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Tema I
Direito das Obrigações: conceito. Fontes das obrigações. Estrutura da relação obrigacional: sujeitos, objeto
e patrimonialidade da prestação, vínculo jurídico e causa. Débito e responsabilidade. Obrigações naturais.
Obrigações reais (propter rem) e figuras afins. Distinção entre obrigações reais, ônus reais e obrigações com
eficácia real.
Notas de Aula1
O direito das obrigações é o mais “matemático” dos ramos do direito civil, pois as
soluções encontradas aqui são bastante próximas do absoluto, menos relativas, mais exatas.
A própria estrutura da teoria geral das obrigações é baseada em normas imperativas,
deixando, o legislador, não muita margem para interpretações. Por exemplo, o devedor de
coisa certa, se não puder cumprir a obrigação em função da perda ou degeneração da coisa,
se teve culpa, responde pelo equivalente, somado a perdas e danos; se não teve, fica isento
de responsabilidade – ou a solução é uma, ou é outra, de forma imperativa. Da mesma
forma, as obrigações alternativas, que na perda de uma coisa se concentra o cumprimento
na outra – e assim por diante.
Esta é a visão clássica do direito das obrigações. No entanto, há duas décadas,
aproximadamente, e no Brasil especialmente depois da vigência do CDC, o direito das
obrigações tem sofrido profunda alteração em seus paradigmas. Tudo aquilo que foi sempre
imperativo e dogmático, na visão clássica, vem sofrendo uma releitura significativa.
Especialmente influenciadas pelo olhar acurado da função social e da boa-fé objetiva, as
obrigações ganharam nuances nunca antes vistas pelo patrimonialismo míope da clássica
visão. Com isso, teorias como o adimplemento substancial, o inadimplemento antecipado,
o adimplemento imperfeito, o venire contra factum proprium, supressio ou surrectio, tu
quoque, duty to mitigate the losses, e o inadimplemento positivo do contrato, passaram a
sugerir soluções diferentes daquela matemática oferecida pela lei, de forma imediata,
relativizando a interpretação estagnada da lei. A obrigação, então, deixou de ser tida por
uma instituição estática, e passou à moderna concepção de obrigação como um processo,
dinamizando-se o conceito.
Façamos, então, um estudo comparativo das fases deste ramo.
Classicamente, a obrigação é o vínculo jurídico que une o credor ao devedor, em
torno de uma prestação de dar, fazer ou não fazer, patrimonialmente apreciável. A primeira
referência a ser feita é que o termo “obrigação” admite várias acepções no direito civil. Este
conceito clássico, acima exposto, conceitua obrigação, em suma, como um vínculo jurídico.
Muitas vezes, porém, assume outro sentido, como quando o legislador classifica-a
como obrigação de dar, de fazer, de não fazer, alternativa, facultativa, de indenizar. Em
todos estes casos, em que o termo é empregado para efeito de classificação, assume sentido
de prestação, associado ao dever jurídico a que corresponde um direito alheio. O próprio
artigo 1º do CC dispõe o termo “deveres”, significando obrigações:
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Aula proferida pelo professor André Roberto de Souza Machado, em 9/10/2008.
Assim, dos sentidos que assume – vínculo jurídico, objeto (prestação) ou dever
jurídico –, o primeiro, de vínculo, é o adotado pela corrente clássica, e é o ora abordado,
como se viu no conceito traçado.
Há quatro fontes geradoras do vínculo jurídico obrigacional: contratos, atos
unilaterais de vontade, atos ilícitos e a própria lei.
A lei, de fato, é a mais controvertida das fontes, pois autores há que crêem que a lei
seria fonte mediata de toda e qualquer obrigação, e não de uma obrigação concreta em
especial. Todavia, a lei como fonte de obrigações, aqui tratada, não se trata da fonte
mediata, que realmente está por trás de toda e qualquer relação jurídica – como suporte
jurídico do contrato, por exemplo –, mas sim da lei como fonte imediata, diretamente
criadora do vínculo. Por exemplo, a obrigação alimentar, em que é a própria lei que impõe
aos parentes tal vínculo, sem demandar nenhum tipo de negócio, ato unilateral ou ato ilícito
para este se formar – a própria lei cria o dever patrimonial de alimentar. No mesmo sentido,
a obrigação tributária.
As declarações unilaterais de vontade, como a promessa de recompensa, a oferta, a
proposta, todas criam ao manifestante unilateral o vínculo jurídico em relação a quem
preencham, eventualmente, o pólo ativo, credor.
O ato ilícito, que aqui se resume ao extracontratual, aquiliano, violação de dever
geral de conduta em não causar dano a outrem – neminem laedere –, cria vínculo
obrigacional com o que padece do resultado, causado pelo dano injustamente causado, a
teor dos artigos 186 e 187, combinados com o artigo 927, do CC:
“Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo,
excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela
boa-fé ou pelos bons costumes.”
“Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica
obrigado a repará-lo.”
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa,
nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida
pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.”
o devedor cooperar, dando, fazendo ou não fazendo o que a ele foi posto como dever, pela
fonte da obrigação. O objeto imediato, então, resume-se a este comportamento esperado do
devedor.
Vejamos um exemplo: um indivíduo é proprietário de uma coisa móvel, certa. A
relação de domínio sobre a coisa é um direito real, de propriedade, e, num primeiro
momento, este direito persiste independentemente de qualquer identificação do sujeito
passivo desta obrigação a que corresponde: o proprietário pode usar, gozar, dispor da sua
coisa certa sem que haja necessidade de intermediação de qualquer pessoa, sem que se exija
nenhum comportamento de ninguém. Contanto que se utilize da coisa regularmente, sem
violar a função social de seu direito, não precisa de qualquer intervenção alheia para que
tenha o benefício pleno de sua propriedade – há poder imediato sobre a coisa.
No passado, chegou-se a imaginar que, por ser assim, a relação de direito real não
teria sujeito passivo algum, ou seja, a relação se estabeleceria entre o titular do direito e a
própria coisa. Rapidamente, porém, se percebeu que coisa não poderia jamais ser sujeito de
relação alguma, e, sendo assim, não poderia haver relação unipessoal. Daí surgiu a
concepção de que o sujeito passivo é toda a coletividade, que se sujeita ao direito real do
titular, possuindo dever de abstenção.
Mas note que, ao contrário da relação obrigacional, na relação real não há
necessidade de manifestação de vontade de quem quer que seja para ocupar o pólo passivo:
o legislador tomou esta providência, manifestando, pelo poder a si conferido no pacto
social, a vontade coletiva em ocupar este pólo passivo universal. E, por assim ser, há a
necessidade de que os direitos reais sejam típicos, taxativos, previstos em lei, pois, do
contrário, se se permitisse a livre criação de direitos reais fora do rol numerus clausus da
lei, quem assim criasse estaria colocando toda a coletividade no pólo passivo de uma
relação, sem que esta coletividade tenha optado por assim fazê-lo (como o fez, no contrato
social, permitindo ao legislador manifestar por todos a sua vontade).
Suponha-se, então, que o titular deste direito real de propriedade pactue com alguém
uma compra e venda desta sua coisa certa móvel. É feita a proposta de venda pelo
policitante, e é dada a aceitação pelo oblato. Este contrato, consensual, se aperfeiçoa desde
quando há a dupla manifestação de vontades, ou seja, desde a aceitação: está surgida, desde
então, a obrigação pessoal, inter partes, de entregar a coisa e haver o pagamento.
Elaborando o exemplo, suponha que haja o pagamento, de imediato, pelo
adquirente, mas acerta-se que a tradição da coisa certa será feita em momento posterior, ou
seja, que a execução do contrato será diferida. Aqui se pode ver situação que ilustra bem a
diferença entre obrigações pessoais e direitos reais: ao aperfeiçoar o contrato de compra e
venda, não se transferiu a propriedade do bem, mas apenas se criou a obrigação, para o
devedor, de realizar este comportamento de entregar o bem. A propriedade só se transferirá,
neste caso, quando houver a tradição. Existe, portanto, a obrigação de dar, pessoal, do
devedor perante o credor, mas não existe, ainda, o direito real deste credor sobre a coisa. O
adquirente não é titular do direito real de propriedade sobre a coisa; é apenas credor, titular
do direito pessoal de crédito contra o devedor, alienante.
Elaborando ainda mais o exemplo, imagine-se que o devedor desta obrigação de dar
coisa certa, em que se estabeleceu momento ulterior para executar-se, já tendo recebido o
preço, revenda o bem a terceiro, pois encontrou melhor preço pela coisa, e entregue o bem
imediatamente a este terceiro, que nada sabia sobre a contratação anterior (estando de boa-
fé, portanto). Aquele credor do primeiro contrato poderá reivindicar esta coisa daquele
terceiro, quando chegar o dies de cumprimento do seu contrato?
A resposta é negativa: o direito deste credor insatisfeito, como dito, é direito de
crédito, exigível exclusivamente inter partes, ou seja, o terceiro, agora proprietário da
coisa, em nada lhe é devedor. A obrigação contratual não cria seqüela para o credor. O pólo
passivo da obrigação contratual é preenchido apenas por aquele alienante que manifestara
sua vontade no contrato, e somente contra ele terá o credor insatisfeito alguma pretensão a
ser observada – que, in casu, gerará exigibilidade de perdas e danos, dada a impossibilidade
de entregar o bem contratado.
Diferente seria se a situação assim se desenhasse: se a alienante, na primeira
contratação, houvesse entregue o bem ao adquirente, e, posteriormente, o tomasse de
empréstimo e alienasse a terceiro inocente, o primeiro adquirente teria concentrado a
propriedade, e, por este direito erga omnes, teria seqüela quanto ao seu bem, podendo
reivindicá-lo do terceiro, mesmo de boa-fé. A venda a non domino não lhe seria oponível,
pois a propriedade, direito real, lhe criou o efeito da seqüela.
Existem, no entanto, algumas figuras que fogem a esta regra de determinação
expressa do sujeito ativo e do sujeito passivo nas obrigações. Há casos em que pode haver
sujeito ativo indeterminado, ou indeterminação do pólo passivo, num primeiro momento.
Veja: há relações jurídicas obrigacionais que nascem com sujeito ativo ou passivo apenas
determinável. São as relações que envolvem obrigações ambulatoriais.
Obrigações ambulatoriais são aquelas em que o credor ou o devedor são alterados
sem que haja qualquer ato de transmissão formal, pois, no seu surgimento, um dos seus
sujeitos ainda não está determinado. Como exemplo, um cheque ao portador: o devedor é
determinado, mas o credor, até a apresentação para pagamento, será indeterminado. É claro
que, na execução da obrigação, na apresentação do título, o credor se determinará, mas até
então, qualquer pessoa que portar o título será credora, pela circularidade absolutamente
informal desta cártula. O crédito é ambulante, havendo ambulatoriedade ativa.
Outro exemplo, em que a obrigação tem ambulatoriedade passiva, ou seja, o
devedor é indeterminado, é a famigerada obrigação propter rem. Obrigações há que são
pessoais, pois não erigidas a direitos reais, mas que guardam alguma ligação com a coisa:
são exigíveis não de quem figurou no momento do nascimento do crédito, mas sim de quem
esteja titularizando o direito sobre a coisa que é fonte geradora da obrigação. Exemplo é o
artigo 1.335 do CC:
Veja que esta regra impõe mobilidade ao débito: este vai ser pessoal, mas
acompanhará a coisa a quem quer que seja entregue sua titularidade. Mudando a
titularidade, automaticamente se altera o devedor, havendo ambulatoriedade passiva. São
propter rem as dívidas condominiais, o IPTU, o IPVA, etc.
Surge uma questão: o fornecimento de água, por exemplo, é propter rem? As
fornecedoras deste serviço defendem que sim: mesmo que o consumo tenha sido feito por
pessoa que ocupava o imóvel, e não pelo atual ocupante, é neste que recai a obrigação.
Ocorre que esta não tem sido a orientação jurisprudencial: trata-se de simples dívida de
consumo, estritamente pessoal, tendo no pólo passivo aquele que efetivamente consumiu o
serviço público.
“Art. 390. Nas obrigações negativas o devedor é havido por inadimplente desde o
dia em que executou o ato de que se devia abster.”
“Art. 189. Violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue,
pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206.”
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Situação peculiar merece comentários: sendo aqui inexigível, a dívida de jogo não fundamenta pretensão
condenatória do credor, se inadimplida. Imagine, agora, que brasileiro contraiu dívida de jogo em país no qual
esta é exigível, e retorna ao Brasil, deixando-a inadimplida. Poderá o credor internacional, por meio de carta
rogatória ao Brasil, requerer a execução da sentença lá exarada sobre os bens do devedor aqui situados?
O STF, enquanto era competente para o exequatur da sentença estrangeira, entendia que a
incompatibilidade do direito exigido, o crédito de jogo, impedia até mesmo a citação do devedor brasileiro,
quanto mais a expropriação de seus bens, com base no artigo 17 da LICC:
“Art. 17. As leis, atos e sentenças de outro país, bem como quaisquer declarações
de vontade, não terão eficácia no Brasil, quando ofenderem a soberania nacional, a
ordem pública e os bons costumes.”
Ocorre que com a EC 45, ao STJ passou a competir o exequatur, e esta Corte, em recente decisão,
decidiu que os atos processuais, a começar pela citação, podem ser realizados no Brasil, mas não os
substanciais – a obrigação não tem eficácia, sequer se alçando o Judiciário brasileiro a apreciar este mérito,
mas o processamento pode ser feito, pois pior avilte aos costumes do que a incompatibilidade da relação
exigida é o fomento à inadimplência em solo alienígena. Há, então, clara alteração de posicionamento
histórico no tema, para a qual se deve atentar.
“Art. 814. As dívidas de jogo ou de aposta não obrigam a pagamento; mas não se
pode recobrar a quantia, que voluntariamente se pagou, salvo se foi ganha por
dolo, ou se o perdente é menor ou interdito.
(...)”
“Art. 818. Pelo contrato de fiança, uma pessoa garante satisfazer ao credor uma
obrigação assumida pelo devedor, caso este não a cumpra.”
Hoje, porém, esta situação dada de exemplo não é assim tratada. Se há esta
onerosidade excessiva, o contrato, que é um processo, será verificado no momento em que
o efeito externo quebrar a paridade, desnaturando o caráter sinalagmático do contrato, e não
a mera verificação das condições originárias.
Outra representação desta evolução conceitual é o do adimplemento substancial das
obrigações. Veja um exemplo: em um contrato de compra e venda se firmou o pagamento
parcelado da coisa em trinta e seis parcelas mensais. Neste contrato, há cláusula resolutiva
expressa pelo inadimplemento. Suponha-se, então, que pagas duas, três parcelas, este o
devedor atrasa e não purga a mora: torna-se inadimplente. Se o credor invocar a cláusula
resolutiva, estará perfeitamente amparado, pelo contrato e pelo ordenamento jurídico.
Outrossim, imagine-se que este contrato seja inadimplido apenas quando do
pagamento da trigésima parcela. Poderá o credor invocar a cláusula resolutiva, da mesma
forma? É aqui que a nova concepção das obrigações se manifesta: considerando que a
obrigação nasce com uma finalidade ideal, comum a ambas as partes – seu adimplemento –,
e, neste caso, o fim ideal está muito próximo, aquele direito de rescindir o contrato, previsto
no início da relação, não pode mais ser considerado legítimo: nesta altura do processo
obrigacional, neste ponto do “filme”, não se justifica rescindir o pacto que se encontra tão
próximo do objetivo perfeito, pois que já há o adimplemento substancial da obrigação.
Rescindir este contrato, nestas bases, seria verdadeiro abuso do direito, pois que contraria a
função social endógena deste contrato, se afastando da boa-fé objetiva, especialmente no
consectário da autocooperação.
O adimplemento substancial, então, traz por efeito aquilo que é chamado supressio
do direito cuja justiça foi limada. Ao devedor do exemplo deverá ser proporcionada uma
forma de cumprir sua obrigação, menos gravosa do que a peremptória rescisão3.
Não se pense, porém, que é previsão exclusivamente protetiva do devedor: é uma
evolução interpretativa que protege o contrato, em vista da sua função social. Mesmo por
isso, é fácil cogitar de um exemplo em que é o credor quem se beneficia do supressio:
imagine-se que há, no mesmo contrato, cláusula de arrependimento em favor do adquirente.
Se ele exerce este direito contratual quando foram pagas poucas parcelas, nada há que o
impeça: o direito é legítimo. No entanto, se pretende invocar a cláusula de arrependimento
quando do pagamento da trigésima parcela, não é legítima sua pretensão, tendo havido
supressio deste direito por força do adimplemento substancial que se percebe no negócio.
Outra alteração conceitual derivada da boa-fé objetiva e seus consectários é a
imposição, ao credor, do duty to mitigate the losses, dever de minimizar seus prejuízos. Se
o inadimplemento de uma obrigação causa prejuízos ao credor, não por isso este deve tomar
atitudes que permitam que este prejuízo se agrave, pois este agravamento não será
imputável ao devedor. Veja um exemplo: locador recebe o imóvel do locatário com um
vazamento. Ao invés de consertar este vazamento desde logo, desde quando recebeu a
posse direta de volta, impedindo que danifique mais o imóvel, prefere quedar-se inerte, à
conta de ressarcir-se de todo o dano, à custa do locatário. Veja que, de fato, há o dever
sucessivo de indenizar, pois o dever originário de restituir em perfeito estado foi violado
pelo locatário. Todavia, o agravamento do prejuízo, oriundo da conduta desleal,
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Vale consignar, entretanto, que estas revoluções conceituais ainda não são pacíficas na jurisprudência, não
sendo raros os casos em que há julgados claramente atinentes à concepção clássica das obrigações, ignorando
esta teorização por completo. Todavia, tudo indica que este é o caminho da unanimidade jurisprudencial, por
já ser uníssona a doutrina moderna.
objetivamente de má-fé, por parte do locador, não poderá ser imputado ao devedor. O
credor descumpriu também um dever: o duty to mitigate the losses.
Início Fim
Adimplemento
Fontes das Transmissão das obrigacional
obrigações obrigações
Contratos;
Cessão de crédito.
Atos ilícitos; Boa-fé Objetiva
Assunção de
dívida.
Atos unilaterais;
Função Social do
Lei. Contrato
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
Questão 2
João Marques interpôs ação de execução por título extrajudicial em face de Lucas
Ribeiro, a fim de receber quantia garantida através de nota promissória. Em embargos à
execução, o embargante sustenta que a dívida é decorrente de aposta e, por isso, na forma
do artigo 814 do Código Civil, não pode ser cobrada judicialmente. Por sua vez, o
embargado sustenta que mesmo tratando-se de dívida de jogo, a garantia dada em nota
promissória é autônoma, não se podendo mais indagar a origem do quantum aposto na
cártula. Decida, indicando os fundamentos legais.
Resposta à Questão 2
Questão 3
passiva, pois a posse do imóvel foi transferida, através de compromisso de compra e venda
irrevogável e irretratável, fato conhecido pelo Condomínio. Merece ser acolhida a
preliminar?
Resposta à Questão 3
Tema II
Classificação das Obrigações quanto ao objeto I. Obrigações positivas e negativas. Obrigações de dar e de
restituir. Obrigação de dar coisa certa. Modalidades. Obrigações de dar coisa incerta. Obrigações
alternativas. Obrigações facultativas.
Notas de Aula4
“Os casos extremos não padecem dúvida, pois que uma envolve uma traditio ou
entrega, e outra uma ação pura. Mas numa zona grísea existem prestações que
reclamam acurada atenção, como, no exemplo clássico, o caso do artesão que
manufatura a coisa para o credor ou, em termos de direito positivo brasileiro, a
empreitada, em que existe o facere no ato de confeccionar e um dare no de
entregar a coisa elaborada, sendo ambos os momentos integrantes da prestação.”
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Aula proferida pelo professor Rafael Viola, em 9/10/2008.
Atualmente, esta relevância não é mais tão severa, porque tanto as obrigações de dar
quanto as de fazer permitem cominação de astreintes para compelir seu cumprimento
específico, e as perdas e danos5 não mais são a única saída para o inadimplemento das
obrigações que à época não contemplavam cominação de multa.
Para Orlando Gomes:
“As prestações de coisas consistem na entrega de um bem, seja para lhe transferir a
propriedade, seja para ceder-lhe a posse, seja para restituí-la.”
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A doutrina sempre foi forte em afirmar que as perdas e danos deveriam ser a última das soluções de uma
questão obrigacional, pois de fato não atendem ao que se espera de um pacto. São um remédio não desejado,
cabível apenas quando outra medida mais próxima da específica não for possível, e não uma solução
satisfatória.
As obrigações de dar, como dito, nada mais são do que a entrega de um bem,
corpóreo ou incorpóreo, seja pela tradição do bem móvel, seja pela transcrição do registro
de bem imóvel. Há mais de uma espécie de obrigação de dar; por isso, vejamos cada
espécie em detalhes.
O credor não está obrigado a receber coisa diversa, mesmo que mais valiosa, pelo
simples fato que pode não lhe ter qualquer utilidade esta coisa mais valiosa. A entrega de
coisa diversa é uma violação positiva do contrato, pois é um cumprimento imperfeito da
Uma das principais problemáticas em direito das obrigações é a chamada teoria dos
riscos, e suas aplicações em cada espécie de obrigação. Não se pode confundir esta com a
teoria do risco, que tem sede na responsabilidade civil objetiva, pois a teoria dos riscos tem
relação com a perda, o perecimento da coisa alvejada numa obrigação, determinando quem
assume o prejuízo pela perda.
O principal aspecto da teoria dos riscos, em geral, é a culpa. Ao contrário da
tendência objetivista do direito, em que até a boa-fé subjetiva vem perdendo importância
diante da objetiva, o direito obrigacional guarda íntima dependência deste elemento,
quando da análise das terminações imperfeitas das obrigações. Por isso, a culpa é regra
geral para a imputação de responsabilidade a um dos relacionandos, somente se escapando
a esta regra quando se tratar de responsabilidade objetiva – o que é sempre excepcional6.
Não somente nas obrigações que envolvem coisa certa, mas como norte geral,
devemos levar em consideração o brocardo res perit domino (a coisa perece para o dono)
como uma máxima: quem suporta, em regra, o ônus do perecimento da coisa é o seu dono,
o seu proprietário. Havendo, é claro, um atuar culposo do relacionando que não é dono,
poder-se-á imputar-lhe o perecimento; não havendo atuação culposa de ninguém – ou seja,
havendo fortuito ou força maior –, o prejuízo é do dono.
Grande importância assume esta regra quando se trata da obrigação de restituir, que
é mera variação da obrigação de dar. Nesta, a coisa não está em poder do dono, e sim do
possuidor, e, mesmo se a perda da coisa ocorre na posse do devedor da restituição, não
havendo culpa deste devedor, o prejuízo é do credor, proprietário, pois se aplica, de forma
simples, a regra res perit domino. São exemplos o contrato de locação, ou o comodato.
Na obrigação de entrega simples, e não restituição, o dono é o devedor, pois a
propriedade só se transfere com a tradição da coisa móvel, ou a transcrição no registro,
quando imóvel. Antes da tradição, havendo perecimento sem culpa, simplesmente se
resolve a obrigação, e quem deve arcar com o ônus da perda é o devedor. Se o credor
houver adiantado algum pagamento ao devedor, deve haver a simples devolução. A relação
deve voltar ao status quo ante.
Se antes da tradição a coisa se perde, agora, por culpa do devedor, proprietário, a
conseqüência jurídica é que, além de se resolver a obrigação, restituindo-se eventuais
adiantamentos feitos pelo credor da obrigação de dar, será devida a este a indenização, pelo
proprietário-devedor culpado, do equivalente somado a eventuais perdas e danos, tais como
danos emergentes ou lucros cessantes, e mesmo alguma perda de chance.
Veja o que dizem os artigos 233 e 234 do CC:
“Art. 233. A obrigação de dar coisa certa abrange os acessórios dela embora não
mencionados, salvo se o contrário resultar do título ou das circunstâncias do caso.”
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No CDC, por exemplo, a desnecessidade de culpa vem da adoção da teoria da qualidade, na vertente
adequação (ausência de vícios) e na vertente segurança (ausência de fatos danosos).
“Art. 235. Deteriorada a coisa, não sendo o devedor culpado, poderá o credor
resolver a obrigação, ou aceitar a coisa, abatido de seu preço o valor que perdeu.”
É claro que este direito não pode ensejar abusos pelo devedor. Não pode ele,
pretendendo forçar a resolução, incrementar demais o valor da coisa com benfeitorias úteis
ou voluptuárias, pois se trataria de quebra da lealdade imposta pela boa-fé objetiva,
denotando abuso de direito.
Como dito, nas obrigações de restituir os efeitos da teoria dos riscos são um tanto
diferentes. A regra geral, como se viu, por conta do res perit domino, é que a coisa se perde
para o proprietário, mas acontece que aqui o proprietário não está na posse da coisa.
Mesmo assim, se há fortuito que impeça a restituição, o prejuízo será do credor-
proprietário, ainda que a coisa esteja na posse do devedor. Se a coisa se perder antes da
restituição, sem culpa do devedor, será resolvida a obrigação, cabendo ao credor o que seria
devido como contraprestação até o dia da perda. Ocorrendo culpa do devedor, o credor terá
direito ao valor equivalente da coisa mais perdas e danos.
Veja o que dizem os artigos 238 e 239 do CC:
“Art. 238. Se a obrigação for de restituir coisa certa, e esta, sem culpa do devedor,
se perder antes da tradição, sofrerá o credor a perda, e a obrigação se resolverá,
ressalvados os seus direitos até o dia da perda.”
“Art. 239. Se a coisa se perder por culpa do devedor, responderá este pelo
equivalente, mais perdas e danos.”
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Data maxima venia, não entendo, pessoalmente, que seja esta a leitura deste artigo. A concordância da
expressão “ressalvados seus direitos até o dia da perda” só pode dizer respeito ao próprio credor, como se
depreende da mera leitura do artigo. Sendo assim, o direito ressalvado até o dia da perda é o do credor da
restituição, aquele que suporta o prejuízo, e deve dizer respeito, no meu entender, a qualquer efeito da
obrigação prévio ao fortuito, que porventura tenha ocorrido. Fica a questão.
“Art. 461. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou
não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se procedente o
pedido, determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao
do adimplemento.
§ 1o A obrigação somente se converterá em perdas e danos se o autor o requerer ou
se impossível a tutela específica ou a obtenção do resultado prático
correspondente.
§ 2o A indenização por perdas e danos dar-se-á sem prejuízo da multa (art. 287).
§ 3o Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado receio de
ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente ou
mediante justificação prévia, citado o réu. A medida liminar poderá ser revogada
ou modificada, a qualquer tempo, em decisão fundamentada.
§ 4o O juiz poderá, na hipótese do parágrafo anterior ou na sentença, impor multa
diária ao réu, independentemente de pedido do autor, se for suficiente ou
compatível com a obrigação, fixando-lhe prazo razoável para o cumprimento do
preceito.
§ 5o Para a efetivação da tutela específica ou a obtenção do resultado prático
equivalente, poderá o juiz, de ofício ou a requerimento, determinar as medidas
necessárias, tais como a imposição de multa por tempo de atraso, busca e
apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras e impedimento de
atividade nociva, se necessário com requisição de força policial.
§ 6o O juiz poderá, de ofício, modificar o valor ou a periodicidade da multa, caso
verifique que se tornou insuficiente ou excessiva.”
“Art. 461-A. Na ação que tenha por objeto a entrega de coisa, o juiz, ao conceder a
tutela específica, fixará o prazo para o cumprimento da obrigação.
§ 1o Tratando-se de entrega de coisa determinada pelo gênero e quantidade, o
credor a individualizará na petição inicial, se lhe couber a escolha; cabendo ao
devedor escolher, este a entregará individualizada, no prazo fixado pelo juiz.
§ 2o Não cumprida a obrigação no prazo estabelecido, expedir-se-á em favor do
credor mandado de busca e apreensão ou de imissão na posse, conforme se tratar
de coisa móvel ou imóvel.
§ 3o Aplica-se à ação prevista neste artigo o disposto nos §§ 1o a 6o do art. 461.”
E veja que este artigo 461-A, instituído pela Lei 10.444/02, tornou sem sentido o
teor da súmula 500 do STF:
“Súmula 500, STF: Não cabe a ação cominatória para compelir-se o réu a cumprir
obrigação de dar.”
“Art. 246. Antes da escolha, não poderá o devedor alegar perda ou deterioração da
coisa, ainda que por força maior ou caso fortuito.”
“Art. 244. Nas coisas determinadas pelo gênero e pela quantidade, a escolha
pertence ao devedor, se o contrário não resultar do título da obrigação; mas não
poderá dar a coisa pior, nem será obrigado a prestar a melhor.”
Nada impede, porém, que se pactue, pela autonomia da vontade, a escolha pelo
credor, e, mais ainda, que este possa escolher qualquer bem, mesmo o melhor.
Quando a escolha não se der no momento da tradição, esta será considerada quando
o devedor cientifica o credor da escolha feita.
Cabendo a escolha ao credor, excepcionalmente, se ele não faz esta escolha, cabe ao
devedor ingressar com ação para que o credor a faça em cinco dias (ou no prazo
contratual), sob pena de poder o devedor fazê-lo mediante consignação em pagamento. Veja
o artigo 894 do CPC:
Se, no entanto, a escolha couber mesmo ao devedor, conforme a regra geral, e este
não a faz, poderá o credor ajuizar ação para obter a coisa, conforme preceitua o artigo 629 e
seguintes do Código de Processo Civil:
“Art. 629. Quando a execução recair sobre coisas determinadas pelo gênero e
quantidade, o devedor será citado para entregá-las individualizadas, se lhe couber a
escolha; mas se essa couber ao credor, este a indicará na petição inicial.”
Se o devedor ainda assim não escolher a coisa, quando instado a fazê-lo, este direito
de escolha passa a ser do credor.
8
Vide nota pessoal na página 18.
As obrigações que envolvem apenas uma única prestação são chamadas simples. As
obrigações que envolvem pluralidade de elementos são as chamadas complexas, e são elas
as obrigações alternativas, facultativas e cumulativas.
Há que se consignar aqui, porém, uma nova leitura desta classificação de obrigações
simples e complexas. Na concepção da obrigação como um processo, ainda que se esteja
diante de uma obrigação classicamente considerada simples, ela será, de fato, sempre
complexa: a boa-fé objetiva impõe, a toda e qualquer obrigação, os deveres anexos que as
partes devem respeitar, quais sejam, os deveres de informação, cooperação e lealdade.
Assim, nesta moderna leitura, toda obrigação é complexa, pois que conta com diversos
deveres. No entanto, a classificação simplista, clássica, não deve ser abandonada, pois
garante a solução de diversos problemas, como se verá.
As obrigações complexas podem ser conjuntivas (ou cumulativas), quando mais de
uma prestação é devida de forma cumulada. Nesta hipótese, o credor tem o poder de exigir
o cumprimento de todas elas, na medida em que todas são devidas. Deve-se destacar a
inexistência de um regime legal particularizado às obrigações de objeto conjunto, e por isso
são aplicadas segmentadamente as regras das obrigações de dar, fazer ou não fazer que
porventura formem o conjunto obrigacional complexo.
O ponto nodal, contudo, é que o devedor não se desonera com cumprimento de
apenas uma das obrigações previstas no cúmulo. O interesse do credor está no conjunto e,
portanto, o devedor só estará exonerado se entregar todas as coisas. O objeto
composto que ela prevê vem destacado pela partícula aditiva “e”: por exemplo, a compra e
venda de uma casa e um carro.
Veja que a causa das obrigações deve ser a mesma, para que possam ser
consideradas cumuladas. No exemplo dado, a compra e venda da casa e do carro, o pacto
deve passar o sentido de unidade, ou seja, o dever de um é pagar o preço total
compromissado pelos bens, e o de outro entregar tais bens. Se a causa for diversa, ou seja,
se se passar a idéia clara de separação – no molde “compra da casa por tal preço, e do carro
por tal preço”, mesmo havendo aparência de um negócio cumulado, não há cúmulo teórico:
há duas obrigações.
Já nas obrigações alternativas (ou disjuntivas), ao devedor compete a entrega de
uma das prestações objeto da obrigação. O objeto não é único, mas o devedor se desobriga
entregando apenas um deles. Nessa obrigação, existem duas ou mais prestações, mas o
devedor só está obrigado a cumprir uma delas. Mesmo por isso, se identifica tal obrigação
por serem os objetos ligados pela partícula “ou”. Como exemplo, compra e venda de uma
casa ou um carro: o adimplemento se dá, perfeito, na entrega de um ou outro.
Veja que, para a caracterização de uma obrigação alternativa, pouco importa que as
prestações sejam genéricas ou que uma seja genérica e outra específica, ou, ainda, que uma
seja uma obrigação de dar e outra de fazer.
A verdadeira função de uma obrigação alternativa, para alguns autores, é garantir o
cumprimento da obrigação para o credor; outros, entendem que se trata de uma facilidade
para o devedor no adimplemento; na verdade, é uma combinação de ambas estas
finalidades, especialmente a depender de a quem incumbe a escolha.
Os problemas, é claro, surgem na solução da concentração e na aplicação da teoria
dos riscos. Vejamos.
“Art. 252. Nas obrigações alternativas, a escolha cabe ao devedor, se outra coisa
não se estipulou.
§ 1o Não pode o devedor obrigar o credor a receber parte em uma prestação e parte
em outra.
§ 2o Quando a obrigação for de prestações periódicas, a faculdade de opção poderá
ser exercida em cada período.
§ 3o No caso de pluralidade de optantes, não havendo acordo unânime entre eles,
decidirá o juiz, findo o prazo por este assinado para a deliberação.
§ 4o Se o título deferir a opção a terceiro, e este não quiser, ou não puder exercê-la,
caberá ao juiz a escolha se não houver acordo entre as partes.”
As partes podem também estabelecer que um terceiro realize a escolha. Pode ser
ainda que a escolha caiba a uma pluralidade de indivíduos. Se o terceiro não quiser realizar
a escolha ou se a pluralidade de optantes não chegar a um consenso, é dado ao juiz escolher
a prestação a ser cumprida
A escolha é feita, de acordo com Orlando Gomes, mediante declaração de vontade
receptícia. Desse modo, somente quando a outra parte toma conhecimento da declaração é
que ocorre a concentração. Depois de realizada a escolha, a obrigação alternativa se
converte em obrigação simples e seguirá as regras referentes ao tipo de obrigação (dar,
fazer ou não fazer).
Enquanto não for realizada a escolha, pode ser que uma, ou as duas prestações
venham a se tornar impossíveis. Novamente, a questão passa pela culpa, e por quem deve
arcar com o prejuízo. Nesse caso, será necessário perquirir, mais uma vez, a culpa do
devedor. No entanto, em se tratando de escolha do credor ou do devedor, os efeitos serão
diferentes, conforme veremos.
Não havendo culpa no perecimento ou deterioração, se a escolha cabe ao devedor,
se uma das prestações se perder, opera-se a concentração do débito em relação à outra. Em
se perdendo ambas as prestações, sem culpa, resolve-se a obrigação. Veja os artigos 253 e
256 do CC:
“Art. 253. Se uma das duas prestações não puder ser objeto de obrigação ou se
tornada inexeqüível, subsistirá o débito quanto à outra.”
“Art. 254. Se, por culpa do devedor, não se puder cumprir nenhuma das prestações,
não competindo ao credor a escolha, ficará aquele obrigado a pagar o valor da que
por último se impossibilitou, mais as perdas e danos que o caso determinar.”
Se, contudo, a escolha couber ao credor, caso uma prestação venha a se perder por
culpa do devedor, aquele poderá optar entre a prestação subsistente ou o valor da que se
perdeu, mais perdas e danos. Em razão da escolha estar a cargo do credor, pode ser que ele
não tenha interesse na outra prestação e, portanto, lhe é facultado exigir o equivalente da
prestação que se perdeu, mais perdas e danos.
Se, no entanto, todas as prestações se perderem por culpa do devedor, o credor terá
direito de exigir o valor de qualquer das prestações, mais indenização por perdas e danos.
Veja o artigo 255 do CC:
“Art. 255. Quando a escolha couber ao credor e uma das prestações tornar-se
impossível por culpa do devedor, o credor terá direito de exigir a prestação
subsistente ou o valor da outra, com perdas e danos; se, por culpa do devedor,
ambas as prestações se tornarem inexeqüíveis, poderá o credor reclamar o valor de
qualquer das duas, além da indenização por perdas e danos.”
9
Gisela Sampaio entende que, neste caso, se abre a possibilidade, para o devedor, de cumprir a prestação ou
pagar as perdas e danos. É posição minoritária.
“Art. 571. Nas obrigações alternativas, quando a escolha couber ao devedor, este
será citado para exercer a opção e realizar a prestação dentro em 10 (dez) dias, se
outro prazo não lhe foi determinado em lei, no contrato, ou na sentença.
§ 1o Devolver-se-á ao credor a opção, se o devedor não a exercitou no prazo
marcado.
§ 2o Se a escolha couber ao credor, este a indicará na petição inicial da execução.”
“Art. 342. Se a escolha da coisa indeterminada competir ao credor, será ele citado
para esse fim, sob cominação de perder o direito e de ser depositada a coisa que o
devedor escolher; feita a escolha pelo devedor, proceder-se-á como no artigo
antecedente.”
Questão 1
Resposta à Questão 1
Questão 2
Resposta à Questão 2
b) Não: este artigo é aplicável para obrigações alternativas, e, como dito, o caso
trata de obrigação facultativa. O credor não tem direito de concentrar seu pleito
no bem secundário, resolvendo-se em perdas e danos. O devedor deverá apenas
restituir eventuais adiantamentos, sem acréscimos, posto que não teve culpa.
Questão 3
Resposta à Questão 3
Obrigação de dar coisa certa infungível. Perecendo o bem, por culpa da devedora,
não resta outra saída senão apurar as perdas e danos da credora, e nestes entendo inclusos
os gastos com a festa, frustrada pela quebra do dever originário, e por isso inclusa na
obligatio da devedora.
Tema III
Classificação das Obrigações quanto ao objeto II. Obrigações de fazer e não fazer. Execução genérica e
específica. Obrigações de meio e de resultado. Obrigação condicional e a termo. Obrigação principal e
acessória.
Notas de Aula10
1. Introdução
10
Aula proferida pelo professor Ricardo Cyfer, em 10/10/2008.
Antes de tudo, vale trazer breve consideração acerca das diferenças entre obrigações
contratuais e extracontratuais. Na verdade, a principal diferença reside em um aspecto
fundamental: a presunção de culpa. Nas obrigações contratuais, a existência de um vínculo
obrigacional claramente delineado, com as suas bases fixadas, determina que, havendo
descumprimento, haja presunção de culpa daquele descumpriu. Por isso, a alegação de
descumprimento de uma relação contratual faz recair sobre aquele que é apontado como
descumpridor o ônus de provar que não o fez.
Na relação extracontratual, ao contrário, a inexistência de vínculo prévio claramente
estabelecido faz com que não haja qualquer tipo de presunção de culpa, pelo que a alegação
de que outrem causou dano, infringindo dever legal, deve comprovar esta alegação, em
regra.
Dito isso, passemos ao tema específico.
3. Obrigações de fazer
qualquer um dos contratantes pode resolver o contrato, a qualquer tempo, variando apenas
as conseqüências desta resolução.
Outra hipótese em que a tutela específica não mais tem lugar é quando a situação
fática demonstrar que não há mais interesse no objeto contratual. Exemplo clássico é a
entrega de um vestido de casamento à noiva, a tempo para usá-lo na cerimônia: se passar o
dies ad quem sem que seria possível usá-lo, não há mais qualquer interesse, em regra, no
cumprimento desta entrega, e as perdas e danos são o caminho mais coerente.
Seguindo a normalidade, porém, é fato que em regra é mais interessante o
cumprimento específico do objeto do que a solução das perdas e danos.
Se a obrigação de fazer for fungível, a solução é simples, pois existem duas
possibilidades de se alcançar a satisfação específica da prestação: a própria parte poderá
obter a prestação de um terceiro, às expensas do seu devedor, quando a urgência a
autorizar; ou o juiz comandará que terceiro realize a obrigação de fazer, também à custa do
devedor original. Veja:
“Art. 249. Se o fato puder ser executado por terceiro, será livre ao credor mandá-lo
executar à custa do devedor, havendo recusa ou mora deste, sem prejuízo da
indenização cabível.
Parágrafo único. Em caso de urgência, pode o credor, independentemente de
autorização judicial, executar ou mandar executar o fato, sendo depois ressarcido.”
11
Há que se abordar brevemente a discussão sobre a natureza do dano, na responsabilidade civil. O artigo 186
do CC parece dispor que se trata de elemento do ato ilícito, dado o uso da expressão “violar direito e causar
“Art. 247. Incorre na obrigação de indenizar perdas e danos o devedor que recusar
a prestação a ele só imposta, ou só por ele exeqüível.”
Na verdade, este dispositivo traz uma posição um tanto escapista do legislador, pois
simplesmente ignora a guia mor das obrigações, hodiernamente, que é a busca pela
execução específica da obrigação, dada a presunção de interesse no objeto prestacional,
para dizer que se impõe o dever de indenizar, solução que deveria ser secundária,
subsidiária.
Por isso, a solução não está neste artigo, e sim no artigo 461 do CPC. Veja:
“Art. 461. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou
não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou, se procedente o
O caput do artigo 927 do CC, ao contrário, dá a entender a sua redação que o ato ilícito pode ser
cometido independentemente do dano, pois separa os conceitos, não sendo elemento do ato ilícito, mas sim
um resultado que o torna indenizável. Veja:
“Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica
obrigado a repará-lo.”
A doutrina, então, é majoritária na tese de que o dano é pressuposto do dever de indenizar, e não
elemento do ato ilícito, pois é certo que atos ilícitos podem ser praticados sem que haja resultado danoso –
continuam sendo ilícito, mas não são indenizáveis. Por isso, a doutrina diz que o dano do artigo 186 é o
jurídico, a lesão a bem juridicamente tutelado, enquanto o dano do artigo 927 é o efetivo prejuízo no mundo
dos fatos – compatibilizando os dispositivos, portanto. Destarte, a indenização depende do prejuízo, na forma
do artigo 927, mas a configuração do ato ilícito depende apenas da violação a bem jurídico, mesmo sem dano
fático.
Este artigo, então, vem coroar a idéia geral da busca pela execução específica. Veja
um caso concreto que ilustra bem esta busca: alunos de um colégio, pretendendo sair da
instituição e se matricular em outra, precisavam do histórico escolar. A instituição de ensino
se recusava a emitir este documento em tempo hábil para a matrícula na nova escola.
Ajuizada a ação, a tutela específica seria a obtenção dos históricos, mas esta prestação é
infungível, somente a escola de origem podendo realizá-la. O juiz poderá, neste caso,
cominar astreintes, de forma a compelir a ré a prestar a obrigação; poderá, também, se
ineficaz a multa diária, determinar busca e apreensão dos históricos – mas esta providência
pode ser infrutífera, se não forem encontrados. Como solucionar esta situação, se a escola
de origem se negar a atender ao comando judicial?
Veja que a resolução em perdas e danos é inútil: não garante a finalidade pretendida,
qual seja, a matrícula na nova escola. Por isso, orientado pela necessidade da prestação
específica, cabe ao juiz identificar medida que a implemente (ou ao autor requerê-la, se
souber). Neste caso concreto, medida que teria o condão de atender ao anseio dos autores
seria a seguinte: colhendo dos alunos todas as provas, avaliações, que realizaram no curso
dos estudos, produzir, em sentença declaratória, um “histórico escolar judicial” – é a
medida equivalente à específica, a que alude rol exemplificativo do § 5º deste artigo 461 do
CPC. Destarte, estaria atendida a especificidade que é o norte das obrigações.
Veja que, então, o juiz tem liberdade criativa para solucionar as questões de
descumprimento obrigacional de prestações infungíveis. Orientado pelo norte da presunção
do interesse no objeto específico, pode determinar prestação que seja suficiente a tal
implemento.
Vejamos ainda um outro exemplo, este de grande presença casuística: se há
inscrição indevida nos cadastros desabonadores de crédito – SPC e Serasa –, somente estas
instituições podem desfazer este cadastro. Todavia, não são parte do processo, em regra,
sendo parte a instituição que requereu a inscrição do suposto devedor. Neste caso, de nada
valerá a cominação de multa ao réu – que, repita-se, não é a entidade de cadastro, mas sim
o credor –, pois não pode este realizar a conduta fim, que é a retirada do registro. Por isso,
neste caso, resta apenas uma saída ao juiz: oficiar à entidade de cadastro (e não intimar,
notificar ou citar, pois não é parte), mesmo de ofício, para que cancele o registro, sob pena
de configurar crime de desobediência (não pode cominar astreintes ou nenhuma medida
processual, pois estas só se dedicam às partes do processo). Se o ofício não for eficaz, pode
o juiz extrair cópias ao MP, a fim de promover a devida ação penal.
Sobre as astreintes, vale ainda consignar que só se justificam quando a prestação a
que se quer compelir for exeqüível. Se não puder ser cumprida, outro método deve ser
adotado, especialmente a obtenção de resultado equivalente (que deve ser a medida
preferencial, desde o início, quando o devedor infungível não cumpre a sua obrigação).
Vale dizer que não há teto para as astreintes, mas há que se atentar para a razoabilidade, e
para a sua eficácia, que, sendo perdida, deve ser convertida em outra medida qualquer.
Há ainda que se abordar as obrigações de declarar vontade, que são obrigações de
fazer, e que se sujeitam a todas as regras ditas sobre esta modalidade, mas estas obrigações
ainda contam com uma outra possibilidade: pode ser pedido que o juiz emita sentença
constitutiva, substitutiva da declaração que seria prestada pelo devedor. Por exemplo, o
contrato de promessa de compra e venda, cujo objeto é a declaração futura de venda ou
compra: pode o juiz substituir-se a um dos contratantes que se negue a declarar a vontade
compromissada no contrato de promessa, firmando o contrato de compra e venda
objetivado, executando a negociação em si. A partir desta sentença constitutiva, então,
surge o contrato de compra e venda, como se o inadimplente da promessa houvesse
manifestado sua vontade, como deveria, em adimplemento da promessa. O nome da ação
que pretende esta sentença é ação adjudicatória.
“A obrigação de não fazer tem por fim impedir que o devedor pratique ato que
teria o direito de realizar se não tivesse se obrigado a abster-se.”
Estas obrigações são muito freqüentes em pactos civis, mais comuns do que se pode
pensar. Por exemplo, todos os contratos que prevêem qualquer tipo de exclusividade na
prestação de serviço, ou na utilização de algum bem, prevêem cláusula que impõe
obrigação de não fazer, qual seja, a de não contratar com outrem sobre o mesmo objeto.
A licitude do objeto da obrigação de não fazer deve ser observada com atenção, pois
há um limite do que se pode impor a alguém que não faça. Existe um entendimento
doutrinário e jurisprudencial que a obrigação de não fazer não pode implicar em uma
abstenção genérica, pois não é razoável. Veja: não se pode fixar em um contrato, como
exemplo, uma obrigação de “não se casar”. Trata-se de uma abstenção extremamente
restritiva, por demais ampla e genérica, e esta cláusula seria nula. Ao contrário, uma
cláusula que impusesse a obrigação de “não se casar com determinada pessoa” seria,
aprioristicamente, válida, desde que acompanhada de plausível justificação.
As obrigações de abstenção podem ter ou não prazo estipulado. Caso não haja prazo
estipulado, é preciso verificar o aspecto finalístico da obrigação para poder-se precisar a sua
duração, ou seja, para quê se destina o dever de abster-se. Se não tiver mais sentido em
abster-se, não mais se impõe a obrigação. Repare, inclusive, que casos há em que até
mesmo depois de encerrado o contrato em que uma cláusula de abstenção tenha sido
consignada, esta obrigação de não fazer pode perdurar indefinidamente, se a ética
contratual assim o impuser: por exemplo, a obrigação de não revelar um segredo industrial,
que pode se estender indefinidamente, qualquer que tenha sido o contrato que envolveu esta
obrigação.
Enquanto se mantiver a omissão, a obrigação está sendo cumprida. Desde que o
devedor pratique o que deve omitir, é inadimplente. Veja o artigo 390 do CC:
“Art. 390. Nas obrigações negativas o devedor é havido por inadimplente desde o
dia em que executou o ato de que se devia abster.”
“Art. 250. Extingue-se a obrigação de não fazer, desde que, sem culpa do devedor,
se lhe torne impossível abster-se do ato, que se obrigou a não praticar.”
“Art. 251. Praticado pelo devedor o ato, a cuja abstenção se obrigara, o credor
pode exigir dele que o desfaça, sob pena de se desfazer à sua custa, ressarcindo o
culpado perdas e danos.
Parágrafo único. Em caso de urgência, poderá o credor desfazer ou mandar
desfazer, independentemente de autorização judicial, sem prejuízo do
ressarcimento devido.”
Atos condicionais só podem ser negócios jurídicos, e jamais atos jurídicos lato
sensu: somente naquelas relações em que às partes é dado o controle sobre seus efeitos é
12
O suicídio não elide a exigibilidade de pagamento do seguro de vida, se não for voluntário. Suicídio
voluntário é aquele em que o contratante do seguro já o pactuou predisposto a se matar, ou seja, já tinha esta
resolução em mente quando pactuou o seguro – ele controla o elemento futuro, e por isso há quebra da boa-fé
do contrato. Ao contrário, o suicídio é considerado juridicamente involuntário quando os motivos que o
ensejam surgem posteriormente à pactuação do contrato de seguro, e este caso não desautoriza a cobertura.
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
13
A integralidade pode ser medida na parcela: se a obrigação é parcelada, não pode ser imposto o pagamento
parcial de uma parcela, mas somente a integralidade da parcela (e não do débito total: a parcela é uma
integralidade em si).
vício é de origem –, há culpa, quiçá má-fé contratual objetiva, vez que mesmo que
subjetivamente estivesse de boa-fé, a análise é objetiva, de acordo com o novo direito
privado. Por isso, responde por perdas e danos do credor.
Diante da situação, a análise da boa-fé objetiva parte do comportamento esperado
do homem médio, e não da convicção pessoal do agente: se o padrão de conduta, a conduta
standard esperada do homem médio naquela situação foi contrafeita, há violação da boa-fé
objetiva. É um juízo objetivo de adequação, e não uma análise subjetiva da intenção do
agente.
Destarte, no caso, há quebra da boa-fé objetiva, mesmo que o pintor estivesse de
boa-fé subjetiva.
Questão 2
Mauro vendeu a Osvaldo seu veículo usado. Ajustaram as partes que o comprador
ficaria responsável pela transferência do registro junto ao Detran. Dois anos após, o
veículo ainda estava registrado em nome de Mauro, e diversas notificações com multas
chegaram à sua casa. Em ação própria, Mauro pleiteia que Osvaldo seja compelido a
proceder à transferência, inclusive das multas de trânsito posteriores à data da venda, sem
requerer, todavia, a aplicação de multa destinada a compelir ao cumprimento da
obrigação. Em contestação, Osvaldo alega que não procedeu à transferência porque
perdera o CRV (Certificado de Registro do Veículo), cuja segunda via o autor não lhe
entregou (alegação não demonstrada). Decida a questão, indicando os dispositivos legais
aplicáveis. Caso seja acolhido o pedido, poderá o juiz aplicar a multa cominatória?
Resposta à Questão 2
Questão 3
O contrato pelo qual o Banco assume a custódia dos bens guardados no cofre, tem
natureza de obrigação de meio ou de resultado? Decida a questão fundamentadamente.
Resposta à Questão 3
Tema IV
Notas de Aula14
14
Aula proferida pelo professor Ricardo Cyfer, em 10/10/2008.
“Art. 258. A obrigação é indivisível quando a prestação tem por objeto uma coisa
ou um fato não suscetíveis de divisão, por sua natureza, por motivo de ordem
econômica, ou dada a razão determinante do negócio jurídico.”
Este artigo demanda combinação com o artigo 87 do CC, pois é este último que traz
o conceito de divisibilidade dos bens:
“Art. 87. Bens divisíveis são os que se podem fracionar sem alteração na sua
substância, diminuição considerável de valor, ou prejuízo do uso a que se
destinam.”
“Art. 314. Ainda que a obrigação tenha por objeto prestação divisível, não pode o
credor ser obrigado a receber, nem o devedor a pagar, por partes, se assim não se
ajustou.”
Imagine-se, então, que há uma relação obrigacional com dois indivíduos no pólo
passivo e um credor, em relação de indivisibilidade. Veja o esquema gráfico:
Devedor
“A”
Vínculo interno Vínculos externos Credor
Devedor
“B”
Se a prestação que estes devedores devem ao credor for indivisível, o credor poderá
exigir-lhes, de cada um, a sua integralidade. Suponha-se que seja um automóvel: o débito
de cada devedor é de metade do automóvel, em regra, mas como é impossível exigir a
entrega de meio automóvel, pela natureza da coisa, a lei cria esta possibilidade ao credor,
de exigi-lo por inteiro de um só dos devedores, restando a este que pagou além do seu
débito se sub-rogar na posição de credor pelo excedente, contra o co-devedor inadimplente.
Sendo a obrigação solidária no pólo passivo, a situação é diferente: os devedores
têm, desde sempre, a obrigação pela integralidade da prestação, diante do credor, não sendo
possível, se demandado por esta integralidade, a sub-rogação na posição de credor, mas
apenas o regresso contra os demais co-devedores. Veja como se desenha graficamente:
Devedor
“A” Vínculo externo
Devedor
“B”
A diferença, então, salta logo aos olhos: a solidariedade é uma situação jurídica em
que se cria um só vínculo externo do pólo passivo com o credor, enquanto a
indivisibilidade, ao menos no exemplo, é uma circunstância fática, em que há pluralidade
de vínculos externos, mas em que se permite a cobrança de um só por toda a integralidade,
vez que é impossível fracionar a prestação. Mesmo por isso, prestações naturalmente
divisíveis, mas cobradas de um pólo solidário, ainda podem ser exigidas na integralidade de
apenas um dos co-devedores.
Veja: mesmo que a situação seja faticamente similar, ou idêntica – um dos
devedores poderá arcar com a integralidade da prestação –, ela é juridicamente diferente: na
solidariedade, cada co-devedor é devedor da integralidade, desde o início, mediante a
análise do vínculo externo do pólo passivo com o pólo ativo; na indivisibilidade, cada co-
devedor tem prestação parcial perante o credor, mas pose ser instado a arcar com toda ela,
pela necessidade fática.
O artigo 265 do CC determina que a solidariedade não se presume, devendo a lei ou
o contrato estabelecer esta situação. O artigo 2º da Lei 8.245/91 é um exemplo de
solidariedade legal:
“Art. 265. A solidariedade não se presume; resulta da lei ou da vontade das partes.”
Outra diferença retumbante pode ser vista na leitura dos artigos 263, 271 e 279 do
CC:
1.1. Remissão
“Art. 262. Se um dos credores remitir a dívida, a obrigação não ficará extinta para
com os outros; mas estes só a poderão exigir, descontada a quota do credor
remitente.
Parágrafo único. O mesmo critério se observará no caso de transação, novação,
compensação ou confusão.”
“Art. 277. O pagamento parcial feito por um dos devedores e a remissão por ele
obtida não aproveitam aos outros devedores, senão até à concorrência da quantia
paga ou relevada.”
Sub-rogação significa substituição. A lei atribui muito mais poderes a quem se sub-
roga do que a quem apenas age em regresso. Veja: se o credor contava com uma garantia
real, por exemplo, ao sub-rogar-se em sua posição, o devedor passa a contar com a mesma
garantia, o que não ocorre no mero regresso; da mesma forma, se um credor tinha um título
executivo, o devedor que paga mais do que devia contará com este título. Veja o artigo 259
do CC, que trata da sub-rogação do devedor, que se passa na indivisibilidade:
“Art. 259. Se, havendo dois ou mais devedores, a prestação não for divisível, cada
um será obrigado pela dívida toda.
Parágrafo único. O devedor, que paga a dívida, sub-roga-se no direito do credor em
relação aos outros coobrigados.”
“Art. 283. O devedor que satisfez a dívida por inteiro tem direito a exigir de cada
um dos co-devedores a sua quota, dividindo-se igualmente por todos a do
insolvente, se o houver, presumindo-se iguais, no débito, as partes de todos os co-
devedores.
A principal nota da solidariedade ativa é que cada um dos credores pode exigir a
dívida por inteiro do devedor, a teor do artigo 267 do CC:
“Art. 267. Cada um dos credores solidários tem direito a exigir do devedor o
cumprimento da prestação por inteiro.”
“Art. 268. Enquanto alguns dos credores solidários não demandarem o devedor
comum, a qualquer daqueles poderá este pagar.”
“Art. 314. Ainda que a obrigação tenha por objeto prestação divisível, não pode o
credor ser obrigado a receber, nem o devedor a pagar, por partes, se assim não se
ajustou.”
As exceções que são pessoais contra um dos co-credores não podem ser utilizadas
contra os demais, por aquele devedor que a detém. Este princípio é basilar do direito como
um todo – nas obrigações, sendo devido ao princípio da relatividade contratual –, e é
expressamente mencionado no artigo 273 do CC:
“Art. 273. A um dos credores solidários não pode o devedor opor as exceções
pessoais oponíveis aos outros.”
“Art. 294. O devedor pode opor ao cessionário as exceções que lhe competirem,
bem como as que, no momento em que veio a ter conhecimento da cessão, tinha
contra o cedente.”
“Art. 371. O devedor somente pode compensar com o credor o que este lhe dever;
mas o fiador pode compensar sua dívida com a de seu credor ao afiançado.”
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
regresso contra o locatário (e não sub-rogação, pois há solidariedade). Assim dispõe a Lei
4.591/64, no artigo 10, § 1º. Veja:
Questão 2
Resposta à Questão 2
Questão 3
Carlos Barbosa ajuizou ação de indenização por danos materiais e morais em face
de Transportes Terrestres Unidos S/A e National Airlines, em virtude do extravio de
bagagem em transporte aéreo. As empresas foram condenadas solidariamente a indenizar
o autor, sendo que, em execução, a empresa aérea celebrou acordo com o credor pelo qual
quitou a dívida. Tendo cumprido integralmente a obrigação, requereu ao Juízo o
prosseguimento da execução para o fim de receber do outro devedor solidário a quota-
parte, a teor do que dispõe o artigo 283 do Código Civil. Transportes Unidos, sustentou
que, mesmo tendo efetuado o pagamento integral, a National Airlines não tem o direito de
regresso contra si, por ter sido ela quem efetivamente deu causa ao dano objeto da
indenização, uma vez que a bagagem extraviou-se durante o transporte aéreo, no percurso
Rio-Paris, o que a torna responsável exclusiva e única interessada em solver a dívida.
Aduz, assim, que a solidariedade declarada na sentença se aplica aos executados perante
o credor, mas não entre os devedores. Por fim, esclarece que os serviços, embora
contratados sob a cláusula porta a porta, não apresentaram nenhum defeito na parte
terrestre, desde a coleta dos livros na casa do passageiro até o seu embarque no aeroporto
do Rio. Dando os fatos como provados e considerando que a sentença prolatada no
processo de conhecimento, assim como o acórdão que a confirmou, deixaram claro ter
ocorrido o extravio dos livros na parte aérea do transporte, e não na terrestre efetuada
pela transportadora, decida a questão, indicando os fundamentos e dispositivos legais
aplicáveis à espécie em exame.
Resposta à Questão 3
Não há direito regressivo, portanto, vez que aquele que pagou é o único interessado
na dívida, tendo sido o verdadeiro causador do dano.
O TJ/RJ assim se posicionou, na apelação 2007.001.23169:
Tema V
Extinção das Obrigações I. Pagamento. Natureza jurídica. Elementos. Solvens e accipiens. Pagamento por
terceiro interessado e não interessado. Prova, lugar e tempo do pagamento. Pagamento antecipado.
Pagamento indevido. Pagamento feito a credor putativo e incapaz.
Notas de Aula15
1. Pagamento
15
Aula proferida pelo professor Sylvio Capanema de Souza, em 13/10/2008.
Antunes Varela, civilista português, sugere que o termo pagamento fosse adstrito
apenas às obrigações pecuniárias, enquanto às demais se dedicaria o termo cumprimento. O
CC brasileiro, porém, mantém-se fiel ao termo pagamento, para qualquer obrigação.
A conseqüência jurídica do pagamento é a extinção do vínculo obrigacional. Pelo
pagamento, o devedor se liberta do credor, se alforria da obrigação. O pagamento é a
“morte natural” da obrigação, e por isso é a solução ideal de toda obrigação, sempre bem-
vindo, implementando, de forma saudável, o pacta sunt servanda. Veja que o pagamento é
um dever jurídico do devedor, e não um favor que este presta ao credor; por isso, é um
direito subjetivo do credor, correspondendo a uma faculdade de agir deste: se o devedor não
entrega a prestação como devido, o credor poderá movimentar a máquina estatal para
compelir o devedor a lhe pagar.
Há um interesse social no pagamento, pois quando este se implementa, a segurança
jurídica se incrementa: o não pagamento é um ato que gera turbulência jurídica e
conseqüente insegurança. Ao pagar, o devedor está servindo à sociedade. Mesmo por isso,
um dos indicadores do desenvolvimento social é a curva de inadimplemento desta: se
estiver elevada, é sinal que a sociedade não está saudável.
O pagamento pode ser direto ou indireto. Será direto quando o devedor entrega a
prestação ao credor, na forma, lugar e prazo convencionados. É claro que esta modalidade
é a ideal, pois dispensa qualquer intervenção do Estado, ou de quem quer que seja, vez que
há cumprimento voluntário e perfeito da obrigação. Todavia, como o mundo dos fatos não é
perfeito, o pagamento indireto é necessário, quando o pagamento direto não for possível,
por diversos motivos. Veja que é pagamento, e tem todos os seus efeitos, mas de forma
diversa do direto. Se não houvesse o pagamento indireto, o nível de inadimplemento
decerto seria muito mais elevado.
Exemplos de pagamento indireto são a consignação, a dação, a imputação, a
compensação, a sub-rogação, e todos os demais métodos, que serão vistos adiante.
Há ainda situações em que a obrigação se extingue sem que haja o pagamento,
direto ou indireto, sem significar inadimplência: é o caso da remissão (perdão do credor à
dívida), por exemplo, ou da confusão (reunião das figuras de devedor e credor na mesma
pessoa).
A natureza jurídica do pagamento é controvertida. Para alguns, é um mero ato
jurídico, pois produz resultado que a lei controla, qual seja, a extinção da obrigação; outros,
entendem ser apenas um fato jurídico; e outros entendem, ainda, que é um negócio jurídico
unilateral. Entretanto, a posição majoritária é que seja um negócio jurídico bilateral, pois
para que o pagamento ocorra é necessário que se conjuguem as vontades do devedor em
pagar, e do credor em receber – do contrário, realmente, não se implementa. Mesmo por
isso, vige o princípio da cooperação, segundo o qual tanto devedor quanto credor devem
envidar seus esforços para que ocorra o pagamento.
Uma regra basilar do direito das obrigações, referente ao pagamento, é aquela
segundo a qual o pagamento deve ser realizado da forma que seja menos onerosa para o
devedor, por razão óbvia: o pagamento é uma depleção patrimonial, e portanto não é um
momento exatamente prazeroso para o devedor.
O Estado, curiosamente, adota duas políticas exatamente contrárias, mas com o
mesmo escopo, de facilitar o pagamento: num primeiro momento, facilita ao devedor os
meios de pagar, estabelecendo regras que tornem este menos oneroso. Como exemplo, o
lugar do pagamento, em regra, é no domicílio do devedor – o que se chama de obrigação
quesível, querable –; em segundo momento, se o devedor não pagou como devia, o Estado
inverte sua conduta, aliando-se ao credor a fim de que obtenha a satisfação de seu crédito,
criando regras que pesam sobre o devedor, como sanções pelo inadimplemento.
Para que o pagamento produza seu efeito principal, o efeito liberatório do devedor,
é necessário que alguns requisitos objetivos e subjetivos estejam presentes. Os elementos
subjetivos do pagamento são os sujeitos da obrigação: o devedor, denominado solvens,
incumbido do dever de pagar; e o credor, accipiens, titular do direito subjetivo na
obrigação, que pode se valer dos meios legítimos para compelir que seu crédito seja pago.
Elementos objetivos, por seu turno, dizem respeito à prestação devida, ao objeto da
obrigação. Vejamo-los.
Mas veja que, além de ser legítimo, é importante se verificar ainda mais um aspecto
quanto ao accipiens: se este está na plena disponibilidade de seus créditos. Veja um
exemplo: se o credor estiver sendo executado, e recair sobre seus créditos uma penhora
requerida por credor do credor, o devedor do executado, desde que ciente da constrição do
patrimônio do seu credor, não pode mais pagar diretamente a ele, devendo depositar o
crédito no juízo de onde emanou a constrição. Se paga diretamente ao credor, paga mal, e
poderá ser instado a pagar novamente. Evidentemente que, neste caso, se não estiver ciente
da constrição, não pode o devedor ser punido, e sua situação se equipara a quando paga a
credor putativo: libertar-se-á da obrigação.
Em suma, então, quanto ao pólo ativo do pagamento, o accipiens deve ser legítimo,
e ter seu crédito disponível, para que o pagamento seja correto.
Vejamos, então, os requisitos subjetivos quanto ao solvens, devedor. O pagamento
não é apenas um dever do solvens: é também um direito seu. Isto porque pagar é o meio
pelo qual se liberta o devedor do vínculo, e esta libertação é um direito seu. Por isso, se o
credor, sem motivo justificado, recusa-se a receber a prestação, o devedor poderá compeli-
lo a receber, para o que foram criados mecanismos poderosos, tais como o pagamento por
meio de consignação.
Pode figurar como legítimo solvens não só o próprio devedor, chamado devedor
direto, principal, mas também uma série de outros legitimados, que poderão exercer o
direito de pagar, ou serem demandadas no dever de pagar. Assim figuram, por exemplo, os
herdeiros do devedor, que recebem na herança o passivo do devedor (que, como se sabe, se
limita às forças da herança, o chamado benefício do inventário, em que o passivo do
devedor obituado não alcança o patrimônio pessoal dos herdeiros, se insuficiente for o ativo
hereditário).
Também o terceiro interessado, que não é o devedor direto, mas ainda poderá ser
alcançado pela execução do credor (sendo exemplo mais claro o fiador, ou o avalista), é
legitimado a pagar: paga para que não se torne réu na execução, eventualmente.
As conseqüências do pagamento feito pelo terceiro interessado são peculiares. A
primeira é a substituição automática, legal, em todos os direitos do credor – é a sub-
rogação, a substituição do credor pelo terceiro interessado. A sub-rogação pelo terceiro
interessado não depende de qualquer manifestação do credor original, não precisa de sua
anuência. O terceiro interessado, inclusive, pode compelir o credor a receber, valendo-se
dos mesmos meios que o devedor principal, como a consignação (em nome próprio, por
direito próprio).
É de se ressaltar que a sub-rogação é mais que o mero regresso: ela coloca o
pagador na mesma posição do credor original, nos seus exatos termos, o que significa, por
exemplo, que as garantias que existiam, tais como uma hipoteca, continuam a existir.
Pode haver também o pagamento por terceiro não interessado. Este é a pessoa que,
não sendo o devedor direto, tampouco podendo ser alcançado pela execução levada a cabo
pelo credor, ainda assim deseja pagar16. Mas veja que o pagamento por terceiro não
interessado pode representar, por vezes, um certo desconforto para o devedor principal. Por
isso, a lei permite que o terceiro não interessado pague, mas não lhe confere as mesmas
prerrogativas que confere ao terceiro interessado, não lhe contemplando com as mesmas
garantias que ao interessado contempla.
16
O pagamento por terceiro não interessado, que parece uma excessiva liberdade legal, na verdade é
condizente com o interesse social que está por trás de todo pagamento, como dito.
A quitação tem requisitos formais para sua regularidade: tem que ser discriminada,
não tendo qualquer valor a quitação genérica (nos moldes “recebi do devedor tudo que me
deve”); tem que conter o nome de quem está pagando, do solvens; deve constar do recibo o
lugar em que se deu o pagamento, e a data em que se realizou; e conter a assinatura do
accipiens.
O CC de 1916 se limitava a arrolar estes requisitos de regularidade da quitação, e se
concluía, à época, que a falta de um deles a tornava inválida, não tendo o condão de liberar
o devedor. Hodiernamente, porém, a tecnologia fez revista a necessidade de tais requisitos,
vez que há quitações que inclusive sequer possuem corpo físico (como os pagamentos
online). Por isso, o CC de 2002 transformou estes requisitos essenciais em relativos, ou
seja, se ausentes, ainda assim poderá o juiz entender válida a quitação, se convencido de
que esta se realizou. Veja o parágrafo único do artigo 320 do CC:
“Art. 320. A quitação, que sempre poderá ser dada por instrumento particular,
designará o valor e a espécie da dívida quitada, o nome do devedor, ou quem por
este pagou, o tempo e o lugar do pagamento, com a assinatura do credor, ou do seu
representante.
Parágrafo único. Ainda sem os requisitos estabelecidos neste artigo valerá a
quitação, se de seus termos ou das circunstâncias resultar haver sido paga a
dívida.”
O que se intenta, portanto, é que a quitação seja inequívoca, ainda que carente de
formalidades exigidas.
Há situações peculiares e excepcionais em que a prova do pagamento é dispensada,
em função de uma presunção relativa, juris tantum, de que houve tal pagamento. Se o
credor, nestes casos, entender que não houve o pagamento, a presunção fará com que ele é
quem deva provar o não pagamento, ou seja, há uma inversão do ônus geral da prova do
pagamento. Exemplo em que isso ocorre é quando a obrigação for divisível, tendo sido
fracionada a prestação em diversas parcelas, e o credor emite quitação da última parcela:
presume-se que todas as anteriores tenham sido pagas. Veja o artigo 322 do CC:
Outro exemplo vem logo no artigo seguinte, quando o recibo que silencia sobre os
juros faz presumir que estes foram pagos; e no artigo 324 do CC, surge a presunção de
pagamento da prestação quando o devedor estiver na posse do título de crédito que é a
única prova que representa seu débito. Veja:
“Art. 323. Sendo a quitação do capital sem reserva dos juros, estes presumem-se
pagos.”
regra do artigo 322 do CC é aplicável: a quitação de uma prestação faz presumir pagas as
anteriores.
Tratando agora do local do pagamento, as obrigações se dividem em dois grandes
grupos: as quesíveis, ou querables, e as portáveis, ou portables. Obrigações quesíveis são
aquelas em que o local em que se deve realizar o pagamento é o domicílio do devedor, ou
seja, é o credor quem tem que se apresentar no domicílio do devedor a fim de colher o
pagamento. Esta é a modalidade que é regra geral, ou seja, no silêncio do título
obrigacional, a obrigação é querable, mas é regra dispositiva.
Ao contrário, a obrigação portável é aquela em que o pagamento deve ser feito no
domicílio do credor, ou em outro lugar qualquer que este indique, devendo o solvens ir ao
local do pagamento, portando a prestação (daí o nomen), para efetivá-lo. Para ser desta
espécie, é imperativo que haja pactuação, pois como dito a regra geral é o pagamento
quesível.
Se a obrigação for eleita portável, o credor pode se recusar, justificadamente, a
receber o pagamento em local diverso do pactuado; no mesmo sentido, o devedor só
poderá consignar em pagamento, quando portable, no lugar eleito.
Sendo quesível, se o credor não buscar o pagamento no domicílio do devedor, à
época estabelecida para vencimento, é o credor quem estará em mora – a chamada mora
accipiendi. Pode interessar ao devedor, neste caso, exercer seu direito de pagar, a fim de se
libertar do vínculo, quando então deverá consignar o pagamento. Veja que a definição do
lugar do pagamento, então, é de alta relevância, servindo até mesmo para definir quem está
em mora, se credor ou devedor.
O CC traz dois dispositivos sobre este tema que são altamente precisos, por duas
casuísticas que previnem. A primeira é a seguinte: imagine-se que o pacto estabeleça dívida
portable, sendo que o credor determina que deverá ser satisfeita em local de difícil acesso,
ou que cause algum constrangimento ao devedor. A fim de sanar esta dificuldade, o artigo
329 do CC diz o seguinte:
“Art. 329. Ocorrendo motivo grave para que se não efetue o pagamento no lugar
determinado, poderá o devedor fazê-lo em outro, sem prejuízo para o credor.”
Outra situação é aquela em que o local indicado pelo credor deixa de ser exigível do
devedor, quando a reiteração dos pagamentos aceitos em local diverso assim demonstrar.
Veja que não pode haver oposição do credor, sendo necessária a reiteração de pagamentos
incontestes em local diverso. Veja o que dispõe o artigo 330 do CC:
“Art. 330. O pagamento reiteradamente feito em outro local faz presumir renúncia
do credor relativamente ao previsto no contrato.”
“Art. 333. Ao credor assistirá o direito de cobrar a dívida antes de vencido o prazo
estipulado no contrato ou marcado neste Código:
I - no caso de falência do devedor, ou de concurso de credores;
II - se os bens, hipotecados ou empenhados, forem penhorados em execução por
outro credor;
III - se cessarem, ou se se tornarem insuficientes, as garantias do débito,
fidejussórias, ou reais, e o devedor, intimado, se negar a reforçá-las.
Parágrafo único. Nos casos deste artigo, se houver, no débito, solidariedade
passiva, não se reputará vencido quanto aos outros devedores solventes.”
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
O terceiro, interessado, pode pagar toda a dívida em seu nome, a fim de levantar a
hipoteca imposta sobre seu bem. Esta recusa não é justa, e por isso a consignação é legitima
a Matheus, e deve ser julgada procedente. Mesmo que fosse terceiro desinteressado, ainda
assim poderia consignar em pagamento, vez que o faria em nome do devedor da hipoteca.
A respeito, vide o REsp 57.766:
Questão 2
Francisco José propôs ação de cobrança em face de Nova América Cia. de Seguros
S/A, postulando o recebimento de diferença de indenização em razão de seguro por roubo
de veículo. Alegou que o objeto da avença era uma indenização correspondente ao valor
atualizado da importância segurada, limitado ao valor médio de mercado do veículo.
Confiando na informação da seguradora, recebeu e deu quitação pela quantia que aquela
lhe pagou, certo de que a mesma correspondia ao valor referido. Constatou, logo em
seguida, que o valor recebido era bem inferior ao devido e manifestou imediato protesto,
recorrendo ao Judiciário a fim de ver solucionado o litígio. Em contestação, a empresa ré
alega que o autor, pessoa acostumada a praticar atos de comércio, recebeu o valor da
indenização e outorgou à seguradora plena, rasa, geral e irrevogável quitação, liberando
a devedora e transferindo-lhe a propriedade, de sorte que nada mais pode dele reclamar
em decorrência do evento. Ademais, sustenta que, somente em casos excepcionais, a
quitação pode ser invalidada, dentre os quais não se incluem os motivos expostos pelo
autor. Dando os fatos alegados na exordial como provados, decida fundamentadamente.
Resposta à Questão 2
A quitação não é prova cabal do pagamento, podendo ser questionada sua validade,
e também sendo certo que as declarações de que a dívida adimplida foi inteiramente
cumprida são juris tantum. Veja que houve um erro, ou mesmo dolo, que levou ao credor
apor que a quitação era integral, enquanto era parcial.
Assim, deve o julgador entender que a quitação só tem valor quanto àquilo que foi
efetivamente pago, e se a dívida material persiste em valor superior, este continua sendo
exigível – a quitação é parcialmente ineficaz, apenas quanto à parte que dela excede.
Questão 3
cada um dos dois grupos divergentes procedido à eleição de seu próprio síndico, sendo que
um desses grupos contratou determinada administradora incumbida de proceder à
cobrança das cotas condominiais. Um ano depois foi ajuizada ação de nulidade da
assembléia que votou o segundo síndico e esta foi julgada procedente, acarretando o
reconhecimento de que o condomínio somente poderia ter um síndico. O condomínio
reunificado ajuíza ação de cobrança de cotas condominiais em face das pessoas que
pagaram a cota condominial a quem não devia e estas se defendem alegando que já teriam
realizado o adimplemento. Diante do conflito de interesses, qual a decisão correta?
Resposta à Questão 3
As pessoas que pagaram o fizeram de boa-fé, a credor putativo que evidenciava erro
invencível. Não se aplica a regra do “pagamento errôneo, pague-se de novo”, e portanto
não poderão ser cobradas. Estão, então, em dia com sua obrigação, não havendo débito a
ser pago. A administradora anterior deverá regredir contra a nova, que recebeu
indevidamente.
Tema VI
Extinção das Obrigações II. Formas indiretas. Pagamento por consignação. Pagamento com sub-rogação.
Imputação do pagamento. Dação em pagamento.
Notas de Aula17
1. Consignação em pagamento
Para estes casos, em que o pagamento é desejado, mas a forma direta é dificultosa para o
devedor, ou rejeitada pelo credor, o ordenamento jurídico prevê as formas de pagamento
indireto, que nada mais é que uma prestação feita de forma diversa do pagamento direto, e
que também terá o condão de liberar o devedor de sua prestação.
O grande fundamento da existência destes meios indiretos é o interesse que há, para
a sociedade, que haja satisfação dos créditos. Do contrário, a instabilidade social aumenta
em muito, pois a lide é quase invariável se há inadimplemento das obrigações.
A primeira (e mais usual) forma de pagamento indireto é a consignação em
pagamento. Vejamo-la.
Quanto à natureza jurídica, trata-se concomitantemente de um instituto de direito
material e de direito processual, sendo clara a natureza mista deste instituto.
Por conceito, o pagamento por consignação é o meio indireto do devedor exonerar-
se do liame obrigacional, consistente no depósito judicial da coisa devida, nos casos e
formas legais. Veja o artigo 334 do CC:
É de se ressaltar que não basta o mero depósito para ser considerado feito o
pagamento. É necessário, para que haja a liberação do devedor, que haja a eficácia deste
pagamento, ou seja, que este depósito seja considerado satisfatório, pelo próprio credor, ou
por sentença que constate todos os requisitos legais exigidos do depósito.
Tais requisitos legais objetivos são: o depósito integral, que deve corresponder ao
valor inteiro da dívida, diante do princípio da integralidade do pagamento; e a recusa
injusta do credor em receber a prestação, vez que não havendo recusa, não há interesse
processual, e sendo a recusa existente, mas justa, a consignação é improcedente. Outro
requisito, óbvio, é a própria existência da dívida, pois do contrário não há o que se
depositar.
Em suma, são requisitos objetivos: existência de débito líquido e certo, proveniente
da relação negocial que se pretende extinguir; oferecimento real da totalidade da prestação
devida; observância de todas as cláusulas estipuladas no negócio.
A modalidade de obrigação passível de ser consignada é somente a obrigação
positiva de dar. Não necessariamente se está falando de dinheiro, tampouco apenas de
coisas móveis: nada impede que haja o depósito de um bem imóvel, e como exemplo bem
claro e corriqueiro a devolução de um imóvel locado: se o locatário, desejoso em entregar o
imóvel ao locador, vê esta restituição recusada por seu credor, poderá consignar o imóvel
em pagamento da obrigação de restituir.
Veja que o bem a ser depositado será líquido e certo, no momento do depósito, mas
a obrigação pode ter sido ilíquida, ou incerta, até aquele momento: basta que seja
determinável, pois no momento do efetivo pagamento indireto por meio da consignação,
deverá estar individualizada.
O oferecimento real da integralidade da prestação devida é um requisito necessário
por conta de um dos principais efeitos da consignação procedente, qual seja, exonerar o
devedor de sua dívida. Mesmo por isso, uma das matérias de defesa do credor, na ação de
consignação, é a insuficiência do depósito – acarretando a improcedência do pedido, se
constatada esta carência de elemento essencial do depósito.
“Art. 890. Nos casos previstos em lei, poderá o devedor ou terceiro requerer, com
efeito de pagamento, a consignação da quantia ou da coisa devida.
§ 1o Tratando-se de obrigação em dinheiro, poderá o devedor ou terceiro optar pelo
depósito da quantia devida, em estabelecimento bancário, oficial onde houver,
situado no lugar do pagamento, em conta com correção monetária, cientificando-se
o credor por carta com aviso de recepção, assinado o prazo de 10 (dez) dias para a
manifestação de recusa.
§ 2o Decorrido o prazo referido no parágrafo anterior, sem a manifestação de
recusa, reputar-se-á o devedor liberado da obrigação, ficando à disposição do
credor a quantia depositada.
§ 3o Ocorrendo a recusa, manifestada por escrito ao estabelecimento bancário, o
devedor ou terceiro poderá propor, dentro de 30 (trinta) dias, a ação de
consignação, instruindo a inicial com a prova do depósito e da recusa.
§ 4o Não proposta a ação no prazo do parágrafo anterior, ficará sem efeito o
depósito, podendo levantá-lo o depositante.”
Vale deixar claro que este rol não é taxativo. O artigo 890 do CPC, já transcrito,
dispõe que a consignação é justificada nos casos previstos em lei, e não no CC.
Doutrinariamente se conclui, então, que sempre que algum diploma legal previr a
consignação, esta é cabível.
O inciso I deste artigo 335 é a recusa injustificada do credor em receber o
pagamento direto ou dar quitação, e é a hipótese mais corriqueira, na casuística.
O inciso II trata das dívidas quesíveis, quando o credor deixa de buscar a prestação
no domicílio do devedor. Veja que, mesmo o credor estando em mora, a obrigação subsiste,
e o devedor pode dela querer se liberar, o que o fará pela consignação em pagamento.
O inciso III, auto-explicativo, não é hipótese muito freqüente, ao contrário do IV: a
dúvida sobre quem é o credor é bastante freqüente, especialmente em relações
previdenciárias e securitárias. Os autores mais modernos defendem que a dúvida é
fundamento para a consignação desde que seja razoável, ou seja, desde que a circunstância
realmente traga dúvida plausível. Neste caso, há uma análise bipartida: primeiro, se analisa
a integralidade do depósito e a razoabilidade da dúvida; feito isso, o juiz libera o devedor e
o exclui do processo, o qual terá seguimento, em procedimento ordinário, para solucionar a
disputa entre os credores – decidindo, ao final, quem deverá levantar o depósito. E veja
uma situação peculiar: se porventura se demonstrar realmente duvidosa a titularidade do
crédito, mas o autor-devedor não depositou a integralidade, a consignação será julgada
improcedente, e o depósito será restituído ao próprio devedor.
Veja, a respeito, a apelação cível 2000.001.14998, do TJ/RJ:
Pelo ensejo, vale tratar aqui da sentença da ação consignatória. Em que pese ser
meramente declaratória, o que é inconteste quando for de procedência, há um a tremenda
particularidade a ser observada quando a sentença for de improcedência por se constatar
que o valor foi depositado a menor: segundo Sylvio Capanema, a sentença de
improcedência, nestes moldes, é uma das raríssimas exceções em que, mesmo sendo
declaratória negativa, poderá ser executada pelo credor pelo valor faltante que foi
identificado no processo, a teor do artigo 899, § 2º, do CPC:
“Art. 899. Quando na contestação o réu alegar que o depósito não é integral, é
lícito ao autor completá-lo, dentro em 10 (dez) dias, salvo se corresponder a
prestação, cujo inadimplemento acarrete a rescisão do contrato.
§ 1o Alegada a insuficiência do depósito, poderá o réu levantar, desde logo, a
quantia ou a coisa depositada, com a conseqüente liberação parcial do autor,
prosseguindo o processo quanto à parcela controvertida.
§ 2o A sentença que concluir pela insuficiência do depósito determinará, sempre
que possível, o montante devido, e, neste caso, valerá como título executivo,
facultado ao credor promover-lhe a execução nos mesmos autos.”
Veja que, a rigor, não se trata de sentença dúplice; ela apenas declara que a
pretensão à quitação do autor não é procedente, pois há valor faltante (que deve ser
determinado pelo juiz). Sendo assim, é mesmo improcedente e executável, e por isso é
excepcionalíssima.
Como se pôde perceber, o depósito, de per si, não é suficiente para liberar o
devedor: é apenas um requisito essencial da pretensão, sendo a liberação alcançada quando
houver sentença de procedência.
Assim, são efeitos da sentença de procedência da consignação: exonerar o devedor;
constituir o credor em mora; cessar, para o depositante, os juros da dívida e os riscos a que
estiver sujeita a coisa; e liberar os fiadores.
Se improcedente a consignação, tais são os efeitos da sentença: manter o devedor na
posição em que se encontrava; caracterizar a mora solvendi; e responsabilizar o devedor
pelas despesas processuais.
O levantamento do depósito pode ocorrer em diversos momentos, e por diversos
motivos. O CC é auto-explicativo, sobre este levantamento, valendo apenas observar os
artigos 338 e seguintes:
“Art. 338. Enquanto o credor não declarar que aceita o depósito, ou não o
impugnar, poderá o devedor requerer o levantamento, pagando as respectivas
despesas, e subsistindo a obrigação para todas as conseqüências de direito.”
“Art. 340. O credor que, depois de contestar a lide ou aceitar o depósito, aquiescer
no levantamento, perderá a preferência e a garantia que lhe competiam com
respeito à coisa consignada, ficando para logo desobrigados os co-devedores e
fiadores que não tenham anuído.”
Por conceito, sub-rogação pessoal vem a ser a substituição, nos direitos creditórios,
daquele que solveu a obrigação alheia ou emprestou a quantia necessária para o pagamento
que satisfez o credor. Em outras palavras, é a substituição da pessoa do credor, assumida
sua posição por um terceiro pagador.
Na sub-rogação, há a satisfação do credor, sem que haja liberação do devedor, que
continua vinculado ao débito, mas agora havendo por credor a pessoa que sub-rogou-se.
A natureza jurídica da sub-rogação pessoal é de um instituto autônomo, mediante o
qual o crédito, com o pagamento feito por terceiro, se extingue ante o credor satisfeito, mas
não em relação ao devedor, tendo-se apenas uma substituição legal ou convencional do
sujeito ativo. A sub-rogação é, pois, uma forma de pagamento que mantém a obrigação,
apesar de haver a satisfação do primitivo credor.
Como o vínculo obrigacional é mantido exatamente como o era, originalmente, o
novel credor conta com todas as prerrogativas, todos os acessórios e garantias que existiam
no pólo ativo, antes da substituição pessoal procedida. A obrigação não foi extinta: apenas o
credor original deixou a relação, dando lugar ao sub-rogado.
O pagamento efetuado por terceiro interessado diferencia-se do feito por terceiro
não interessado justamente neste aspecto da sub-rogação: quando se trata de interessado, há
a sub-rogação nos direitos do credor; quando o terceiro pagador é não interessado, apenas
ganha direito de regresso, e não sub-rogação, o que lhe concede muito menos direitos do
que àquele que se sub-roga. Veja: sub-rogação implica em ganho da posição de credor, com
todos os consectários; regresso é direito apenas a ser reembolsado do que pagou.
A sub-rogação legal, imposta pela lei, se encontra versada no artigo 346 do CC:
3. Imputação do pagamento
“Art. 352. A pessoa obrigada por dois ou mais débitos da mesma natureza, a um só
credor, tem o direito de indicar a qual deles oferece pagamento, se todos forem
líquidos e vencidos.”
“Art. 353. Não tendo o devedor declarado em qual das dívidas líquidas e vencidas
quer imputar o pagamento, se aceitar a quitação de uma delas, não terá direito a
reclamar contra a imputação feita pelo credor, salvo provando haver ele cometido
violência ou dolo.”
“Art. 354. Havendo capital e juros, o pagamento imputar-se-á primeiro nos juros
vencidos, e depois no capital, salvo estipulação em contrário, ou se o credor passar
a quitação por conta do capital.”
“Art. 355. Se o devedor não fizer a indicação do art. 352, e a quitação for omissa
quanto à imputação, esta se fará nas dívidas líquidas e vencidas em primeiro lugar.
Se as dívidas forem todas líquidas e vencidas ao mesmo tempo, a imputação far-se-
á na mais onerosa.”
4. Dação em pagamento
Por conceito, dação em pagamento vem a ser um acordo liberatório, feito entre
credor e devedor, em que o credor consente na entrega de uma coisa diversa da avençada. O
objeto da dação é uma prestação de qualquer natureza, não sendo de dinheiro: bem imóvel
ou móvel, fatos e abstenções.
É imperativa a aceitação do credor, pois a alteração do objeto não é direito
potestativo do devedor.
A natureza jurídica da dação e de pagamento indireto, por ser um acordo liberatório,
com o intuito de extinguir relação obrigacional, derrogando o princípio que obriga o
devedor a fornecer exatamente o objeto prometido, pois lhe permite, com anuência do
credor, entregar coisa diversa daquela a que se obrigara.
Veja que o valor das prestações não guarda relação de obrigatoriedade de
correspondência: o objeto da dação não precisa ser de mesmo valor que o objeto original,
podendo ser maior ou menor – basta que o credor anua em sua substituição.
São requisitos da dação: a existência de um débito vencido; o animus solvendi; a
diversidade do objeto oferecido em relação ao devido; e a concordância do credor na
substituição. Veja: se o débito não estiver vencido, não há ainda a configuração de devedor,
e a dação pode ser uma mera doação; o animus solvendi é a vontade de pagar a obrigação; e
a diversidade de objetos é mera lógica, pois senão se trata de pagamento direto.
O efeito da dação, como pagamento indireto, é a extinção da dívida. Mas se o credor
receber objeto não pertencente ao solvens, e se houver a sua reivindicação por terceiro, que
prove ser seu proprietário, ter-se-á evicção, e assim vai se restabelecer a obrigação
primitiva, ficando sem efeito a quitação dada. Veja o artigo 359 do CC:
Há algumas causas que nulificam a dação em pagamento que devem ser apontadas
aqui: é nula a dação feita por erro, bem como a que é compreensiva de todos os bens do
devedor, deixando-o à míngua de patrimônio. Também é nula a dação feita por ascendente a
descendente, sem o consentimento dos demais, vez que pode significar violação das regras
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
“Súmula 188, STF: O segurador tem ação regressiva contra o causador do dano,
pelo que efetivamente pagou, até ao limite previsto no contrato de seguro.”
Repare que esta posição, datada de 2000, leva em conta o tratamento da matéria
pelo CC de 1916. Hoje, há uma norma expressa no CC de 2002 que, apesar de trazer
previsão que parece alterar substancialmente toda a concepção, não se aplica ao caso em
tela no sentido literal: a seguradora não pode ser prejudicada por atos do segurado que
disponham do seu crédito, a teor do artigo 786, § 2º, do CC, mas, no caso, o acordo não
diminuiu ou extinguiu direitos da seguradora; na verdade, esta ainda tem o direito de reaver
o que pagou, mas agora este direito deve ser exercido contra o próprio segurado, por
fundamento em enriquecimento sem causa, enquanto que na situação padrão o direito seria
exercido contra o causador do dano, por sub-rogação. Veja:
Tema VII
Extinção das Obrigações III. Formas indiretas. Novação. Compensação. Confusão. Remissão de dívidas.
Notas de Aula18
1. Confusão
18
Aula proferida pelo professor Sylvio Capanema de Souza, em 14/10/2008.
“Art. 384. Cessando a confusão, para logo se restabelece, com todos os seus
acessórios, a obrigação anterior.”
2. Remissão
“Art. 385. A remissão da dívida, aceita pelo devedor, extingue a obrigação, mas
sem prejuízo de terceiro.”
A regra é simples: só pode remitir seu devedor o credor que após a remissão
continuar solvente. Veja: se o credor de uma relação por quantia de cem é devedor em
outra, diante de outra pessoa, por quantia de oitenta, e em seu patrimônio só possui como
ativo aquele crédito de cem, é ainda solvente, porque seu passivo é menor que o ativo. Este
indivíduo não poderá remitir a divida de cem integralmente, pois se tornará insolvente;
poderá, no máximo, remitir parcialmente a dívida, pelos vinte que seu ativo excede o
passivo, quando então ainda continuará solvente. Se proceder à remissão total, o seu credor
pelos oitenta disporá de ação pauliana, a fim de anular esta remissão, que se demonstrou
uma fraude contra credores.
A remissão é irrevogável, não admitindo arrependimento desde quando for levada
ao conhecimento do devedor – momento em que a obrigação se extinguiu. Nada impede,
porém, que se existir um vício de consentimento qualquer, a remissão seja anulada, como
qualquer negócio jurídico.
Por óbvio, outro óbice à remissão é a indisponibilidade do crédito: se o credor tiver
seu crédito penhorado, é claro que não mais poderá remitir seu devedor.
3. Novação
Consiste na extinção de uma obrigação para que em seu lugar surja uma nova
obrigação. É a substituição de uma obrigação por uma nova.
Pressuposto essencial, inafastável, da novação, é que a obrigação original tenha sido
extinta, dando lugar a uma nova obrigação. Veja que as meras modificações na obrigação,
em aspectos da obrigação, não são novações – são mesmo meras modificações, meros
aditamentos. Se não houver a extinção da obrigação, não se pode falar em novação.
Se é possível a livre modificação das obrigações, qual é a necessidade de se
proceder à novação? Há situações em que as divergências em uma obrigação são tão
severas, que a mera alteração não é suficiente para sanar todos os conflitos. Por isso, as
partes preferem pôr fim àquela obrigação original, e reiniciar a relação, mas sem solução
temporal entre um vínculo e outro: a extinção se dá pela própria iniciação da nova
obrigação.
Assim, é necessária a presença de um outro elemento, este subjetivo: o animus
novandi, a intenção em inovar, em criar uma nova obrigação em substituição à antiga,
extinta. Veja o que diz o artigo 361 do CC:
“Art. 361. Não havendo ânimo de novar, expresso ou tácito mas inequívoco, a
segunda obrigação confirma simplesmente a primeira.”
“Art. 367. Salvo as obrigações simplesmente anuláveis, não podem ser objeto de
novação obrigações nulas ou extintas.”
“Art. 363. Se o novo devedor for insolvente, não tem o credor, que o aceitou, ação
regressiva contra o primeiro, salvo se este obteve por má-fé a substituição.”
4. Compensação
ao contrário do que se possa pensar. Se uma das prestações for infungível, não há como se
compensar
Além disso, as prestações precisam ser da mesma espécie, e da mesma qualidade.
As prestações devem também ser certas e líquidas, pois o cálculo não poderá ser
feito, se não o forem.
Outro requisito é a exigibilidade: ambas as prestações precisam ser exigíveis para
serem compensáveis. Do contrário, se uma delas não for exigível, estar-se-ia impondo a
antecipação do pagamento àquele devedor cuja prestação ainda não é vencida.
Presentes todos os requisitos, as partes não podem negar a compensação, a não ser
que no negócio se tenha consignado expressamente a sua vedação. Recusando-se a
compensar, aquele devedor que se sentir prejudicado poderá consignar em pagamento a
diferença daquilo que compensaria, pois esta recusa é injusta.
Como dito, a compensação pode ser total ou parcial, sem problemas. Se há a total,
ambas as obrigações são extintas. Na compensação parcial, ainda haverá um pagamento por
ser feito, da diferença não compensada.
A princípio, a origem do débito, a causa da prestação, é irrelevante para a
possibilidade de compensação: se uma vem de um contrato de locação, e outra de uma
compra e venda, nada há de relevante; ambas são dívidas pecuniárias, compensáveis.
Todavia, há exceções: se uma das prestações resulta de ilícito penal, não poderá haver
compensação, pois se estaria legitimando o ato ilícito, praticamente convalidando-o. Outra
exceção é quando uma das prestações devidas tem caráter alimentar: não se a pode deixar
de pagar, a título de compensação. Isto porque a verba alimentar é subsistencial, e não pode
a subsistência ser detrida por qualquer outra satisfação creditícia. Da mesma forma, os
salários não são compensáveis, pois têm esta mesma natureza alimentar.
A reciprocidade de débitos e créditos é pressuposto inafastável da compensação,
como dito, mas há uma única exceção: o fiador, instado a pagar a dívida pela qual se
responsabilizou, pode compensar a dívida pelo crédito de seu afiançado perante o credor.
Veja: se o afiançado é credor de seu credor, ele tem reciprocidade, mas o fiador não;
contudo, é uma exceção perfeitamente cabível, pois não representa prejuízo a nenhum dos
envolvidos. O fiador pode compensar com o credor aquilo que o credor deve ao afiançado.
Veja o artigo 371 do CC:
“Art. 371. O devedor somente pode compensar com o credor o que este lhe dever;
mas o fiador pode compensar sua dívida com a de seu credor ao afiançado.”
4.1. Solidariedade e compensação
Sobre este tema, a análise é mais bem feita de forma indutiva. Imagine-se que há
três credores solidários, diante de um devedor, por dívida de trezentos, e cada um com um
quinhão de cem. Um dos credores solidários, em outra relação absolutamente desvinculada
desta, é devedor singular daquele devedor da obrigação de pólo ativo solidário, por cento e
quarenta.
Um dos credores solidários, diverso deste que tem dívida recíproca, cobra do
devedor a integralidade, os trezentos. Poderia o devedor alegar compensação dos cento e
quarenta, contra este credor, sendo que seu crédito é perante outro credor?
Veja: contra os credores solidários, a compensação pode ser requerida, mas somente
até o quinhão que ao credor-devedor incumbe naquela relação. O devedor pode compensar
com um dos credores o que outro credor lhe dever, mas apenas até o limite do quinhão do
credor-devedor na dívida comum – que no exemplo, é de cem.
A razão técnica é que o devedor não pode opor a um dos credores comuns exceção
pessoal que tenha contra outro credor. No exemplo, o valor de cem é uma exceção comum,
pois integra a dívida comum, consubstanciando-se no quinhão do seu devedor naquele
crédito; todavia, os quarenta remanescentes, se fossem opostos, invadiriam as parcelas que
incumbem aos demais, ou seja, seria uma dívida pessoal de um dos co-credores invadindo
os quinhões dos demais.
Casos Concretos
Questão 1
João ajuizou embargos à execução de nota promissória que lhe move Banco do
Brasil S/A, alegando a iliquidez do título pois decorrente de empréstimo para cobrir saldo
devedor de conta corrente, com presença de cláusulas abusivas de juros remuneratórios
acima do limite legal de 12% a.a, capitalização mensal e cobrança de multa de 10%. Em
admitindo a vinculação da nota promissória quando da celebração do contrato de conta
corrente, pode o devedor ou avalista discutir em juízo o débito em cobrança? Após a
apuração do saldo devedor, assinada uma nota promissória em realização de uma novação
da dívida, tem o estabelecimento bancário título hábil para promover sua execução? A
novação impede o exame da abusividade dos critérios de apuração do saldo devedor? Se
vinculada a contrato de abertura de crédito, perde a nota promissória as atribuições de
autonomia e literalidade?
Resposta à Questão 1
Questão 2
Resposta à Questão 2
“(...)
III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio
público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos;
(...)”
A diferença entre a ação penal pública e a ação cível pública reside apenas na
matéria que é tratada em cada uma, sendo que ambas são dedicadas à proteção do bem
comum – na penal a segurança pública, e na cível quaisquer outros bens coletivos ou
difusos. Assim sendo, se o MP pode buscar suporte fático para a promoção da ação civil
pública diretamente, porque não o poderia na ação penal? é por isso que este é um
argumento sólido a favor do exercício da polícia judiciária pelo MP.
Há ainda que se mencionar como fundamento a previsão do artigo 129, IX, da
CRFB:
“(...)
IX - exercer outras funções que lhe forem conferidas, desde que compatíveis com
sua finalidade, sendo-lhe vedada a representação judicial e a consultoria jurídica de
entidades públicas.
(...)”
na seara cível a mesma possibilidade na órbita criminal. Todavia, este inciso dependeria de
previsão expressa infraconstitucional que conferisse expressamente tal atribuição ao MP,
sendo matéria tratada na Lei Complementar 75/93 e na Lei Orgânica do MP, Lei 8.625/93,
nesta constando do artigo 26, incisos II e IV:
Questão 3
Resposta à Questão 3
Tema VIII
Transmissão das Obrigações. Cessão de crédito. Conceito e natureza. Validade da cessão de crédito entre as
partes e em relação a terceiros. Responsabilidade do cedente. Efeitos da cessão. Assunção de dívida.
Conseqüências.
Notas de Aula19
São partes, lato sensu, de cessão de crédito o cedente, que repassa o seu crédito; o
cessionário, que é o que recebe o crédito; e o cedido, que é o devedor daquele crédito. É
importante ressaltar, porém, que este contrato não é triangular: é bilateral, e só são partes
dele o cedente e o cessionário.
Todavia, o devedor, cedido, deve ser notificado, pois a ciência de quem é o seu
accipiens é fundamental, vez que deve poder pagar com segurança. Veja o artigo 290 do
CC:
“Art. 290. A cessão do crédito não tem eficácia em relação ao devedor, senão
quando a este notificada; mas por notificado se tem o devedor que, em escrito
público ou particular, se declarou ciente da cessão feita.”
Uma vez notificado eficazmente, se o cedido pagar ao cedente, terá pago mal, e não
se libertará da dívida perante o cessionário. Se acionado por este, deverá pagar, mas terá
regresso contra o cedente. Se não foi notificado, contudo, não é eficaz a cessão contra si, e
19
Aula proferida pelo professor Ricardo Cyfer, em 14/10/2008.
terá pago bem se pagou ao cedente – cabendo ao cessionário agir contra o cedente pelo
crédito.
O artigo 286 do CC traça as linhas gerais a respeito de quais créditos são passíveis
de cessão:
“Art. 286. O credor pode ceder o seu crédito, se a isso não se opuser a natureza da
obrigação, a lei, ou a convenção com o devedor; a cláusula proibitiva da cessão
não poderá ser oposta ao cessionário de boa-fé, se não constar do instrumento da
obrigação.”
A regra geral é a liberdade em ceder o crédito, mas assim como quaisquer negócios
que envolvam bens têm restrições, a cessão de crédito tem estes limites traçados na lei.
A cláusula proibitiva de cessão pode ser livremente pactuada pelas partes (similar a
uma cláusula de inalienabilidade, fosse um bem corpóreo).
Há também proibições expressas na lei, assim como se vê, por exemplo, no artigo
520 do CC:
“Art. 520. O direito de preferência não se pode ceder nem passa aos herdeiros.”
A última ressalva ao direito de ceder, presente neste artigo 286 do CC, é quando a
própria natureza da obrigação impede a cessão. Trata-se das obrigações em que os créditos
são ligados à natureza de subsistência, como os créditos alimentares, ou salariais.
Há ainda mais uma restrição à cessão, que vem consignada no artigo 298 do CC:
“Art. 298. O crédito, uma vez penhorado, não pode mais ser transferido pelo
credor que tiver conhecimento da penhora; mas o devedor que o pagar, não tendo
notificação dela, fica exonerado, subsistindo somente contra o credor os direitos de
terceiro.”
Este óbice é processual, qual seja, se o crédito for penhorado, estará indisponível.
A respeito dos efeitos da cessão de crédito, os artigos 295 e 296 do CC são
fundamentais:
“Art. 295. Na cessão por título oneroso, o cedente, ainda que não se responsabilize,
fica responsável ao cessionário pela existência do crédito ao tempo em que lhe
cedeu; a mesma responsabilidade lhe cabe nas cessões por título gratuito, se tiver
procedido de má-fé.”
“Art. 296. Salvo estipulação em contrário, o cedente não responde pela solvência
do devedor.”
Se for da vontade das partes, pode ser criada uma obrigação pro solvendo, quando o
cedente passará a ser responsável subsidiário pelo adimplemento do crédito, e não somente
pela sua existência.
Numa cessão de crédito onerosa pro solvendo, o cedente terá maior compensação
pelo crédito cedido, pois a garantia que oferece ao cessionário é muito maior. Sendo pro
soluto, ou seja, garantida apenas a existência do crédito, o cessionário pagará menos pelo
crédito que lhe é cedido, pois a garantia é menor.
Os contratos de factoring, que nada mais são do que cessões de créditos que são
oriundos de títulos de crédito, nos quais o faturizador é o cessionário, é vedada a
constituição de cessão pro solvendo. Isto porque, por natureza, a empresa de factoring
compra o risco, e se fosse pro solvendo, seu risco seria muito baixo. Se há esta cláusula em
contratos de faturização, é nula. Nada impede, outrossim, que em cessões entre particulares
seja criada a cessão pro solvendo.
A cessão de crédito, em regra, como qualquer contrato, só gera efeitos entre os
contratantes, vez que vige o princípio da relatividade. Mas este princípio está longe de ser
absoluto. E um dos exemplos de exceção a este princípio vem no artigo 294 do CC:
“Art. 294. O devedor pode opor ao cessionário as exceções que lhe competirem,
bem como as que, no momento em que veio a ter conhecimento da cessão, tinha
contra o cedente.”
Também chamada cessão de débito, esta operação tem natureza jurídica de contrato,
que pode ser oneroso ou gratuito, ou seja, quem assume o débito pode fazê-lo sem custo, ou
mediante alguma contraprestação.
Diferença fundamental entre este contrato e a cessão de crédito é que enquanto este
último é bilateral, não fazendo parte do negócio o devedor, cedido, e portanto não tendo
este qualquer ingerência sobre a sua efetivação (bastando ser notificado, como visto), na
assunção da dívida a participação dos três envolvidos – assuntor (cessionário da dívida),
cedente e cedido – é por vezes necessária.
Veja: há duas espécies de assunção de dívida, aquela que é celebrada entre credor e
terceiro, que é denominada cessão por extromissão; e a que é celebrada por devedor e
terceiro, denominada cessão por delegação. A primeira, de fato, consiste em uma expulsão
do devedor da relação, procedida pelo credor; nesta, não há mera autorização do credor
para substituição do pólo devedor: há uma ação direta deste nesta expulsão, afinal é ele
próprio quem está contratando com o terceiro.
20
Se a cessão for pro soluto, o cedente, em verdade, não teria interesse em negativar o nome do devedor, pois
só responde pela existência, e não pela solvência do crédito; se for pro solvendo, aí sim há interesse do
cedente no adimplemento do crédito, pois senão será responsável pelo pagamento.
Em regra, a manifestação de vontade das partes deve ser expressa (ou tácita), e o
silêncio é ausência de manifestação. Contudo, nestes casos ali previstos, o silêncio assume
natureza de manifestação positiva de vontade, e a casuística demanda interpretação. Um
exemplo seria o de um contrato renovado sucessivamente, mês a mês: se os contratantes
habituais não se opuserem, o silêncio importa em anuência, em renovação do contrato.
Mas, reitere-se, a regra é que o silêncio é ausência de manifestação de vontade. Como
exemplo, um cartão de crédito enviado sem ser solicitado: se o destinatário não fizer
absolutamente nada, o negócio é inexistente.
Há ainda situações em que se verifica o chamado silêncio qualificado. Veja que a
cláusula geral, do artigo 111, demanda análise das circunstâncias casuísticas para que o
silêncio ganhe significância; no silêncio qualificado, a própria lei exprime o significado
que o silêncio assume, se é manifestação positiva ou negativa. Dito isso, a aceitação do
credor da assunção de dívida é um caso típico de silêncio qualificado. Veja o parágrafo
único do artigo 299:
“Art. 303. O adquirente de imóvel hipotecado pode tomar a seu cargo o pagamento
do crédito garantido; se o credor, notificado, não impugnar em trinta dias a
transferência do débito, entender-se-á dado o assentimento.”
Mas veja que as garantias não se repristinam, pois o terceiro não pode ser
prejudicado pela nulidade, salvo se este terceiro garantidor soubesse da nulidade, quando se
desonerou.
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
Na verdade, o banco “A” tem legitimidade. É que só pode ajuizar a ação de rescisão
contratual quem tenha participação no contrato, e o terceiro, que é cessionário apenas do
crédito, nada tem com a relação original. Apesar de ter cedido o crédito, continua sendo o
contratante. Não tem razão, portanto, Belarmino.
O STJ, no REsp 97.554, assim se posicionou:
Questão 2
Resposta à Questão 2
Tema IX
Inadimplemento das Obrigações I. Inadimplemento absoluto e relativo. Mora. Espécies. Efeitos. Mora
presumida. Juros de mora. Purgação da mora.
Notas de Aula21
1. Inadimplemento
podemos esclarecer o instituto como sendo aquele pelo qual em um negócio jurídico se
concede em garantia a propriedade de um bem que é de sua propriedade ou que acabara de
ser seu em razão de uma relação triangular.
Inicialmente, tal instituto se incorporou ao ordenamento para favorecer as
instituições financeiras, tendo como objeto bens móveis infungíveis. Posteriormente foi
ampliado o rol, permitindo-se também a ter como objeto bens imóveis, bem como a
possibilidade de realização do negócio por pessoas jurídicas que não fossem instituições
financeiras.
Antes da Lei 10.931/04, o devedor que deixava de pagar as parcelas poderia sofrer a
busca e apreensão do bem; esta, depois de efetivada, possibilitava ao devedor purgar a mora
acrescida dos encargos e mantendo o contrato em relação às parcelas vincendas. A polêmica
era se a purga poderia se dar a qualquer momento da inadimplência, e daí se discutia qual o
percentual do débito deveria já se encontrar pago para que se concedesse a possibilidade do
devedor purgar a mora. A posição do STJ era de que a purga da mora seria tida como direito
do devedor, desde que este já tivesse pagado ao menos quarenta por cento do contrato.
Cumpre trazer o artigo 3º do referido decreto, com as respectivas alterações pela Lei
10.931/04, que assenta:
Assim, a pergunta que se faz é se, diante do texto do referido decreto, ainda caberia
a purga da mora. A resposta varia: caso a interpretação do referido dispositivo se dê de
forma literal a resposta seria negativa, pois o § 2º fala em toda a dívida ou execução total
do contrato, e não em mora. Nesse sentido, o TJ/RJ tem decisões em que se exige todo o
pagamento do contrato para receber o bem em sede de busca e apreensão, devendo ser a
discussão sobre a legitimidade ou não das cobranças ser feita a posteriori. Para corroborar
o exposto, deve ser salientado que a contestação deveria ser apresentada no prazo de quinze
dias, ao passo que o referido pagamento deveria ocorrer em cinco dias.
De forma contrária, ao interpretar o dispositivo de forma principiológica, tem-se
que a obrigação não é estática, mas sim dinâmica, devendo ser analisado casuisticamente
acerca da utilidade ou impossibilidade. A exclusão do direito a purgar a mora acabaria por
violar a função social do contrato, ignorando o fato de que quando o devedor contrata em
sede de alienação fiduciária em garantia seria justamente pela impossibilidade financeira
deste fazer o pagamento de forma imediata (à vista), sendo caracterizado um abuso de
direito.
Nesse sentido, o legislador acabou por retirar o limite mínimo objetivo previsto em
lei para purgação da mora, deixando a critério do julgador reputar casuisticamente se seria
legítima ou ilegítima esta purgação, independentemente de um patamar mínimo.
Diante do exposto, há julgados no próprio TJ/RJ no sentido de permitir a purga da
mora pelo devedor, levando-se consideração somente às parcelas vincendas acrescidas os
encargos legais, ignorando as vencidas. Este entendimento tende a prevalecer, posto o
caráter principiológico da matéria.
Em suma, sobre o inadimplemento, este é absoluto quando resulta da
impossibilidade ou inutilidade da prestação contraída; a inutilidade está no parágrafo único
do artigo 395 do CC, em que se permite a conversão em perdas e danos, em conformidade
com o artigo 187, do CC:
“Art. 395. Responde o devedor pelos prejuízos a que sua mora der causa, mais
juros, atualização dos valores monetários segundo índices oficiais regularmente
estabelecidos, e honorários de advogado.
Parágrafo único. Se a prestação, devido à mora, se tornar inútil ao credor, este
poderá enjeitá-la, e exigir a satisfação das perdas e danos.
“Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo,
excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela
boa-fé ou pelos bons costumes.”
Envolve o retardo no adimplemento, ou seja, mesmo que não tenha sido solvido
ainda, poderá ser, posto ainda ser útil e possível na relação entre credor e devedor. Não
enseja a conversão em perdas e danos, mas sim a reclamação da obrigação principal
acrescida dos encargos moratórios.
Tais encargos são: juros de mora; correção monetária; multa moratória 25; honorários
de advogado26; custas judiciais; verbas sucumbenciais; e indenização suplementar27.
Assim, se faz necessário discorrer acerca dos institutos de forma específica.
Importa salientar que a ausência de previsão no contrato acerca dos juros de mora
não tem o condão de ilidir sua aplicação, pois tal encargo é moratório, sendo devido a partir
do momento da configuração da mora, não havendo que se falar em sua cobrança antes do
advento do inadimplemento relativo.
Os juros têm caráter de ressarcimento do capital que deveria estar à disposição do
credor a partir do vencimento, pois se trata de ilícito, sendo desnecessária a previsão
contratual.
Mesmo destino não possuem os juros remuneratórios ou compensatórios, posto ser
necessária a sua previsão no pacto para ensejar a sua cobrança.
Os artigos que regem a matéria são:
“Art. 395. Responde o devedor pelos prejuízos a que sua mora der causa, mais
juros, atualização dos valores monetários segundo índices oficiais regularmente
estabelecidos, e honorários de advogado.
Parágrafo único. Se a prestação, devido à mora, se tornar inútil ao credor, este
poderá enjeitá-la, e exigir a satisfação das perdas e danos.”
“Art. 406. Quando os juros moratórios não forem convencionados, ou o forem sem
taxa estipulada, ou quando provierem de determinação da lei, serão fixados
segundo a taxa que estiver em vigor para a mora do pagamento de impostos
devidos à Fazenda Nacional.”
A dúvida freqüente é acerca de qual taxa deve ser aplicada, se a SELIC ou o um por
cento do CTN. O primeiro entendimento seria o exposto no enunciado 20 da I jornada do
CJF, já transcrito, que entende que deveria ser aplicada a taxa de um por cento prevista no
artigo 161, § 1º, do CTN. Nesse sentido, veja a súmula 95 do TJ/RJ:
“Súmula 95, TJ/RJ: JUROS MORATÓRIOS. ART. 406. NOVO CÓDIGO CIVIL.
CRITÉRIO DE INCIDÊNCIA. CRITÉRIO DE FIXAÇÃO.
Os juros, de que trata o art. 406, do Código Civil de 2002, incidem desde sua
vigência, e são aqueles estabelecidos pelo art. 161, parágrafo 1º, do Código
Tributário Nacional.”
bojo do índice SELIC, se acabaria por realizar correção mensal – posto ser sabido por nós
que os juros são reajustados mensalmente –, gerando um conflito com a legislação vigente
acerca da matéria.
Tais questões não estão respondidas, posto a surpresa quando da adesão do STJ a
tese da SELIC.
Há outra discussão, que diz respeito que, à época da edição do CC de 2002, não
havia sido revogado o artigo 19228 da CRFB; logo, os juros de mora seriam de até doze por
cento ao ano. Assim, esta tese entende que seria inconstitucional o artigo 406, CC caso este
se vincule a SELIC, pois esta é superior àquele limite.
Somente é pacífico à impossibilidade de cumulação do índice SELIC com a
correção monetária.
Ainda sobre os juros, estes poderiam ser cobrados uns sobre os outros, o chamado
anatocismo, conforme assenta o artigo 591 do CC, desde que fosse anualmente. Veja:
28
A súmula vinculante n.º 7 entendia o art. 192, CRFB/88 como não sendo auto-aplicável.
“Art. 395. Responde o devedor pelos prejuízos a que sua mora der causa, mais
juros, atualização dos valores monetários segundo índices oficiais regularmente
estabelecidos, e honorários de advogado.
Parágrafo único. Se a prestação, devido à mora, se tornar inútil ao credor, este
poderá enjeitá-la, e exigir a satisfação das perdas e danos.”
Tal artigo, em seu parágrafo único, traz a conversão do adimplemento relativo em
absoluto, logo da mora a perdas e danos.
“Art. 396. Não havendo fato ou omissão imputável ao devedor, não incorre este em
mora.”
Para melhor interpretar este dispositivo, necessário se faz verificar a regra prevista
no artigo 393 do CC: a responsabilidade é subjetiva.
“Art. 393. O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou
força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado.
Parágrafo único. O caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato necessário,
cujos efeitos não era possível evitar ou impedir.”
No entanto, tendo ocorrido o vencimento, e não tendo sido adimplida, a culpa seria
presumida, cabendo ao devedor comprovar o caso fortuito ou força maior, ilidindo a sua
responsabilidade. A exceção seria em sede de responsabilidade objetiva, tais como em
relações consumeristas.
“Art. 397. O inadimplemento da obrigação, positiva e líquida 29, no seu termo,
constitui de pleno direito em mora o devedor.
Parágrafo único. Não havendo termo, a mora se constitui mediante interpelação
judicial ou extrajudicial.”
O artigo 397, por sua vez, trata-se do dies interpelatt pro homine, ou seja, o simples
vencimento já constituiria em mora o devedor, sendo uma mora ex re. Dá-se em sede de
obrigação positiva (dar ou fazer)30.
Dúvida há acerca do momento em que ocorrerá a constituição em mora, incidindo
os juros de mora. Esta, segundo Nery, Cavallieri e Cláudia Marques, se daria partir do
vencimento, não havendo que se falar em citação válida.
No entanto, não havendo termo ou liquidez, a mora se dará a partir de uma
interpelação judicial ou extrajudicial, posto se tratar de mora ex persona. Dúvida há se esta
teria o condão de interromper a prescrição, devendo prevalecer a tese de que somente teria
tal efeito a interpelação judicial, posto a extrajudicial não figurar no rol do artigo 202 do
CC. Ademais, o ato que teria o condão de interromper a prescrição seria o “cite-se”.
Dúvida também há acerca da possibilidade de interrupção da prescrição, em que
pese esta, pelos ditames do artigo 202 do CC, somente poder ocorrer uma vez. Há um
primeiro entendimento capitaneado por Caio Mario, que orienta ignorar a referida norma,
podendo a interrupção da prescrição se operar quantas vezes puder ser proposta a demanda,
ou seja, até o limite da perempção. Outro entendimento, majoritário, assenta pela aplicação
29
A obrigação líquida seria aquela em que é certa quanto à existência e qualidade, logo sendo exigível e
determinado quanto ao objeto mediato.
30
Faz-se necessário salientar que em se tratando de obrigação de “não fazer” não há mora, posto o simples
comportamento positivo, quando se comprometera por abster-se, acabaria por gerar o inadimplemento
absoluto (art. 390, CC).
do artigo 202 do CC; logo somente poderia ser interrompida uma só vez, vindo as
proposituras supervenientes a gerar somente a suspensão da prescrição.
Ao fazermos uma interpretação conjunta entre o artigo 397, § único e 405, do CC, a
solução seria, majoritariamente, que havendo obrigações sem termo ou ilíquidas, os juros
de mora seriam contados desde a citação válida. Outros sustentam que os juros deveriam
ser computados desde a interpelação (extrajudicial) ou da citação válida (judicial).
“Art. 398. Nas obrigações provenientes de ato ilícito, considera-se o devedor em
mora, desde que o praticou.”
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
Inicialmente, deve ser salientado que a purga da mora seria um direito do devedor,
desde que ainda seja útil e possível. Mas a questão não é pacífica, pois há entendimento no
sentido de serem atitudes antagônicas, vez que se há pagamento, presume-se a aceitação, ao
passo que a contestação externa divergência quanto à cobrança. No entanto, se a dívida
cobrada for superior à devida, então nada seria exigível neste momento, somente sendo
verificado em sede meritória. Porém, se somente contestar e não pagar, há sério risco de
que seja reputado como legítimo, e por isso gerar cobrança de todo o valor, posto haver
decisão do próprio STJ no sentido de obrigatoriedade de purgar a mora da parcela
incontroversa, vindo a cumprir com a boa-fé, e contestar quanto a diferença. Veja:
Questão 2
Resposta à Questão 2
Vê-se na situação proposta que, caso a parcela fosse paga em atraso, mas não
tivesse ocorrido o sinistro, a parcela teria sido admitida, sob a alegação de mera liberalidade
da seguradora.
Para sanar a controvérsia, o STJ tem entendido que, pela aplicação da teoria do
adimplemento substancial ou inadimplemento mínimo, seria abuso de direito do segurador
optar por rescindir o contrato, ante a possibilidade de purgar a mora e permanecer o
contrato, obrigando a seguradora a custear o sinistro.
Neste sentido, veja a ementa do REsp. 76.362:
O STJ tem ido além, entendendo pela necessidade de notificação prévia ao segurado
de que não estaria mais coberto. Tal tese vem a coadunar com a tutela da confiança.
Questão 3
Resposta à Questão 3
impõe é que, junto com a parcela em atraso, se faça também o pagamento consignado dos
encargos moratórios referentes ao período.
Antes, se entendia que a ação de consignação seria uma “execução as avessas”, que,
para ser proposta, deveria haver a liquidez, certeza e tempestividade.
Essa visão é ultrapassada. Veja: se é direito do devedor purgar a mora, e esta poderá
ser feita por consignação em pagamento, ter-se-á por legítima a via eleita, não havendo que
se falar em impedimento legal.
Quanto ao pedido de rescisão do contrato, deve ser considerado abuso de direito,
posto o adimplemento substancial ou inadimplemento mínimo (quatro parcelas).
Por todo o exposto, seria possível a consignação em pagamento, bem como a
impossibilidade de rescisão do contrato.
Nesse sentido, veja a apelação cível 2004.001.12925, do TJ/RJ:
Tema X
Inadimplemento das Obrigações II. Cláusula penal. Natureza e caracteres. Pena convencional moratória e
compensatória. Cláusula de arrependimento. Efeitos da cláusula penal. Arras: confirmatórias e penitenciais.
Notas de Aula31
1. Cláusula Penal
31
Aula proferida pelo professor André Roberto de Souza Machado, em 15/10/2008.
Mas qual seria o valor desta cláusula penal? O artigo 412 do CC assenta que o valor
da cláusula compensatória não poderia exceder ao valor da obrigação principal ou seu
equivalente. Veja:
“Art. 412. O valor da cominação imposta na cláusula penal não pode exceder o da
obrigação principal.”
Diante do exposto, pode ser afirmado que em sede de obrigação solidária, caso a
mesma não possa ser adimplida por atitude de um dos devedores, todos deverão arcar com
o valor da cláusula penal, pois quem assume a obrigação principal assume também a
custear o equivalente, mesmo não tendo sido culpado, caso este em que o não culpado que
arcar terá direito de regresso contra o causador.
Ademais, deve ser ressaltada a diferença do contrato de trato sucessivo para o de
execução diferida, pois neste último é inviável o pedido de rescisão cumulado ao pedido de
recebimento a prestação, somente sendo possível em sede de contratos com trato sucessivo,
posto a rescisão se operar com efeito ex nunc, ao passo que nos de execução diferida ocorre
ex tunc.
O inadimplemento absoluto não é sinônimo de inadimplemento total. Tal afirmação
se torna clara em sede de contratos de trato sucessivo 32, pois pode ser cumprida parte do
contrato, sem que tenha direito a ressarcimento ao valor já pago. Assim, pode ser que as
partes venham a ajustar uma cláusula penal que, no curso da obrigação, vem a se tornar
excessivamente onerosa; nestes casos, ante ao adimplemento parcial, não se poderia aplicar
a mesma sanção daquele que não fora em nada cumprido – se aplicam as normas dos
artigos 413 e 416 do CC.
“Art. 413. A penalidade deve ser reduzida eqüitativamente pelo juiz se a obrigação
principal tiver sido cumprida em parte, ou se o montante da penalidade for
manifestamente excessivo, tendo-se em vista a natureza e a finalidade do negócio.”
“Art. 416. Para exigir a pena convencional, não é necessário que o credor alegue
prejuízo.
Parágrafo único: Ainda que o prejuízo exceda ao previsto na cláusula penal, não
pode o credor exigir indenização suplementar se assim não foi convencionado. Se
o tiver sido, a pena vale como mínimo da indenização, competindo ao credor
provar o prejuízo excedente.”
32
Como dito, necessário ressaltar que estes se diferenciam dos de execução fracionada na medida em que sua
rescisão se dá ex nunc, ao passo que os últimos na forma de ex tunc.
“Enunciado 356, CJF - Art. 413. Nas hipóteses previstas no art. 413 do Código
Civil, o juiz deverá reduzir a cláusula penal de ofício.”
“Enunciado 357, CJF - Art. 413. O art. 413 do Código Civil é o que complementa
o art. 4º da Lei n. 8.245/91. Revogado o Enunciado 179 da III Jornada.”
“Enunciado 359, CJF - Art. 413. A redação do art. 413 do Código Civil não impõe
que a redução da penalidade seja proporcionalmente idêntica ao percentual
adimplido.”
§ 1° (Vetado).
§ 2º Nos contratos do sistema de consórcio de produtos duráveis, a compensação
ou a restituição das parcelas quitadas, na forma deste artigo, terá descontada, além
da vantagem econômica auferida com a fruição, os prejuízos que o desistente ou
inadimplente causar ao grupo.
§ 3° Os contratos de que trata o caput deste artigo serão expressos em moeda
corrente nacional.”
33
Tal tese deve ser tida como majoritária, tendo em vista se tratar a cláusula penal de uma estipulação
bilateral, devendo valer tanto para credor quanto para o devedor. Isto porque se trata também de garantia do
devedor acerca do ônus de seu inadimplemento, e, assim, deve ser interpretada tal cláusula como uma
“renúncia” à discussão judicial das perdas e danos, para que seja cobrado somente o valor fixado na cláusula
penal.
Em que pese ter sido este instituto bem abordado no tema anterior, se faz necessário
estabelecer uma solução em caso de inadimplemento relativo, em que deve ser cobrada a
cláusula penal moratória, que é o valor principal acrescido de encargos.
Ao contrário da compensatória, que como sabemos possui o desiderato de pré-fixar
o valor a ser pago a título de perdas e danos, a cláusula penal moratória visa inibir a
inadimplência, podendo ser cobrada a multa mais perdas e danos, tal como ocorre em sede
de contratos de trato sucessivo.
Mas qual seria o valor máximo da cláusula penal moratória? Podemos utilizar o
limite da obrigação principal?
Parece óbvio que não, salvo em sede de obrigação de fazer, nos casos em que o
efeito decorrente do inadimplemento seja tão significativo a ponto de justificar uma
cláusula penal um pouco maior. No entanto, como regra, não se utiliza o artigo 412 do CC.
Assim, dependerá da natureza da relação jurídica em análise.
Caso seja relação de consumo, necessária se faz a aplicação do § 1º do artigo 52 do
CDC, o valor equivalente a até dois por cento34. Veja:
Caso se tratar de condomínio, pelo código anterior seria de vinte por cento; no
entanto, pelo artigo 1.336, §1º, do CC, o valor da referida multa será também de dois por
cento. Veja:
Acerca do tema, cumpre cogitar da aplicação de tal norma nos casos em que a
convenção de condomínio ocorrera antes do novo diploma civil. A resposta deve ser
fundamentada diante do caráter de ordem pública que reveste o tema, e, assim, deverá
incidir imediatamente sob os efeitos futuros dos atos jurídicos pretéritos, reputando o STF
como caso de retroatividade mínima.
Por derradeiro, nos demais contratos, o limite objetivo seria o previsto na Lei da
Usura, Decreto-Lei 22.626/33, no artigo 9º, que estabelece o teto da multa em dez por
cento:
34
Importa ressaltar que a multa moratória, como dito, possui o escopo de inibir o inadimplemento; logo,
incidirá somente uma vez, mesmo que haja várias parcelas em atraso, devendo sobre estas incidir somente os
juros de mora. A exceção seria em sede de obrigação mensalmente vencível, caso este em que a multa incidirá
sempre que ocorrer o inadimplemento de cada prestação (nas de trato sucessivo, não nas parceladas).
“Art. 9º. Não é válida a cláusula penal superior a importância de 10% do valor da
dívida.”
2. Arras
“Art. 417. Se, por ocasião da conclusão do contrato, uma parte der à outra, a título
de arras, dinheiro ou outro bem móvel, deverão as arras, em caso de execução, ser
restituídas ou computadas na prestação devida, se do mesmo gênero da principal.”
“Art. 418. Se a parte que deu as arras não executar o contrato, poderá a outra tê-lo
por desfeito, retendo-as; se a inexecução for de quem recebeu as arras, poderá
quem as deu haver o contrato por desfeito, e exigir sua devolução mais o
equivalente, com atualização monetária segundo índices oficiais regularmente
estabelecidos, juros e honorários de advogado.”
“Art. 419. A parte inocente pode pedir indenização suplementar, se provar maior
prejuízo, valendo as arras como taxa mínima. Pode, também, a parte inocente
exigir a execução do contrato, com as perdas e danos, valendo as arras como o
mínimo da indenização.”
Após a verificação dos artigos supra, surge uma questão: se as arras possuírem
valores muito elevados, tais como cinquenta por cento da prestação, e o negócio for
desfeito por inadimplência, valeria a literalidade da lei no sentido de aplicar tal percentual
com um mínimo indenizatório?
Esta lógica não pode prosperar: deve ser realizada uma analogia ao artigo 413 do
CC, vindo o magistrado a afastar a excessiva onerosidade do sinal dado, por imperativo da
boa-fé objetiva e comutatividade. O CJF, no enunciado 165, assim se manifestou:
“Enunciado 165, CJF – Art. 413: Em caso de penalidade, aplica-se a regra do art.
413 ao sinal, sejam as arras confirmatórias ou penitenciais.”
Casos Concretos
Questão 1
Resposta à Questão 1
2) Como discorrido, seria possível, desde que estivesse estipulação expressa neste
sentido no contrato, conforme assenta o artigo 416, parágrafo único, do CC.
Questão 2
Resposta à Questão 2
“Enunciado 356, CJF - Art. 413. Nas hipóteses previstas no art. 413 do Código
Civil, o juiz deverá reduzir a cláusula penal de ofício.”
Tema XI
Inexecução das Obrigações. Dolo e culpa. Indenização: dano emergente e lucro cessante. Redução pelo Juiz.
Inexecução da obrigação sem indenização: caso fortuito de força maior. A cláusula de não indenizar.
Notas de Aula35
1. Inadimplemento
“Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo,
excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela
boa-fé ou pelos bons costumes.”
35
Aula proferida pelo professor Fábio de Oliveira Azevedo, em 21/10/2008.
“Art. 389. Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais
juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos,
e honorários de advogado.”
“Art. 421. A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função
social do contrato.
aplicável nas relações aparentemente paritárias, e não apenas nas relações em que impera a
verticalidade?
Veja que, de uma ou de outra forma, a tutela terá o mesmo efeito: o contrato será
nulificado. Se se optar pela violação à função social, estar-se-á apenas consolidando, no
direito privado, o respeito a um preceito desenvolvido para esta seara; se se optar pela
aplicação direta da proteção constitucional aos direitos fundamentais no pacto privado
horizontal, não será necessária a roupagem da função social para tanto. E repare que a
mescla dos conceitos se dá apenas quando se aplica a perspectiva privada ao dilema:
quando se aplica a função social como método de controle desta ilicitude, se está apenas
revestindo o próprio direito fundamental – in casu, dignidade da pessoa humana – com uma
roupagem desenvolvida para o direito privado, nomeada de função social. Destarte, então,
no fundo, é a mesma solução.
O inadimplemento é tido por absoluto quando a prestação não pode mais ser
cumprida, ou quando o cumprimento não mais interessa ao credor.
Surge uma questão: esta análise deve ser feita de forma objetiva ou subjetiva? A
impossibilidade de cumprimento é de verificação naturalmente objetiva, mas a aferição da
inutilidade do cumprimento poderia suscitar dúvida quanto ao seu meio de verificação. A
doutrina é tranqüila ao afirmar que a utilidade ou não da prestação deve ser feita diante do
credor no caso concreto, ou seja: é uma análise subjetiva.
A explicação é simples: não se pode analisar esta utilidade objetivamente, à luz do
homem médio, pela simples razão de que haveria grave injustiça se fosse observada a
utilidade em abstrato de uma prestação, tomando por base o homem médio. O que é útil em
uma perspectiva aberta pode ser completamente inútil para aquele contratante.
Veja um exemplo simples: sujeito adquire um veículo de luxo com o propósito de
usufruir do bem durável, mas também de utilizá-lo em determinada data específica, como
na sua festa de formatura. O vendedor inobserva a data de entrega, e só põe o carro à
disposição em data posterior à dita festa. Esta prestação, diante do homem médio, é útil – o
bem durável, mesmo se entregue com atraso, poderá ainda servir por muitos aos ao seu
propósito principal. Todavia, ao comprador, a utilidade do bem será questionável, senão
inexistente, vez que um dos propósitos, para ele tão importante quanto o uso duradouro do
bem, será impossível de ser adimplido – a festa já ocorreu, e ele não dispôs do bem quando
precisou. Por isso, para ele, é inadimplemento absoluto.
A mora é o atraso. Há que se ter cuidado com duas questões em relação a esta
afirmação. Primeiro aspecto é a já comentada redação do artigo 394 do CC, pois que dali
poder-se-ia depreender que não observar o lugar e a forma de cumprimento seria também
mora, enquanto já se viu que é violação positiva do contrato; segundo aspecto é a existência
de mora sem atraso, no sentido dicionário: a mora accipiendi ocorre quando o credor dá
causa, ou seja, o devedor não incorreu em atraso, e mesmo assim há mora, só que do credor
Por isso, é mais técnico, terminologicamente, se dizer que a mora é o retardo do
cumprimento da obrigação.
O inadimplemento culposo, lato sensu, é aquele que advém de dolo ou culpa stricto
sensu do contratante descumpridor. Os consectários deste inadimplemento são todos os
encargos cabíveis, tais como perdas e danos e multas.
O inadimplemento fortuito, por sua vez, ocorre quando não há qualquer fato
imputável ao descumpridor, e tem expressão no artigo 393 do CC:
“Art. 393. O devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou
força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado.
Parágrafo único. O caso fortuito ou de força maior verifica-se no fato necessário,
cujos efeitos não era possível evitar ou impedir.”
O parágrafo único deste artigo supra equipara o fortuito e a força maior quanto aos
seus efeitos, que é afastar os consectários do inadimplemento. Todavia, há distinção entre
fortuito e força maior: para a melhor doutrina, o fortuito, gênero, consiste no acontecimento
ligado à natureza ou a terceiro, daí surgindo a distinção entre fortuito interno e externo,
espécies; a força maior, por seu turno, seria exatamente o fortuito externo.
O fortuito interno é aquele evento oriundo de um risco criado pela própria natureza
da atividade que está sendo desenvolvida, enquanto o fortuito externo é aquele que é
proveniente de riscos estranhos à normalidade da atividade.
5. Cláusula de não indenizar
“Art. 424. Nos contratos de adesão, são nulas as cláusulas que estipulem a renúncia
antecipada do aderente a direito resultante da natureza do negócio.”
“Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas
ao fornecimento de produtos e serviços que:
I - impossibilitem, exonerem ou atenuem a responsabilidade do fornecedor por
vícios de qualquer natureza dos produtos e serviços ou impliquem renúncia ou
disposição de direitos. Nas relações de consumo entre o fornecedor e o consumidor
pessoa jurídica, a indenização poderá ser limitada, em situações justificáveis;
(...)”
Pelo artigo 424 do CC, a cláusula de não indenizar poderia ser declarada nula por se
tratar de um direito resultante da natureza do negócio, mas somente se inserida em contrato
de adesão. Da mesma forma, seria nula pelo artigo 51, I, do CDC, quando o contrato for
regido pelo codex consumerista. Reitere-se, a cláusula é considerada válida se for inserida
em contratos paritários, nas relações entre comuns. Exemplo recorrente, em que esta
cláusula é válida, é sua colocação em convenções de condomínio.
Há eu se mencionar ainda um detalhe fundamental: a regra, nas relações de
condomínio, é que não haja esta responsabilidade, mesmo que a convenção seja omissa,
não existindo cláusula de não indenizar. Veja porque: suponha-se o furto de um automóvel
na uma garagem de um condomínio. Se a responsabilidade civil subjetiva impõe a conduta
culposa ou dolosa para que haja imputação, se o condomínio não concorrer culposamente
para o dano – por exemplo, o porteiro que abriu a porta sem zelo algum, deixando o
meliante entrar por negligência –, não há conduta culposa, e não há como se imputar ao
condomínio tal responsabilidade, porque não há dever originário que tenha sido quebrado:
o condomínio não se propõe, pela natureza de seu escopo, à guarda dos veículos. Não há
legítima expectativa de que os bens serão guardados e restituídos incólumes.
Por isso, nesta situação específica do condomínio, entendimento que se pode
estender às associações não empresariais em geral (clubes, agremiações, etc), para haver a
responsabilização é necessária a prova da responsabilidade subjetiva, e sequer seria
necessária, de fato, a presença da cláusula de não indenizar.
Diferente é se o condomínio (ou o clube) cria a expectativa de guarda: se a
associação apregoa que há plena segurança, lançando mão de câmeras, vigias noturnos,
rígido controle de entrada e saída de pessoas, etc, o condomínio está gerando esta
expectativa, e com isso criando para si o dever originário de guarda, que, se quebrado por
um furto, criará a responsabilidade pela indenização para este condomínio.
7. Denúncia injusta
Uma outra forte presença da cláusula geral da boa-fé, no CC, é a previsão que vem
expressa no parágrafo único do seu artigo 473:
“Art. 473. A resilição unilateral, nos casos em que a lei expressa ou implicitamente
o permita, opera mediante denúncia notificada à outra parte.
Parágrafo único. Se, porém, dada a natureza do contrato, uma das partes houver
feito investimentos consideráveis para a sua execução, a denúncia unilateral só
produzirá efeito depois de transcorrido prazo compatível com a natureza e o vulto
dos investimentos.”
Este artigo expõe deforma expressa a atenção à boa-fé objetiva, mas vale dizer que
sequer seria necessária esta previsão expressa. O STJ, de fato, vem aplicando esta lógica ali
impressa desde há muito, sendo casuística recorrente especialmente em contratos de
distribuição, nos quais um contratante precisa do fornecimento de bens para desenvolver
sua atividade. Nestes casos, o fornecedor só poderá denunciar o contrato se o distribuidor
puder sanar todos os prejuízos que forem ser gerados pela denúncia, ou seja, mesmo
havendo cláusula de resilição unilateral, esta só poderá ser invocável quando os
investimentos houverem sido repostos, no mínimo.
Veja que este dispositivo nada mais faz do que pôr expresso aquilo que a lealdade e
cooperação, consectários da boa-fé objetiva, já impõem por natureza. Se há a denúncia
injusta, há abuso do direito, e há responsabilidade civil.
Casos Concretos
Questão 1
"A" ajuizou ação ordinária de indenização em face de "B", alegando que, após
quatro anos de cumprimento do contrato, o último deixou de oferecer ao primeiro os
produtos que revendia, o que ocasionou sua falência, como estabelecimento comercial.
Considerando que A, na inicial, requereu indenização pelos lucros cessantes, mas não
particularizou o quantum devido a esse título, é possível ao juiz, diante da prova cabal de
sua existência, concedê-lo?
Resposta à Questão 1
De plano, consigne-se que esta falta de fornecimento pode ser considerada uma
denúncia injusta, se violou a legítima expectativa criada no revendedor de que teria o
fornecimento dos itens necessários.
Todavia, a questão é mais processual do que material: é fato que se impõe, apenas,
que na petição inicial o autor apresente o pedido de indenização por danos emergentes e
lucros cessantes, mas é desnecessário que tais verbas sejam particularizadas desde a inicial.
É caso em que se admite o pedido genérico, certo quanto ao quid, incerto quanto ao
quantum, o qual será deixado à apuração em liquidação de sentença. a existência do dano
deve ser demonstrada ab initio; a quantificação, não.
A respeito, veja o REsp 201.414:
Questão 2
Resposta à Questão 2
Questão 3
José ingressa com ação em face de Vôo Linhas Aéreas, requerendo a compensação
dos danos morais decorrentes do atraso no vôo programado entre Rio de Janeiro e São
Luís em julho de 2007, com escala programada apenas em Recife. Afirma que, em razão de
atrasos nos vôos, oriundos de São Paulo (Congonhas), e por não ter a conexão aguardado
seu vôo, foi obrigado a fazer trajeto bem mais longo (Rio de
Janeiro/Salvador/Recife/Fortaleza/São Luís), atrasando sua chegada ao destino final em
quatro horas. A empresa aérea, em contestação, alegou caso fortuito, por ter ocorrido o
fato durante a situação de caos aéreo que assolou e vem assolando o país, e, em especial,
em virtude dos problemas operacionais ocorridos no Aeroporto de Congonhas, de onde
proveio o vôo. Decida a questão.
Resposta à Questão 3
Embora a questão seja polêmica, não pode ser negada a incidência de mero fortuito
interno, ou seja, inerente ao risco empresarial do transportador aéreo, que não rompe o nexo
causal, ao contrário do fortuito externo.
O caos aéreo, por si só, ainda que devido parcialmente a terceiros, como o sistema
de controle aéreo (Cindacta), não exclui a responsabilidade do transportador. Assim prevê o
artigo 735 do CC, com redação idêntica à súmula 187 do STF:
Tema XII
Notas de Aula37
1. Indenização
37
Aula proferida pelo professor Fábio de Oliveira Azevedo, em 21/10/2008.
materialidade deste dano é questionável, e por isso a chance seria um direito subjetivo
próprio, uma nova natureza, diversa do dano material.
Em verdade, é mais simples do que parece: a chance é um direito em si, que se
exprime na assertiva de que é direito subjetivo do detentor a chance de tentar conseguir
algum proveito. Por conta disso, a extirpação desse direito subjetivo de tentar é tida por um
dano em si – há a supressão da chance, o que é um dano real de per si.
E como todo dano deve ser real, e não meramente uma hipótese, voltando ao
exemplo dado, para que se entenda existente o dano é necessário que se comprove a
existência real da chance de reverter a sentença prejudicial. Se a chance de reversão
inexiste, a conduta culposa do advogado não pode ser tida por causadora de um dano,
porque simplesmente não existe o bem jurídico supostamente afetado: não existe a chance,
e por isso não há prejuízo, porque nada foi perdido. Comprovando-se claramente a
existência real da chance de reversão, há a perda da chance, e há o dano – havendo que se
indenizar.
Veja que mesmo se existir a chance, mas de forma muito remota, se estará tratando
de uma chance hipotética, e ainda assim não há que se indenizar, porque, repise-se, não há
dano hipotético.
Quanto ao cálculo do valor da indenização pela perda da chance, o problema é ainda
mais complexo. A doutrina vem tendendo a dizer que se deve realizar um arbitramento do
valor, baseando-se como parâmetro (e apenas como parâmetro de lógica, não como medida
obrigatória) na verificação do percentual de chance de ganho que se auferiria se a chance
não fosse perdida. Veja: se, no exemplo dado, o recurso tempestivo faria com que o
condenado ao pagamento de cem mil reais reduzisse sua condenação a dez mil reais, sendo
esta chance real (porque a jurisprudência maciça condena o fato ali imputado neste
montante), o cálculo é bem simples: o advogado fez, com sua conduta culposa, com que o
cliente perdesse a chance real de deixar de pagar noventa mil reais, e este é o valor que
deverá perseguir quando acionar o próprio advogado pela perda da chance: este é o melhor
parâmetro para calcular o valor da sua chance perdida. Veja que não será o exato valor,
porque se estaria indenizando a título de lucro cessante; será mais ou menos próximo do
valor de noventa mil o quanto mais real for a chance perdida.
Em síntese: não se deve indenizar o dano meramente hipotético, pois que a certeza é
um elemento necessário do dever de indenizar. Na responsabilidade por perda de uma
chance, não se indeniza a título de lucro cessante, pois isso equivaleria à indenização de um
dano hipotético. Para a doutrina moderna, se trata de um dano emergente, que consiste
numa violação ao direito subjetivo à chance. Como qualquer dano, deverá ser comprovado
que a chance era real, sólida, e não mera possibilidade remota. A fixação da indenização é
feita por arbitramento, e não pode utilizar o valor que seria ganho se a chance não fosse
perdida de forma estanque, porque se estaria indenizando o lucro cessante hipotético; o
valor da perda pode, outrossim, valer como parâmetro para o arbitramento, sendo mais
próximo da integralidade o quanto maior for a chance perdida.
A última exceção é a lei do Plano Real, Lei 10.192/01, que na verdade faz apenas
menção à aplicabilidade das demais exceções ao real:
Este artigo é muito controverso. Há quem entenda que se trata de autorização legal
para a chamada cláusula de escala móvel, que é a cláusula que permite gradações efetivas,
aumentos reais, nas prestações de trato sucessivo. Como exemplo, uma cláusula que
preveja prestações de mil no primeiro ano, dois mil no segundo, e três mil no terceiro ano
de contrato.
Mas há quem entenda que este dispositivo seja apenas a autorização para a correção
monetária, recomposição do valor da moeda. Gustavo Tepedino é um dos que entendem
que é uma autorização à escala móvel, pela simples razão de que a correção monetária
dispensa, para sua admissibilidade, qualquer previsão legal expressa: é permitida pela
própria vedação ao enriquecimento ilícito, que ocorreria para o devedor se não se pudesse
se recompor o valor perdido da moeda, ao longo do tempo.
Casos Concretos
Questão 1
Jarbas firma com o Banco Pontual contrato de mútuo, cujo objeto foi vinculado ao
dólar norte-americano, a ser convertido para a moeda nacional por ocasião do
vencimento, devendo o pagamento ocorrer no Brasil. Comente a legalidade da cláusula
acima, em face do curso forçado da moeda nacional e da orientação jurisprudencial sobre
a matéria.
Resposta à Questão 1
III. Correta a execução movida contra os garantes, seja em função de aval dado na
nota promissória, seja em razão da hipoteca atrelada ao contrato.
IV. Instrução suficiente da execução.
V. Recurso especial conhecido e provido.”
Questão 2
Caio celebrou com Tício contrato de mútuo feneratício, dele recebendo a quantia
de R$ 10.000,00, com a taxa de 3% ao mês de juros remuneratórios, vencendo-se o
empréstimo no dia 30 de outubro de 2003; o mutuário não realizou o pagamento no seu
vencimento. O mutuante ajuíza a ação, dele exigindo o principal, correção monetária, pelo
índice previsto no contrato, que é o IGP-M, juros remuneratórios devidos, juros
moratórios, multa moratória, também avençada, de 20% sobre o débito, além das perdas e
danos, já que insuficiente à multa para ressarci-lo integralmente, mais custas e honorários
de advogado. Em sua defesa, sustenta Caio o excesso de cobrança, alegando a existência
de "bis in idem", já que a multa e as perdas e danos têm a mesma natureza jurídica, aduz,
ainda, a prática de juros abusiva e impossibilidade de cumulação entre juros
remuneratórios e moratórios. Julgue a causa, dispensando relatório. Se for acolhida a
pretensão, a partir de quando fluirão a correção monetária e os juros? Justifique.
Resposta à Questão 2
“Enunciado 20, CJF: Art. 406: a taxa de juros moratórios a que se refere o art. 406
é a do art. 161, § 1º, do Código Tributário Nacional, ou seja, um por cento ao mês.
A utilização da taxa SELIC como índice de apuração dos juros legais não é
juridicamente segura, porque impede o prévio conhecimento dos juros; não é
operacional, porque seu uso será inviável sempre que se calcularem somente juros
ou somente correção monetária; é incompatível com a regra do art. 591 do novo
Código Civil, que permite apenas a capitalização anual dos juros, e pode ser
incompatível com o art. 192, § 3º, da Constituição Federal, se resultarem juros
reais superiores a doze por cento ao ano.”
Merece ainda referência a Lei de Usura, Decreto 22.626/33, em seu artigo 1º:
“Art. 1º. É vedado, e será punido nos termos desta lei, estipular em quaisquer
contratos taxas de juros superiores ao dobro da taxa legal (Código Civil, art. 1062).
(...)
§ 3º. A taxa de juros deve ser estipulada em escritura publica ou escrito particular,
e não o sendo, entender-se-á que as partes acordaram nos juros de 6% ao ano, a