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micropolíticas da linguagem em Roland Barthes

Esse trabalho tem passado por um resgate da ação molecular da

linguagem, em uma espécie de demonstração das raízes já micropolíticas da

pesquisa semiótica. Já nos textos do Círculo de Bakhtin, por exemplo, se pode

ler tal conjunção – e em ​Marxismo e Filosofia da Linguagem​, há esse anúncio:

“Ali onde o signo se encontra, encontra-se também o ideológico. Tudo que é

ideológico possui um valor semiótico”. Nesses termos que nossa proposta parte

da consideração da língua como caso de política, e da semiótica como sistema

de pensamento e investigação capaz de ressaltar as disputas moleculares nos

atos de comunicação.

Nesse sentido e em uma das frentes de pesquisa organizadas pelo grupo,

se discutiu o método de discussão Roland Barthes como um modo inicial e

bastante potente de interrogar esses agenciamentos micropolíticos da língua.

Veja-se: já na nascente do projeto semiológico, as mitologias lidas por

Barthes buscavam justamente ressaltar o ideológico no semiótico, aliados nas

trincheiras dos meios de comunicação: discursos do jornalismo e da

publicidade, plácidos e inocentes em aparência, que veiculavam sentidos

conotados. Uma revisão desses textos, atenta à sua estrutura sígnica e


abertamente inspirada pela estratificação da linguagem de Hjelmslev, é que

torna capaz a avaliação dessas mensagens ideológicas.

A própria ideia de crítica, como cara a Barthes e apropriada na nossa

conceituação da Semiótica Crítica, é uma ação nesse sentido: reescrever os

discursos e as palavras de ordem a partir delas mesmas, ressaltando a forma

como se organizam e como ​nos​ organizam. Se compreendemos, com Deleuze e

Guattari, a micropolítica como essa ação do olhar e de apontar as interdições,

não podemos deixar de reparar aí as particularidade da perspectiva barthesiana,

no que busca demonstrar que a própria língua é uma ferramenta desse controle e

dessa sujeição.

Se é mesmo célebre a afirmação de que “A língua é fascista”, cabe

destacar sua continuação: é fascista não porque censura ou proíbe, mas

justamente porque faz falar. Conceber a língua como proibição seria a visão

“denuncista”, desprezada por Barthes; o caso seria entender seu potencial de

ordem, escondido nas leis da gramática e da sintaxe, dos códigos culturais e das

normas dos gêneros e critérios de noticiabilidade e afins. Destacar aí como o

próprio poder, difuso e fragmentário, pode ser ele próprio molecular, e agir nas

minúcias, no rodapé da linguagem.

Daí a atração de Barthes pela literatura como desempenho que vai forçar

os limites dessa língua, em uma ação micropolítica dos atos de comunicação.


No testamento de sua visão performativa da linguagem, na ​Aula​, Barthes

aproxima axiomas de Mallarmé e de Marx: “Mudar a língua”, do lado do poeta

do lance de dados, e “Mudar o mundo”, do lado do Manifesto Comunista.

A micropolítica da linguagem que encontramos em Barthes e nos auxilia

na construção dessa Semiótica Crítica, parece, em tal sentido, ser esse sistema

de leitura iconoclasta (ou semioclasta), interessada sobretudo em ​rachar​ as

palavras, desmontar os enunciados e sua circulação, atentando sempre ao

“discurso que pega”. Conceber a própria semiologia como trapaça, no que joga

com os signos desse fascismo linguístico, tentando fazê-los dizer coisas outras,

inesperadas na sua ordem natural – ou, de outro modo, demonstrar, como nas

Mitologias​, que não há um natural, e a sua imposição enquanto tal é uma

questão de política, e, no seu inverso, das micropolíticas capazes de alertar a

essa inversão.

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