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INTRODUÇÃO
Como o título deste ensaio sugere, uma importante charada tem de ser
solucionada por qualquer meditador ou estudioso que tentar entender de
modo claro as qualidades da experiência que acompanham a transição
da mera atenção na respiração até a completa imersão na consciência
dos jhanas. Mostrarei que existem bons motivos para confusão a esse
respeito quando alguém investiga a evolução histórica das descrições nos
comentários, desde o Patisambhidamagga passando
pelo Vimuttimagga até o (mais recente) Visuddhimagga.
DISCUSSÃO
Para o iogue que se ocupa com a respiração com a mente purificada das
nove contaminações, a imagem surge com uma sensação prazerosa
semelhante àquela que é produzida na ação de fiar algodão ou seda.
Também é comparada à sensação prazerosa produzida por uma brisa.
Assim, ao inspirar e expirar o ar toca no nariz ou no lábio e causa o
estabelecimento da atenção plena na percepção do ar. Isto não depende
de cor ou forma e é chamado de imagem. Se o iogue desenvolver a
imagem, [sinal], e aumentá-la na ponta do nariz, entre as sobrancelhas
ou na testa, ou estabelecê-la em vários lugares, ele irá sentir como se a
sua cabeça estivesse cheia de ar. Incrementando a imagem desse modo,
todo o seu corpo irá se permear com o prazer. Isso é chamado de
perfeição.
O alerta para não ficar distraído pode ter sido obtido diretamente do
discurso da Atenção Plena na Respiração (Anapanasati Sutta MN
118.26): “Eu não digo que possa existir desenvolvimento da atenção
plena para aquele que é esquecido e que não está totalmente
consciente.”
A frase “isto não depende de cor ou forma” deixa bem claro que o
meditador não deve esperar que o sinal da atenção plena na respiração
seja uma imagem visual, visto que não é possível conceber uma
percepção visual que não tenha cor e forma. O que pode ser inferido
dessa frase é que o sinal é uma percepção táctil. A propósito,
no Patisambhidamagga, o tratado sobre a respiração mais antigo e mais
abrangente, não há nenhuma menção ao longo de toda a seção sobre a
meditação da respiração de um nimitta visual ou de uma “luz”.
Tal qual a lua cheia livre de nuvens: as impurezas são como as nuvens, o
conhecimento dos nobres é como a lua, o bhikkhu é como o filho da
divindade que possui a lua cheia. Tal qual a lua que quando liberta
das nuvens, liberta da névoa, liberta da fumaça e da poeira, liberta das
garras do Demônio do Eclipse Rahu, brilha, cintila e resplandece, assim
também o bhikkhu que está liberto de todas as impurezas brilha, cintila e
resplandece. Por conseguinte, foi dito “Tal qual a lua cheia livre de
nuvens” (Pat.III, 182, p.175). [sublinhado pelo autor]
Aqui, o que num texto do Cânone é dado como um símile para a mente,
no Vimuttimagga é tomado literalmente, ainda que corretamente, como
percepções visuais, como imagens às quais não se deve dar atenção.
O Visuddhimagga, no entanto, se equivoca duas vezes tomando os
símiles “fumaça”, “névoa”, “poeira”, “brilho”, “cintilante”,
“resplandecente”, e “lua” como imagens visuais no sentido literal, e
também ao caracterizá-los como sinal de contrapartida, um indicador do
sucesso [!], em oposição direta ao Vimuttimagga.
Alguns mestres modernos têm sugerido que não importa onde o contato
com a respiração esteja localizado, provavelmente em resposta à frase
que ocorre mais tarde no sutta: “Eu inspiro vivenciando todo o corpo ...”,
etc. E visto que o corpo da respiração não está mencionado de forma
explícita, eles sentem que há espaço para interpretação. Mas a
respiração como um “corpo” é mencionada de modo explícito
no Anapanasati Sutta, embora não no Satipatthana Sutta, e o significado
da frase é o mesmo: “Eu digo que esse é um corpo entre os corpos, ou
seja, a inspiração e a expiração” (Anapanasati Sutta, MN 118.24; a nota
diz que “Inspiração e expiração devem ser consideradas ... entre os
fenômenos corporais uma vez que o objeto da atenção é a sensação do
toque da respiração entrando e saindo das narinas”). Há também uma
localização explícita da “entrada” neste sutta, com o que os três
comentários estão de acordo, qualquer que seja a confusão que tenha
surgido mais tarde. Ela também ignora o símile que vem em seguida à
localização explícita, isto é, “Da mesma forma como um torneiro
habilidoso ou seu aprendiz, quando faz uma volta longa, compreende:
‘Eu faço uma volta longa’; ou, quando faz uma volta curta, compreende:
‘Eu faço uma volta curta’; assim também, inspirando longo, um Bhikkhu
compreende: ‘Eu inspiro longo’...ele treina dessa forma: ‘Eu devo expirar
tranqüilizando a formação do corpo.’” (Satipatthana Sutta, MN10.4). O
Buda incluiu este símile aparentemente redundante por uma razão.
Símiles são como retratos, valem por mil palavras e em geral sobrevivem
à carnificina das traduções. Este é o mecanismo de segurança do Buda
para mostrar que assim como um torneiro fixa a sua atenção num só
ponto com o cinzel enquanto o torno está em constante movimento, o
meditador faz o mesmo no “ponto de entrada” enquanto a respiração
segue fluindo continuamente. Basicamente, todos os comentários
lograram preservar essa noção do “símile da serra”, mas infelizmente a
boca como localização foi descuidada na época do Visuddhimagga.
Tudo isso não quer dizer que existe apenas uma forma de alcançar a
tranqüilidade usando a respiração. Se alguém desenvolveu uma técnica
que resulta em jhana, e que não segue as instruções explícitas, está
bem. O que quer que funcione vale.
RESUMO
Referências: