You are on page 1of 2

○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○

O BRASIL EM FOCO
THOMAS E. LOVEJOY

The H. John Heinz III Center for Science, Economics, and the Environment, 1001 Pennsylvania Avenue NW, Suíte 735 South, Washington, D.C. 20002, U.S.A.
e-mail: lovejoy@heinzctr.org

O Brasil está em foco em duas iniciativas deste mês de tarde, liderou a Eco-92 no Rio de Janeiro, onde os brasi-
julho de 2005: no Encontro Anual da Sociedade de Biolo- leiros assumiram o movimento de defesa do meio ambi-
gia da Conservação, que acontece em Brasília, e no Volu- ente. Foi o Embaixador Paulo Tarso Flecha de Lima, fun-
me 19 (Número 3) da Conservation Biology (traduzido na dador do Departamento de Promoção Comercial do
íntegra para o lançamento da revista Megadiversidade). Itamaraty, nos anos 80, quem reconheceu que o Ministé-
O país tem importância fundamental para a biodiversidade rio das Relações Exteriores precisava de uma Divisão para
do planeta e para o campo da biologia da conservação. lidar com questões ambientais. Ele também negociou para
Em nenhum outro lugar, as necessidades de proteção da que o Brasil sediasse a Eco-92, o que mudou sua imagem
natureza são mais críticas. Para entender isso, é preciso internacional e causou uma profunda e duradoura
fazer uma breve retrospectiva do ambientalismo brasilei- sensibilização popular com respeito ao tema ambiental.
ro e refletir sobre seu potencial de conservação, regional O Brasil colaborou com o Protocolo de Kyoto por meio
e globalmente. do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo, que prevê
Há cerca de 25 anos, quando me perguntaram porque formas de comércio de carbono entre nações desenvolvi-
o World Wildlife Fund (WWF) estava fazendo tanto pelo das e em desenvolvimento.
Brasil, minha resposta foi imediata : “O Brasil corresponde Nada disso teria sido possível sem algumas bravas li-
à metade da América do Sul. Antes da definição formal deranças, que trabalharam sem descanso pela solução dos
de hotspots de biodiversidade ou países de megadiver- problemas ambientais. O principal dentre eles foi o zoó-
sidade, logo que o termo “diversidade biológica” surgiu, logo Paulo Nogueira-Neto, que começou como primeiro
era mais que óbvio que o Brasil tinha uma grande con- Secretário para Meio Ambiente com uma equipe de ape-
centração da diversidade de vida da Terra. Como Darwin nas três pessoas. Ele conduziu o desenvolvimento de uma
apontou, o Brasil é “uma grande, selvagem, desordenada das mais modernas legislações ambientais do mundo e a
e exuberante estufa feita pela natureza para ela mesma”. criação de cerca de 3,2 milhões de hectares de áreas pro-
Essa afirmação justifica claramente a concentração de tegidas além de parques nacionais. Ele ficou no cargo por
esforços de conservação na região. Mas, existia e ainda 12 anos e foi apontado por José Goldemberg (outro dos
existe uma questão adicional: o tremendo potencial de grandes líderes e então reitor da Universidade de São
liderança da vasta nação brasileira. Os anos seguintes Paulo) como uma pessoa criticada, enquanto estava no
presenciaram um significante progresso nas lideranças de cargo, por não ser suficientemente ativa, mas reconheci-
conservação. O Brasil desenvolveu uma das mais fortes da logo depois por ter sido, na verdade, muito ativa.
capacidades do mundo em ciência da conservação e os Paulo Nogueira-Neto segue ativo, como também o é
principais avanços nessa área progrediram no meio de sua colega Maria Teresa Jorge Pádua, uma defensora de
forças de destruição horrendas e poderosas. Entre outras parques nacionais. Outros pioneiros incluem o
coisas, os líderes conservacionistas brasileiros contribuí- primatólogo Adelmar Faria Coimbra Filho, José Cândido
ram com o conceito de um novo tipo de área protegida de Melo Carvalho, da Academia Brasileira de Ciências, e
por meio do estabelecimento das reservas extrativistas. o Almirante Ibsen de Gusmão Câmara, que teve um im-
A idéia ganhou força após o assassinato, em 1988, de um portante papel na esfera das organizações não-governa-
líder seringueiro – Chico Mendes. Os conservacionistas mentais brasileiras. Muitos outros merecem menção –
brasileiros também tiveram um importante papel no ce- como o geneticista Warwick Kerr – mas é feita justiça a
nário internacional, sendo capazes de sofisticadas nego- eles em outras partes desta publicação.
ciações em reuniões de cúpula. O exemplo do então Em- Mais além dessa curta e vibrante história, nós nos per-
baixador Marcos Azambuja é revelador. No ano de 1972, guntamos: quais os destinos do ambientalismo brasileiro
em Estocolmo, ele anunciou que o Brasil acolhia a polui- a partir daqui, nacional e internacionalmente? A situação
ção para alcançar o desenvolvimento. Vinte anos mais no Brasil não é diferente daquela em qualquer outro país:

MEGADIVERSIDADE | Volume 1 | Nº 1 | Julho 2005


6 | O Brasil em foco

as sementes já foram plantadas e cultivá-las não é uma zônico. Com a secretaria do Tratado, agora permanentemen-
tarefa fácil. Os ecossistemas brasileiros são globalmente te sediada em Brasília, sob o comando de Rosalia Ortega
importantes. A Mata Atlântica, o Pantanal (a maior área (ex vice-presidente do Equador), existe um enorme po-
úmida da América do Sul), o Cerrado e as áreas costeiras tencial para que todos os interessados no futuro da Ama-
e marinhas apresentam características únicas e têm seus zônia reúnam forças para apoiar e sustentar a iniciativa.
próprios desafios de conservação. A biodiversidade de As parcerias internacionais para a conservação vão re-
água doce tem sido particularmente negligenciada. querer um cuidadoso balanço das necessidades nacionais,
O desmatamento na Amazônia continua cronicamente incluindo as econômicas. O plano de integração e
elevado, a despeito dos muitos esforços, que incontesta- infraestrutura, em escala continental, é um grande desa-
velmente fazem diferença. Novas ameaças como o avan- fio. Essa combinação de conexões em transporte, ener-
ço da agricultura da soja estão trazendo alterações não gia e comércio – nascida das compreensíveis necessida-
só pela conversão da floresta em terras agrícolas, mas des de integração e oportunidades econômicas – não pa-
também pela infra-estrutura associada cujos impactos vão rece, até o momento, considerar os impactos ambientais
muito além do propósito de facilitar o transporte dos e sociais de forma adequada. O projeto, em sua íntegra,
produtos. A China já deixou clara sua disposição em fi- precisa ser analisado em termos de todos os seus impac-
nanciar qualquer obra que facilite a entrega de commodities tos potenciais, mais que examinado por partes, separa-
de seu interesse. Mais perturbador são os indícios do damente, como tem sido feito até o momento.
aumento da vulnerabilidade do sistema, especialmente a O IIRSA (Iniciativa para a Integração da Infraestrutura
susceptibilidade a queimadas mesmo em anos sem El Niño. Regional Sul-Americana) menciona a necessidade de pla-
Ao mesmo tempo, observamos um considerável pro- nejar não somente as áreas protegidas individualmente
gresso. Com a realização dos compromissos do Progra- mas também a conservação e o manejo dos ecossistemas
ma Áreas Protegidas da Amazônia, mais que 40% da Ama- de forma integrada. Isso é particularmente válido na
zônia Legal estarão sob alguma forma de proteção. Isso Amazônia, que possui um ciclo hidrológico dependente
sem contar a extensão das outras áreas que, como prevê da floresta. Diariamente, à medida que o desmatamento
a legislação, devem manter 80% de floresta. Políticos elei- avança, o sistema aproxima-se do limiar de uma irrever-
tos em vários estados da Amazônia estão engajados com sível seca. O Pantanal – gigantesca esponja que absorve
o processo de desenvolvimento sustentável. Mas em al- água na estação chuvosa e a libera lentamente na estação
guns estados (particularmente no Pará), a violência per- seca – também precisa ser manejado como um sistema.
manece, em torno de um conflito de interesses de assen- Enquanto eu escrevo este texto, uma reprise trágica
tados, sem-terras e o meio ambiente É necessário ser re- da história de Chico Mendes está acontecendo. As gran-
almente criativo para lidar com essas situações! des tensões entre proprietários de terras, sem-terras e
O país está em processo de debate sobre uma questão necessidades ambientais culminaram com o assassinato
legítima: os assuntos de conservação podem ir além da de uma freira de 74 anos - Dorothy Stang. O conflito ga-
alçada do Ministério do Meio Ambiente e de agências nhou, agora, uma nova face humana. As regras para os
ambientais estaduais e tornar-se parte de outras instân- cortes de árvores, anteriormente relaxadas, foram res-
cias dos governos estaduais e federal? Uma importante tauradas, a criação de novas áreas protegidas tornou-se
discussão em torno do programa de infra-estrutura, ori- alta prioridade e dois mil soldados foram mandados para
ginalmente chamado Avança Brasil, questiona se o eixo a região de conflito no estado do Pará. Estamos em meio
de planejamento do governo está realmente disposto a a uma competição entre as forças da destruição e as for-
incorporar preocupações ambientais e a conduzir o país ças da conservação?
com esforços de desenvolvimento sustentável, mais que A Sociedade para Biologia da Conservação reúne-se em
simplesmente criar áreas protegidas como “boas ações” Brasília num momento crítico da história do Brasil e do
no final do processo. Esse é o esforço central da atual meio ambiente. Estes também são momentos cruciais para
Ministra do Meio Ambiente, Marina Silva. o futuro de sua extraordinária biodiversidade. O país está
O futuro da biodiversidade regional também depende preparado para fazer uma diferença maior que qualquer
da posição que o Brasil assumir para além de suas fron- outro da América do Sul no futuro do Tratado Amazôni-
teiras. O país já se posicionou de forma construtiva fren- co. Ele pode mudar a escala do trabalho de conservação
te ao Paraguai e a Bolívia, evitando repetir alterações ao longo de todo o continente sul-americano. Há tantos
hidrológicas mal concebidas, a exemplo do que ocorreu executores e idealizadores quantos podem ser encontra-
no Pantanal. Nos anos 70, o Brasil iniciou o Tratado de dos em qualquer lugar, e eles estão atuando em um dra-
Cooperação Amazônica, que parecia basicamente uma ma de conservação monumental. O Brasil pode trazer uma
medida defensiva. Sob a presidência de Fernando Henrique contribuição profunda e positiva para o meio ambiente
Cardoso, o Brasil transformou-se em uma liderança mundial. Compete a nós apoiar a transformação desse
construtiva de desenvolvimento sustentável no Tratado Ama- potencial em realidade.

MEGADIVERSIDADE | Volume 1 | Nº 1 | Julho 2005

You might also like