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REFLEXÃO FILOSÓFICA OU INTERPRETAÇÃO PEDAGÓGICA?

Lizia Helena NAGEL *


)

A experiência docente, durante muitos se, é interessante recordar que existem sinte-
anos, nas disciplinas de História da Filosofia e ses e "sinteses"!Como já foi dito em outro
de História da Educação, nos Cursos de Peda- texto!, uma boa síntese contempla, em nosso
gogia levou-nos, a partir de 1990, enquanto entendimento, a organização de fenômenos
professora do Curso de Mestrado em Educa- específicos sob dois requisitos. Primeiro, é
ção, a organizar uma pesquisa cujo ponto de estruturada sobre o levantamento ou o resgate
partida seria a análise dos livros, dessas áreas dos fatos; segundo, é ordenada por critérios
do conhecimento, maisrecomendadosaosedu- que, preservando o significado dos conceitos,
cadores, quando em fase de formação profis- categorias ou reflexões dos autores clássicos,
cujas idéiassão resumidas, preocupam-secom
sional ou quando instados a participarem de a não-interferênciade sua subjetividade, quan-
Concursos Públicos.
do da interpretação dos autores escolhidos,
A listagem das obras mais aconselhadas mantendo, assim, a originalidade das questões
(que resultou, posteriormente em uma classifi- fundamentais.
cação de Manuais Didáticos preferenciais) foi Sabemos que um bomCompêndio,ou um
organizada após terem sido elencados os títu- bom Manual Didático,precisa combinar os ele-
los repetidos em mais de um Programa das mentos e partes da comunicação de tal forma
disciplinas de História da Filosofia e História da que a visão da totalidade seja garantida por um
Educação, que foram solicitados a diversas critério unificador, um critério que dê estrutura
Instituições de Ensino Superior do país.
aodiscurso. Issoimplica,obrigatoriamente,que
Os Manuais. ou Compêndios Didáticos. a concepçãode mundoe/ou de homem (daque-
separados por freqüência numérica, foram (e leque organizaouproduzumLivro-texto)emerja,
continuam sendo) examinados em seu conteú- de modo significativo, nas sínteses feitas. No
do. A questão de fundo, nesse momento do entanto, o fato de uma síntesetornar evidente a
trabalho, consiste em avaliar as sínteses necessidade de parâmetros para expor idéias,
explicadorasdas propostasfilosóficase/ou edu- ou para dar unidade a uma seqüência de argu-
cacionais neles divulgadas. Operacionalizando mentos, isso não quer dizer que os pressupos-
a questão da análise desses livros, nos limites tos adotados sejam, por exemplo, de ordem
de um período histórico temos: Como estásen- subjetiva. onde valores são tomados
do interpretado,pelo autores dos Manuais Didá- metafisicamente, ou, onde ideais descon-
ticos, o pensamento do(S)poeta(S) ou dOiS)filósofo(S) textualizados regulam alocuções. Nesse senti-
da Antigüidade Grega? do, não nos propomos a apoiar sínteses que,
Sem adentrar na função dos Compêndios, tentando recuperar o pensamento filosófico,
entendidos genericamente como textos-sínte- questionador, de épocas passadas, mante-

(") Professora Doutora - Universidade Estadual de Maringá.


(1)Ver Um Programa de Pesquisas: resultados e expectativas. comunicação apresentada na ANPED, em Caxambu. no ano
de 1996, no GT de Filosofia.

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nham-se reguladas por códigos de comporta- Sofistas, sem nos determos, nestes últimos, e
mento próprios à modernidade. Isso já seria em nenhum em particular. Nessa primeira ava-
suficiente para destruir a possibilidade de liação, constatamos que os filósofos e/ou os
entendimento da filosofia de outras épocas. educadores gregos, na maioria das vezes, são
Antes de expormos nossas reflexões so- interpretados sob pressupostos que violentam
bre os Compêndios, antes de assinalarmos o a consciência que esses pensadorestinham de
afastamento desses textos-síntesedos conhe- si mesmos e/ou da sociedade em que viviam.
cimentos mais substantivos da filosofia ou da Subjetividades, princípios políticos e éticos da
história, precisamos arrolar as premissas que modernidade impõem-se nos resumos encon-
sustentam nosso trabalho como um todo. Por trados nos Compêndios, descaracterizando o
isso, por estarmos pesquisando em um espec- conhecimento dos personagens que viveram
tro que abrange a análise tanto de livros de as diferentes lutas, dos diferentes estágios, de
História da Filosofiacomo deHistóriada Educa- desenvolvimento social da Grécia.
ção, por sermos parametrados pela concepção Com HOMERO, iniciamos nossas análi-
de que não há pensamento sem uma prática ses. A importância dada pelos gregos a esse
que lhe anteceda, por entendermos que educa- educador está na proporção inversa da impor-
ção é a expressão das lutas vividas pelos ho- tância dada pelos Manuais a esse mesmo poe-
mens em sociedade, incluímos em nossas crí- ta. HOMERO é pouco relevante no quadro dos
ticas não só os comentários feitos sobre filóso-
personagens que compõem osCompêndios.A
fos como, também, sobre os grandes nomesda arte homérica não é considerada legítima para
Literatura Antiga. Dessa forma, classificamos, se compreender a filosofia do povo. As afirma-
de modo geral, como educadores não só ções que por ele perpassam são escassas,
HOMERO e HESíODO, mas osgrandes poetas curtas, geralmente, paralelas à sua obra, se-
que, através do teatro, estimulavam, pedagogi- cundárias, mesmo; pouco tratam de suas pre-
camente, no povo grego, o exercício de pensar ocupações ligadas ao mundo guerreiro, onde o
sobre si mesmos, o prazerde desenvolverem a herói (e não o cidadão) é a figura central da
consciência de si. sociedade,onde a luta pela sobrevivência, atra-
Entendendo, pois, a filosofiade modomais vés da força, tem conotação divina.
amplo- como a produção humana que, através A fuga dequalquertentativa de decifração
de indivíduos é capaz de a) pensar as media- da llíada e da Odisséia, em geral do mito,
ções do tecido social; b) por em foco as contra- naquilo que ele poderia ajudar a entender a
dições reveladoras das lutas em so-ciedade; c) consciência de uma época, garante que as
denunciar valores em ruína e apontar para informações "mais filosóficas" encontradas so-
princípios morais emergentes; d) captar o movi- bre os poemas homéricos nos Manuais Didáti-
mento das instituições; e) expor, enfim, o tempo cos sejam, na maioria das vezes, similares a
histórico do próprio pensador, - não podemos que se segue:
restringir nosso trabalho, no exame dos Com- [...] Assim, conforme a mitologia de
pêndios Didáticos, apenas ao que é dito sobre Homero, devemos procurar a causa pri-
filósofos, tradicionalmente reconhecidos como meira de todo o devir nas divindades do
tais. mar, Oceano e Tetis, e também na água,
pela qual os deuses costumam jurar, e
Após termos precisado o significado (para que o poeta denomina Estígio.
nós) do conteúdos das reflexões filosóficas, (HIRSCHBERGER, 1969,p. 30)
passamos, neste trabalho, a examinar algumas Na perspectiva de HIRSCHBERGER,
interpretações dos Manuais, de HOMERO aos encontramos em HOMERO uma busca de cau-

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sas primeiras que parece escapar ao próprio encontráveis nos aristocratas e/ou nos guerrei-
autor, tanto pelo momento histórico no qual o ros!
saber ainda não se caracteriza pela LembrandoMANACORDA,quando subli-
racionalidade, como pela perspectiva de totali- nha para o leitor a oposição entre as duas
dade com que aborda outras questões ou acon- propostas de formação do homem (paideíai) - a
tecimentos. de HOMERO e a de HESíOD()2,- assinalamos
Na verdade, a épica capta uma realidade que, sob parâmetrovalorativo não declarado, o
leitor é encaminhado a acreditar na última for-
muita rica em transformação, mas essa consci-
ência da sucessão temporal em HOMERO não made organizaçãosocial (e/oude educacional)
oferece possibilidades para comentários como definitivamente como superior à que lhe ante-
cedeu. Contraditoriamente, este tipo de inter-
esse, a seguir:
pretaçãocom forte aceno evolucionista, escon-
Na Odisséia, encontram-se as mesmas de que a sociedade, constituída por classes
virtudes[da lIíada] com umconteúdo mais sociais antagônicas, é decorrente de um pro-
humano e, freqüentemente, os dotes sel- cesso histórico; é produto de muitos atos de
vagens do combatente cedem lugar à vir- acumulação individual, processo social já de-
tude da vida de paz e das relações cotidi- nunciado por Aquiles, nallíada, quando, conde-
anas, com um maiorrespeitoda dignidade nando Agamémnon, acusa-o de romper com a
humana, como o atestam as figuras de tradicional e eqüitativa distribuição dos despo-
Nausicaae de Telêmaco(SCIACCA,1966, jos e saques para os participantes das guerras
p.68). ou razias.
Uma perspectiva teleológica é induzida, Assinalando uma lacuna nos Compên-
substituindo a análise do poema naquiloque ele
dios quanto aos Líricos e lambógrafos, reco-
poderia expressar por si mesmo. A doutrina de
nhecemos, também, que os filósofos enqua-
fins reguladores dos processos, o entendimen-
to da dinâmica social sob as coordenadas do drados no Período chamado Cosmológico ou
Naturalista (como TALES, ANAXI-MANDRO,
evolucionismo, é repassado aos leitores, inde-
HERÁCLlTO, PITÁGORAS, PARMÊNIDES,
pendentemente, de HOMERO ter tido, ou não,
ZENÃO, ANAXÁGORAS, DEMÓCRITO) pou-
possibilidades concretas, em termos teóricos,
co são lembrados pelos livros mais indicados
de ter preocupações de ordem finalista.
para a formação de docentes. Parece haver
Já com HESIODOaparece o problemade uma grande dificuldade em relacionar os
colocar na Antigüidade questões próprias a aforismos desses pensadores com a prática
séculos muito posteriores. Em algumas obras humana vigente. As primeiras especulações
contemporâneas esse pensador do Período filosóficas, quando apontadas nos Manuais,
Arcaico é identificado como porta-voz de uma expressam apenas uma mera busca de um
classe social, escrevendo, portanto, não mais princípio (Ar, Água, Fogo, Indeter-minado, etc.)
em nome dos poderosos, mas em nome dos e carregam, consigo, comentários muito rígi-
humildes, dos pobres ou deserdados da sorte! dos. A filosofia, nesse caso, já aparece como
Tal como SCIACCA, já citado, outros autores,
simples abstração e não como um processo de
ao assinalarem adescrição e/ou consciênciado
substituição das estruturas compreensivas do
poeta sobre as condições de vida de um deter-
real em resposta às transformações concretas
minado estágio (regional) do desenvolvimento
da organização social.
grego, imputam ao mesmo pensador uma apo-
logia da classe camponesa, apresentando a Dandocorpo à hipótese de que os educa-
mesma como detentora de virtudes não dores afastam-se das reflexões de caráter filo-

(2) Vide Manacorda, História da Educação, p. 46.

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sófico,- enquanto essas reflexõesexpressam a cam apenas a apresentação de assertivas que


busca pelos nexos da vida em uma determina- confirmam uma filosofia particular de vida, uma
da sociedade, - e procuram, nos filósofos, pre- concepção de mundo ou umconjunto de princí-
ferencialmente, as relações que podem ser pios éticos já assumidos, sem discussões
estabelecidas com a perspectiva de ensino ou elucidativas prévias.
de escolarização, trazemos um autor que nos Propondo que os Manuais Didáticos des-
induz a problematizar essa questão. Diz esse tinados aos educadores tem muito mais uma
intérpreteda Antigüidade, depois deter lembra-
linguagem afirmativa do que explicativa, lem-
do PITÁGORAS, como aquele filósofoque pen- bramos a forma como muitos autores falam de
sa a educação como um bem que não se perde
ARISTÓFANES, dando um exemplo que res-
ao transmiti-Io:
ponde pelo tipo de interpretação de caráter
Uma reflexão de grande relevânciapeda- subjetivo:
gógica (bem compreendida por Dante, Aristófanes seria hoje classificado de "re-
quando fala do sumo bem que "como
acionário". Hostilizava toda e qualquer
espelho, um a outro entrega", e muito
novidade. Em política ataca o regime de-
freqüentemente esquecida por quantos mocrático de Atenas. Investe contra as
temem a difusão da instrução); ela abre
novidadesnaartee nopensamento.Odeia,
caminho para a concepção da educação
às vezes de má-fé do panfletário, os ho-
dos jovens como "fundamento" da socie-
mens que ameaçam o passado. Ama a
dade (MANACORDA, 1989, p.47).
paz, mas, observe-se,sua paz nãopossui
Percebe-se,dessa forma, que muitosdos elevação (GIORDANI, 1986, p. 311).
filósofos do passado -sob maior ou menor luci- Conscientes de ARISTÓFANES ser uma
dez dos autores contemporâneos dos Manuais
possibilidadepara muitas leituras,discordamos
- são selecionados (como objetos de discurso),
previamente, por julgamentos de valor, em de- dos argumentoscom os quais justifica-se o não
trimento do exame das questões filosóficas aprofundamento de sua obra cujo conjunto,
propriamente ditas. Julgamentos que resultam tomado em sua totalidade, obriga o leitor a
em prestígio para alguns pensadores antigos, debruçar-se sobre as intrincadas relações con-
principalmente para aqueles aos quais Ihes traditórias de uma sociedade. Contradições por
pode ser imputado um comportamento de valo- ele captadasque, se lidas sem preconceitospor
rização dos mestres, do ato de ensinar, do ato nossos contemporâneos,permitem ver a esco-
de apreender e/ou da escolarização sistemáti- la (de um período extremamente crítico, como
ca, independentemente de tempo, lugar, con- o das Guerras de Peloponeso,) tal como esse
juntura, condições ou contradições. comediógrafo a teria visto. Ou seja, a escola
como locus onde os pais - em uma sociedade
Dito isso, cabe ressaltar que o ato de
com dificuldades para garantir a sobrevivência
ensinar parece ser, no quadro dos julgamentos
de seus membros, - vão buscar (interessa-
que sustentam as interpretações/recomenda-
damente)formas alternativasde comportamen-
ções dos Compêndios, muito mais importante
to para os filhos, e onde os filhos vão apren-
do que o ato de explicar os motivos pelos quais
a educação torna-se cada vez mais necessária der, - em nome da educação (retórica) - que
tudo é permitido, até mesmo bater nos próprios
na Grécia do Século V a.C. Ora, explicações
implicam arcabouços teóricos definidos e pais. Afinal, o debate que grassava nesse tem-
estruturados, principalmente para o enfren- po não dizia respeitoàs dúvidas quanto ao ser,
tamento das contradições que aparecem na ou não, o homema medidade todas as coisas?
prática social, ou nodesenvolvimentodas argu- A dificuldade de percebere de analisar as
mentações. Afirmações, por outro lado, impli- contradições, - com as quais os gregos convi-

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li
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,
vem sem medo, na prática ou no discurso, - faz rações sobre os mesmos. Dentre inúmeras
, com que as reflexõesdessa época, apropriadas frases categóricas a favor dos sofistas, um
pelos Manuais, fiquem empobrecidas. Nesse pequeno exemplo:
sentido, nem a escola, nem a retórica, nem a
, Saudamos essesgrandes antepassados,
sofística ganham uma compreensão de caráter
os primeiros professores do ensino supe-
filosófico nos Compêndios recomendados aos
) rior, quando a Grécia conhecia apenas
educadores.
treinadores esportivos, mestres do arte-
O afastamento da compreensão histórico- sanato e, noplano escolar,humildes mes-
filosóficados fatos,torna-se, incontestavelmen- tres-escolas (MARROU, 1975,p.85).
te, o fator para a incompreensão do sentido da
Como contraponto, registramos outra
própria educação. Impossível, por exemplo,
apreciação, tão emocional quão pouco filosófi-
entender a educação do Século V a.C sem
ca, que não pode ser imputada a poucos
entender a retórica. E para entendê-Ia nada organizadores de Manuais.
melhor que precisar o momento em que os
homens enfrentam-se com o descolamento da Chamam-se sofistas, os mestres popula-
palavra das coisas propriamente ditas. As tra- res da filosofia, homens venais e sem
gédias gregas desse período poderiam ajudar convicções, ávidos de riqueza e de glória
na compreensão de uma sociedade que esfor- que, nesta época de crise para o pensa-
ça-se para pensar-se como capaz de reconhe- mento grego, exploram em benefício da
cer verdade e erro. Deixemos EURíPEDES, própria vaidade e cupidez, o estado dos
falar por nós, através de: espíritos criado pelas especulações filo-
sóficas e condições sociais do tempo
HÉCUBA: Entre os homensAgamémnon,
(FRANCA, 1973,p. 48).
a palavra não deveria nunca prevalecer
sobreosfatos.Muitopelo contrário,quando Não apenas o jesuíta Leonel FRANCA,
se age bem, deveriatambémfalar-sebem, com uma tiragem de mais de 20 edições de seu
e, quando se age mal, as palavras deve- livro Noções de História da Filosofia, garante,
riamsoar falso,semque fossepossível,em nas dimensões do nosso país, uma tendência
caso algum, colorir a injustiça de belas condenatória dos sofistas. Autores de muitos
palavras (Hécuba, v 1187-1192,p. 226). outros Compêndiosconcordam com essa rejei-
Se não penetrarmos nos conflitos dos ção explícita às condutas consideradas imo-
indivíduos desse período pelas mãos dos que rais, a-éticas, não-cívicas.
interagiam nasociedade grega,captando todas
[...J Do mesmo modo, o ceticismo e o
as suas contradições, certamente nossas difi-
utilitarismo da educação sofística condu-
culdades de entendimento aumentarão, princi-
ziram à impiedade, no domínio religioso e,
palmente ao lermos os Manuais quando os no domínio moral, à licenciosidade dos
mesmos se propõem a falar do movimento dos
sofistas! costumes, ao culto desmedido do prazer,
e às decadência geral da vida grega.
A sofística, nas mãosdos intérpretes con- (BELLO, 1967,p. 63).
temporâneos, transforma-se, visivelmente, em Nesse quadro de julgamentos prévios,
um divisor de águas que permite a reclas- difícil adentrar nas questões teóricas de fundo,
sificação dos livros didáticos em doisgrupos: os da sofística ou do significado dela, quando
que são a favor e os que são contra os sofistas. essas mesmas questões já estão inviabiliza-
Os sofistas são aceitos ou são rejeitados. Pou- daspelodebate moral. A adesão à democra-
cos autores apelam para um relativismo onde cia -lida apenas de modo linear, apologético ou
elogios e acusações se entrelaçam nas decla- laudatório - não oferece nenhuma oportunidade

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para a tomada de consciência da prática objeti- título dos livros contemporâneos citados neste
va do cotidiano onde a solidão e o oportunismo trabalho, finalizamos com outra pergunta que
caminham juntos. remete à questão inicial: Podemos falar de
Os Manuais Didáticos, embora propondo- interpretação pedagógica ou mesmo de inter-
se a falar da Grécia ou da Educação Grega, não pretação filosófica, quando as esvaziamos das
atividades sociais?
conseguem ver nas concepções teóricas anta-
gônicas, os conflitos concretos que assinalam o
limite de desenvolvimento do Século de Péricles.
BIBLIOGRAFIA
No entanto, concepções antagônicas, (não ge-
radas para eliminação das classes sociais, como
BELLO, Ruy de Ayres. Pequena História da
muitos querem pensar), que tentam, responder Educação.SãoPaulo:Editorado Brasil,1967.
a questões práticas e dramáticas, relacionadas
com a reprodução da sociedade em época de EURípEDES.Hippolyte.Andromaque.Hécube.
desestruturação, precisam ser dissecadas por Tomo 11.Texte établi et traduit para Louis
aqueles que pretendem entender de educação. Méridier. Cinquieme Tirage. Paris, Societé
No entanto, perguntas intrínsecas aos debates
D'Édition "Les Belles Letrs", 1973.
gregos como a) a sociedade é um ato de razão FRANCA, Pe. Leonel S.J. Noções de História
ou um ato de espontaneidade?, b) a superação de Filosofia. 21 ed. Rio de Janeiro: Agir.
de sua crise depende de maior controle político 1973.
ou é garantida pela absoluta liberalização de HIRSCHBERGER, Johannes. História da Filo-
normas? não são consideradas questões bási- sofia na Antigüidade. Trad. e Prefácio de
cas para a interpretação dos filósofos ou dos Alexandre Correia.2. ed. revisada e aumen-
poetas da Grécia da Antigüidade, tampouco tada. São Paulo: Herder, 1969.
consideradas relevantes para entender as ten- MANACORDA, Mario Alighiero. História da
sões na área da pedagogia propriamente dita. Educação: da Antiguidade aos nossos dias.
Sem esgotarmos o assunto, sinalizando São Paulo: Cortez: Autores Associados,
1989.
que existe uma relativa diferença entreManuais
de História da Filosofia e Manuais de História da MARROU, Henri -Irenée. História da Educação
Educação (que terminam por privilegiar ques- na Antigüidade. São Paulo: EPU, 1975.
tões da interioridade do processo educativo
SCIACCA, M.F. O Problema da Educação na
institucionalizado), informando que o Rol de história do pensamento filosófico e pedagó-
Compêndios recomendado não se esgota no gico. Vol. I. São Paulo: Herder, 1966.

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