Professional Documents
Culture Documents
SALA DE AULA
Partindo da premissa de que existe uma relação visceral entre História e linguagem, e
reconhecendo a mutabilidade das palavras, Koselleck realizou subsídio decisivo a este debate
inaugurando uma abordagem sobre a História das Ideias que se funde a uma verdadeira teoria
da história. E a desenvolve a partir de alguns aspectos basilares: o problema da consciência
histórica, sua articulação por meio do conceito de experiência e fazendo recurso à
hermenêutica filosófica que integrados perfazem uma História Social dos Conceitos. O ponto
alto de sua contribuição foi demonstrar os vínculos existentes entre o pensamento social ou
político e os sujeitos, por um lado e como se dá o amálgama entre as expressões de
determinadas consciências históricas por outro, que expressam o quanto o conhecimento
1
Mestrando pela Universidade Federal de Sergipe. Professor da Rede Estadual – SE. E-mail:
rai.dyda@hotmail.com
histórico pode tematizar as condições de possibilidade de histórias e a própria existência
humana (KOSELLECK, 1997, p. 68).
Notoriamente, uma das inquietações daqueles que lidam com o ensino de História na
contemporaneidade, é a de como proceder para que os alunos possam construir não só um
vocabulário histórico, que seja de fácil assimilação, mas que, principalmente, eles tenham
competência para utilizar tais conceitos em diversas situações de sua vida social. Uma das
elementares questões a ressaltar diz respeito ao fato de que o aluno já é detentor de um
vocabulário histórico de uso habitual, apropriado para descrever situações da realidade por ele
vivida. Isto mostra que os alunos, no cotidiano da sala de aula, possuem pontos de vista
acerca do mundo social, por exemplo, sobre poder, família, economia. Todavia, na maior
parte das vezes, estas concepções são incapazes de apreender os fenômenos sociais em sua
essência.
Definição de conceito
2
Ver. KOSELLECK, Reinhart. Uma história dos conceitos: problemas teóricos e práticos. Estudos históricos.
Vol. 5, n. 10, p. 134-146.
Nesse sentido, é possível adotar alguns critérios para nortear a primeira seleção dos
conceitos a serem abordados no ensino de História. Dentre os quais:
2. A seleção de conceitos que tenham a natureza mais universal possível, para facilitar
o seu uso em um maior número de situações e contextos históricos.
À primeira vista, uma das primeiras noções que os alunos apresentam em discussões
acerca do mundo social, é a de que ele se mantém inalterado, tudo foi sempre igual. As
questões de mudança, de transformações e do processo histórico são elaborações mentais
mais complexas e dependem da intervenção, da mediação do ensino. Tal intervenção é no
sentido de fazer com que os alunos tenham a chance de refletir sobre as especificidades destas
duas dimensões do tempo, a saber, passado e presente (dos "tempos da História"). Intervir
para que os alunos adquiram, gradativamente, o fundamento dos tempos históricos, da
sucessão, da ruptura, da permanência, da duração e das mudanças. O trabalho com os tempos
históricos deve levar os alunos a construírem diferenciações, tanto entre distintos momentos
da História, como entre diferentes tipos de sociedades. Esta abordagem será mais eficaz de
estiver atrelada a noção de período histórico, dentre outras, levando o aluno a construir pontos
de referência (datas, durações, acontecimentos), levando os alunos compreenderem a divisão
ou medida do tempo ( hora, dia, ano, século).
Esse mesmo princípio pode servir de ponto de partida no que diz respeito ao tempo
biológico do homem, o qual, apesar dos recursos da medicina, varia de forma bastante
limitada. Entretanto, tal pressuposto natural, presente em nossa divisão do tempo, será
estranho à investigação da co-incidência entre história e tempo. Por isso, os estudantes
precisam compreender que o tempo histórico revela e elucida o processo pelo qual passou ou
passa a realidade em análise, uma vez que ele tem como agentes os grupos humanos, os quais
promovem as mudanças sociais, e concomitantemente são modificados por elas. Todavia, a
história não se deixa aprisionar pelo tempo cronológico. Por vezes, é forçoso ir e voltar no
tempo. Voltamos para compreender as origens de certa situação estudada e seguimos em
frente ao explicar os seus desdobramentos.
Quem busca achar o cotidiano do tempo histórico deve observar as rugas na face de
uma pessoa, ou mesmo as cicatrizes nas quais se desenham os traços gerais, as marcas de uma
saga já vivida. Ou pode também, observando ao redor, a própria cidade, trazer à memória a
presença, lado a lado, de edificações em ruínas e construções atuais, vislumbrando assim a
evidente transformação de estilo que confere uma profunda dimensão temporal a um simples
conjunto de habitações.
Por fim, que contemple a sucessão das gerações dentro da própria família,
assim como no mundo do trabalho, lugares nos quais se dá a justaposição de
diferentes espaços da experiência e o entrelaçamento de distintas
perspectivas de futuro, ao lado de conflitos ainda em germe. (Koselleck,
2006, p. 14).
Esse simples exercício de contemplar a passagem do tempo a partir de coisas que estão
ao nosso redor já é suficiente para que se note o quão é complexo traduzir, prontamente, a
universalidade de um tempo calculável e natural – mesmo que esse tempo tenha uma história
própria – para um conceito de tempo histórico. Então,
Fazer com que o aluno construa o conceito de tempo é muito importante, porque ele
não o domina de maneira a priori, para tanto é exigido certo grau de abstração (teoria da
história). Nessa linha de pensamento, o conceito de tempo deve ser correlacionado a outras
categorias, como a da noção de período histórico, levando o aluno estabelecer pontos de
referência, a exemplo de: datas, durações, acontecimentos. A partir disso é possível que os
alunos compreendam a divisão ou medida do tempo (hora, dia, ano, século). Se a História
estuda os grupos humanos através do tempo, a experiência do tempo faz parte do nosso
cotidiano; por exemplo, quando percebemos coisas que mudaram ou permaneceram de uma
3
Ver. HARTOG, François. "Regimes de Historicidade. Presentismo e Experiências do Tempo". Belo Horizonte:
Editora Autêntica, 2013. O grande evento que definiu a época atual ocorreu em 1989: a queda do muro de
Berlin, que representou o fim do projeto comunista e da revolução e a ascensão de múltiplos fundamentalismos.
4
Sobre o assunto do presentismo dominante, Hartog afirma que vivemos o tempo galopante da globalização que
é ao mesmo tempo resultado da crise de credibilidade do progresso e sua realização, já que o avanço tecnológico
continua a se expandir e a sociedade de consumo se amplia.
época para outra, experimentamos a diversidade de concepções, perspectivas ou mentalidades
existente entre pessoas do mesmo grupo. Podemos então concluir então, que a noção de
tempo é ampla. Abrange, portanto aspectos cronológicos, psicológicos e o aspecto histórico-
social. O chamado tempo histórico se relaciona com as percepções sobre mudanças e
permanências nos modos de ser e de viver das sociedades. Para o historiador Nicolau
Sevcenko ( 2001, p. 3), o tempo histórico nos fornece o contexto no interior do qual podemos
avaliar a escala, a natureza, a dinâmica e os efeitos das mudanças em curso, bem como quem
são seus beneficiários e a quem elas prejudicam.5
Ao lidar com estes diferentes conceitos, uma dos mais recorrentes dificuldades diz
respeito ao fato de que muitas vezes, o limite entre o conceito e o fato histórico é
demasiadamente tênue. Ademais, diferentes conceitos são compostos de diferentes graus de
dificuldade de aprendizagem, tanto pelo seu nível de abstração, como pelo seu afastamento do
vivido ou do existente previamente no conhecimento do aluno.
5
Em sua brilhante obra “A corrida para o século XXI: no loop da montanha-russa”, Nicolau Sevcenko inicia
dizendo que uma das sensações mais intensas, do mundo atual, que se pode experimentar é a montanha-russa,
por submeter às pessoas as experiências extremas de deslocamento e aceleração que alteram a percepção do
próprio corpo e do mundo ao redor. Assim, Sevcenko faz uma analogia entre a montanha-russa com o século
XX, mostrando que os dois possuem um ritmo bem parecido de grandes subidas (momento de grandes avanços
tecnológicos) e descidas (período em que não ocorre grandes avanços tecnológicos).
O trabalho com conceitos no ensino de História envolve algumas atividades básicas,
dentre as quais podemos destacar as de classificar, definir e de aplicar os conceitos em
determinadas situações, de programação e de comunicação. Enquanto alguns conceitos podem
ser classificados conforme o seu significado mais amplo, outros se classificam pelo seu
significado mais peculiar ou temático. Sociedade, poder, civilização, cultura e economia, por
exemplo, podem ser mais facilmente apreendidos a partir do seu significado mais amplo, ou a
partir de certas referências:
Por fim, há as definições que podem ser feitas de forma serial. Nessa perspectiva, o
conceito é definido a partir de sua contextualização dentro de um recorte temporal de
sucessão ou simultaneidade. Ditadura é um termo que se refere a um dos regimes não
democráticos ou antidemocráticos, ou seja, governos onde não há participação popular, ou em
que essa participação ocorre de maneira muito restrita. Num regime ditatorial, o poder está em
apenas uma instância, portanto esse conceito pode ser aplicado ao Brasil, no período de 1937
– 1945 e 1964 a 1985.
Vale notar que, na construção das definições dos conceitos, devemos tomar muito
cuidado para não dar a entender que apenas uma definição é válida, pois os conceitos sociais e
políticos encerram uma exigência real de generalização, ao mesmo tempo em que são
palavras que reúnem vários significados, e por essa mesma razão são, necessariamente,
sempre polissêmicos.6 No que tange a aplicação, essa etapa pode ser feita de maneira
gradativa:
6
Nas palavras de Marcelo Jasmin: “na relação complexa entre conceitos e realidade, entre “dogmata” e
“pragmata”, a separação entre linguagem e história não implica em aceitar por aceitar o caráter linguístico
constitutivo da realidade social e política, mas a busca de um modelo teórico no qual os significados linguísticos
simultaneamente criam e limitam as possibilidades da experiência política e social”. (Jasmin, 2005, p. 33).
a) O aluno precisa detectar os conceitos em fontes primárias ou secundárias;
c) Comparar o conceito identificado em uma fonte com o mesmo conceito usado em outras
situações, percebendo diferenças e semelhetudes;
Numa etapa seguinte, o aluno deve saber usar por escrito ou oralmente conceitos
alusivos a personagens ou situações com maior fundo histórico; aplicar oralmente ou por
escrito, conceitos relacionados a fatos conectados à vida cotidiana ou a aspectos técnicos,
situando-os numa perspectiva histórica; fazer uso de conceitos diametralmente relacionados
com a História, como o conceito de fonte histórica.
REFERÊNCIAS