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213. URBAN, G. Ceremonial dialogues in South America. American Anthropolo8Y,


88(2): 371-86, 1986.
.~
l
169

214. Semiotic functions of macro-parallelism in Shoklain origin myths.


o

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of Neruda's works. Ver ref. 200 [1941], 1982, p. 103-34. o que é contexto?
220. VOLOSINOV, V. N. Marxism and the philosophy of language. Trad. L. Matejka
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222. WEINREICH, U. On Semantic. Philadelphia: University of Pennsylvania I. Introdução
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222a. WERTSCH, J. V. Modes of discourse in the nuclear arms debate. Work. Um dos focos centrais das pesquisas sobre a lingua~ nas últi-
Papo Proc. Cento Psychosoc. Chicago: Cent. Psychosoc. Stud, n. 8, 1987. mas décadas tem sido a~ação entre linguagem e contextoJTrabalhos
222b. Voices of the mind. Work. Papo Proc. Cento Psychosoc. Chicago:

o
em antropologia lingüística, sociolingüística, pragmática, psicolingüís-
Cent. Psychosoc. Stud, n. 19, 1988. tica, e filosofia da linguagem apontaram uma grande variedade de mo-
223. WOODBURY, A. C. Functions of rhetorical structure: a study of Central dos pelos quais a língua e a informação de vários tipos comunicada ver-
Alaskan Yupik Eskimo discourse. Lang. Soc., 14: 150-93, 1985. balmente são formatadas ou moldadas pelos contextos sociais e inter-
224. o Rhetorical structure in a Central Alaskan Yupik Eskimo traditional pessoais nos quais o discurso ocorre (ver Duranti & Goodwin, 1992).
narrative. Vera ref. 188, 1987, p. 176-239. Linhas de pesquisa parcialmente coincidentes também demonstraram
vários§dos pelos quais a~gem constitui o contexlQ)incluindo os
efeitos sociais descritos na teoria dos alos de ~la, a formulação e atribui-
ção de crenças na teoria da relevância (Grice, 1989; Levinson, 2000,
Sperber & Wilson, 1996) e o "uso criativo" de termos indiciais como
pronomes, dêiticos e outros embreadores (Silverstein, 1976). ° foco no
contexto, tanto como fator restritivo quanto como produto do discurso,
tem conduzido a um refinamento cada vez mais crescente das aborda-
gens da fala, já que@Yrincipalmente na elaboração de enunci~d~s.fala-\
dos ou escritos que linguagem e contexto são é!rticuladõB0 SIgnIfIcado
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W F. HANJ<s
LÍNGUA COMO PRÁTICA SOCIAL 171

desses desenvolvimentos para a lingüística encontra-se no aumento da


precisão na qual os sistemas lingüísticas, os processos cognitivos, e o ção (AC) enfatizou a o!,ganização temporal e, conseqüentemente, a or-
ganização se,q.i.ien..cial
das trocas verbais (Sacks et aL, 1974),a existência .,.ç

I uso da língua são co-articulados. (para a antropologia, esse significado


reside principalmente no fato de que a prática comunicativa é integran~ de regras procedimentais que regulam as tomadas de turno na fala, o Q ""-

te da prática social mais geral}A linguagem é um elemento importante, fenômeno da correção conversacional, e~ microanálise do que está efe-
se não for o definidor, em grande parte da vida social, e as idéias sobre a tivamente acontecendo na interação verbaUOs psicolingüistas e os lin-
linguagem têm tido um impacto fundamental sobre a teoria social no güistas cognitivistas tratam o contexto como uma questão de conheci-
último século. f.!lentopartílhado e de r~l2ITsentaçõesmentais, conseqüentemente como
um construto fundamentalmente mental.
Dado o âmbito desses desenvolvimentos, não é surpresa que exis-
tam várias abordagens do contexto, de acordo com as preferências disr], As abordagens mencionadas qté aqui têm em comum o fato de
plinares dos pesquisadores.f;"teoria dos atos de fala dirigiu sua atenção tratarem o contexto comoG!ma estrutura radial cujo ponto central é o
para as relações entre as formas lingüísticas e as circunstâncias captura- enunciado faladõ]Elas partilham um comprometimento com o indivi- ,*,.
das pelas condições de felicidade e pela doutrina das forças (Austin, dualismo metodológico, que prioriza o individual sobre o coletivo e
1962J]As abordagens griceanas da conversação dirigiram sua atenção procura reduzir as estruturas sociais aos comportamentos individuais.
para as inferências e as crenças declaradas dos sujeitos, considerando [1ãrtindo da perspectiva do(s) participante(s) da produção de fala, elas
que a fala é um empreendimento cooperativo, sujeito às máximas de derivam o contexto da relevância, da representação mental (incluindo
q~lidade, qUgntidade, relação e modo (Grice, 1989).A teoria da rele- o foco da atenção e a razão prática), e da emergência momentânea da
vância tem em comum com a teoria griceana o fato de colocar a 4!ferência. situação de fa4J Segundo este ponto de vista, o contexto é um conco-
como uma característica central da conversação, mas prescinde do prin- mitante local da conversação e da interação, efêmero e centrado sobre
cípio cooperativo, das máximas conversacionais, e das tarefas de calcular o prQ~sso emergente ~la. Se se coloca ênfase principal sobre o uso '.,-tr.
e testar as implicaturas. Ao invés disso, ela propõe explicar os processos efetivo da língua como atestado em situações reais ou sobre exemplos 1"
inferenciais em termos de um único princípio, o princípio da relevância, construídos, o quadro de referência e de explicação resultantes são as O•.~
de acordo com o qual as informações lógicas, enciclopédicas e lexicais atividades individuais de fala € as interações verbais nas quais elas ;-
são combinadas. Atos de fala, i!!lplicatura e teoria da relevância estão ocorrem.
intimamente relacionados à lingüística e têm em comum o fato de trata- '~

rem o contexto cOgt9 alg~onstruído pela~!l~~ção, e pela enuncia- @e um ponto d~ v~oEo~to, outros pesquisadores desenvolve- ~\,~
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ção no curso da conversação. ram abordagens da língua e do discurso segundo as quais o contexto S:Or

A etnometodologia
----...:....:.. - --
e a análise da conversação, de uma perspectiva
não é nem local nem efêmero, mas global e d~uro, com escopo so-
cial e histórico maior que qualquer ato 10calizad~Há alguns desloca-
"
social, deram grandes contribuições para nossa compreensão da lingua-
mentos aqui que merecem ser evidenciados. Enquanto o primeiro con-
gem em interação. Ambas afirmam que a interação face a face é o con-
----
texto primordial para a socialização humana (Schegloff, 1987: 208) e,
junto de abordagens está assentado na lingüística, na psicologia, e na
microssociologia, o segundo está fundado em uma teoria social ampla e
portanto, o mais importante locus de observação da linguagem. Apesar
na história. A produção de enunciados não é tomada como sendo o cen-
de considerarem em suas análises os processos pragmáticos e inferenciais
tro gerador do contexto, como o é para as abordagens individualistas.
estudados pelos lingüistas, seu foco é diferente. A análise da conversa-
Ao invés disso,~ sistemas de referência exE).icativossão as condições
r-
)
172 W F. HANKS lÍNGUA COMO PRÁTICA SOCIAL 173
,"- ,
sociais e históricas que são anteriores à produçã-2-dQ ~urso e que o ca do Discurso enfatiza o poder, a exploração e a desigualdade como
restringeiff]A descrição lingüística convencional é um exemplo porque se.ndo as condições sociais da linguagem, investigando-os no interior de
postula que os usos individuais da linguagem, para sua inteligibilida_ vários contextos, incluindo o discurso político e econômico, o racismo, a
de, dependem dos sistemas lingüísticos (gramatical e semântico) que propaganda e a mídia, e os ambientes institucionais como a burocracia e
sejam logicamente anteriores a qualquer ato de fala. Na medida em que
estas perspectivas tratam a produção do discurso como um todo, as
a educação.§ote-se que, embora essas forças possam ser colocadas em
jogo em eventos individuais de fala, o quadro de referência é maior que; 'i
\'" .
")
unidades relevantes são ou abstrações analíticas (o falante idealizado da e logicamente anterior a, qualquer evento da~Além disso, o foco so- \
lingüística) ou coletividades (comunidades, classes, redes sociais, tipos bre as intenções do falante como fonte do sentido, que é comum às abor-
de agentes definidos por sexo, idade, profissão, local onde moram etc.). dagens metodológicas individualistas, está ausente em todas as aborda-
~ /
Do mesmo modo,~ <!!ladrotemporal da produção do discurso não é o gens em larga escala. ~ r ilr~
I '-' (/' r-,J 0/1.." c:A- rp"-o r I '" /.~~

desenrolar momentâneo dos enunciados que os defensores do indivi- As abordagens lingüística, psicológica, e microssociológica, a parf; -t '\ I
dualismo chamam de t.emE~I, mas o teml2.oconjuntural dos siste-
mas coletivos e dos processos históricoS]
tir das quais iniciamos, são em grande medida complementares às abor- <'5<,ç 2:
dagens em larga escala recém-mencionadaslOs cenários locais da enun- '3?,
Assim como há várias a~rdagens locais para o contexto, há tam- ciação e da interação face a face são centrais para o primeiro grupo e:~ c.._,je.
bém abordqgensg!QQais diversas. Segundo o ponto de vista de Foucaultt- ausentes, ou pelo menos marginais, no segundo. Inversamente, os fatos / 'je/",
por exemplo, caso se possa dizer que há um contexto básico para a lin- coletivos, centrais para as definições sociais de contexto, são marginais ~;;~
guagem, não é nem a interação nem a parte individual da fala ou do ou simplesmente ignorados nas abordagens individualistas. Esta pola-
texto, familiares aos lingüistas. Pelo contrário, o quadro de referência é rização dá origem a exageros e deixa escapar muitas oportunidades de
o "<ilscurso", significando@rmações de crenças em larga escala e cate- pesquisa produtiVéD.Elatoma obscuro como articular diferentes níveis
gorizaçõ~s atravessadas pelas relações de poder e articuladas em "as- de contexto analiticamente, ou até mesmo se tal articulação é um objeti-
sembléias" .~Demodo semelhante, Bourdieu defendeu que as formas e vo adequado. Dado que o discurso responde ao contexto em ggus va-
variedades lingüísticas poderiam ser analisadas relativamente às nego- [iad~ e que nenhum cenário social efetivo pode ser caracterizado ape-
ciações lingüísticas pelas quais elas carregam vários tipos de capital sim- nas sob micro ou macroperspectiva, as duas estão inevitavelmente con-
bólico e cultural (Bourdieu, 1993). Tanto Foucault como Bourdieu to- trapostas uma à outra. Em sua forma mais forte,,€::individualismo meto-
mam como ponto de partida fatos coletivos e exibem pontos de vista dológico defende que os fatos coletivos estudados pelos sociólogos e
que contradizem o individualismo metodológico (um corolário previsí- pelos antropólogos são epifenômenos das ações individuais, ao passo I~
vel a partir da orientação estruturalista de ambos os pensadores). A aná- que os proponentes do coletivismo podem defender com igual convicção
lise crítica do discurso (AÇI» fornece outros exemplos claros (bem apre- que os enunciados individuais e as interações face a face são materiali-
sentados em Blommaert e Bulcaen, 2000). ~ssa abordagem, o ~rso zações triviais de forças sociais maio~Desse modo, as divisões em,
é tratado sob três perspectivas: como texto dotado de forma lingüística, escala subscrevem alegações contraditórias sobre o que é mais funda-
como "prática discursiva" por meio da qual os textos são produzidos, mental para o contexto.
dist~ibuídos e consumidos, e como "prática s~ial" ~ tem vários efei- Enquanto grande parte da literatura relacionada ao contexto pode
tos Ideológicos, incluindo normatividade e h~gemonia: A Análise Críti- ser colocada em um ou outro desses extremos, a antropologia lingüísti-
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ca é exceção porqueiela tentou integrar os níveis] Uma das motivações uagem. Conseqüentemente, não há razão para esperar que algum
para isso é o fato empírico de que@§práticas discursivas são configura~ ~odelo único ou conjunto de processos sejam analiticamente suficien-
/ das por e ajudam a configurar os contextos em vários nív~Outra t~S para toda pesquisa (e há boas razões para ser cético em relação a
motivação é a patente inadequação de todas as explicações dicotômicas , pretensões universais). Ao mesmo tempo, é claro que há princípios e
que inevitavelmente distorcem a importância relativa das característi~ tipOS de relações que organizam os contextos de maneira recorrente. O
cas contextuais e produzem um vazio entre um nível e outro. Por ser @õSso inter~sse aqui é tanto pelas. especificida~es se~i~ti.::s das ~ráti-
um empreendimento interdisciplinar, a antrorologia lingüística sempre cas discurslvas como por seu encaixamento SOCIale hlstonc2j QUalS são
incluiu a gramática e o uso efetivo da língua nos cenários definidos so- as unidades e os níveis de contexto que devem ser distinguidos com o
cial e historicamente.@ foco sobre o discurso requer análise detalhada objetivo de fornecer uma rigorosa explicação da linguagem como práti-
dos fatos lingüísticos e etnográficos emergentes localmente (por essa ca? Quais são as relações e os processos que dão origem a diferentes
razão, "micro"), ao passo que o foco nos sistemas lingüísticos e socio, unidades e níveis contextuais? Como analisar os contextos efetivos sem
culturais requer análises igualmente cuidadosas das regularidades for- cair no pântano das particularidades?
mais e funcionais, cujas motivações se encontram muito além dos indi- Meu modo de lidar com essas questões se dá por meio de duas
víduos e de suas ações (por essa razão, "1flac~Desse modo, a etno- dimensões abrangentes do contexto, as quais eu chamo de emergência e
grafia da fala combinou ll.!!idades descritivas como o evento de fala, a incorporação/ encaixamento (emergence and embedding). A primeira de-
comunidade, e os repertórios verbais, na tentativa de trazer o cenário signa~spectos do discurso que surgem da produção e da recepção en-
etnográfico dos enunciados para estabelecer relações entre suas proprie- quanto processos em curS<DEla diz respeito à atividade mediada verbal-
dades formais e funcionais. Nas últimas décadas, os lingüistas antropó- mente, à interação, à c<l-presença, à temporalidade, em um contexto res-
logos investigaram a relação entre linguagem e economia política e o trito como um fEto sensível (em termos fenomenológicos), social e histó-
que ficou conhecido como ideologias da lin~m, ambas combinan- rico. Já a incorporação (embedâíng) designa a relação entre os aspectos
do fenômenos de diferentes escalas (Silverstein, 1976; Schieffelin et aI., contextuais relacionados ao enquadramento (jraming) do discurso, sua
1998). Nenhum estudo do contexto que tente dar conta das especificida- centração ou seu assentamento (groundedness) em quadros teóricos mais
des formais das práticas enunciativas e de seu encaixamento social (so- amplõShDito desse modo.rhá, por um lado, um alinhamento inicial da
cial embedding) deve rejeitar as divisões rotineiras entre fenômenos de emergência com a esfera altamente local da produção do enunciado, ea
micro e macronível. incQ.q::oraç~o ao contexto em larga escala, por outro la~ste é o modo
C.Contexto é um conceito teórico, estritamente baseado err:G.;laçõ"éSl Como as duas noções são discutidas usualmente na literatura sobre a
~ ~
Não há contexto que não seja "contexto de", ou "contexto p~a". Como linguagemWmergência está associada ao chamado tempo real da pro-
este conceito é tratado depende de como são construídos outros ele- dução do enunciado e da interação, e a incorporação descreve a situação "-
mentos fundamentais, incluindo língua(gem), discurso, produção e re- dos enunciados em algum contexto mais am~Entretanto, a emergên-
cepção de enunciados, práticas sociais, dentre outros. Hoje em dia se cia pode ser facilmente concebida em níveis temporais diferentes, como
reconhece de forma bastante ampla que muito (se não tudo) da prodU- qualquer historiador sabe, assim como a incorporação aplica-se a cam-
ção de sentido que ocorre por meio da língua(gem) depende fundamen- pos mais locais de produção do enunciado. Para entender isso, vamos
talmente do contexto e que, além disso, não há uma definição única de nos concentrar mais detalhada mente em cada uma das duas dimensões,
quanto ou de que tipo de contexto é necessário para a descrição da lin- iniciando com a dimensão da emergência.

t""
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2. Emergência elas emergem a cada momento: A co-presença mútua e o acesso recípro-


COdos interactantes assumem a forma de uma r~ciprocidade mais preci-
2.1 Contexto como uma situação momentânea sa~até novo sinal e para todos os propósitos práticos, c~a participante
p~car-se no lugar do outro, a~umindo ou ao menos levando em
consideração a perspectiva do outro.
Em uma interessante discussão acerca do problema micro-macro --- ,

desenvolvida a partir do ponto de vista da análise da conversação, ......--


Goffman (1972) contribuiu para a formulação das idéias de Schutz
acerca do contexto em seu influente artigo" A situação negligenciada".
Schegloff (1987: 208) afirmou que a\!TIt~ã"O, que envolve no mínimo
Goffman criticou os tratamentos difundidos na época acerca do contex-
duas pessoas, é o local primordial da socialização. Esta visão está funda-
to social, que o consideravam em termos de correlações entre variáveis
da em uma importante história das noções de socialização e de intera-
sociológicas de macronível, tais como sexo, classe, profissão e papéis
ção (Schutz, 1970a). O primeiro termo geralmente é definido de maneira
institucionais. Ele defendeu que ~ gtuaç~ têm suas próprias caracte-
precisa, mas na asserção incisiva de Schegloff, ele indica a propensão
rísticas que resultam do fato de haver co-presença entre duas ou mais
humana para se engajar com outros, levando a inferir que esta propen-
pesso~Uma situação é um espaço de possibilidades mútuas de moni-
são é um aspecto fundamental da sociedade humana. A importância
toramento dentro do qual todos os indivíduos co-presentes têm acesso
primordial conferida à interação pode ser encontrada na sociologia fe-
sensório uns aos outros diretamente. Por essa razão, as seguintes condi-
nomenológica de Alfred SChutz, que parte da combinação da teoria so-
ções se aplicam:
cial de Max Weber com a fenomenologia de Edmund Husserl (com uma
boa dose das idéias de WilliamJames e da psicologia Gestalt). De acordo 1. Há p~lo menos dois participantes que co-ocupam o mesmo tem-
com Schutz,~s sujeitos sociais se desenvolvem em um mundo de rela- po objetivo (que Schutz [1970a: 165ss] distingue do tempo psi-
ções intersubjetívâs, no qual outros são dados para eles como objetos no cológico e da experiência constituída de tempo-espaço), no qual
espaço e como outros eus (Schutz, 1970a: 163). Eles compartilham de as percepções e os gestos expressivos desenrolam-se sequen-
uma reciprocidade primitiva no sentido de que cada um existe em rela- cialmente.
2. Cada participante da situação é p.r.esentec~poralmente, poden\ r
ção com outro. Eles são partes de um "nós" mútuo, cada um situado em ...F'«--'"
um mundo também ocupado por outros.Íõlas relações de interação (como do ser percebido e sendo capaz de perceber o outro. X.~

oposto a relações entre contemporâneos ou predecessores), as par~s 3. A situação é um campo de possibilidades de rponitoramentQ.
estão fisicamente co-presentes, o que requer que estejam no mesmo lu- mútuQ.. o que acarreta a capacidade dos co-ocupantes percebe-
gar e ao mesmo te~poe-no que os fenomenólogos chamam de atitude rem e prestarem atenção uns aos outros.
natural (bem atentos, em seus sentidos, para acessarem o senso comum).
Para cada participante da interação, os gestos cO:Q.2orais do outro (in- Essas três condições implicam cooperação mútua (compartilhamos
cluindo os enunciados) apresentam a si mesmos como expressões que isso), co-ocu~ão do mesmo espaço-tempo (estamos aqui-agora) e reei-
rojetam e que tornam perceptíveis os estado~ internos de consciência. pr~idade (eu percebo você e você me percebe). Note-se que a\situãç~
Na interação, o c..2E.R0 do outro é primariamente um c~mp~expres- não é um campo de cooperação mútua, reciprocidade eco-ocupação
são tomado como sendo significativo, não um mero objeto percebidc;.\ rnútuas efetivas, mas um campo no qual elas existem como ~
Como corolário da co-presença, os dois participantes estão no mesmo dades. (Isto é outro fator reminiscente da fenomenologia na idéia de
fluxo temporal, e cada um pode perceber as expressões do outro corno hOriUllte.) Ela é minimamente estruturada,logicamente anterior a qual-

"- C (\f~\t.('í1-IN'~S ~
~trJ{\If'~( k \}Jl\ (v- "'
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quer enunciado, e eminentemente desprovida de qualquer objeto além @vel da situação cada participante é potencialmente cônscio da presen-
da co-presença dos participantes.G\ partir desta perspectiva da lingua_ ça do outro, mas não está necessariamente atento ao significado expres-
gem, a situação fornece um tipo de "externalidade prévia" dentro da sivOdos~ do outrQJComo um mero campo de co-presença (que
qual o discurso e a linguagem são projetados através dos atos de enun_ 5chutz [1970b]chamou relação pura do nós), uma situação não tem es-
ciaçã~ trutura significativa: nada em particular acontece ou é especialmente
De acordo com o que dissemos até aqui, todo discurso dialógico relevante. 5e dispusermos em camadas na situação os atos socialmente
pode ser descrito como situado à medida que ele ocorre em situações. O identificáveis, as expectativas, a compreensão mútua entre as partes, e
enunciado o prato está pronto está situado, digamos, quando produzido um sistema de relevância, chegaremos a uma unidade contextual mais
por um cozinheiro em resposta à questão quando o jantar ficará pronto? próxima da interação e consideravelmente mais estruturada. Chamare-
Tanto a pergunta como a resposta estão situadas na relação perceptível mos essa nova unidade de §(setting) (Sacks, 1992:521-22).
e interativa entre os participantes, e as três condições acima se aplicam. Se um falante diz estou aqui para me encontrar com Martin, isto é uma
~as Goffman distingue entre fatores "meramente situados" e fatores grande festa, ou estou pedindo sua ajuda, ele tem em cada caso formulado
inerentemente situadóSj Os primeiros incluem as estruturas lingüísticas o cenário no qual o enunciado ocorre. Nos termos da análise da conver-
sação, aCf2!mulaç!oJéuma descrição, e conseqüentemente, uma catego-
-
e simbólicas que são instanciadas em enunciados, mas não dependem
-----
realmente da situação para sua definição. Em contraposição, o momen- rização, em oposição ~expressões indiciai~que evocam o cenário, mas
to e ~elocução de enunciados refletem o ajustamento mútuo in situ en- não o formulam, já que elas carecem de conteúdo descritivo. Em casos
tre os interlocutores e são inerentemente situad~ituação de Goffman, paradigmáticos@Õrmulação se aplica ~eflexiyam~nte ao próprio cená-
então, representa ~ma camada do contexto que é anterior à linguagem, rio discursivo no qual ela ocorr~ O que mais nos interessa nessa ques-
mas com a qual podemos distinguir entre os aspectos meramente e ine- tão é que€s formulações são internas ao contexto interativo, revelam os ~
rentemente situados do fluxo discursivo}pma grande parte das pesqui- julgamentos dos participantes do que é relevante e do que acontece, e
sas realizadas nas últimas décadas demonstrou a importância desse ilustram a CºD~ão de uma simples situação em um cenário so~iã!J
quadro teórico, e do€lodos como o discurso transforma e se adapta às (Schegloff, 1987). "--- -
~
situaçõ~ Tornou-se parte do senso comum considerar que o contexto é Introduzir o conceito de reIevâií.ciaé transformar fundamentalmente
situado, qualquer que seja ele. ~ idéia de contexto. Por u~ "lado,[uÍgamentos de relevância sempre
.~".~ irnplicam um~llla ou um p,onto dejnJeresse a partir dos quais a relação
\ \,. "h
t (li-\ .~.11-'~
de relevância é estabelec~Por outro lado, esta relação está ancorada
2.2 Cenários relevan;;es
-- nas experiências prévias dos sujeitos, à luz das quais o interesse emerge
-
(/\:vv'}!'-~
e '" --
>J'7 '-'<J'
../
~ o ~ 0-(' \)

<Definida desse modo, a situação é insuficiente para descrever a ín-


(Schutz, 1970b: 5).lqm~a, assim como um ponto focal, implica um
p_anode fundo ou horizonte do qual se distingue e em relação ao qual
~\J~\
\oi-")..
teração porque ela carece de vários traços fundamentais. Enquanto uma ele funciona como um ponto central. Isto, por sua vez, implica que qual- ~
situação existe no tempo, ela carece das distinções assentadas temporal- quer contexto no qual a relevância temática opera é uma estrutura con:}

~(:s~~.
7"
,r-..,J mente tais como cedo em oposição a tarde, IEeio em oposição a início~
Os últimos termos somente podem ser aplicados ao curso de ativi-
dades nas quais existem unidades e expectativas de ação. Ademais, no
~is nívels (usualmente descrita como primeiro plano/segundo p~
t~ma/horizonte).®eferência
e P,
à história dos su'eitos ara quem algo ~'--"r. "'-te
temático efetivamenterexpande Oâmbito do contexto, que passa do pre- ,--Uf-\
ç ,
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\J ""~~ ~ ~\'1/
~~',,-)-C ("~~v--) ~~~~~'" -)
180 W F. HANKs ÚNGUA COMO PRÁTICA SOCIAL 181

sente vivido da percepção situada para ulllfassado rememorado e Se~ antropologia lingüística contemporânea). Buhler distingue dois aspec-

-,
dimentado através da experiência cotidian.!0Em resumo.Iâo se introdu~ toSdo contexto no qual qualquer signo é usado: (1) o Symbolfeld, "~-
zir a noção de relevância, o conte~o se toma uma estru!Ur~ hierárquica po simbólico", que consiste de palavras, de outros signos e dos concei-
conectada a uma história não-loca tos que eles representam, e (2) o Zeigfeld, "~a~p~ demonstrativo", que é
Além da distinção entre tema e horizonte, Schutz (1970b) desen~ o cenário interpessoal imediato no qual um enunciado é produzido. Es-
volveu ~m modo tríplice de contrastar os tipos de relevância] os quais ses dois elementos são combinados de vários modos nos estudos de
" ele chama topical, interprgtativa e m~ional. O primeiro se centra no suhler, por exemplo, [náf~e "dêixis imaginária", e o modelo de con-
texto resultante é permeadamente semiótico. Ele herda todas as caracte-
IIII ~v @bjeto ou no assunto para o ~l os sujeitos dirigem sua atençãõ.\ O
, \ ~ segundo está relacionado com 't!uais aspectos do objeto são relevantes rísticas dos cenários como indicado acima, mas estas são transformadas
pelos ~os (simbólicos, indiciais e icônicos~ pelas relações dos signos
,\V\~ para a questão em pauta e quais partes do conhecimento de mundo dos
(sintáticas, semânticas, pragmáticas), pela presença dos objetos signifi-
II1 {' sujeitos são colocadas em relação com eleJO terceiro diz respeito aos
cados, e de várias funções incluindo a referência e a diretividade
" propósitos prospectivos 'do~ sujeitos (denominado por Schutz "com a
individuadas (orientação de propósito de atenção de um interlocutor
.u finalidade de motivar") e-àscondições passadas que possibilitam a emer-
por meio de palavras e gestos). '------'!J.Y,/-- Le. I M.,ur Y fi'>' k_ Jv"f' . ./
gência daqueles propósito€ (chamado por Schutz "porque motivar"). O
'<,

,/ ( I I/ ~
Buhler resumiu o Zeigfeld como" Aqui-Agora-Eu" (Here-Now-If, co-
efeito da combinação desses três tipos de relevância é a criação de um
locando assim em primeiro plano sua relação com o(s) sistema(s)
sistema de relevância de múltiplas camadas ligado de vários modos ao
lingüístico(s) dos participantes. Esses três termos são os ?erriCoS
contexto, e~globando memória' e antec~ção. Embora os estudos inqui-
prototípicçs: eles são(êXpressões referenciais cujos significados conven-
ridores de Schutz façam outras distinções, essas são suficientes para sa-
cionais pertencem ao código lingüísticg, e, ainda assim, como elemen-
lientar que o contexto interativo, mesmo em um nível relativamente
tos indiciais~ua referência em qualquer ocasião de uso depende estrita-
primitivo do cenário, é hierárquico em várias dimensões, tanto as co-
mente do contexto do enunciadô, A dêixis é o modo singular mais óbvio
presentes locais como as não-locais.
pelo qual o contexto é incorporado em muitas categorias das línguas
humanas. Retomando os termos de Sacks,(Es dêiticos "invocam" o ce-
nário, porque eles são indiciais, mas não o "formulam", porque eles ca-
2.3 Campo semiótico, simbólico e demonstrativo recem de conteúdo descritivo. Compare-se eu estou aqui com eu estou na
sala de jantar de minha caSãJ Também tem sido comum na literatura sobre
Embora tenhamos apresentado a função de formulação ,com o fito o tema distinguir entre element,os de referência indiciais (e.g., dêiticos,
de esclarecer a diferença entre uma situação e um cenário, nosso quadro pronomes, elementos apresentativos, alguns advérbios de tempo) e
teórico ainda está pobre, olhando da perspectiva da estrutura e da indicialidade não-referencial ou social (Silverstein, 1976). Esta última
semiótica da língua. Este é o próximo elemento que devemos apresen- noção poderia incluir fenômeno~ como~~grr;..r.eglpnal ou outros tipos
tar c~ o objetivo de nos aproximarmos de uma noção de contexto ade- de sotaques identificáveis, registros estilísticos e honoríficos (Agha, 1998;
quada para a descrição lingüística. Nós o faremos a partir da teoria de Errington, 1988)à medida queresses traços da língua assinalam aspectos
Karl Buhler (1990 [1934]), que teve um profundo impacto nas subse- do contexto do enunciado sem se referirem a ele ou sem descrevê-Io. \
qüentes abordagens lingüísticas e semióticas do contexto (particular- Compare-se um enunciado proferido com o marcado sotaque de New
mente na etnografia da fala, nos tratamentos lingüísticos da dê~ e na England, que indica não-referencialmente a origem do falante, com o
LÍNGUA COMO PRÁTICA SOCIAL 183
182 W F. HANKS

;l Note-se que a emergência acarreta tempo, mas é diferente dele, já


enunciado eu sou de New England, que afirma o mesmo. O que é mais
importante sobre a indicialidade, para nossos objetivos, é o modo pelo que ela descreve a relação entre várias unidades de produção do discurso.
qual variedades referenciais e não-referenciais servem para àrticular a Quando os indivíduos co-engajam em um senário, seus campos
língua, como um sistema geral, com o contexto do enunciado.As cate- perceptuais são orientados pela relevância e quando eles co-participam
gorias dêiticas de qualquer língua, e a combinação dessas categorias em de um campo demonstrativo eles são reorientados pelos signos. Do mes-
frases, sentenças e enunciados, revelam modelos esquemáticos para o mo modo também as relações temporais são transformadas na passagem
contexto. da situação para o cenário e deste para o campo demonstrativo. A diacroni~ \
é uma condição existencial para o contexto em qualquer nível de-análise,
-'*- O campo demonstrativ~~ por conseguinte, converte o cenário inte-
mas denota diferentes processos de acordo com o nível. Por exemplo, a
rativo em um campo de signos"\Para Buhler, ele inclui os gestos e outros
duração interna da experiência, a simultaneidade das relações puras do
aspectos perceptíveis dos participantes, tais como a postura, o ato de
nÓS, a produção de enunciados, a tomada de turnos na fala, o início, o
apontar, a direção do olhar e o som da voz do falante, de modo que tudo
meio e o fechamento das unidades conversacionais, e a projeção pros-
isso oriente o foco da atenção subjetiva do falante. Assim como Goffman pectiva implicadas pela intenção e pela estratégia são diferentes
e outros analistas da conversação, Buhler assume que os participantes diacronias.LÃemergência está em tudo relacionada à estrutura e descre-
estão em "atitude natural": muito atentos, orientados cada um pelos ver o contexto como emergente implica assumir que ele é estruturadoà
sentidos de seu corpo, assimilando os dados que chegam pela visão, ~~~J:~ -
pela audição e pelo tato, em um sistema de coordenadas, cuja origem é dCL~~\W).,U·;" • ,.-~C
o Aqui-Agora-Eu (Buhler, 1990: 169ss). No interior desse cenário feno-
3. Incorporação (embedding)\ c.~II~(
) lo; (
E mênicofõs enunciados, em suas dimensões simbólica e indicial, tanto ""'~
"- ~ \'L ~"
-1\ refletem como trausformam o contexto) Eles orientam a atenção dos
participantes, tematizam objetos de referência, formulam, invocam e A progressão da situação para o cenário e deste para o campo de-
constroem o cenário, atuam sobre os sistemas de relevância, em resu- monstrativo não é nem uma seqüência temporal nem um conjunto de, v" "\
mo, produzem contexto} relações de inclusão. É um problema deordenamento lógico, a partir de ~~"'t )
um nível relativamente primitivo da esfera da consciência perceptual
A situaçãoI o cenário, e o campo demonstrativo são~tes no
através do campo demonstrativo semioticamente complexo. O cenário
sentido de que eles se desdobram no tempo. Esta é uma conseqüência
herda os traços de co-presença da situação transformando-os por meio
do fato de que ás práticas lingüísticas produzem contexto de forma con-
de relações de relevância e de unidades de ação socialmente reconheci-
tínua. Isso dá origem a noções como duração, seqüência, simultaneida-
das. O campo demonstrativo simbólico herda do cenário um sistema de
de, sincronização, e nos obriga a incluir as noções de memória, antecipa-
relevância interperspectival, mas o transforma por meio de sistemas
ção e teleologia em nosso modelo de contexto. O twpo é central para o
semióticos multifuncionais (sendo a linguagem o mais notável). O mo-
estudo da conversação e a seqüência é fundamental para os sistemas de
delo de contexto implícito no campo demonstrativo é ponto de partida
tomada de turno, para a anáfora, para a coerência temática, para a pro-
dução interativa de sentenças (Goodwin & Goodwin, 1992), e para a
núnimo para o estudo do discurso.
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, .. ,
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organização de inúmeras estruturas conversacionais. Ele também está - ~~ ,J~IM.-rt- J
~(i(l) t ~lM' dl. ~,w/L
na base do conceito de 'adjacência na análise da conversação, e da rela- 1. Ver nota 1, do capítul6 1 deste volume sobre a justificativa dos tradutores pela escolha dos
ção entre unidades contíguas na conversa. termos "incorporação/encaixamento" para a tradução do termo embedding. (N.T.) r· 3 ~
I' \'
70
184 ÚNGUA COMO PRÁTICA SOCIAL 185
W F HANi(S

o que quer que seja verdadeiro sobre o contexto discursivo, então ;;.ação e relações de relevância do cenário, mas o reconstitui via semiose
engloba corpos e campos perceptuais, sistemas de relevância, tipos d~ JXl.ulti(uncional(ii). O sistema de relevância de um cenário organiza como
atos e as expectativas que eles engendram, sistemas semióticos e as trans- OSsujeitos monitoram um ao outro na situação, e as funções semióticas
formações que eles produzem. Como só foi enfatizadoftodas essas for- do campo demonstrativo simbólico transformam a relevância por meio
mações contextuais são e.!!lergentes devido ao fato de envolverem dura- da tematização (iii). Se surge um problema no monitoramento mútuo
ção, seqüência, simultaneidade e, nas formações mais complexas, me- entre os sujeitos co-presentes, então ele é tratado à luz do cenário, que
mória e antecipaçã~~Virtualmente, em todas as práticas comunicativas estabelece as expectativas e os requisitos de relevância para identificar
ordinárias, os três níveis estão coadunados e as distinções entre eles são OU resolver o problema. Igualmente, se um problema de (ir)relevância

analíticas: (Um cenário é meramente o que sobra quando nós analitica_ ou de falsas expectativas surgir, então ele é entendido e tratado à luz do
mente retiramos os efeitos da semiose; uma situação é o que permanece campO demonstrativo simbólico em curso, que invoca, formula e forne-
quando nós colocamos a relevância de la~ Tais separações analíticas ce os significados para se construir o cenário (iv). O desfecho para esses }
rt'
têm a vantagem de esclarecer como os contextos discursivos se unem e comentários é o fato de que ~ incorporação textual nunca é um mero ~~ I

se separam, e como língua e discurso se ligam de modos diferentes a acréscimo ou entorno externo para aspectos do discurso ou da intera- ,
distintas ordenações do contexto. Não se está sugerindo com isso que os ção. Em qualquer nível que o examinarmos, o contexto é constituído de .
três (situação, cenário e campo demonstrativo) têm existência indepen- relações de incorporação.
dente, mas sim que no curso da vida social, não há situação que não A pesquisa em antropologia lingüística nas últimas décadas forne-
esteja intimamente ligada a um cenário e não há cenário separado de ceu evidências abundantes e fortes de que a incorporação não está limi-
semiose. Essa relação dejm12licação~ordenada e de conexão nós a des- tada aos níveis até agora citados. O campo demonstrativo simbólico não
crevemos como incorporação / encaixamento (embedding). existe em um vazio social e por mais forte que seja a tendência a se
Estudar o contexto é estudar a incorporação / encaixamento. Se a generalizar por meio de regras, estruturas invariantes, ou procedimen-
formação contextual X é incorporada a ou encaixada em Y, então as se- tos, os contextos variam mais radicalmente do que sugerido até o mo-
guintes asserções são verdadeiras: mento, e sobre parâmetros ainda não mencionados. Isto não é surpresa
para os etnógrafos, mas coloca um desafio real para os lingüistas por-
i. Y acarreta X, mas X não acarreta Y.
que os sistemas lingüísticos e as práticas se articulam detalhada e preci-
ii. Y herda certas propriedades de X, mas apresenta outras pro- samente com os fenômenos sociais para além do alcance da mais sofisti-
priedades. cada semiótica. Como explicaremos o impacto exercido sobre o contexto
iii. Y transforma X, alterando propriedades herdadas e apresen- por fenômenos sistemáticos como a diferença entre indivíduos expe-
tando novos princípios de organização (via re-arranjamento, rientes e novatos nos cenários institucionais (Cicourel, 2001), o papel da
reavaliação etc.). ideologia sobre a prática discursiva,1§s diferentes sentimentos de identi-
iv. Se alguma parte de X se torna um foco temático, ou para OS dade nacional, étnica, ou de classe, sobre a produção do discurso] os
sujeitos ou para os analistas, então Y é o horizonte relevante. Valores que ligam diferentes modos de falar, escrever, ou outras formas
mediadas de discurso que não tomam a forma de situação face a face no
Por exemplo, um cenário acarreta a possibilidade de monitoramento coração do campo demonstrativo? Por exemplo, está claro que pessoas
mútuo entre os participantes, mas uma situação não acarreta uma estru- e Objetos no campo demonstrativo têm, para os participantes, valores
tura relevante (i). O campo demonstrativo simbólico herda unidades de de vários tipos. Eles são bons, maus, bonitos, feios, meus, seus, caros ou
LÍNGUA COMO pRÁTICA SOUAL
186 W F HANKS
ça, mas que os moldam significativamente. @elegar tais dimensões ao
baratos, desejados ou evitados, mesmo que tais valores derivem dos ;, cenário social é uma simplificação conveniente, mas falha em explicar
sistemas sociais e das experiências além do âmbito do campo demons, como elas afetam o discursõjExigir que essas dimensões sejam relevan-
trativo. Na prática efetiva, em oposição a substitutos da prática basea, teS para os participantes é exigir que elas sejam tematizadas, visto que
dos em teoria, o discurso circula em contextos que estão eles próprios grande parte da formação social que afeta o contexto do discurso fica
incorporados a formações sociais apenas parcialmente explicáveis pelo
despercebida. Rotulá-Ias como conhecimento de mundo evita a ques-
discurso. No campo demonstrativo de Buhler, sujeitos e objetos são anô,
tão, já que muitos indivíduos em cenários institucionais têm fragmentá-
nimos, são os ocupantes acidentais de posições e papéis definidos se-
ria e sistematicamente distorcido o conhecimento das forças que mode-
mioticamente. E, mais ainda, no discurso cotidiano, as pessoas, os gru~
lam objetivamente os contextos nos quais interagem.
pos, os objetos e os-cenários reais estão em jogo, e são, em grande parte,
familiares e avaliados.
Este é um dos problemas mais difíceis no estudo do contexto: para
conseguir uma explicação geral, formulamos regularidades esquemátí. 3.1 Campo social
cas, mesmo que com o objetivo de se engajar efetivamente no discurso, Dissemos que quando um nível ou esfera contextual é incorpora-
falantes e destinatários devam se confrontar com detalhes emergentes.
doía) a outro, o nível incorporante herda determinadas propriedades
As explicações semióticas procuram superar essa dificuldade distinguin-
daquele incorporado, que o transforma, e que serve como um horizonte
do tipos (generalidades) de ocorrências (realização particular), ou com- operativo no qual o nível incorporado é compreendido. Nesses termos,
binando estruturas (e.g., sistemas lingüísticos) com fenomenologia (a
podemos dizer que ~ualquer campo demonstrativo é incorporado a um
solução de Buhler).~ problema dessas abordagens é que elas tratam as C?U mais campos sociai~~O termo" campo social" tal como é usado aqui
~ práticas efetivas como mera instanciação situada de leis gerais, que do- é adaptado da sociologia da prática e designa~m espaço delimitado de
mesticam as particularidades, fazendo delas uma mera instância de algo posições e de tomadas de posição por meio das quais valores circulam,
\ geraSAo mesmo tempo, elas preservam a definição radial de contexto, no interior do qual agentes possuem trajetórias ou carreiras e se engajam
de acordo com a qual o individual, o enunciado, ou a situação é o ponto em vários fEptings (a saber, competitivos, colaborativos, estratégicos et2}j
tcentral e todos os outros fatores são definidos em relação a ele. Esta é Assim definido, o campo social não é nem radial, nem baseado no dis-
uma solução produtiva para determinados problemas, tais como a se-
l
mântica da referência indicial onde o signo designa seu objeto no inte-
curso (embora o discurso circule na maioria dos campos), existindo sim
cenários interativos incorporados a qualquer campo social. O queé dife-
rior de uma relação temáticaCM:as o que dizer a respeito de um contexto rente sobre o campo social é seu âmbito (não-local) e a forma como ele é
organjzacional como um hospL@l, um camp"us universitário, ou um tri- organizado (não-radialmente), o caráter de seus limites (acessos creden-
bun~? Muitas das interações que ocorrem nesses contextos são molda- ciados e limitados opostos aos acessos relativamente abertos dos cam-
das em parte por ~stemas institucionais, processos de credenciamento e pos demonstrativos) e os valores que nele circulam (poder e capital eco-
divisões sociais que existem antes e além de .qualquer campo demons- nômico e simbólico opostos à produção dos sentidos por meio da
trativo, que não estão assinaladas em lugar algum do discurso e, mes- indicialidade, da referenciação e da descrição). Além disso, enquanto os
mo assim, moldam o contexto e restringem o acesso dos sujeitos ao dis- participantes na produção do discurso são tradicionalmente concebidos
curso. Precisamos de um meio para analisar as dimensões contextuaiS como indivíduos (já que as interações significam engajamento intersub-
que não são radiais em relação ao enunciado ou ao campo da co-presen-
e.. vt
LÍNGUA COMO PRÁTICA SOCIAL 189
188 W F. HANKs

jetivo), as posições dos agentes em um campo social somente podem ser _jrldiciais simples, nós somos forçados a olhar para além do campo ime-I
ocupadas por coletividades (organizações profissionais, "comunidades" ~diato de co-presença, da mesma forma que os participantes devem fazê-
classes. corpo departamental) cujas p~r~ções são tipicamente media~ 10 com o objetivo de entender os enunciado~Para explicar o funciona-
das pela escrité!:,por meios r eletrônicos e por outros instrument~ De mento efetivo do Zeigfeld, então, somos obrigados a olhar para além do
acordo com esta definição, \!1ospital, universidade, profissão, disciplina campo social. Estes são todos efeitos incorporados e é inevitável levar
acadêmica, tribunal, supermercado, aeroporto, congregação religiosa e em conta o campo social em qualquer descrição das práticas indiciais.
vizinhança, são todos campos socíais.ílsso não significa que eles sejam Cenários e campos demonstrativos são desenhados para se proje-
todos equivalentes ou que qualquer um deles não possa ser ele próprio tarem em novas incorporações. Qualquer sistema de relevância ancora
incorporado a outro campo. Significa, sim, que essas e outras formações seu foco temático dentro de uma história de outros engajamentos com o
sociais fornecem contextos críticos incorporados que modelam campos objeto, de um horizonte de outros objetos relacionados, de um conjunto
demÇ!lstrativos radiais, interativamente centrados. de objetos em relação aos quais é interpretativamente relevante e que
9 campo social co19@.re..§trições acerca de quem tem acesso aos pode ser ignorado. Conseqü~emente\B cenário já é fundado em um
I?~pji~articipantes de Falante, Destinatário, Ouvintes Não-Previstos mundo para além dele próprio.jl.Ima vez introduzida a semiose, temos
(ratificados ou nã~ aprovação para fazer parte de uma competência, à as relações temáticas, e nem todos os objetos significados estão co-pre-
necessidade de lidar com as faces de modo específico (Goffman, 1967) e sentes na situação. Além disso, ~s próprias categorias simbólicas ligam
assim por diante. No campo demonstrativo como tal, não há restrições o signo e seu objeto a outros signos e objetos in absentia, como colocou
acerca de quem pode desempenhar qual papel em atos de referência, SaussuieJ
dirigir a atenção conjunta, ou semioticamente propor indicialidade. É l?uas transformações um tanto diferentes acontecem no processo
suficiente que os participantes dominem a língua e estejam em atitude de incorporação de um campo demonstrativo a um campo social. O cam-
natural. Mas isto não é verdade em relação a um campo social, no qual po toma-se atual, podemos dizer, localizado, por sua articulação via re-
o acesso a diferentes posições é restrito, a autoridade de falar de deter- levância, simbolização e evocação indicial (tanto melhor se ele for for-
minados modos e de especificar outros é restrito, e a capacidade de mulado explicitamente, embora isto não seja necessário, como vimos).
monitorar o outro é um direito seletivo ou até mesmo uma responsabi- Isso é uma verdadeira transformação porque o campo social não deve
lidade, e não uma mera condição existencial. sua estrutura ou sua existência ao tipo de estruturas radiais, intencio-
Nos tipos de campos organizacionais lista dos acima, há também nais dentro das quais ele é acionado pelos signos (o mll!ldQ.nª--Qé orga-
muitas relações virtuais de contrapartida como, por exemplo, a corres- nk<!do_do_mesmo moJlQ....ç.omo a língua se..,!efere9- el~). O s~~cio mod9
pondência entre o paciente e a imagem de raio-X, o caixa e a caixa regis- de incorporação é o da QÇupaçã9: o ator ocupa um papel de participan-
tradora, a evidência e as ações passadas-presentes que a produzem, o te, que ocupa uma posição de agente (Dr. [ones fal? comO um especia-
artigo e seu autor. Essas correspondências criam redes de relações de lista ao realizar um procedimento cirúrgico). Os cenários co-presentes
contrapartida entre objetos no campo demonstrativo imediato e aqueles OCupam um lugar socialmente definido (o sistema de relevância e as
que estão ausentes (em outros lugares ou em outros tempos).\Q estudo ações em curso são procedimentos realizados em uma clÚ1icamédica).
detalhado das práticas dêiticas mostra que tais correlações desempe- O referente-objeto ocupa uma posição socialmente definida (os instru-
nham um papel f~mativo no modo como os participantes resolvem a mentos necessários em um procedimento sendo realizado). Desse modo,
'referência indicial.:)~ implicação disso é que para entender práticas ~mpo social incorporante fornece um espaç2-.ge_posiçÇí:3 (incluindo

......J
190
W F HANKs LÍNGUA COMO PRÁTICA SOCIAL 191

posições de referente) e ~ssas posições são ocupadas ou assumidas pe-


Os participantes de qualquer processo de produção do discurso
los diferentes elementos herdados do campo demonstrativo incorporado.
são claramente uma parte-chave do contexto, quer eles se engajem indi-
Incorporação é um Erocesso no tempo, e um estudo adequado do vidualmente ou em grupos, quer tratemos o contexto em termos locais
contexto no nível dos campos sociais deve observar a QLdeffitemporal
das ocupações, incluindo as ocupações das pessoas, dos objetos, dos
OU não-locais. t;i;
discussão feita até agora, há uma série implícita de
incorporações de participantes, desde o sujeito individual até a <:.~-pre-
lugares, e das ações no curso do tempo das organizações. O campo so- s~.fl intersubj.e.,!ivª-(IDtllilSão), o co-engajaJllento_(~o), os Bapéis ~
cial tem uma história que transcende qualquer ocupação particular. A .ê!ticirantes (campo ~~strativ~), as posições, aggn!e_s (campos sq-
clínica médica sobrevive sem o Dr. Jones, já que ela se afasta da posição ciaiS2}Emuma série de influentes estudos, Goffman (1963, 1981) dirigiu
que ele ocupa em tal ou tal ocasião. A temporalidade de cada enunciado sua atenção para os diferentes tipos e graus de envolvimento que os
no nível do campo demonstrativo é incorporada e, conseqüentemente, sujeitos do discurso mantêm na prática social. Ele distinguiu, por exem-
transformada, na história mais geral do campo. plo, interação desfocada de interação focada, sendo que o primeiro ter-
@lhar as práticas comunicativas incorporadas a um ou mais mo diz respeito a meras situações e o segundo aos cenários nos quais os
campo(s) social(is) nos permite perguntar quais elementos permanecem participantes partilham focos de atenção e de orientação comuns (que
relativamente invariantes durante a incorporação, e quais são sujeitos a ele chamou de "encontros"). Dada uma interação focada, surge a ques-
transformaçõ~A distinção entre Falante, Destinatário, Objeto, o signi- tão relacionada ao nível de intensidade do envolvimento e de distribui-
ficado semiótico da tematização, a total relevância da percepção e da ção do envolvimento entre os participantes (ao longo do tempo). Isso
organização procedimental da tomada de turno (Schegloff, 1987) podem levou Goffman a estabelecer a distinção entre contextos a partir do modo
permanecer constantes, por exemplo, até mesmo quando diferentemen- como eles regulam o envolvimento, a incorporação daquela regulação
te realizadas e limitadas em campos diferentes. Tal invariância contribui ao espaço e a conduta física, as punições pelo envolvimento inapropriado
para a autonomia parcial do campo demonstrativo no curso das incor- (invasão, exclusão, desconcentração, intensidade excessiva), e toda a
porações. Inversamente, certos traços dos campos sociais podem fun- "(de)limitação" ou "abertura" dos contextos (Goffman, 1963: 198-210).
cionar como restrições ou recursos constantes para qualquer campo de- Embora toda essa discussão esteja fundada no sentimento fenomenoló-
monstrativo que surja dentro de seus escopos de incorporação. Até cer- gico de engajamento subjetivo, ela pode ser projetada de modo análogo
to ponto, esses fatores contribuem para o que Bourdieu (1993) chamou ao nível do campo social e das posições de agente acarretadas. Aqui, o
de "~ronomia~_ do~ c~PQsJnçQrporados. a;;Ços autônomos de qual- envolvimento tem que lidar com (i) os modos de ocupação de posições,
quer êampo derivam da organização do próprio campo, ao passo que (ii) quão "(de)limitado"ou "aberto" um campo ou uma posição é, (iii) o

I
I
t
- traços heterônimos (não-autônomos) derivam de sua incorporação a al-
gum outro camp~Desse modo, podemos perguntar sobre qual que;
contexto discursivo: em que medida e em quais traços é autônomo? E
nível de acordo com o qual ocupar uma posição impede ou requer enga-
jamento com outras posições, (iv) os vetores de acesso ou exclusão for-
necidos por determinadas posicões, (v) as formas de mostrar ou ocultar
comum na literatura sobre a linguagem descrever contextos de fala como o envolvimento, (vi) as variedades de maquinação ou competição que
se eles fossem altamente autônomos, tal como o Zeigfeld generalizado são construídas de diferentes modos dentro dos setores de um campo.

1 r~ Buhler ou a díade comum f.ala~te-o::vi~e da lingüística. Mas esta


~ . .iJ;.clinação para leis que visem a esquemas autônomos esconde efeitos
heter_ô..ni~os que são sistemáticos e consequenciais para uma teoria do
contexto. \
Em resumo, a incorporação da produção do discurso a campos sociais
define um espaço de envolvimento entre agentes.
Enquanto muitas das teorias ocidentais sobre a linguagem postula-
ram um sujeito falante dotado de vontade e intencionalidade irrestrita,
193
192 ÚNGUA COMO PRÁTICA SOCIAL

a teoria social debateu longamente o quão os atores sociais e as ações de hexis, que, combina desejo ou disposição individual com o julgamen-
são determinados por forças sociais externas a eles. Isso ocasionou o to avaliativo do que é bom. Se as duas coisas estão em qonformldade
surgimento de inúmeros conceitos importantes para o estudo do con, podem~s diz~r ~~e ~ pessoa está dis~o.sta a ~gir do mod~ que é bom.
texto, incluindo estruturação, sujeição, aparelhos ideológicos do estado Om analogo língüístico pode ser a hexis mterativa, como evidenciado no
e habitue' (Bourdieu, 1977).Não obstante diferenças significativas entr~ desejo espontâneo de que bons falantes têm de ser interlocutores coope-
elas,~ssas idéias têm em comum a observação fundamental de que Os rativos ou dizer a coisa certa no tempo certo. Segundo, a idéia fenome-
atores sociais, desde sujeitos até coletividades, não são dados pela natu- Ilológica sobre '~ábj!2.je habituação como desenvolvida nos escritos de
Busserl, Merleau-Ponty e Schutz. A idéia é a de que no curso da expe-
reza, mas são, em uma visão crítica, produzidos pela sociedad;) Essas
riência cotidiana habitualmente nos engajamos de determinada forma,
idéias atingem diretamente o individualismo ao asseverarem que não
ou seja, t~demo~a ro~ a tipificar. Sob vários aspectos, a idéia.
só o "sujeito natural" não é o ponto a partir do qual a sociedade é produ-
de que os Falantes usam a língua de modo rotineiro e habitual tem sido
zida, mas ainda o sujeito é já ele próprio, um produto social. A impor-
um elemento fundamental nos estudos lingüísticos durante a última
tância dessa linha de pensamento para o estudo do contexto reside na
metade do século passado ou mais (cf. os fenomenólogos, Sapir, Whorf,
mudança que ela propõe para qualquer teoria da produção do sentido
- - -
_que principie com intenções individuais e com situações fenomênicas
- Garfinkel, os analistas da conversação, os etnógrafos da fala). A terceira
fonte para o desenvolvimento do conceito de habitus é a idéia, enfatiza-
( para depois derivar o contexto por meio do acréscimo de fatores externos da por Mauss (1973),de que'oS seres humanos l':econduzem fisicamente
(uma visão difundida nas ciências da linguagem). A partir da pers~ de modos padronizados cultural e habitualmente) Mauss estava interes-
va dos campos sociais, a questão correspondente seria em que medida o - -
sado em fenômenos- como o modo de caminhar, a postura, modos de se
engajamento em um campo conforma os participantes, não apenas em conduzir, a administração do espaço corporal em cenários sociais (como
seus engajamentos externos baseados na função agente, como sempre esperar em fila), gestos socialmente padronizados (se realmente con-
foi, mas, de forma mais ampla, conforma-os em seus hábitos, disposi- vencionais ou não, como gestos de aprovação com o polegar), modos
ções e intenções. Em outras palavras,~ uma "virada" na qual o contex- padronizados de pegar objetos, como ferramentas, modos de cobrir ou
to deixa de ser concebido como uma série de camadas da estrutura na expor partes do corpo. O insight de Mauss foi de que esses inúmeros
co-presença intersubjetiva e se toma a produção de sujeitos e a condição aspectos sobre o modo como os atores sociais habitam seus corpos e
de possibilidade para a intersubjetividaclBNossa definição de incorpo- agem por meio deles são socialmente padronizados. Note-se que en-
ração como acarretamento, herança parcial, transformação, e horizonte quanto alguns deles são ensinados para as crianças e aprovados, como a
necessário para qualquer fator contextual prenunciou esta mudança. modéstia adequada ou os modos à mesa, outros aspectos são simples-
Na teoria da prática, a idéia de campo está intimamente relaciona- mente inspirados ~!o hábito e pela tendência que os grupos humanos
da à noção de\hcimtus. A primeira define o espaço de posições e de toma- têm para rotinizar.~m a~l.ogo lingüístico disso poderia ser considerar-
das de posição~gunda define0Conformação social dos agentes que mos a produção de enunciados cõffio uma atividade corporal, sujeita à
se engajam no espaço.~Há quatro fontes principais da idéia de habitus, modulação habitual da voz, ao ritmo, à postura, aos graus de envolvi-
que ajudarão a esclarecer seu significado. Primeiro, a idéia aristotélica mento, e à sua corporificaç~
A quarta fonte é a idéia escolástica de habitus, significando os hábi- \
tos mentais <l\;!e~am as ações. Esta idéia entrou mais decisivamen~e
1. Ver no capítulo 1 deste volume a discussão dos conceitos bourdiesianos de habiius e de
campo. (N.T.) na teoria da prática através dos escritos do historiador da arte Erwín
LÍNGUA COMO PRÁTICA SOCIAL
195
194 W E HANKs

.outro, sendo que esta divisão é típica dos estudos da linguagem domina-
Panofsky, cujo trabalho Bourdieu traduziu e considerou fundamental
:> dos pelo mentalism~Finalmente, ele é uma visão alternativa do sujeito
para sua teoria da prática. Para nossos propósitos, as idéias mais salien~
falante, abertamente contraditória à idéia tradicional de que os falantes
tes do argumento de Panofsky (1976) são as seguintes:
são pessoas livremente intencionais cujos estados mentais internos (ati-
1. Em uma dada conjuntura histórica, existem hábitos mentais sub~
tudes proposicionais, intenções) são a fonte do sentido discursivo.
jacentes que guiam a produção cultural em diferentes esferas
A relação entre habitus e campo é sutil e de longo alcance. Por um
(como, por exemplo, a filosofia e a arquitetura de Paris nos sé~
lado,\ o habitus é usualmente associado, em escritos sobre a prática, à
culos XII e XIII).
origem social do indivíduo em termos de classe, sexo, etnia e outras
2. Estes hábitos são introjetados por meio da educação.
divisões macrossociológica~ Ele é in5ulcado na infância, inicialmente
3. @es servem tanto para guiar o modo de agir dos atores como no campo doméstico e por meio da ed~são mais ou menos formal. Ele
para guiar o modo como eles avaliam os atos.) é reforçado e reEroduzido na viçla social cofuliana dessas esferas e tam-
4. Eles realizam-se no curso das atividades. bém nas práticas de trabalho, que exercem influências particulares (por
exemplo, a agricultura, para um agricultor, pesquisa, escrita e ensino
Posto desse modo, o habitus é um modus operandi, flexível o sufi- para um professor, pintura para um pintor e similares, dirigir para um
ciente para realizar-se em diferentes atividades, sendo cada uma delas taxista etc.). Qualquer forma de ]2!ática ritual tem um impacto poten-
única, e em diferentes esferas de atividade, que podem ser largamente cialmente forte sobre o habitus, por meio do engajamento das disposi-
diferentes entre si. De uma perspectiva dos estudos da linguagem, o ções, avaliações. orientações mentais e corporais dos praticantes no fa-
habitus poderia abarcar os gêneros do discurso/ (Hanks, 1987; Briggs & zer repetido da prática. O ponto importante é que~ uma relação dinâ-
Bauman, 1992), os modos rotineiros de falar e de interpretar o discurso, mica (se não dialética) entre a incorporação contextual e a formação dos
e os hábitos mentais implícitos nos modos padronizados de representar atores que se engajam nos contex1õb,A língua e o discurso estão entre as
o mundo por meio da linguagem. modalidades centrais por meio das quais essa dinâmica é articulada.
Do modo como é usado na teoria da prática, o conceito de habitus Como os participantes representam suas posições no campo para
reúne essas quatro fontes em uma única idéia. Conseqüentemente, esse assim alcançar seus objetivos comunicativos? Como eles decidem sobre
conceito possibilita a afirmação de que\Fá uma unidade fundamental os objetivos e os modos plausíveis de atingi-Ias? Quais estratégias e
entre a disposição de falar de determinadas formas, a avaliação do dis- movimentos são admissíveis ou eficazes em um dado campo, e quais
curso, os hábitos corporais realizados na produção do discurso e os há- são ineficazes ou proibidos? A idéia de que os falantes são estratégicos é
bitos mentais introjetados nos falantes como seres sociaI~.p que unifica amplamente aceita nos estudos do discurso. O trabalho de Gumperz
este conjunto de traços não é uma necessidade lógica, mas uma necessi- sobre as estratégias do discurso efetivamente mostra que ao produzi-
dade histórica. O habitus é individual, já que ele modela pessoas indivi- rem pistas de contextualização, os falantes posicionam-se estrategica-
duais, e coletivo, já que é uma formação social.@e combina corpo e mente e delimitam a interpretação de seus enunciados de acordo com
mente ao invés de afirmar a divisão e a prioridade de um deles sobre o seus próprios objetivos. A teoria de Grice (1989) acerca das implicaturas
apóia-se em um modelo de falante como alguém que persegue fins co-
municativos através da "implicitação", derivando e comunicando senti-
2. Para uma visão detalhada acerca da relação entre os gêneros discursivos e a teoria da prá- dos com declarações sub-especificadas, formuladas para serem expan-
tica, ver o capítulo 2 deste volume. (N.T.)
!1NGUA COMO PRÁTICA SOCIAL ".
196 W F HANI<s

contextualizar seu enunci~do corrente~lações semióticas são produzi- ~


didas por meio de inferências. O falante, em um jogo inferencial de lín, ~
d~ entre o fluxo expresslVo e o contexto d~ sua expres~Em usos
guagem, deve ser estratégico apenas se for para alcançar adequadamente
dêiticoS,os falantes constroem o contexto, assmalando tanto o referente
tais intenções sutis e sugeridas. Igualmente, a análise da conversação vê
corno a perspectiva sob a qual ele é individualizado. Os performativos
o falante em interação como um elaborador ativo de contextos, alguélll
austinianos (Austin, 1962) fundam-se parcialmente sobre a intencionali-
que domina o sistema de procedimentos de tomada de turno, as rele,
dade que liga o c~mteúdopro~ional ao ato convencional típico, o ato
vâncias condicionais dos movimentos conversacionais, que sabe COlllo
locucionário ao ilocucionário. Todos os tipos de\ffiaicialidade cnatj\Ta:r~'
manter o turno, fazer um reparo, provocar ou bloquear determinadas
~os por Friedrich (1979), por Silverstein (1976) e por outros pes-
inferências. Em geral, o falante modelo fala com um determinado pro.
quisadores envolvem~so conseqüente dos signos para pvocar co..!'-\
pósito e persegue fins práticos por meio de expedientes mais ou menos
iext'?se, por meio disso, realizá-I;-SAtravés da intencionalidade, os sig-
efetivos, em contextos mais ou menos definidos localmente. Chamar
noS e expressões projetam seus objetos e, conseqüentemente, alteram
isso de "estratégia" atrai o pressuposto de que esse modo de agir é pla-
contextos. Os processos inferenciais (interpretação, extrapolação, impli-
nejado cuidadosamente, o que é verdade algumas vezes, mas nem sem-
citação,enriquecimento contextual) também operam sobre as formas de
pre. Quer sejam estratégias bem desenvolvidas ou movimentos inten-
expressão à luz dos contextos, conferindo-se um importância especial
cionais corriqueiros, as estratégias discursivas têm uma dupla relação
para as estruturas de relevância. Todos esses processos fiam-se criterio-
com o campo: elas podem ser produzidas pelo contexto ou elas po-
samente na capacidade de os participantes P!9d~irem e -ª.valiaremsig- .
dem, de algum modo, produzi-lo. Se o contexto tem uma inevitável
nos do conte~to, e de fazê-lo deliberadamente.~stratégia e ~provisa-
relação com o habitus daqueles que o ocupam, ele (o contexto) também
está sujeito aos projetos intencionais e às estratégias que estes (os ato- ção são modos de exercitar essa capacidad~\
res) perseguem. Mas mencionamos também\Eiocessos que não estão sujeitos à in-
tencionalidade dos participan~, ao menos não necessariamente. Essa é
uma classe diferente de fenômenos. De situações a cenários, campos
3.2 Processos de contextualização demonstrativos, e çampos sociais incorporados, dissemos que objetos,
pessoas e grupos ocupam posições no contexto. Essa ocupação não é
uma relação de querer-dizer e não pode nem deve estar sujeita aos pro- ~
No decorrer da explicação de uma arquitetura mínima para o .con-
pósitos do ator. Se um oficial de polícia me chama na rua, eu sou ~- ~
texto do discurso b da na incorporação e na emergência, fizemos
~lado em uma posição, quer eu queira ou não, quer eu produza ou não
. r- referência a vário proc~ Como enfatizamos, todas as unidades en-
um sinal de minha posição. Quando vou para o aeroporto e passo pela
çJ -ç~"" volvidas e!llergem n .eI, ainda que em níveis diferentes~ a íncor-
segurança, eu ocupo a posição de um passageiro a ser inspecionado
poração de uma a outras é um processo dinâmicô, Neste ponto, quero
quer eu queira ou não, assim como eu me tomo um cliente quando sen-
resumir e oferecer uma síntese preliminar do processo no qual o contex-
to em um restaurante. A ocupação de uma posição pode ser descrita ~ ç
to ocorre. A primeira classe de processos envolve intencionalidade, tan-
como "tomada de posição", mas ela também designa "encontrar-se'L~
to no sentido de representação como no de finalidade. Assim fi?ando
em" e "ser colocado tm"
uma posição. Quando pessoas ou objetos são 'pL
um falante dirige sua atenção para, tematiza, formula, ou invoca o con-
texto, ele ou ela o converte em objeto semiótico em uma relação de qge-
dIII
referidos pelo discurso, eles são por meio disso levados para dentro~ se
das ~çõ~s e das relações sociais que os definem. p:- ~ues~ão-chave é t--.~
rer-dizmDe modo semelhante, quando o falante usa pistas gramati-
queias posições e os processos de ocupação das pOsIçoes sao fatos so- ~e.
cais, entonacionais ou gestuais para sugerir seu footing corrente e para ""Je
""'v"
"I
c.
c,cr'" ~~. ~~~(~~-'{'
Ir- r<Ú!- 1A7...... '" ~
G~\ ç&Ye.
~~~~'J~
~'" r ~J ~ ),.r
rG;~~8:;;",
r..-I-'
r"1f
~rAJyw~lHANKs
l -: LÍNGUA COMO PRÁTICA SOCIAL 199

ciais e pelo menos parcialmente independentes dos estados intencio_


nais dos participantêD ~ nos, Ide (2001) distinguiu entre aspectos volitivos da produção do dis-
~
curso e discernimentos"
1/ não-volitivos do contexto. Esta última noção
Outro processo contextual cuja fonte está além do âmbito da ação
designa o processo pelo qual os participantes se constroem e se ali-
intencional é o que deve ser chamadQ§Q!?rede~@ campo s_o-
nham às exigências do contexto baseados no campo, como acontece
~0>-h
(\1-1 l r cial ao qual uma interação é incorporada não determina o que os partir],
__
quando os sujeitos usam os honoríficos japoneses irrefletida e automa-
v pantes fazem, ou como O Contexto emerge, mas ele produz determina_
ticamente, desconsiderando os sentidos clássicos exigidos pelo habitus.
~ J," das configurações e ações contextuais mais prováveis e mais previsí-
Qualquer um desses processos pode envolver intencionalidade, mas eles
~ J.! ve~le as reforça e as demanda como a Elalade cirurgia demanda Um
ilustram a capacidade de os campos exercerem uma influência estru~
certo engajamento por parte dos especialistas médicos que trabalham
~te à parte da intencionalidade.
nela, ou o tribunal demanda formas específicas de engajamento por parte
de seus o~A aquisição do habitus por parte do praticante de
qualquer profissão é reforçada constantemente pelos cenários, pelos di-
reitos, pelas responsabilidades e pelas práticas rotineiras que compõem
4. Conclusão
o campo. Ao longo do treinam~t9 que inculca modos de ser apropria-
dos para cada profissão, esses aspectos do campo reproduzem, sancio- O contexto discursivo não pode ser formulado como um conjunto
nam e guiam os contextos e os modos de ocupá-los, Diremos que a in- de correlações entre características sociais globais, de macronível, e ca-
corporação sobredetermina o contexto quando o hE.bitus, o campo, o es- racterísticas locais, de micronível[i:noção de correlação é insuficiente~
paço construído, e as práticas sancionadas alinham-se no sentido de para os tipos de articulações em jO~O contexto discursivo não pode
impor ou induzir características específicas do contexto. Organizações, ser descrito como a reprodução de tipos (types) de macronível no nível
da ocorrência (tokens): o discurso é produtivo e inerentemente sítuadoõ
J
cenários religiosos e missionários fornecem exemplos claros disso, mas
o efeito é muito mais difundido. Ele não pode ser deduzido da repentina e_xpressão criativa guiada por
intenções puramente locais e por sistemas de relevância:@o simples-
~ampos sociais também autorizam e legitimam determinados con-
mente fabricamos o contexto a partir do nosso todo discursivo.jlim re-
textos e modos de engajamento, mas não outros. Um caixa tem a autori-
sumo, o horizonte social da produção do discurso requer que usemos
dade de dizer a você quanto você deve pagar por um produto, da mes-
um voca~~ário diferente. Dois termos-chave neste novo léxico são ~m~
" ma forma que um médico tem a autoridade d~ diagnosticar seu estado
~a e incorporação, que, juntos, definem um espaço de contextuali-
(Jt~{ físico e que um professor é autorizado a avaliar seu trabalho acadêmico.
(]"sta autoridade é desempenhada em processos intencionais, mas sua [ zação mais produtivo e realístico do que qualquer outro da usual divi-
(.r- <-,,,,
são em escala. A incorporação descreve a relação que se dá entre .êtua-
\(~. fonte é o campo, não o estado intencional dos indivíduõs.\ Descrevemos
ções, cenários, campos demonstrativos, ca!l1pos sociais e habit"USj Estes
isso como um processo e não como um atributo com o objetivo de sa-
têm o estatuto de níveis isoláveis analiticamente na arquitetura global
lientar a dinâmica pela qual é conferida autoridade a certos contextos
do contexto. Para qualquer nível X incorporado em Y, Y acarreta X, Y
e a certos agentes dentro deles. A legitimidade também poderia ser
herda traços de X e acrescenta outros, Y transforma X em várias dimen-
concebida como um atributo dos contextos e das ações, mas é mais
sões distinguíveis (temporalidade, participação, avaliação de fatores), e
produtivamente vista como o processo pelo qual estes últimos são ali-
Y serve como horizonte presumido de X, tomado prontamente para
nhados aos valores do campo. Dentro da mesma família de fenôme-
tematização e para relaçõ;s de relevância. A incorporação é mais básica
201
200 W F. HANKS ÚNGUA COMO PRÁTICA SOCIAL

que a correlação, a instanciação, ou a reprodução, porque ela é a cond], ;\ que pressupõem intencionalidade individual, e aqueles que não a pres-
ção objetiva sobre a qual todos esses processos ocorrem. supõem. Estes últimos derivam diretamente do campo ao qual a prática
comunicativa é incorporada. Intencionalidade abarca propósitos (como
Alguns traços do contexto seguem uma lógica distinta do nível do
em pretendo X) e relações temáticas (estou falando sobre X). Para qualquer
ual eles surgem, ao passo que outros são impostos pela incorporação.
estudioso da linguagem, é questionável se as disposições, os hábitos
~ completa co-presença da situação, a relevância do cenário, a semiose
mentais, e as incorporações do habitus podem substituir a intenção como
do campo demonstrativo, as restrições e os recursos do campo social, as
motor para a ação, como Bourdieu propôs. É difícil imaginar uma teoria
disposições corporais do habitus - qualquer um deles pode ser relatívg;
da linguagem ou do contexto discursivo que ignore as relações temáti-
mente livre dos efeitos estruturantes dos campos aos quais são incorpo-
cas ou as ações intencionais. Ainda mais, o habitus e o estado corrente do
rados. Em decorrência disso, o nível contextual ao qual esses traços per-
campo co-operam sobre os estados intencionais daqueles que os ocu-
tencem é relé!!iY9mente autônomo. Por contraste, na medida em que
pam. Eles fornecem um universo já pronto de objetos e de agentes, de
algum processo em um dado nível é determinado por sua incorporação
quadros de referência, de espaços e de posturas avaliativas - as maté-
a outro campo, ele é não-autônom~ As funções que compõem o campo
demonstrativo, por exemplo, são relativamente autônomas, ao passo rias-primas do contexto.
que aquilo que se considera como monitoramento mútuo e como rele-
Tradução: Marco Antônio Rosa Machado e Anna Christina Bentes
vância não o são, porque estes dependem do campo ao qual são incor-
porados. Setnelhantemente, a resolução da referência indicial ordinária
é não-autônoma.
A§ergência é um traço difundido do contexto, o qual é dinâmico Bibliografia
ao longo de várias trajetórias em seus diferentes níveis. O que devemos
chamar de tempo do contexto decorre da interação entre distintas tem- AGHA,A. Stereotypesand registers of honorificlanguage. Language in society,
oralidades nos níveis da situação (tempo do corpo), do cenário (tempo 27(2): 43, 1998 .
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