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Primeira parte

“O bom senso é a coisa mais bem distribuída do mundo:


pois cada um pensa estar tão bem provido dele, que mesmo
aqueles mais difíceis de se satisfazerem com qualquer outra
coisa não costumam desejar mais bom senso do que têm.”
Descartes está convencido de que o bom senso ou a capacidade de julgar tenha sido nos homens
distribuída igualmente; sendo, portanto, apenas o modo como conduzimos nosso pensamento o
motivo das divergências de opiniões. Diz ele que a razão, sendo o que distingue os homens dos
outros animais só pode estar inteira em cada homem. Apoiando-se na compreensão de que apenas
o que é acidental é passível de maior ou menor quantidade.
“Pois, não basta ter o espírito bom, mas o principal é
aplicá-lo bem.”
Daí o subtítulo da obra: para bem orientar a razão.
“As maiores almas são capazes dos maiores vícios, assim
como das maiores virtudes; e aqueles que só caminham
muito lentamente podem avançar muito mais, se sempre
seguirem o caminho certo, do que aqueles que corre e dele
se afastam.”
Convém ressaltar, entretanto, que Descartes embora tenha nos presenteado com seu Discurso do
método, não estava convencido de que seu espírito fosse em qualquer coisa mais perfeito que o dos
homens comuns, mas pelo contrário, como sugere na seguinte passagem:
“​Muitas vezes até desejei ter o pensamento tão pronto ou a
imaginação tão nítida e distinta, ou a memória tão ampla ou
tão presente como alguns outros.”
Contudo, afirma que teve sorte por desde muito cedo ter se encontrado em certos caminhos que o
levaram a considerações que posteriormente o fizeram chegar a um método que parece fornecer
meios de aumentar gradativamente o conhecimento.
No que toca à presunção, Descartes parece bastante cauteloso e é tão somente pelos frutos que
parece ter colhido a partir de seu método que intentou mostrar ao mundo de que maneira procurou
conduzir sua alma. (Na época em que o Discurso do Metodo fora publicado, Descartes já havia
constituído sua física, sua metafísica e sua geometria). De tal sorte que propuserá seu escrito como
uma história ou mesmo uma fábula composta por exemplos os quais pudessem ser seguidos ou
mesmo rejeitados.
“​Meu proposito não é ensinar aqui o método que cada um
deve seguir para bem conduzir sua razão, mas somente
mostrar de que modo procurei conduzir a minha.”

Segunda parte

Foi numa certa temporada em que esteve retido numa caserna que Descartes, sem encontrar
nenhuma conversa que o distraísse e nenhuma preocupação ou paixão que o perturbasse​, e,
portanto, detendo-se ao longo dos dias apenas com seus pensamentos, chegou a certas
considerações que puseram luz ao que viria integrar seu método.
Um dos primeiros pensamentos que a ele acometeu foi o de que ​não há tanta perfeição no que é
feito pelas mãos de várias pessoas quanto há naquilo que é feito por apenas uma.
“Assim, vê-se que os edifícios iniciados e terminados por um
único arquiteto costumam ser mais belos e mais bem
ordenados do que aqueles que muitos procuraram reformar.”
Seguindo por essa linha Descartes será levado a pensar que as ciências dos livros (pelo menos as
que são apenas prováveis e carecem de demonstração) tendo sido compostas e aumentadas pouco
a pouco pelas opiniões de muitas pessoas diferentes não deveriam se aproximar tanto da verdade
quanto os simples raciocínios que um homem de bom senso era capaz de fazer o pudera.
É também assim que Descartes será levado a pensar que por ter sido o homem desde criança
governado pelos mais diversos apetites e preceptores, frequentemente contrários uns aos outros,
que deveria ser impossível que seus juízos fossem puros e sólidos como os de alguém que pudesse
ter tido a oportunidade de fazer uso apenas de sua razão desde a hora do nascimento. [ler nota de
rodapé 21, na página 25.]
“​Quanto às opiniões que até então eu aceitara, o melhor que
podia fazer era suprimi-las de uma vez por todas, a fim de
substituí-las depois, ou por outras melhores, ou então pelas
mesmas, quando eu as tivesse ajustado ao nível da razão.”
[alegoria da cesta de maçã, se quiser, nota de rodapé 23,
página 26.]

“Nunca meu propósito foi mais do que procurar reformar


meus próprios pensamentos e construir um terreno que é
todo meu. E se, tendo minha obra me agradado bastante,
mostro-vos aqui o seu modelo, isto não quer dizer que
queria aconselhar alguém a imitá-la.”
Foi compreendo as vantagens da lógica, da álgebra e da análise dos geômetras e, isentando-se de
seus defeitos, que Descartes norteou o método que estava por desenvolver.
Quatro são os preceitos que Descartes tirará, a exemplo, da lógica, a fim de levá-los a cabo com
firmeza e ininterrupta atenção.
1) Nunca aceitar coisa alguma como verdadeira sem que a conhecesse evidentemente como
tal. Ou seja, não incluir aos juízos nada além daquilo que se apresentasse de tal maneira
clara e distinta que não fosse possível de ser colocado em dúvida;
2) Dividir cada uma das dificuldades examinadas em tantas parcelas quantas fossem possíveis
e necessárias para melhor resolvê-las
3) Conduzir por ordem os pensamentos, começando pelos objetos mais simples e mais fáceis
de conhecer, para pouco a pouco subir até o conhecimento dos mais compostos
4) Fazer em tudo enumerações tão completas e revisões tão gerais que fosse seguro saber que
nada foi omitido.

Das longas cadeias de razões, tão simples e fáceis (pela boca de Descartes) que os geômetras
serviam-se para chegar às suas mais difíceis demonstrações, Descartes fora levado a pensar que
todas as coisas passíveis de conhecimento ao homem deviam poder ser encadeadas da mesma
maneira, com a condição de que nos abstêssemos de aceitar como verdadeira alguma coisa que não
o fosse e de observar sempre a ordem necessária para deduzir umas das outras. De forma que não
haveria nenhuma coisa tão afastada de outra que não pudesse nos conduzir por fim a ela, nem
tampouco algo tão escondido que nos inviabilizasse de descobrir.

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