Professional Documents
Culture Documents
São esses “detalhes inúteis” representados pelo barômetro, que Barthes pretende
defender do método de análise estruturalista ao considerar como válida a presença do
supérfluo que não é supérfluo, tentando provar que, mesmo não obedecendo aos
princípios da análise estrutural, merece seu espaço.
Podemos concluir então que a descrição cumpriu por muito tempo uma função
estética garantida pelo discurso de aparato do gênero epidídico, cuja função não era a
persuasão, mas a admiração do auditório. Posteriormente, correspondendo a neo-
retórica alexandrina, a descrição não estava sujeita ao realismo nem mesmo ao
verossímil, que aqui, desempenha neste momento não um papel referencial, mas
discursivo.
“ (...) não é mais que uma espécie de fundo destinado a receber as joias de algumas
metáforas raras, o excipiente neutro, prosaico, que reveste a preciosa substancia
simbólica, como se em Rouen, importassem apenas as figuras de retórica, às quais a
vista da cidade se presta, como se Rouen não fosse notável senão por suas substituições.
” (BARTHES, 1972, p.39)
Vale observar que, a partir desse raciocínio, o efeito de realidade rompe com a
lógica da representação tomando o real pelo real (princípio realista da história), criando
uma outra categoria de verossimilhança diferente da clássica, que é precisamente o
realismo. Barthes ainda declara que a nova verossimilhança é responsável pela nossa
necessidade da autenticação do real4, pensemos então no advento e desenvolvimento das
fotografias, reportagens, exposições, ou seja, todas essas coisas nos revelam que:
“(...)o real é suposto bastar-se a si mesmo, que é bastante forte para desmentir
qualquer ideia de função, que sua enunciação não tem nenhuma necessidade de ser
intrigada numa estrutura e que o ter-estado-lá das coisas é um princípio suficiente da
palavra. ” (BARTHES, 1972, p.42)
Barthes finaliza seu ensaio com uma resposta à pergunta inicial sobre a função
da descrição nos trechos de Flaubert e Michelet:
“ o barômetro de Flaubert, a pequena porta de Michelet, não dizem mais do que isto:
somos o real; é a categoria do real ( e não seus conteúdos contingentes) que é então
significada; ou melhor, a própria carência do significado em proveito do único referente
torna-se o próprio significante do realismo: produz –se um efeito de real, fundamento
desse inverossímil inconfessado que forma a estética de todas as obras correntes da
modernidade” (BARTHES, 1972, p.43)