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Universidade Estácio de Sá

Curso de Direito

A dissolução da sociedade conjugal e o melhor interesse da criança

KARLA CHRISTIANE BARREIROS SAMBUGARO

Rio de Janeiro
2010
2

RESUMO:

SUMÁRIO: 1- Introdução; 2 - Desenvolvimento; 2.1 – Abordagem Constitucional; 2.2


– A atuação do judiciário nas dissoluções da entidade familiar e o melhor interesse da
criança; 2.3 – Tipos de guarda; 2.4 – Situações de risco para o menor; 3 -
Considerações finais; 4 – Referências.

1. INTRODUÇÃO

Este trabalho tratará sobre as questões relativas as relações de parentesco, no


momento da dissolução do casamento ou entidade familiar, preponderando-se o melhor
interesse da criança, inclusive no que tange as questões relativas aos tipos de guardas e
suas aplicabilidades. Dentro deste contexto, a abordagem dos riscos que envolvem a
própria relação de parentesco da criança com os entes familiares.
Atualmente, a proteção integral a criança se expande em todos os ramos da
sociedade balizada pela Constituição Federal de 1988, que mudou toda a forma de como
os direitos da criança eram encarados até então.
A criança, que já contava com seus direitos assegurados e apoiados por garantias
constitucionais, começa a contar também com a proteção da Lei 8.069/90 o ECA,
3

Estatuto da Criança e do Adolescente, que pormenoriza e determina as diversas


situações e procedimentos no trato com a criança e o adolescente, onde a criança e
detentora de direitos, e sujeito de proteção integral da sociedade e do Estado.
Dentro deste viés, o Código Civil de 2002, já segue a nova tendência a
preponderar o real interesse dos filhos, pois, procura-se identificar quem possui
melhores condições de exercer a guarda dos filhos, mesmo que não sejam os genitores,
diferentemente do código de 1916, onde os filhos eram ofertados como prêmio aquele
cônjuge que não houvesse dado causa a separação. Dento desta visão, serão abordados
os diversos tipos de guardas.
Partindo destes pontos, a abordagem proposta também se estenderá sobre
questões mais delicados das relações de parentesco, onde a criança é colocada em risco
dentro da própria entidade familiar, e como se efetiva a atuação do Estado na questão da
proteção ao menor dentro deste contexto.
Com o mesmo enfoque, critica-se o Judiciário Brasileiro e sua falta de traquejo
em lidar com questões tão sensíveis relacionadas as crianças em situações de risco,
muitas das vezes não consegue dar o provimento jurisdicional adequado aos casos
apresentados, tornando a prestação da justiça morosa e ineficiente.
Desta forma, o presente trabalho será realizado através de pesquisa bibliográfica
e descritiva, que permite a partir da análise da vontade do legislador na elaboração da lei
demonstrar a proteção integral à criança e a ineficiência do Estado em cumprir a
efetivação das determinações legais.

2. DESENVOLVIMENTO

2.1 ABORDAGEM CONSTITUCIONAL

A Constituição Federal de 1988 nasceu como um símbolo de um novo momento


no nosso país, e esse símbolo de mudança e transformação não deixou de lado os vários
aspectos sociais, onde se encontra bem evidenciado o chamado, estado social, que atua
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de maneira intervencionista em setores da vida pessoal para garantir a proteção do


cidadão.
Talvez, seja esta, uma das características mais marcantes desta Constituição,
inclusive por garantir de forma tão taxativa os direitos humanos. Neste viés, a proteção
à família vem trazendo profundas mudanças para a sociedade atual, inclusive,
cristalizando através do princípio da dignidade da pessoa humana, o direito à família,
reconhecendo-o como base da comunidade familiar, garantindo o pleno
desenvolvimento e a realização de todos os seus membros.
Ressalte-se que se trata de uma mudança estrutural, onde de forma definitiva,
buscou-se dar uma nova concepção de família em todas as suas nuances, partindo-se
para uma proteção integral à criança, considerando a igualdade jurídica entre os
cônjuges e companheiros, reconhecendo a igualdade jurídica entre todo os filhos e tendo
a união estável como entidade familiar definida, protegida e amparada
constitucionalmente.
A Magna Carta, na realidade, introduziu profundas mudanças no conceito de
família, chegando a impor novos modelos, pois a concepção clássica de família, já não
mais se aplica à atualidade, uma vez que esta não se origina apenas do casamento.
Hodiernamente, temos a família formada por uma união estável, e também a formada
por um dos pais e seus descendentes.
Todavia, se por um lado a família foi protegida e tão bem resguardada, por outro
a individualidade também o foi, e neste ponto a Constituição mais uma vez tenta
acompanhar os novos rumos da sociedade e estabelece novas regras para a efetivação de
um divórcio um pouco mais rápido e simplificado, onde posteriormente o Código Civil
de 2002 complementa com a possibilidade de um divórcio via escritura pública no
tabelionato. No entanto, ainda muito se questiona, a respeito do instituto da separação,
que permaneceu no nosso sistema jurídico como uma fórmula antiga de manter a
unidade familiar.
Neste processo de constituição de entidade familiar e desconstituição, nos
deparamos com o princípio do melhor interesse da criança, superando os antigos
entendimentos sedimentados, onde a prole era oferecida como uma espécie prêmio ao
cônjuge isento de culpa pela separação. Não mais se indaga que deu causa a separação,
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visa-se primordialmente o bem estar dos filhos, o interesse destes é que deve ser levado
em consideração.
A Constituição Federal, ao consagrar o princípio da igualdade e assegurar à
mulher e ao homem a igualeza de direitos e deveres referentes à sociedade conjugal,
excluí definitivamente, discriminações da interpretação constitucional nas relações
familiares, possibilitando um equilíbrio nas relações de poderes intrafamiliares.
Busca-se qual dos cônjuges revela melhores condições para exercer a guarda dos
filhos menores, cujos interesses são colocados no primeiro plano. 1 Este entendimento,
fundamentado no art. 227 da CRFB/88, o melhor interesse da criança, tem status de
direito fundamental na nossa Carta Magna, em função da ratificação da Convenção
Internacional sobre os Direitos da Criança, da ONU em 1989.
Como complemento à CRFB, o Estatuto da Criança e do Adolescente, veio
definir de maneira efetiva, estruturada e sistematizada a proteção à criança em seus
diversos aspectos, abrangendo tanto a questão infantil do risco quanto o da infração.
O ECA prioriza absolutamente a criança e o adolescente, transforma-os em
sujeitos de direito, trazendo uma nova concepção, destacando os direito fundamentais
das pessoas de zero a 18 anos.
Diante de toda a proteção constitucional, não há mais espaço para a coisificação
da criança, onde, em um passado não muito distante, encontramos mulheres e crianças
vistas como cidadãos de segunda classe, onde filhos adulterinos eram socialmente
castigados, chamados de bastardos, sofriam em função de uma sociedade puritana e
completamente machista, onde não havia responsabilidade do genitor com relação à
criança, o que na Constituição atual é completamente repudiado e um novo conceito
surge igualando todos os filhos, criando um novo formato para a responsabilidade dos
pais, de forma mais equilibrada e dividida equanimemente.
Não se pode olvidar das famílias homoafetivas, que também encontram-se
inseridas dentro da realidade social, e que certamente, possuem respaldo dentro da
Constituição, pois a consagração do respeito à dignidade da pessoa humana é
inquestionável, balizando o sistema jurídico pátrio, de forma que, o compromisso do
Estado que é estendido a todos, não permita desigualdades e cerceamentos, apregoa-se

1
Carlos Roberto Gonçalves, Direito Civil Brasileiro, Vol. VI, 19.
6

como princípio basilar constitucional a liberdade e a igualdade. Desta forma, veda


terminantemente a discriminação e preconceitos e assegura uma sociedade pluralista e
fraterna.
Inclusive, a modificação produzida pela Carta Magna, até mesmo altera a nomenclatura
do antigo instituto pátrio poder, trazendo a moderna expressão, poder familiar, com a
intenção de sensibilizar para a nova realidade igualitária entre os gêneros, buscando a
supressão das desigualdades no âmbito familiar.
Em decorrência de todas estas alterações trazidas pela CRFB/88, muito foi
modificado com relação às formas de guarda dos filhos e regulamentação de visita,
acentuando-se também as motivações e possibilidades para a perda do poder familiar.
No entanto, apesar todas estas alterações a sociedade ainda se encontra em um
momento muito delicado, onde a esta se depara com uma prestação jurisdicional pouco
eficiente, contando com a estrutura do judiciário para lidar com tantos conceitos
especiais, e esta, ainda se encontra emperrada, com processos que demoram uma
eternidade, operadores do direito pouco familiarizados com os novos princípios
basilares do direito de família e magistrados assoberbados com o volume de processos.
Em um dado instante, aquelas crianças que deveriam ser tuteladas pelo estado,
verificando-se os seus interesses como prioridade, transformam-se apenas em apenas
mais um número, arrastadas pela morosidade e assoberbamento do judiciário e a tutela
que deveria ser prestada de forma a consolidar as novas disposições na Constituição
acaba gerando insatisfação e insegurança para a sociedade.
Contudo, deve-se a Constituição Federal de 1988, o profundo avanço em termos
de relações familiares, esta trouxe modificações estruturais aos conceitos de família,
filhos, pais e mães. Uma nova visão paira sobre relações de parentesco, este momento é
marcado por uma profunda reflexão em torno da criança no momento da dissolução da
sociedade conjugal, humanizando-se as relações e considerando a dignidade humana em
primeiro lugar.
Com o respeito à dignidade humana, observa-se uma valorização das relações
baseadas nos laços socioafetivos respeitando-se as diversidades e os pluralismos
existentes das entidades familiares, garantindo direitos que apesar de não estarem
positivados pelo ordenamento jurídico vigente, existem e carecem de ser efetivados.
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2.2 – A ATUAÇÃO DO JUDUCIÁRIO NAS DISSOLUÇÕES DA ENTIDADE


FAMILIAR E O MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA

O momento determinante da atuação do judiciário da atualidade advém da


Constituição de 1988 que trouxe a possibilidade do reconhecimento de da igualdade
entre homens e mulheres e passou a proteger a família de forma igualitária, assim como
a todos os seus membros2, não deixando de fora a União Estável e muito menos a
proteção aos filhos gerados dentro ou fora do casamento ou os adotivos.
O Código Civil de 2002, apesar de ser novo, já chegou sofrendo diversas
emendas, pois seu projeto inicial é de 1973, anterior até mesmo a Lei do Divórcio que
data de 1977, contudo, mesmo com as alterações que procuraram estar consoante com
as novas famílias, ainda restam muitas lacunas que são interpretadas de diversas formas.
Apesar de todas as tentativas do legislador, tentar regular as relações humanas de
forma absoluta seria quase que impossível, pois, a própria sociedade evolui em um
ritmo acelerado, onde as questões afetivas não ficam sujeitas as apenas reguladas pelas
Leis, e por este motivo o legislador conseguiu de forma não absoluta, mas esforçando-se
açambarcar, da melhor forma possível parte dos princípios constitucionais, transpondo-
os para dentro das legislações infraconstitucionais.
Seguindo esta linha, o conceito de família tendeu a seguir uma nova definição,
respeitando sua evolução social gradativa e contemporânea, e esta significação se deu
por uma lei que tenta, justamente, coibir a violência doméstica, que é a Lei Maria da
Penha, em seu art. 5º, III a Lei 11.340/06 identifica como família qualquer relação de
afeto.
O novo modelo de família funda-se sobre os pilares da afetividade, pluralidade e
do eudemonismo, conceituando um novo valor ao direito de família. Atualmente, a
tônica reside no indivíduo, e não mais nos bens ou coisas que guarnecem a relação
familiar. A família-instituição foi substituída pela família-instrumento, ou seja, ela existe
e contribui tanto para o desenvolvimento da personalidade de seus integrantes como
para o crescimento e formação da própria sociedade, justificando, com isso, a sua
proteção pelo Estado.3
2
Maria Berenice Dias, Manual de Direito das Famílias, 30
3
Maria Berenice Dias, Manual de Direito das Famílias, 41
8

Nestes moldes o Estado tem uma função menos intervencionista na intimidade


da família, não se identifica mais o cônjuge culpado quando da dissolução do casamento
evitando assim, todo o constrangimento da revelação da intimidade da vida a dois para
que o juiz declare este ou aquele culpado, até porque, está é uma violação à privacidade
e a intimidade que a identificação de culpas impõe, e acaba constituindo uma violação
ao princípio da dignidade da pessoa humana. Até porque, na ação de divórcio direto ou
da conversão de separação em divórcio, não se fala mais em culpa.
Diante desta evolução da questão da culpabilidade dos cônjuges na separação, já
percebemos refletido nas relações familiares um ponto muito positivo para os filhos
envolvidos no processo, doloroso e traumatizante que representa a separação por si só.
E sendo assim, agora se busca o interesse dos filhos menores envolvidos no
deslinde da questão. Neste ponto, a não atribuição de culpa, já é um sinal que as
relações familiares estão mudando, não havendo um Estado controlador, tendo o
casamento como indissolúvel, segundo os moldes tradicionais obrigados pela Igreja
Católica Romana.
A atribuição de culpa ou inocência ao cônjuge, representava conforme o Código
Civil de 1916, a possibilidade da guarda dos filhos, o entendimento jurídico dominante
era que, se apenas um dos cônjuges se revelasse culpado pela dissolução da sociedade
conjugal, por ter praticado os atos que lhe deram causa (conduta desonrosa ou grave
violação dos deveres do casamento), natural que se contemple o inocente com a posse
dos filhos menores, por ter sabido guardar com zelo e dignidade os deveres do
casamento e que forem violados pelo consorte.4
Importante salientar que os critérios utilizados dentro da sociedade da época para
determinar a culpa para o fim das sociedades conjugais, seriam completamente
inadmissíveis na atualidade, pois até bem pouco tempo atrás, o ato de abandonar o lar
era considerado como o bastante para alegara a culpa do cônjuge, além do que, os filhos
seriam um prêmio para o vencedor.
Observe-se que, trata-se explicitamente de um caso de posse, e quando falamos
sobre o Instituto da Posse, nos atemos a coisas, desta feita, por uma questão lógica, fica

4
Washington de Barros Monteiro, Curso de Direito Civil, Vol. II, 224
9

claro que a relação com os filhos tratava de coisas, uma versão bem menos humanizada
para as crianças.
Percebe-se que, muitas das vezes os pais impregnados por estes conceitos
antigos, utilizam-se ainda hoje dos filhos como moeda de barganha ou fonte de
chantagem para conturbar a separação, tentando continuar o clima beligerante da
relação que por si mesma já terminou, sem perceber que estas atitudes trazem profundo
sofrimento para os próprios filhos. E o judiciário, deve atuar solucionando as demandas
e evitando maiores conflitos familiares.
A CRFB/88 quando estabeleceu o princípio da igualdade assegurando à
mulheres e homens os mesmos direito e deveres referentes a sociedade conjugal, baniu
discriminações, produzindo reflexos significativos no poder familiar. Deixou de vingar a
vontade do pai. Da mesma forma, o ECA, ao dar prioridade absoluta a crianças e
adolescentes, transformando-os em sujeitos de direito, trouxe toda uma nova concepção,
destacando os direitos fundamentais das pessoas de zero a 18 anos.5
Entretanto, com as questões da afetividade regendo a relações familiares, a
sociedade evolui para novos modelos de famílias, e surgem novos tipos de sociedades
conjugais, e dentro destas novas estruturas, os desafios são constantes para o judiciário,
pois não se tratam apenas de questões relacionadas ao pai e a mãe biológicos, ou muito
menos pela extinção da união em função da morte de um dos conviventes, nesta
sociedade contemporânea os dilemas envolvem uniões homoafetivas e o direito da
criança, onde familiares, mais uma vez tem a criança como coisa, fonte de lucro ou
apenas ignoram o que lhes trará bem estar.
Atualmente, as soluções encontradas tentam priorizar o melhor interesse da
criança entretanto, a estrutura do sistema judiciário brasileiro ainda está muito pouco
preparada para atuar dentro dos conflitos que se apresentam.
Um dos principais aspectos que corroboram este entendimento, esta na
morosidade do próprio processo no judiciário em questões mais delicadas relacionadas à
criança, o desgaste emocional propiciado por esta demora cria tensões e causa tanta dor
quanto a própria separação em si.

5
Maria Berenice Dias, Manual de Direito das Famílias, 391
10

Outro fator a ser preponderando com bastante cuidado é a atuação dos auxiliares
da justiça, tais como psicólogos, assistentes sociais, psiquiatras e médicos que deveriam
ser mais presentes no processo e suas investigações mais profundas. E o mais
importante, nos casos relacionados ao bem estar da criança, estes profissionais é que
deveriam, através de seus pareceres, serem determinantes na solução da lide. O
judiciário deveria investir maciçamente nestes profissionais, com uma equipe
multidisciplinar bem preparada, para que, trabalhando em conjunto pudesse averiguar,
investigar e avaliar as situações apresentadas nos casos concretos, sendo o parecer da
equipe o instrumento que daria o direcionamento sobre a solução das questões
envolvendo a criança. A facilidade do trabalho de uma equipe multidisciplinar
trabalhando de forma integrada, com certeza evitarias danos nas vidas das famílias e das
crianças, evitando tragédias conforme podemos observar na grande mídia.
Os profissionais do judiciário atuam de forma separada, tem muitos processos e
poucos recursos e seus pareceres não são tão decisivos. Os peritos do judiciário, apesar
de atuarem, não são uma equipe trabalhando de forma estruturada e engrenado. E desta
forma, se trabalho nem sempre é eficaz.
Esse distanciamento provoca uma desumanização no processo que trata sobre
relações de afeto, e acaba ficando ao encargo magistrado, apoiados em avaliações nem
sempre seguras, o destino da criança. Em consonância, a premissa de que, não basta que
os magistrados conheçam com perfeição as leis tais como são escritas e que seria
necessário que conhecessem igualmente a sociedade em que essas leis devem viver6,
nos deixa refletir sobre as questões ligadas à humanização do judiciário, e ao menos nas
questões relativas as relações de afeto e parentesco, a importância que se apresentar
sentenças justas baseadas em uma visão da sociedade, da humanidade e da maturidade.
Outra atuação mecânica nos processos familiares é a do Ministério Público, está
fiscalizando o processo, buscando os interesses do menor, envolvido muitas das vezes,
em situações que o expõe a riscos, tem poderes para atuar de forma mais enérgica, e no
entanto na grande maioria das vezes não se pronuncia como devia.
Os pais, muitas das vezes estão patrocinados por seus causídicos e com certeza a
competência dos mesmos será determinante para a solução da lide, entretanto, a solução

6
Piero Calamandrei, Eles, Os Juízes Vistos por um Advogado, 183
11

desta nem sempre irá atender aos reais e melhores interesses das crianças. E, justamente,
neste ponto entraria a eficaz atuação do Ministério Público, visando unicamente os
interesses das crianças.
Contudo, o judiciário tem buscado soluções que realmente atendam ao real
interesse da criança, inclusive estando atento às novas famílias que se formam na
sociedade. Atualmente, além das questões relativas aos moldes tradicionais de famílias,
temos situações de afetividade ligadas a homoafetividade, que não cabem mais serem
ignoradas e assim requerem, com toda legitimidade que a CRFB/88 assegurou, a
prestação jurisdicional adequada.
Percebe-se que o caminho adotado pelos magistrados, na busca de respostas para
atender aos anseios desta sociedade contemporânea nos casos concretos, tem se
mostrado vanguardistas, priorizando as relações de afeto, proferindo decisões notórias,
onde se verifica a coragem destes nobres julgadores, ao proferirem sentenças que estão
fora do lugar comum, contudo dentro da ética da afetividade e respeito à criança.
Entende a mais moderna doutrina que, quando as pessoas desfrutam de uma
situação jurídica que não corresponde à verdade, detêm o que se chama de uma situação
de posse de estado ou posse de filho afetivo, assim a tutela da aparência acaba
emprestando juridicidade a manifestações exteriores que não existem, mas que, ao
mesmo tempo, não podem ser desprezadas pelo direito. Apesar do sistema judiciário não
contemplar de modo expresso a noção de posse de estado de filho, visto que, esta não se
estabelece com o nascimento de filiação e sim num ato de vontade, que se sedimenta
com a afetividade, questionando-se desta forma tanto a verdade jurídica quanto a
certeza científica no estabelecimento do estado de filiação, a afeição tem valor jurídico,
reconhecido o vínculo afetivo que se forma entre a criança e aquele que trata e cuida
dela, lhe dá amor e participa da sua vida.7
Sentenças ousadas estão sendo proferidas neste sentido, e, talvez uma das mais
impactantes tenha sido a que tratava da guarda de um menor, após a dissolução da união
homoafetiva em função do falecimento de uma das parceiras, e o deferimento da guarda
do menor, a parceira homoafetiva da genitora do mesmo, em detrimento do avô
materno. A predominância dos laços afetivos sobre os biológicos, demonstra um novo

7
Maria Berenice Dias, Manual de Direito das famílias, 333
12

direito que desponta, muito mais pautado nas relações humanas, um verdadeiro avanço
no judiciário.
Outra não pode ser a postura ética da jurisprudência diante de situações
similares, tratando com coragem temas delicados, respeitando as desigualdades e
oferecendo justiça a todos.
Neste caminho, percebe-se que há realmente uma busca pela tutela jurisdicional
justa e eficaz, mesmo que nem todos os resultados sejam alcançados com perfeição,
mesmos que nem todos os magistrados sejam tão corajosos e dispostos a enfrentar a
própria sociedade para defender a ética das relações humanas, mesmo que tenha-se
muito que corrigir e fazer, mas, ainda assim, vislumbra-se a tentativa de acompanhar
uma sociedade que não para de crescer e transformar-se, distribuindo justiça a todos, ao
menos no que tange as relações afetivas e o cuidado com as pessoas.

2.3 – TIPOS DE GUARDAS

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