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CAPACIDADE CONTRIBUTIVA E IMPOSTO ECOLÓGICO: UMA ANÁLISE SOBRE A

COMPATIBILIDADE DOS INSTITUTOS


CONTRIBUTIVE CAPACITY AND ECOLOGICAL TAX: AN ANALYSIS OF THE
COMPATIBILITY OF INSTITUTES

Resumo: O artigo analisa o princípio constitucional tributário da capacidade contributiva à luz


do mandamento constitucional da manutenção do equilíbrio do ecossistema. Para tanto,
utilizou-se dos conceitos da isonomia tributária, enquadrando a capacidade contributiva como
uma consequência e uma derivação da isonomia. Utilizou-se das aplicações mais usuais do
princípio, bem como foram apresentados os principais exemplos de impostos ecológicos
aplicados pelos entes federativos no Brasil. Analisou-se a coexistência dos dois institutos no
ordenamento jurídico brasileiro, apresentando autores com posicionamentos divergentes. Ao
fim, apesar de aparentemente contraditórios, os institutos podem conviver harmonicamente ao
compreender que meio ambiente é uma necessidade coletiva e transindividual, devendo ser
observado por todas as gerações atuais.

Palavras-chaves: Isonomia. Capacidade Contributiva. Imposto Ecológico.

Abstract: The article analyzes the constitutional principle of taxation of contributory capacity
in light of the constitutional mandate to maintain the equilibrium of the ecosystem. For that, the
concepts of tax isonomy were used, framing the contributory capacity as a consequence and a
derivation of the isonomy. The most usual applications of the principle were used, as well as
the main examples of ecological taxes applied by federative entities in Brazil. The coexistence
of the two institutes in the Brazilian legal system was analyzed, presenting authors with
divergent positions. In the end, although apparently contradictory, the institutes can live
together harmoniously when they understand that the environment is a collective and
transindividual need, and must be observed by all present generations.

Keywords: Isonomy. Contributory Capacity. Ecological Tax.

Sumário: Introdução. 1. Princípio constitucional tributário da isonomia. 2. Capacidade


contributiva. 3. Imposto ecológico. 4. Compatibilidade entre princípio da capacidade
contributiva e imposto ecológico. Considerações finais.
Introdução
Os problemas ambientais do século XXI são de múltiplas ordens e têm gerado preocupações
nos diversos setores da sociedade. Ainda assim, as atitudes concretas em prol do meio ambiente
precisam crescer, principalmente no Brasil, que nos últimos anos registrou um aumento do
desmatamento florestal e por conta da crise política deixou de lado algumas discussões
ambientais importantes.
Sendo o Direito um instrumento não apenas de repressão de atos contrários à lei, mas também
um instrumento promocional de políticas públicas positivas perante a sociedade, faz-se
necessária sua inserção no campo ambiental e tributário.
A tributação voltada à proteção do meio ambiente têm sido um excelente meio para fazer
cumprir o direito fundamental ao meio ambiente equilibrado. Através dos incentivos fiscais, ao
menos duas situações estão ocorrendo: a conscientização dos cidadãos e a reformulação do
sistema tributário a permitir uma nova perspectiva do tributo, quase sempre conhecido como
unicamente arrecadatório e como uma intromissão no patrimônio do particular.
Não se pode esquecer que a capacidade contributiva é princípio constitucional a ser observado
pelo legislador brasileiro, tendo como fundamento principal a distribuição igualitária da carga
tributária.
O questionamento se dá em torno da capacidade contributiva e do tributo com finalidade
ecológica, sobre a existência de fundamentos em comuns e sobre a possibilidade de coexistirem
no plano jurídico e fático.
A consciência da dimensão jurídica e da importância do princípio constitucional, e como sua
aplicação está sendo afetada diante de uma nova perspectiva da tributação ligada à área
ambiental, constitui fator basilar do artigo.
Nesse diapasão, o presente estudo traz os conceitos de isonomia e sua consequência lógica, qual
seja, a capacidade contributiva e sua importância para o Direito Tributário.
Além disso, o artigo evidencia algumas considerações sobre o imposto ecológico com alguns
exemplos reais já postos em prática no país e a interpretação de alguns autores sobre
extrafiscalidade e capacidade contributiva.
Os institutos são antigos, porém, pouco ainda se discute sobre a problemática.
Países mais desenvolvidos têm utilizado a política tributária voltada para a área ambiental já
faz algum tempo, enquanto que o Brasil ainda precisa se conscientizar em tomar atitudes
ambientais básicas como não jogar o lixo na rua e fazer a coleta seletiva.
A União Europeia, ao estudar iniciativas emblemáticas para uma Europa eficiente nos recursos,
exige que os impostos ambientais representem 10% da receita total de impostos e contribuições
sociais até 2020.
A previsão constitucional acerca da manutenção do equilíbrio ambiental deixa claro a
necessidade de uma atuação conjunta do Estado e do cidadão e, todas as medidas com esse
objetivo, são de suma importância para a coletividade.
Por fim, as considerações finais são no sentido da aceitação de ambos os institutos no mundo
jurídico.
1. Princípio da isonomia
O princípio da isonomia, em sua acepção geral, defende o tratamento igualitário de pessoas que
se encontram na mesma situação, bem como orienta a tratar com desigualdade aqueles que se
encontram em situações distintas. Assim, é lícito dizer que as acepções do princípio são
horizontal, referindo-se às pessoas que estão na mesma situação, e vertical quando estiverem
em situações diferentes e exigirem a aplicação da norma de uma forma distinta para cada um.
Apesar do conceito, há um consenso entre a doutrina que o aproveitamento prático é
extremamente difícil, e a separação entre o que é igual e o que é desigual é controversa.
Na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, a figura da isonomia é mencionada
inicialmente no art. 5º ao afirmar que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza.” Ao longo do documento, muitas são as referências à isonomia em suas diferentes
aplicações.
Discorrendo um pouco mais sobre as acepções horizontal e vertical, a doutrina assevera que a
primeira atribui o tratamento igualitário para as pessoas que se encontrarem na mesma situação.
Já a segunda, entende que é preciso diferenciar aqueles que não em se encontram na mesma
situação, devendo a lei trata-los diferentemente usando como medida a razoabilidade.
Em se tratando da vertente tributária, a isonomia está devidamente observada no art. 150, inciso
II da Carta Magna e veda à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios “instituir
tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida
qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida,
independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos.”
Desta feita, pode-se inferir que a lei máxima expressa a acepção horizontal do princípio da
isonomia tributária, mas isso não que dizer que devemos desconsiderar a aplicação do sentido
vertical, quando estivermos diante de situações que assim o exigirem.
O exemplo clássico para ilustrar a aplicação do princípio da isonomia é o imposto de renda
pessoa física, de competência federal.
Quem está na mesma faixa de renda estipulada pela lei, é tributado com a mesma alíquota
(acepção horizontal) e, na medida em que a faixa de renda da pessoa física vai aumentando, a
alíquota sofre uma ascensão (acepção vertical).
Dulcemar Pianissolli Futuro faz uma interessante observação sobre o tema assegurando que “a
igualdade aqui não é o mesmo que identidade, isto é a paridade absoluta entre os comparados
(...). A igualdade tributária é determinada em função de elementos, características ou
circunstâncias que tornam o indivíduo equivalente juridicamente a outro.” (FUTURO, 2009)
A isonomia é, em todos os sentidos, uma matéria interligada à justiça. A questão a ser
observada, no entanto, é o critério utilizado ao afirmar que um certo grupo está na mesma
situação ou que está em situação distinta.
O mais indicado, diante de uma situação concreta, é estabelecer uma medida de comparação e
um elemento indicativo dessa medida. Por fim, os dois conceitos devem guardar relação com a
finalidade da comparação. (BRAGA; FRATTARI, 2009)
A lei é discriminatória em sua essência, pois ao tratar de uma situação, quem não se enquadra
está automaticamente fora da aplicação da mesma. A dificuldade é saber quais são os fatos ou
as situações desiguais que permitem à lei atribuir o que se chama de “desigualização” jurídica.
E o que mede a igualdade ou a desigualdade, aplicando as medidas isonômicas, é o que
Alexandre de Moraes chama de uso da desigualdade objetiva e razoável. O autor afirma:
“para que as diferenciações normativas possam ser consideradas não discriminatórias, torna-
se indispensável que exista uma justificativa objetiva e razoável, de acordo com critérios e
juízos valorativos genericamente aceitos, cuja exigência deve aplicar-se em relação à
finalidade e efeitos da medida considerada, devendo estar presente por isso uma razoável
relação de proporcionalidade entre os meios empregados e a finalidade perseguida, sempre
em conformidade com os direitos e garantias constitucionalmente protegidos.” (MORAES,
2004, p. 67)
O tema é trabalhado caso a caso pelo Poder Judiciário, o qual tem usado a subjetividade em
cada caso para decidir conforme a isonomia.
2. Princípio da capacidade contributiva
A capacidade contributiva de um sujeito é o principal parâmetro utilizado pela isonomia no
campo tributário, bem como é uma importante medida do direito fundamental da igualdade.
O princípio da capacidade contributiva é uma derivação do princípio da isonomia e designa a
aptidão para desembolsar, para pagar, no caso em tela, os tributos, conforme as disposições
econômicas da pessoa e levando em conta sua situação pessoal e familiar. O elemento trabalha,
portanto, com o ideal de justiça tributária, com distribuição justa sendo usado como limite à
tributação.
Alguns autores fazem alusão a dois momentos distintos de determinação da capacidade
econômica do contribuinte. Em um primeiro momento, ocorre uma análise pré-jurídica,
conhecida como absoluta ou objetiva pelo fato de retratar a atuação do legislador em eleger os
fatos indicadores de riqueza (CARVALHO, 2016, p. 179). Além desse, há o momento
conhecido como relativo ou subjetivo, em que seria a concreta repartição do tributo.
Não resta dúvidas que a melhor medida de comparação é o nível de riqueza manifestado pelo
contribuinte.
Até porque, como sustenta Simone Sebastião, “a consideração do mínimo vital na tributação
trata-se, em verdade, de imunidade e não mera regra de isenção” (SEBASTIÃO, 2006). Nesse
diapasão, a autora sustenta a tese de que o sistema tributário nacional é norteado pelos princípios
da dignidade da pessoa humana e do direito à vida.
As Constituições Brasileiras já remontam à capacidade tributária desde 1824. A Constituição
do Império do Brasil dispôs da isonomia afirmando que ninguém deixaria de ser tributado para
arcar com as despesas do Estado, porém tal ocorreria na proporção dos seus haveres.
A Constituição de 1988 dispõe no seu art. 145, § 1º, a possibilidade “sempre que possível da
pessoalidade dos impostos levando em consideração a capacidade econômica do contribuinte.”
Assim, a possibilidade de pessoalidade dos impostos limita-se em tese da capacidade
contributiva a uma das espécies tributárias. No entanto, o Supremo Tribunal Federal já se
posicionou no sentido da aplicabilidade do instituto em tela a qualquer espécie tributária, bem
como afirmou a obrigatoriedade do legislador em levar em conta as disponibilidades
econômicas do contribuinte sempre que houver as características essenciais do imposto assim
o permitirem.
Assim, por exemplo, diante de uma taxa o instituto da capacidade contributiva pode dar-se pela
remissão ou redução do montante a pagar. Sacha Calmon traz o exemplo da isenção da taxa
judiciária para os pobres (CALMON, 2016).
Isso porque a doutrina divide os impostos em pessoais e reais. São pessoais os impostos que
incidem sobre aspectos pessoais do contribuinte, como o IR; e reais aqueles que incidem sobre
coisas, como o IPTU e o IPI.
O renomado autor critica essa classificação entendendo que todos os impostos são pagos por
pessoas, pois mesmo um imposto sobre o patrimônio ele vai atingir o dono da coisa.
A capacidade contributiva é praticada de maneira distinta, considerando as características
especiais de cada tributo. Ou através da seletividade, estipulando alíquotas diferenciadas de
acordo com a essencialidade, ou através da proporcionalidade sendo a alíquota definida de
acordo com a base de cálculo do tributo, ou através da pessoalidade utilizando aspectos pessoais
do contribuinte para determinar um valor a ser cobrado de tributo, ou, ainda, através da
progressividade a qual aumenta a alíquota quando aumenta a base de cálculo.
3. Imposto ecológico
A realidade mundial, em qualquer sentido que seja, nos leva a crer que nossas atitudes refletem
no ambiente em que vivemos. O meio ambiente de hoje não é o mesmo de ontem e, cada dia
mais, surge a preocupação em mantê-lo ecologicamente equilibrado visando sua perpetuidade
em prol da humanidade.
O Estado tem o papel fundamental de incentivador e propulsor de políticas públicas com o
intuito de contribuir com a sustentabilidade ambiental.
É fato que no Brasil tal atuação ainda é pouco perceptível e a sociedade brasileira ainda caminha
a passos lentos, quando o assunto é conscientização e preservação do meio ambiente.
Prevenir a degradação e fazer com que os degradadores indenizem a sociedade pelo ato já
consumado contra o meio ambiente têm sido basicamente as medidas ambientais adotadas.
Simone Sebastião ressalta, ainda, os sistemas de ordem jurídica que o Estado tem utilizado na
implantação de políticas de preservação ambiental, quais sejam, o chamado de comando-e-
controle e os instrumentos econômicos. Sobre o chamado comando e controle, a autora afirma:
“O comando decorre da normatização editada pelo Estado-legislador, e regulamentada pelo
Estado-administração, em face do particular, com vistas a determinar condutas a serem
adotadas em afinidade com os objetivos de preservação ambiental. O controle se dá através
do exercício do poder de polícia ambiental, com a fiscalização posta em prática pelos
organismos estatais competentes, cuja atribuição é a de verificar o efetivo cumprimento dos
comandos normativos expedidos.” (SEBASTIÃO, 2006, p.226)
Já sobre os instrumentos econômicos, entende-se que o Estado lança mão de recompensas e
vantagens por um agir ecologicamente correto.
Nossa Constituição Federal de 1988 foi a primeira Lei Máxima do Estado Brasileiro a falar de
meio ambiente como direito fundamental e traz em seu corpo alguns princípios ambientais. O
art. 225, inaugurando o capítulo especificadamente destinado ao meio ambiente, dispõe que
“todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo
e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de
defendê-lo e de preservá-lo para as presentes e futuras gerações.”
Nesse sentido, há um compartilhamento da responsabilidade entre o Poder Público e a
sociedade. Ao Poder Público, coube a incumbência de promover e incentivar a preservação
ecológica. À sociedade, coube a conscientização, a proatividade e o cumprimento de medidas
determinadas por documentos legais.
Uma das recompensas encontradas para prevenir ou amenizar os impactos ambientais é a
implantação do imposto ecológico.
Antes de mais nada, tributo ecológico não se trata de um novo tributo a ser cobrado da
população, mas sim uma série de direcionamentos visando a adequação do sistema tributário a
uma política ambiental.
Trata-se da aplicação dos preceitos constitucionais como o art. 192, o qual sela a ligação entre
meio ambiente e tributos ao afirmar que o sistema financeiro nacional, estruturado de forma a
promover o desenvolvimento equilibrado do País e a servir aos interesses da coletividade.
Denise Lucena Cavalcante defende a ideia de que tributação ambiental é uma nova motivação
e os princípios constitucionais tributários são inteiramente válidos nesse sentido. Para tanto, a
autora fala em remodelação ambiental do sistema tributário nacional (CAVALCANTE, 2016).
Nesse diapasão, não há uma mudança de tipicidade ou característica essencial do tributo quando
adota a nomenclatura “ambiental”. Há, unicamente, o objetivo em incitar a preservação
ambiental o que é, por sinal, um objetivo constitucional.
Contrariamente à ideia de motivação, mas considerando um novo tributo, Marcos Domingues
de Oliveira faz a diferenciação alegando que
“em sentido amplo, tributo ambiental é um tributo tradicional ou ordinário adaptado de molde
a servir aos esforços de proteção ambiental. Em sentido estrito, significa um tributo novo
cobrado em razão do uso do Meio Ambiente pelos agentes econômicos.” (OLIVEIRA, apud,
SEBASTIÃO, 2006)
Respeitando os posicionamentos doutrinários, não há que se falar em novo tributo, pois as
espécies tributárias são as mesmas elencadas na Carta Magna de 1988. O que ocorre é uma
motivação diferenciada da preliminarmente estabelecida nos documentos legais.
Os impostos ambientais são promulgadores de um novo comportamento por parte do
contribuinte o qual é, antes de tudo, um cidadão. E, como tal, faz parte de uma coletividade e
merece viver em um ambiente ecologicamente equilibrado.
A única ressalva a ser feita é em relação ao antagonismo entre o conceito de tributo e o conceito
ambiental do poluidor-pagador.
O princípio ambiental do poluidor-pagador consiste em impor ao poluidor os custos da
reparação do dano por ele causado ao meio ambiente. Trata-se de uma sanção por uma atitude
reprovável.
Já o conceito de tributo trazido pelo art. 3º do Código Tributário Nacional Brasileiro traz uma
afirmação completamente diferente, pois é da sua essência não ser uma sanção por ato ilícito.
De acordo com os estudos de Alessandra Monteiro, quem trouxe o conceito de poluidor pagador
foi a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OECD) que o definiu
nos seguintes moldes: “O princípio que se utiliza para alocar os custos das medidas de
prevenção e controle da poluição é chamado Princípio do Poluidor-Pagador”. (OECD, 1989
apud MONTEIRO)
A autora continua sua explanação delineando mais características do princípio ambiental
trazidas pela OECD, assegurando que “a implementação deste princípio irá incentivar o uso
racional dos recursos naturais escassos” e, “o poluidor deve suportar os custos das medidas
acima mencionadas tomadas pela autoridade pública para assegurar que o meio ambiente esteja
em um estado aceitável.”
O tributo não é uma penalidade por um ato legalmente ilícito, sendo inclusive diferenciado das
multas exatamente por sua definição.
No entanto, vê-se uma relação com o antônimo do poluidor-pagador. O tributo pode coadunar-
se com o princípio protetor-recebedor, já que este estimula a preservação ambiental por
incentivar economicamente quem protege uma área, deixando de utilizar seus recursos.
Em se tratando de ações tributárias com o intuito de colaborar para o equilíbrio do meio
ambiente podemos citar o ICMS ecológico, criado pela primeira vez no estado do Paraná em
1989 e regulamentado em 1991, por meio Lei Complementar.
A partir daí muitos outros estados brasileiros foram aderindo ao projeto e, atualmente, apenas
9 estados no Brasil mais o Distrito Federal não fazem parte do programa ICMS ecológico.
A iniciativa se deu como forma de compensar os municípios paranaenses que possuíam
dificuldades em aumentar suas atividades econômicas por conta das restrições legais e, como
consequência, não geravam receitas de ICMS e também não participavam de forma
significativa na repartição das receitas tributárias, determinada pela CF/88.
Cabe afirmar que o “ICMS Ecológico é um instrumento de política pública que representa a
operacionalização de um conjunto de princípios inovadores para o aprimoramento da gestão
ambiental brasileira, em especial do princípio do provedor-recebedor” (THE NATURE
CONSERVANCY, 2008).
Portanto, aquele município que mais implantar políticas voltadas à preservação ambiental, mais
receberá da repartição constitucional do ICMS, como forma de recompensá-lo pela iniciativa e
prática ambiental.
É uma alternativa que deu muitíssimo certo e que resultam em números muito positivos para os
Estados.
No âmbito federal, as iniciativas governamentais giram em torno do IPI. É o caso da Lei n.
12.715, de 17/09/2012, iniciada em 2003 e encerrada sua validade no final de 2017, a qual
previa redução do IPI como incentivo às empresas que investiram em processos de fabricação
e uso de componentes mais eficientes para reduzir o consumo de combustíveis e minimizar a
poluição. O regime foi chamado de Inovar-Auto e tinha como propósito estimular a elaboração
de carros mais eficientes, modernos, baratos e com menos emissão de carbono.
Algumas PEC foram propostas, porém, estão paradas na Câmara dos Deputados aguardando
criação de comissão temporária para discussão do tema.
É o caso, por exemplo, da PEC 571/2006 a qual pretende dar nova redação ao art. 150 da
Constituição Federal, para incluir alínea "e" no inciso VI, proibindo aos Entes Federados
instituir impostos sobre os produtos reciclados de matéria-prima nacional, concedendo
imunidade tributária.
Em se tratando de imposto municipal, o IPTU verde tem sido a alternativa usada por alguns
municípios brasileiros como forma de incitar a prática de preservação ambiental. Os municípios
oferecem descontos no tributo em tela para aqueles que implantarem práticas como o uso de
energia solar, captação das águas das chuvas, coleta seletiva de lixo, sistema natural de
iluminação, construção com materiais sustentáveis e telhado verde.
A adesão municipal à ideia ainda é acanhada, porém, tem ganhado força com os números
positivos resultantes das experiências já praticadas.
4. Compatibilidade entre princípio da capacidade contributiva e imposto ecológico
A princípio, pode parecer que um instituto não tem nada a ver com o outro. No entanto, um
questionamento surge quando se faz a análise da aplicação do imposto ecológico no Brasil.
O imposto ecológico se traduz em um incentivo governamental no sentido de estimular práticas
ambientais e, como recompensa, o contribuinte recebe um benefício fiscal, uma isenção, ou
outra facilidade tributária. Em termos mais grosseiros, o contribuinte vai pagar menos tributos.
Já o princípio da capacidade contributiva tem um fundamento diferente, construído na
capacidade econômica do contribuinte, pois a interferência dos tributos na vida do particular
fica condicionada à disponibilidade financeira do contribuinte. E, quem tem mais renda, paga
mais tributos.
A problemática perpassa também pela classificação doutrinária entre tributos fiscais e
extrafiscais. O primeiro seria conceituado como o tributo com finalidade exclusivamente
arrecadatória, com intuito de atrair receitas para que o Estado possa realizar suas funções
precípuas constitucionais. O segundo, por sua vez, teria a finalidade principal de amparar algum
setor social ou econômico.
Alguns autores, dentre eles Henrique Cavalheiro Ricci, entendem que a classificação
doutrinária entre tributo fiscal e extrafiscal influencia no conceito de imposto ecológico. Isso
porque o conceito de capacidade contributiva se amolda perfeitamente à classificação de tributo
como fiscal, entendendo ainda que aquela seria uma limitação à tributação. (RICCI, 2016)
Essa linha doutrinária, composta também por André Folloni, assevera que a finalidade
ambiental dos tributos e, em especial dos impostos, é típica de uma tributação extrafiscal e o
termo capacidade contributiva não fundamenta tal tipo de tributação. (FOLLONI, 2014)
Além do mais, por mais que a tributação extrafiscal arrecade recursos financeiros para os cofres
do Estado, isso não será uma ocorrência frequente e com o passar do tempo, a alíquota do
imposto pode chegar a zero. Para completar, a medida de comparação não é a capacidade
econômica do contribuinte.
É importante salientar que alguns autores brasileiros entendem que nem todas as espécies
tributárias podem ter finalidades ambientais. Heleno Tavares Torres entente que não há
possibilidade de criação de impostos ambientais, cabendo apenas às taxas a às contribuições de
intervenção no domínio econômico tal possibilidade. (TORRES, 2005)
Giovana Bolzan, discorrendo sobre a ponderação da capacidade contributiva com a defesa do
meio ambiente, citou autores que defendiam a incompatibilidade dos tributos, bem como os que
defendem tese contrária. Segundo a autora,
“embora alguns autores (como Giuliani Fonrouge, Sacha Calmon Navarro Coêlho e Klaus
Tipke), afirmem não ser possível a incidência do referido princípio, modernamente estudiosos
têm se esforçado no sentido de buscar a compatibilização dos institutos, assim, entendemos
que há a necessidade de respeitar o princípio da capacidade contributiva quando se está diante
de tributação extrafiscal com fins ambientais.” (BOLZAN, 2013)
Nesse sentido, a manutenção do meio ambiente é um mandamento constitucional de obrigatória
observação e aplicação prática, pois trata-se de uma necessidade coletiva.
A autora ainda citou Salvatore La Rosa o qual “leciona que pode se considerar legítima uma
disparidade de tratamento contrastante com o princípio da capacidade contributiva na medida
em que esta seja necessária para concretizar uma particular diretriz constitucional”. (ROSA,
2012)
É preciso ponderar que o fato da doutrina seguir uma linha de pensamento no sentido de
entender o mandamento constitucional superior ao da capacidade contributiva, não quer dizer
que ele deveria ser totalmente desconsiderado.
Aliás, das propostas tributárias já implantadas no país, pode-se afirmar que não há uma
vinculação exclusiva de imposto com fins ambientais e extrafiscalidade. O ICMS é classificado
precipuamente como imposto fiscal e, no entanto, é um dos maiores exemplos de tributação
ambiental no Brasil.
Pelo contrário, esta vinculação da espécie tributária está superada de forma que mesmo os
impostos classificados como fiscais também são utilizados com a finalidade ambiental. Essa,
inclusive, é a qualificação que mais tem importado: o efeito que o imposto quer produzir na
sociedade e no ambiente em que ela vive.
A preocupação quanto à justiça fiscal gira em torno dos recursos financeiros necessários para
implantações de certas práticas ambientais, o que pode tornar-se um privilégio de poucos como,
por exemplo, a captação de água da chuva que confere desconto do IPTU em alguns municípios
brasileiros. O sistema é caro para a maioria da população e somente alguns poucos poderão
privilegiar-se do desconto do imposto municipal, enquanto que a maior parte da sociedade não
teria o benefício, e acabaria por pagar mais pelo tributo.
Outras situações parecidas poderiam causar uma distorção econômica no mercado e Alessandra
Monteiro alerta para o fato de que um subsídio nesses moldes pode “gerar lucros aos
comerciantes em situações em que o tributo é repassado ao consumidor”.
Nesse específico caso, o contribuinte receberia o subsídio fiscal por uma postura ambiental
louvável, mas manteria o preço de seu produto ao ser repassado ao consumidor final. Seu lucro,
claramente, seria maior.
Empresas com maiores recursos financeiros teriam maiores condições de implantar certas
medidas ambientais exigidas para a concessão de um benefício fiscal, enquanto pequenas e
médias empresas teriam um pouco mais de dificuldade para execução das mesmas.
Evidente que qualquer medida com o intuito de manter o equilíbrio ecológico, pode e deve ser
levada em consideração. Porém, cabe a análise dos institutos. Enquanto ganha-se em um setor,
perde-se em outro no que tange à justiça fiscal.
É um caso totalmente diferente se falarmos em ICMS Verde. O programa iniciado no estado do
Paraná promove ações que beneficiam toda uma população do município, pois as mudanças
ambientais são atribuídas a toda uma coletividade. Todos se beneficiam da tributação ambiental.
A capacidade contributiva não se alia somente ao fato de uma situação econômica do
contribuinte, mas é implicitamente ligada ao princípio de justiça fiscal, de solidariedade e de
igualdade. E os impostos ecológicos têm íntima ligação com a solidariedade.
Embora sendo de uma corrente a incompatibilizar os institutos em discussão, Henrique Ricci
defende um aproveitamento da capacidade contributiva de forma relativa, a depender do quanto
esta participa como parâmetro para a realização da igualdade no tributo em questão.
Márcio Gonçalves, ressaltou a utilização do princípio tributário em tributos ambientais, porém,
reduziu sua aplicação apenas a limitar a tributação ambiental à forma legal. Assim, afirmou o
autor:
“Indispensável ressaltar que os impostos graduados de acordo com a capacidade contributiva
são os chamados impostos progressivos, em que a alíquota aumenta à medida que cresce o
montante a ser tributado. No campo tributário ambiental, este princípio atua como legítima
limitação da tributação ambiental para que esta seja processada de forma legal, com vistas a
proteger o contribuinte e seus direitos e garantias individuais.” (GONÇALVES, 2015)
A Constituição Federal, quando disse que sempre que possível os impostos seriam graduados
segundo a capacidade econômica dos contribuintes, não deu margem ao legislador em dizer se
tal imposto levaria ou não em consideração o conceito. O legislador tem a obrigatoriedade de
levar a cabo o conceito de justiça fiscal e, dessa maneira, atingir um fim maior que é o da justiça
social.
Sendo conceito intimamente ligado à essência do imposto, não pode ser desprezado ainda que
tratemos de uma finalidade ambiental, considerada por alguns como extrafiscal. Deve-se
sopesar, acima de tudo, o direito fundamental à vida e à dignidade da pessoa humana. E o
equilíbrio ambiental é, categoricamente, um direito à vida.
Conclusão
Após as considerações elencadas, pôde ser constatado a importância do tratamento isonômico
nas questões tributárias, especificadamente em relação à capacidade contributiva. Além de ser
um instrumento de justiça fiscal, tem embasamento na igualdade - direito fundamental do
cidadão.
Aliado às questões dos direitos fundamentais, encontra-se a necessidade de preservação do
meio ambiente tanto para as gerações atuais quanto para as futuras, tendo em vista muitos
recursos serem finitos.
A tributação ambiental já é uma realidade no Brasil, entretanto, apresenta-se de forma tímida.
Espera-se que, cada vez mais, o Estado e o cidadão possam abraçar efetivamente seus papéis
na transformação da realidade existente. Até porque, a atividade humana de ontem está
diretamente ao impacto ambiental de hoje.
O artigo abordou a possibilidade de coexistência dos institutos da capacidade contributiva e de
imposto ecológico, afirmando que apesar de essencialmente diferentes, quando se trata de
direitos transidividuais, há uma necessidade de adequação dos conceitos.
Não há antagonismo quando se enxerga um direito à vida em discussão, como é caso do direito
fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.
Todas as espécies tributárias brasileiras podem e devem incluir uma motivação ambiental,
justamente porque tributação não é apenas uma arrecadação aos cofres do Estado, mas também
uma forma de incitar comportamentos positivos.

Referências bibliográficas
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Trabalho de conclusão de Curso como requisito parcial para a obtenção de grau de Bacharel em
Ciências Jurídicas e Sociais pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.
Aprovação com grau 10 pela banca examinadora composta pelo orientador Prof. Leandro
Paulsen, pelo Prof. Arthur Maria Ferreira Neto e pelo Prof. Fabio Canazaro em 26 de junho de
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