias interpôs recurso de apelação,


que foi parcialmente provido, pela E. Décima Sétima Câmara Cível do
Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, em v. acórdão assim
ementado:

"AÇÃO DE RESPONSABILIDADE CIVIL. (erro médico


e culpa da empregadora improvados). Internação com atraso de
cinco dias e falta de exames mais sofisticados, que evitariam a
indicação cirúrgica inócua. Dano moral mínimo, correspondente a 50
salários mínimos na data da r. sentença. Apelo provido em menor

Documento: 8243815 - RELATÓRIO, EMENTA E VOTO - Site certificado Página 1 de 9


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parte" (fls. 392)

Inconformada, Companhia Siderúrgica Nacional interpôs o


presente Recurso Especial (fls. 426/448), com fulcro no art. 105, inciso III,
alíneas 'a' e 'c', da Constituição Federal, alegando, em suas razões, e em
síntese, violação ao art. 159 do Código Civil de 1.916, por ausência de nexo
de causalidade.

Aduz, ainda, que "admitir-se a indenização com fundamento


em uma 'questão humanitária' ou por 'pena', significaria julgar a causa com
fundamento diverso do que foi pretendido na inicial, o que é vedado pelo art.
128 c/c 460 do CPC. " (fls. 436)

Por fim, pretende a redução do valor fixado a título de


indenização por danos morais, sustentando que o valor mostra-se excessivo.
Colaciona arestos para configuração do dissídio jurisprudencial.

Contrarrazões do autor às fls. 472/476.

A Terceira Vice-Presidência do eg. Tribunal a quo


determinou seguimento ao apelo, conforme decisão às fls. 478/479.

É o breve relatório.

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RECURSO ESPECIAL Nº 685.929 - RJ (2004/0117969-5)

RELATOR : MINISTRO HONILDO AMARAL DE MELLO CASTRO


(DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/AP)
RECORRENTE : COMPANHIA SIDERÚRGICA NACIONAL - CSN
ADVOGADO : CARLOS EDUARDO ABREU MARTINS E OUTRO(S)
RECORRIDO : PAULO CÉSAR DIAS
ADVOGADO : FUEDE NAMEN CURY
EMENTA

CIVIL. INDENIZAÇÃO. DANO MORAL. CIRURGIA


PARA DESCOMPRESSÃO DA MEDULA. PARAPLEGIA DO
AUTOR. NEXO CAUSAL. INEXISTÊNCIA. COMPROVAÇÃO.
VIOLAÇÃO AO ART. 159 DO CC/1916. CONFIGURADA.

1. Não há como se deferir qualquer pretensão


indenizatória sem a comprovação, ao curso da instrução nas
instâncias ordinárias, do nexo de causalidade entre a cirurgia
e a paraplegia do Autor.

2. Viola o art. 159 do CC/1916, a decisão do Tribunal


de origem que entende rompido o nexo de causalidade da
obrigação de indenizar e, mesmo assim, condena a
recorrente ao pagamento de indenização por danos morais
como resposta humanitária mínima.

3. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa


extensão, provido.

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VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO HONILDO AMARAL DE MELLO CASTRO


(DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/AP) (Relator):

Sustenta a ora recorrente violação ao art. 159, do Código


Civil de 1.916, aduzindo, em síntese, que " o acórdão recorrido, apesar de
reconhecer expressamente que não houve erro médico ou sequer nexo
causal entre a cirurgia a que foi submetido o Recorrido e a sua
paraplegia , condenou a Recorrente ao pagamento de 50 (cinqüenta)
salários mínimos de danos morais, sob o argumento de que tal
indenização seria uma 'resposta humanitária mínima' (fls. 394). " (fls. 428
- grifos no original)

Afirma que não pode ser condenada ao pagamento de


indenização por danos morais, por piedade e que, para a configuração do
dano moral, capaz de gerar direito à indenização, é necessário que sejam
demonstrados (i) o nexo de causalidade e (ii) a conduta dolosa ou culposa
daquele que se alega ter praticado o ato.

Requer seja julgado improcedente o pedido.

O eg Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro deu


provimento parcial à apelação do autor, sob os seguintes fundamentos:

"...

A) Examinamos toda a documentação dos autos, assim


como os argumentos do recurso, convencendo-nos do acerto da r. sentença
do prudente e culto prolator, Dr. José Roberto Portugal Compasso.
Imaginamos até uma nova perícia, mas esta não foi requerida e a idoneidade
e coerência e seriedade do laudo oficial a desaconselham.

B) Em verdade, não houve culpa, por erro médico (perita

Documento: 8243815 - RELATÓRIO, EMENTA E VOTO - Site certificado Página 4 de 9


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artis) dado que a compressão da medula e quadro crítico apresentado,
explicara a cirurgia, que não agravara a doença delicada do Autor.

C) O laudo atestou e concluiu:

C.1) O A. apresentou mielopatia súbita, sem história


traumática (fls. 256);

C.2) Admite falhas de cuidados, porque o A. deveria ser


internado em 05.07.89, quando surgiu a doença e não cinco dias após (fls.
257);

C.3) Não houve nexo causal, nem erro médico. A cirurgia


visou 'emergentemente, para amenizar o sofrimento medular' (fls. 258);

C.4) A avaliação de doenças medulares exige MUITOS


EXAMES;

C.5) Tumores de medula, síndrome radicular e de


compressão da medula são um quadro da síndrome mielocompressiva pode
confundi-las com mieliote (fls. 251);

C.6) A cirurgia descompressiva era alternativa médica (fls.


262). Caso de 'diagnósticos diferenciais' confundíveis (fls. 264);

C.7) A ressonância magnética seria vantajosa na época (fls.


270);

C.8) Com a tomografia computatorizada, não mostrando


lesão significativa, TALVEZ NÃO FOSSE REALIZADA A CIRURGIA (fls. 271);

C.9) A patologia do A. não tem tratamento, sendo


ininfluente a cirurgia. Esta não obteve o resultado esperado. (fls. 274)

D) CONCLUSÃO

D.1) Sem razão o A. quanto a erro de diagnóstico e nexo


entre a cirurgia emergencial e sua paraplegia , resta-nos, como resposta
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humanitária mínima, até mesmo pietatis causa, diante da perplexidade e
indefinição científica, quanto à doença do A, entendemos e votamos pela
reforma mínima , da brilhante sentença, apenas, para condenar a Ré (pela não
internação e não submissão do A. a tomografia computadorizada,
incontinente, ao se apresentar o postulando com quadro médico complexo e
enganador), ao pagamento do dano moral mínimo do correspondente a 50
salários mínimos, na data da r. sentença, com juros legais da citação e
correção do ajuizamento, compensadas as sucumbências afastável (sic), ante
o melhor suporte científico-laboratorial." (fls. 393/394) (grifei)

Com razão a recorrida.

À luz do comando normativo inserto no art. 1.060 do Código


Civil de 1916, reproduzido no art. 403 do vigente códex, sobre nexo causal em
matéria de responsabilidade civil – contratual ou extracontratual, objetiva ou
subjetiva – vigora, no direito brasileiro, o princípio da causalidade adequada,
também denominado princípio do dano direto e imediato.

Segundo referido princípio ninguém pode ser


responsabilizado por aquilo a que não tiver dado causa (art. 159 do CC/1916
e art 927 do CC/2002) e somente se considera causa o evento que produziu
direta e concretamente o resultado danoso (art. 1060 do CC/1916 e 403 do
CC/2002).

Destarte, o direito, mesmo em se tratando de


responsabilidade objetiva, rejeita qualquer indenização, se incomprovado o
nexo de causalidade entre o fato alegado e o dano, entendimento esse que se
extrai da valoração jurídica da prova, consoante precedente de lavra do em.
Ministro Luiz Fux, assim ementado:

"PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO.


PREQUESTIONAMENTO IMPLÍCITO. POSSIBILIDADE.
VIOLAÇÃO DOS ARTIGOS 186 E 927 DO CÓDIGO CIVIL
BRASILEIRO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. PLEITO DE
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DANOS MATERIAIS E MORAIS. MORTE EM DECORRÊNCIA DE
AÇÃO POLICIAL. TIRO DISPARADO CONTRA A VÍTIMA.
INVASÃO DE DOMICÍLIO. CABIMENTO DA INDENIZAÇÃO. ONUS
PROBANDI DO ESTADO. CORRETA APLICAÇÃO DO DIREITO
MATERIAL. (...) 3. A situação descrita nos presentes autos não
desafia o óbice da Súmula 07 desta Corte. Isto porque, não se trata
de reexame do contexto fático-probatório dos autos, circunstância
que redundaria na formação de nova convicção acerca dos fatos,
mas sim de valoração dos critérios jurídicos concernentes à
utilização da prova e à formação da convicção, ante a distorcida
aplicação pelo Tribunal de origem de tese consubstanciada na
Responsabilidade Civil do Estado, por danos materiais e morais,
decorrente do falecimento de vítima, ocasionado por errôneo
planejamento de ação policial, que impõe a inversão do onus
probandi. 4. "O conceito de reexame de prova deve ser atrelado ao
de convicção, pois o que não se deseja permitir, quando se fala em
impossibilidade de reexame de prova, é a formação de nova
convicção sobre os fatos. Não se quer, em outras palavras, que os
recursos extraordinário e especial, viabilizem um juízo que resulte
da análise dos fatos a partir das provas. Acontece que esse juízo
não se confunde com aquele que diz respeito à valoração dos
critérios jurídicos respeitantes à utilização da prova e à formação da
convicção. É preciso distinguir reexame de prova de aferição: i) da
licitude da prova; ii) da qualidade da prova necessária para a
validade do ato jurídico ou iii) para o uso de certo procedimento; iv)
do objeto da convicção; v) da convicção suficiente diante da lei
processual e vi) do direito material; vii) do ônus da prova; viii) da
idoneidade das regras de experiência e das presunções; ix) além de
outras questões que antecedem a imediata relação entre o conjunto
das provas e os fatos, por dizerem respeito ao valor abstrato de
cada uma das provas e dos critérios que guiaram os raciocínios
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presuntivo, probatório e decisório". (Luiz Guilherme Marinoni in
"Reexame de prova diante dos recursos especial e extraordinário",
publicado na Revista Genesis - de Direito Processual Civil,
Curitiba-número 35, págs. 128/145) [...]"(REsp 737797 / RJ, Rel.
Ministro LUIZ FUX, DJ 28/08/2006 p. 226). "

Na esteira desse raciocínio, posiciona-se a a doutrina pátria:

“mesmo na responsabilidade objetiva – não será


demais repetir –é indispensável o nexo causal. Esta é a regra
universal, quase absoluta, só excepcionada nos raros casos em que
a responsabilidade é fundada no risco integral, o que não ocorre no
dispositivo em exame. Inexistindo relação de causa e efeito, ocorre
a exoneração da responsabilidade. Indaga-se, então: quando o
empresário poderá afastar seu dever de indenizar pelo fato do
produto ou do serviço? Tal como no Código do Consumidor,a
principal causa de exclusão da responsabilidade do empresário será
a inexistência de defeito. Se o produto ou serviço não tem defeito
não haverá relação de causalidade entre o dano e a atividade
empresarial. O dano terá decorrido de outra causa não imputável ao
fornecedor de serviço ou fabricante do produto. Mas se o defeito
existir, e dele decorrer o dano, não poderá o empresário alegar a
imprevisibilidade, nem a inevitabilidade, para se eximir do dever de
indenizar. Teremos o chama fortuito interno, que não afasta a
responsabilidade do empresário.” (Sérgio Cavalieri Filho, Programa
de Responsabilidade Civil 7ª ed, Ed. Atlas, 2007, p.166/7).

A imputação de responsabilidade civil, portanto, supõe a


presença de dois elementos de fato, quais: a conduta do agente e o resultado
danoso; e de um elemento lógico-normativo, o nexo causal (que é lógico,
porque consiste num elo referencial, numa relação de pertencialidade, entre
os elementos de fato; e é normativo, porque tem contornos e limites impostos

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pelo sistema de direito, segundo o qual a responsabilidade civil só se
estabelece em relação aos efeitos diretos e imediatos causados pela conduta
do agente.

In casu, revela-se inequívoca a ausência de nexo causal


entre o ato praticado pela ora recorrente ( a realização da cirurgia) e o dano
ocorrido (a paraplegia do ora recorrido), razão pela qual, não há de se falar
em responsabilidade daquela pelos danos morais advindos do evento danoso.

Rompido o nexo de causalidade da obrigação de indenizar,


não há falar-se em direito à percepção de indenização por danos morais,
ainda que a condenação seja por questões humanitárias, uma vez que tal
hipótese não está prevista na legislação pertinente.

Ante o exposto, conheço parcialmente do recurso especial


somente no que tange à violação ao art. 159 do Código Civil e, nessa
extensão, dou-lhe provimento para julgar improcedente a ação, mas concedo
ao recorrido, de ofício, a assistência judiciária na forma legal, ficando
prejudicados os demais temas do apelo nobre.

É como voto.

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