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Resumo: Este artigo apresenta uma investigação sobre os livros didáticos escolhidos
por professores da Rede Pública Municipal de Ensino, para os anos iniciais do Ensino
Fundamental, em Cascavel-PR. Os livros didáticos em análise fazem parte do Guia de
Livros Didáticos, elaborado pelo governo federal e divulgado por meio do Programa
Nacional do Livro Didático (PNLD) e correspondem ao triênio 2013/2015. O principal
objetivo dessa pesquisa, de viés qualitativo, foi analisar se a Coleção “Porta Aberta:
Ciências” atende aos critérios estabelecidos no PNLD (2010). Alguns dos critérios do
PNLD (2010) foram adaptados e orientaram o estudo dos livros em forma de categorias
de análise.Os resultados indicam que mesmo com o Guia de Livros Didáticos como
referência para elaboração dos livros didáticos, ainda encontramos fragilidades, como a
frágil valorização dos conhecimentos prévios dos alunos, a ausência de sugestões de
realização de atividades em espaços físicos que ultrapassam o ambiente escolar e
contradições entre a proposta de ensino e alguns dos exercícios de experimentação
indicados. Conclui-se que estudos como este são importantes por representarem o
compromisso com o que é ensinado e com o como é ensinada a ciência para as crianças
nos materiais didáticos.
Introdução
1
Pedagoga. Aluna do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação, da Universidade Estadual
do Oeste do Paraná (UNIOESTE), Cascavel-PR. prescilasgarioni@yahoo.com.br
2
Aluna do 3º ano do curso de Pedagogia da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE),
Cascavel-PR. Bolsista CNPq. s-sarag@hotmail.com
3
Mestre em Educação. Doutoranda em Educação pela Faculdade de Educação da Universidade de São
Paulo (USP). kellys@usp.br
4
Doutora em Educação. Docente do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação
(UNIOESTE), Cascavel-PR. dulce.strieder@unioeste.br
1
sua importância reconhecida, o livro didático não pode ser o único recurso do docente,
sendo necessário buscar em outras fontes a complementação para o planejamento de
aulas (VERCEZE; SILVINO, 2008).
Em 1970, o Ministério da Educação criou o Plano Nacional do Livro Didático
(PNLD) com a intenção de diminuir e corrigir problemas conceituais nas obras
destinadas as escolas públicas. Os livros são analisados por profissionais que compõem
o quadro funcional do PNLD e posteriormente são publicadas resenhas dos mesmos no
Guia de Livros de Didáticos. Na sequência o Guia e os livros são encaminhados para as
escolas afim de que os professores realizem a análise e escolha dos livros conforme a
concepção política pedagógica de cada unidade escolar (BRASIL, 2013).
A instituição do processo avaliativo por meio de um Guia passou a ocorrer a
partir do ano de 1996, agora completa duas décadas e tem um total de sete edições.
Então, as análises do PNLD prosseguiram e foi adotado o nome Guias de Livro
Didático para os documentos que resultavam dessa avaliação. O primeiro foi datado no
ano de 1996 e os próximos foram nos anos de 1998, 2001, 2004, 2007, 2010 e 2013
(BASSO, 2013). Estes documentos são produtos finais „„[...] de todas as etapas do
programa que compreende desde a publicação do edital para convocação de editoras até
a divulgação dos resultados das análises dos livros‟‟ (BASSO, 2013, p. 4).
O presente trabalho se insere nas reflexões a respeito da qualidade dos livros
didáticos e teve por objetivo analisar a coleção intitulada “Porta Aberta: Ciências”,
composta por livros do aluno e manual do professor para os 2º, 3º, 4º e 5º anos de
escolarização do ensino fundamental, publicados pela Editora FTD e de autoria de
Ângela Gil e Sueli Fanizzi (2011). Nesse estudo procuramos responder se “A coleção
Porta Aberta: Ciências atende aos critérios de análise estabelecidos pelo PNLD
(2010)?”.
2
Martins (2005), Souza e Almeida (2013). Estes autores o consideram um importante
recurso pedagógico, entretanto, Fracalanza (2006) critica quando o livro didático é
utilizado exclusivamente. Este pesquisador afirma que para o ensino nas escolas
públicas melhorar, são necessários recursos pedagógicos alternativos, juntamente com
uma boa formação inicial e continuada e melhorias nas condições de trabalho dos
professores.
Em especifico no ensino de Ciências, o livro didático corresponde a um dos
principais representantes da comunicação científica em ambiente escolar. Conforme
Nuñez (2003), o livro didático tem também uma função interdisciplinar:
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problematize a produção do conhecimento científico com seus alunos, que articule os
conteúdos e que consiga organizar atividades com uma correta visão dos conceitos da
Ciência.A fim de contribuir com o trabalho em sala de aula como também na escolha do
material didático a ser utilizado pelos alunos. Já o professor que não refletiu em seu
processo formativo sobre o livro didático, ao se deparar com ele na escola, corre o risco
de ser adotado por ele (GERALDI, 1994).
Metodologia de Pesquisa
Sobre a escolha do Livro Didático cabe ressaltar que é uma tarefa complexa e de
muita responsabilidade. No caso da escolha do livro de Ciências o Guia do Livro
Didático – PNLD 2010 caracteriza elementos que devem contribuir para o ensino de
Ciências nas escolas:
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Como critério de avaliação da coleção investigada, ainda, utilizamos cinco
categorias de análise extraídas do PNLD 2010. Descrevemos estas categorias e seus
subitens no quadro a seguir:
Resultados e discussão
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Os livros didáticos analisados têm uma mesma apresentação para a coleção
indicando o posicionamento metodológico assumido pelas autoras. Nesta aparecem
conceitos de Ciência indicativos de uma valorização da investigação e da
experimentação nas Unidades temáticas de cada livro, a saber:
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Sobre o significado das concepções prévias dos alunos, Amaral e Mortimer
(2001), consideram que na abordagem comunicativa estas estão relacionadas às
estratégias de ensino do professor, sendo relevante que ele integre as diferentes visões
de mundo sobre um único termo científico. Seria muito interessante se os professores
realizassem pesquisas sobre os conteúdos que comporão suas aulas, integrando
diferentes visões de mundo à temática que será desenvolvida em sala de aula. Em
relação aos itens 5, 6 e 7 a coleção revela sutis limitações, evidenciando minimamente o
reconhecimento da construção do conhecimento científico.
No livro destinado ao 2º ano, na Unidade 1, que fala sobre os órgãos do sentido,
especificamente, quando as autoras apresentam o paladar (GIL; FANIZZI, 2011, p. 26),
observa-se que o tema foi trabalhado de forma limitada, desconsiderando a importância
da associação dos sentidos paladar e olfato. As autoras usam como recurso visual
explicativo a conversa entre duas crianças (um menino e uma menina), um deles está
com os olhos fechados e o outro lhe oferece um pedaço de chocolate. A criança
responde imediatamente, identificando a guloseima. Ao ser questionada sobre como
descobriu, respondeu que foi pelo sabor. Essa resposta pode gerar a falsa impressão de
que somos capazes de identificar os alimentos, apenas sentindo o gosto deles, quando na
verdade dependemos do olfato (ou seja, do cheiro) para fazer esse exercício. A função
do paladar está muito mais associada às sensações de doce, amargo, azedo e salgado.
Nesse caso, a criança também sentiria o gosto doce se lhe fosse oferecido outra
guloseima.
Na segunda categoria Pesquisa e Experimentação observamos que esta foi
parcialmente contemplada na coleção, propiciando algumas situações investigativas,
porém com roteiros de pesquisa limitados e na maioria antecipando a resposta do
experimento para o aluno. Como observamos no experimento do livro do 3º ano, na
Unidade Temática “Vento: uma fonte de energia”, no qual as autoras sugerem um
experimento sobre a presença do ar (GIL; FANIZZI, 2001, p. 32-33). O experimento
propõe a construção de um foguete, no roteiro é apresentado os materiais necessários e
os passos de como fazer o foguete. Explica-se passo a passo como o aluno deve
proceder na construção do foguete, não oportunizando a possibilidade de criar outro
modelo de foguete. O que imaginamos para potencializar essa atividade é a
apresentação dos materiais e a formulação de um problema sobre como podem ser
construídos os foguetes, isso implicará na formulação de hipóteses e incentivará a
criatividade dos alunos. Por meio das respostas, das tentativas, erros e acertos dos
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próprios alunos, aqueles que não tivessem obtido êxito poderiam reavaliar os seus
procedimentos e a uma solução positiva para o problema.
Sobre o método científico na coleção também identificamos a seção
“Investigando e Experimentando” esta, segundo as autoras, tem o objetivo de promover
o ensino de procedimentos, tais como: observação, formulação de hipóteses,
manipulação de experimentos, escrita de relatórios, etc. Em alguns dos experimentos
propostos, entretanto, como já mencionado, foi observado à proposição de roteiros
bastante fechados, em que o enunciado sinaliza o que o exercício demonstrará ao aluno,
fragilizando o potencial da formulação de hipóteses e o papel da observação científica.
Nesse caso, o que se sugestiona é a elaboração de questões problematizadoras, que
permitam estimular a curiosidade e ampliar a participação do aluno na observação e na
formulação de hipóteses durante a realização do experimento.
Na terceira categoria Cidadania e Ética identificamos que os livros didáticos
favorecem o item selecionado demonstrando que são trabalhados temas transversais
como: Ética, Meio Ambiente, Pluralidade Cultural, Saúde, Orientação Sexual, Trabalho,
Consumo e Cidadania. São propostos para o debate temas atuais da sociedade,
estabelecendo relações entre conhecimento científico e exercício da cidadania, o que
pode ser um indicativo de que as relações Ciência, Tecnologia, Sociedade e Ambiente
(CTSA) (CACHAPUZ, et al., 2005) estão entre as preocupações das autoras.
A quarta categoria de análise corresponde ao Incentivo ao uso de outros
recursos e meios nesta a categoria a proposta do PNLD foi atendida parcialmente. Para
o primeiro item: − A coleção sugere visitas a museus e centros de ciências e a outros
espaços pedagógicos? A resposta é negativa, pois a coleção apenas indica ao final dos
livros uma relação de endereços de centros e museus de Ciências, que oferecem
propostas educacionais, em diferentes regiões do Brasil, sem fazer conexão com ações
pedagógicas, neste ou naquele conteúdo. Entende-se que a interdisciplinaridade poderia
ser mais explorada, com a sugestão de visitas, ainda que virtuais a espaços de educação
não formal como os centros e museus de Ciências. No segundo item analisado,
entretanto, foi possível observar que a coleção propõe a integração das diversas
linguagens e a interação com outras disciplinas, observável na seção “Projetos” onde a
proposta é incentivar o trabalho coletivo.
Na quinta categoria Manual do Professor, os três critérios de análise referentes
ao PNLD/2010, foram contemplados, evidenciando no Manual do Professor a proposta
metodológica da coleção, retomando a importância de ensinar Ciências,
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contextualizando os conteúdos procedimentais, atitudinais e conceituais, assim com
sugerindo leituras básicas e complementares ao professor. Ainda, no Manual do
Professor, encontramos a prevalência pela formação de uma visão crítica e de um
conhecimento construído por meio da interação professor/aluno/conhecimento
científico. Valorizando a postura do professor problematizador e mediador, descrita
detalhadamente na parte final do livro didático destinada a orientações para o professor.
Em relação a questão de pesquisa “A coleção Porta Aberta: Ciências atende aos
critérios de análise estabelecidos pelo PNLD?” a análise dos livros didáticos revelou
que a coleção contempla, ainda que parcialmente em alguns tópicos, a maioria dos
critérios analisados neste trabalho. Isso revela que a elaboração de livros didáticos não é
um oficio simples envolve inúmeros parâmetros, metas e objetivos, que mesmo com
critérios pré-estabelecidos pelo PNLD os autores e as editoras ainda encontram
dificuldades em atendê-los em sua totalidade.
Considerações finais
Em relação à análise dos livros didáticos da coleção “Porta Aberta: Ciências” foi
possível verificar que mesmo com o direcionamento por meio do Guia de Livros
Didáticos: PNLD 2010, orientado por critérios de avaliação, ainda, podem existir
problemas, como em muitos outros livros.A investigação possibilitou observarmos que
existem fragilidades nos livros didáticos analisados, como a parcial valorização dos
conhecimentos prévios dos alunos, a presença de roteiros de pesquisa bastante fechados,
que em sua maioria antecipam o resultado final do experimento, não privilegiando a
curiosidade infantil e a investigação. A análise ainda denunciou à ausência de sugestões
para o uso de outros recursos e meios, deixando de referenciar ações pedagógicas que
privilegiem espaços físicos fora do contexto escolar como, por exemplo, a visitação a
museus, jardins botânicos, jardins zoológicos, centros de ciências, feiras livres, entre
outros.
Diante do importante papel que o livro didático exerce nas aulas de Ciências
consideramos relevante que o material didático apresente atividades que permitam o
desenvolvimento da linguagem, utilizando estratégias como o registro das observações,
organização de informações, debates, levantamento de hipóteses, entre outras ações sob
a mediação do professor.
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Conforme o documento que delibera sobre os elementos conceituais e
metodológicos para definição dos direitos de aprendizagem e desenvolvimento do ciclo
de alfabetização do ensino fundamental, o ensino de Ciências precisa evidenciar o
ensino por investigação, com interações discursivas e dialógicas, priorizando o trabalho
intelectual e manipulativo dos alunos na busca por soluções para problemas (BRASIL,
2012).
Nesta perspectiva sugestiona que aspectos como a oportunidade de realizar
investigações, o levantamento de hipóteses, a organização de informações, a proposição
de explicações e produção de relatos acerca do observado (BRASIL, 2012) poderiam,
do ponto de vista pessoal e acadêmico, fazer parte dos materiais didáticos para o ensino
de Ciências, principalmente quando o foco são alunos do Ensino Fundamental Anos
Iniciais.
Referências bibliográficas
CACHAPUZ, A.;et al.A Necessária renovação do ensino das ciências. São Paulo.
Cortez, 2005.
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CASSAB, M.; MARTINS, I. A escolha do livro didático em questão. In: Atas do IV
Encontro Nacional de Pesquisa em Educação em Ciências. Bauru, SP. 25-29 de nov.
2003 (CDROM).
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GIL, Â.; FANIZZI, S. Porta Aberta: ciências, 3º ano. São Paulo: FTD, 2011.
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GIL, Â.; FANIZZI, S. Porta Aberta: ciências, 2º ano. Manual do Professor. São Paulo:
FTD, 2011.
GIL, Â.; FANIZZI, S. Porta Aberta: ciências, 3º ano. Manual do Professor. São Paulo:
FTD, 2011.
GIL, Â.; FANIZZI, S. Porta Aberta: ciências, 4º ano. Manual do Professor. São Paulo:
FTD, 2011.
GIL, Â.; FANIZZI, S. Porta Aberta: ciências, 5º ano. Manual do Professor. São Paulo:
FTD, 2011.
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NASCIMENTO, T. G.; MARTINS, I. O texto de genética no livro didático de ciências:
uma análise retórica crítica. Investigações em Ensino de Ciências. Porto Alegre.v.10,
n. 2, p. 255-278, 2005. Disponível em: <http://www.if.ufrgs.br/ienci/artigos/Artigo_ID1
31/v10_n2_a2005.pdf>. Acesso em: 24 maio 2015.
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VERCEZE, R. M. A. N.; SILVINO, E. F.M. O livro didático e sua implicação na
prática do professor nas escolas públicas de Guajará-Mirim. Práxis Educacional, v.
v.4, p. 83-102, 2008.
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