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CENTRO UNIVERSITÁRIO ADVENTISTA DE SÃO PAULO

CAMPUS ENGENHEIRO COELHO – PROGRAMA DE PÓS GRADUAÇÃO LATU-SENSU


2011 – EDUCAÇÃO MUSICAL

HANAQ PACHAP KUSIKUYNIN:


APROXIMAÇÃO CULTURAL NA MÚSICA

ALEXANDRE HENRIQUE DOS SANTOS

ENGENHEIRO COELHO
2010
Resumo: O presente artigo pretende buscar elementos de aproximação cultural entre o povo Inca
e o Espanhol na música. Foi feita a análise da partitura da canção Hanaq Pachap Kusykuynin,
obra composta pelo sacerdote Juan Pérez Bocanegra, e publicada em 1631 em língua quéchua
(idioma adotado como língua padrão nesta época pelo império espanhol no Peru). Vale ressaltar
que a obra foi concebida durante o período de colonização, para tanto o trabalho visa mostrar a
condição social e política do momento ao qual surgiu a música. A pesquisa não pretende
enquadrar a obra em nenhuma estética musical da música ocidental, mas se faz relevante ao
apontar detalhes que podem ajudar a compreender melhor a aproximação musical européia frente
a culturas primitivas, no caso, o povo Inca.

Palavras-chave: Hanaq Pachap Kusykuynin, Etnomusicologia, Aproximação cultural, Povo Inca.


HANAQ PACHAP KUSIKUYNIN: APROXIMAÇÃO CULTURAL NA
MÚSICA

A música executada entre os povos latino-americanos anteriores à colonização, sofreu


consideráveis influências a partir do processo de ocupação européia, fato esse que gerou a
produção de uma música fundida entre as duas culturas. Ao se deparar com tal situação, faz-se
necessária uma abordagem etnomusicológica para melhor compreensão do discurso musical
proposto.
O presente trabalho pretende discorrer sobre uma obra que foi composta no período da
colonização espanhola sobre o povo Inca, no Peru, mais precisamente em 1631, por Juan Pérez
de Bocanegra e tendo como título Hanaq Pachap Kusikuynin (anexo A). A pesquisa em questão
se limita à análise da partitura da peça, não adentrando inclusive na sua análise textual, porém se
torna inevitável uma contextualização desse período de colonização.
Segundo Módolo (2006), não havia uma preocupação em preservar a cultura nativa no
processo de colonização praticado por paises europeus, tais como Portugal, Espanha ou
Inglaterra, ou seja, além da tomada de território, era também incorporado o ideal cultural e
religioso do país dominante. No entanto, o que aconteceu com o povo Inca, foi que mesmo se
rendendo à pressão ideológica espanhola, este conseguiu preservar elementos culturais, inclusive
religiosos, de suas antigas práticas. Esse processo se fez devido à estratégia dos sacerdotes
espanhóis ao catequizar os nativos aproximando as ideias que constituíam as respectivas crenças,
e a aceitação por parte do povo Inca em assimilar tais influências. Para tanto algumas medidas
foram essenciais, como a padronização do idioma do império para o quéchua.
Desta forma com a liturgia toda escrita em quéchua e a igreja tendo como exigência acadêmica
que seus sacerdotes dominassem esse idioma, foi natural a inserção desta língua nas músicas,
muito frequentemente apropriando-se de melodias existentes.
Segundo Módolo (2006), é prudente dizer que seja controversa a autoria de Bocanegra
sobre Hanac Pachap KusiKuynin, pois por exceção do texto, a música não tem características
andinas: nesse caso é o texto Inca adaptado à música européia. Esses dois fatores mostram o
intercâmbio cultural na produção musical entre os dois povos.
Hanac Pachap KusiKuynin, foi publicada por Gerônimo de Contreras, no convento de
Santo Domingo em 1631, uma canção composta para o ritual de entrada dos cantores na igreja.
Módolo (2006), de acordo com Stevenson (apud Módolo 2006, p. 11), afirma que essa é a mais
antiga obra polifônica publicada na América.
A obra em questão é uma composição para coro a quatro vozes, sendo da mais aguda para
a mais grave: soprano, contralto, tenor e baixo (SATB), nos moldes estilísticos europeus,
conforme retrata Módolo (2006), em relação à métrica da poesia, rimas e estrofes.
Analisando a partitura, pode-se buscar uma visualização tonal da obra, embora não seja
comprovada a intenção do autor para o uso de tal recurso composicional. Percebe-se ainda a
presença de outros elementos como o uso do modo menor na tonalidade de Ré. No primeiro
compasso a abertura vocal possui somente a fundamental e a 5ª sem a presença da terça, tem
movimentação nas vozes do baixo e do tenor em sentido contrário, onde o baixo desce e o tenor
segue em direção ascendente. No segundo compasso existe um paralelismo de oitavas entre as
vozes do tenor e do soprano, o que de certa forma é evitado por alguns, se tratando de
composições mais tradicionais. Outro importante ponto a destacar é no aspecto rítmico. A
presença de contratempo e síncopes nos compassos 7 e 8, dando uma sensação de deslocamento.
No compasso seguinte, as presenças do trítono entre as vozes do baixo e do tenor, e a disposição
intervalar entre as vozes, geram grande dissonância resolvendo em seguida em um acorde de Ré
maior, de forma modulatória se pensarmos em contextos tonais. No compasso 13, existe a
presença da nota que em termos tonais funcionaria como sensível (7ª – dó#), fazendo um
intervalo de 3ª com uma nota que seria a fundamental de um acorde dominante, mas nesse caso
não resolve, o compasso seguinte inicia-se com um contratempo, seguido de um compasso com
síncopes e novamente no compasso 16 a presença da sensível agora sim resolvendo na nota ré,
formando um acorde de Ré menor. As conduções das vozes nos compassos subseqüentes também
possuem as síncopes e a finalização em um acorde de Ré maior.
Como dito anteriormente não há base teórica para embasar a formação musical do autor,
ficando oculta suas características de composição, mas conclui-se que há evidências que podem
ser analisados sobre o âmbito tonal, ou pelo menos sobre uma ótica harmônica ocidental.
A pesquisa não pretende “rotular”, a escola acadêmica do compositor da obra, no entanto
comprova a aproximação cultural entre os povos. Além dos elementos métricos e poéticos,
também há na parte técnica de harmonia e ritmo influências européias. Vale ressaltar que ainda
assim a peça tem um teor de autenticidade Inca, sobretudo pelo idioma e a concepção textual da
obra.
BIBLIOGRAFIA

MÓDOLO, Parcival. Os Incas: Língua, Cultura e Música. Revista USP, São Paulo, n. 72, p. 143-
156, 2006
BOCANEGRA, Juan Pérez de. . Hanaq Pachap Kusikuynin. Lima: Publicado en su “Ritual
Formulário”, 1631. Coro a quatro vozes. 1 partitura.

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