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Frank Hahn, não por acaso, foi o orientador no doutoramento de Stiglitz, depois de este ter
sido classificado como "keynesiano americano arquétipo" (nada podia ser pior em Cambridge,
na época, segundo Harcourt) por Joan Robinson, a quem tinha sido remetido por Paul
Samuelson e Robert Solow (HARCOURT, 1997) Uma abordagem abrangente e crítica da
construção e dos requisitos do modelo Arrow-Debreu pode ser encontrada em Ganem
(1996).
c o m p o r t a , á Ia K e y n e s , a p o s s i b i l i d a d e d e d e s e m p r e g o involuntário e e s t a g n a -
ção. T a m b é m c o m o Keynes — e diferentemente dos modelos novos-keynesianos
c e n t r a d o s n a rigidez d e p r e ç o s — , a flexibilidade d e salários e p r e ç o s n o m i n a i s
p o d e e x a c e r b a r a instabilidade d o s i s t e m a e c o n ô m i c o . C o n f o r m e p r e t e n d e m o s
realçar n e s t e t r a b a l h o , a a p r o x i m a ç ã o e n t r e Stiglitz e K e y n e s a p a r e c e , a i n d a ,
e m v á r i o s o u t r o s p o n t o s d a o b r a d o primeiro.
O presente trabalho aborda as relações de proximidade ou distância
e n t r e Stiglitz e K e y n e s a partir d e um p r i s m a particular. Utilizando a n o ç ã o
d e " m o d e l o s h e u r í s t i c o s " , f o r m u l a d a por V e r c e l l i ( 1 9 9 1 ) , e m s u a c o m p a r a ç ã o
d e K e y n e s e Lucas, t e n t a r e m o s resumir u m m o d e l o heurístico d e Stiglitz,
tomando como referência seus trabalhos sobre estruturas financeiras e
f l u t u a ç õ e s e c o n ô m i c a s . O d e s e n h o d e tal m o d e l o h e u r í s t i c o — a l g o i n t e r m e -
diário entre a Visão e os Modelos Analíticos de S c h u m p e t e r ( V E R C E L L I ,
1 9 9 1 , p.95)^ — e m b a s a r á n o s s a p r ó p r i a r e s p o s t a s o b r e Stiglitz e K e y n e s .
Esta é a de que, apesar de existirem diferenças acentuadas em termos de
s e u s m o d e l o s heurísticos, os dois t ê m , no sentido s c h u m p e t e r i a n o do ter-
mo, "visões" muito próximas quanto ao f u n c i o n a m e n t o das e c o n o m i a s d e
m e r c a d o . Stiglitz é " n ã o k e y n e s i a n o " p e l o s t r a ç o s f o r m a i s e " k e y n e s i a n o " n a
substância!
A c r e d i t a m o s q u e o tipo d e exercício aqui b u s c a d o p o d e ter u m a utilidade
q u e vai a l é m d e d e m a r c a ç ã o d e direitos d e p r o p r i e d a d e e d e h e r a n ç a q u a n t o à
filiação d e a u t o r e s . P e r c e b e - s e , por e x e m p l o , c o m m a i o r clareza, c o m o , d e f a t o ,
F a z z a r i e V a r i a t o s u b e s t i m a m a s dificuldades d e c o m p a t i b i l i z a ç ã o e m nível d e
m o d e l o s h e u r í s t i c o s e d e p r o g r a m a s d e p e s q u i s a . N o t a - s e , p o r é m , q u e Stiglitz
e s t a b e l e c e u m c a m i n h o alternativo aos p ó s - k e y n e s i a n o s e m t e r m o s d e m a t e r i a -
lizar a v i s ã o d e K e y n e s , o q u e constitui, n e s s e sentido, e s f o r ç o c o m p l e m e n t a r ,
a m p l i a n d o o e s c o p o d e trajetórias teóricas s o b e x p l o r a ç ã o científica. A q u e s t ã o
é a t u a l , p a r t i c u l a r m e n t e d i a n t e d a c o n v e r g ê n c i a parcial e m c u r s o n a s a g e n d a s
d e m a c r o e c o n o m i s t a s d o mainstream e das margens ( C A N U T O , 1997; P O S -
SAS, 1997).
"Capital e s t á no â m a g o d o capitalismo; n ã o s u r p r e e n d e , d e s t e m o d o ,
q u e d e v a m o s buscar n a s falhas d o s m e r c a d o s d e capitais a explicação
para u m a das mais importantes falhas do capitalismo, as marcadas
f l u t u a ç õ e s n o p r o d u t o e e m p r e g o q u e t ê m caracterizado o c a p i t a l i s m o
a t r a v é s d e t o d a s u a história." ( S T I G L I T Z , 1992a, p.269).
Stiglitz v ê n a p r e s e n ç a g e n e r a l i z a d a d e a s s i m e t r i a d e i n f o r m a ç õ e s n o s
m e r c a d o s d e capitais, c o m s u a s implicações s o b r e o s c o m p o r t a m e n t o s d e aver-
são a riscos dos agentes econômicos, u m a das responsabilidades pelas
flutuações tanto nas decisões de investimento das firmas c o m o na oferta de
f u n d o s p a r a financiá-los. Isto p o r q u e tais assimetrias, a o tornar difíceis a diversi-
f i c a ç ã o e a t r a n s f e r ê n c i a d o s riscos n a e c o n o m i a , influem n a f o r m a e n a m a g n i -
tude de captação de recursos das empresas. Assim, mudanças na percepção
d e r i s c o s d e c o r r e n t e s d e c h o q u e s (monetários, reais ou expectacionais) l e v a r ã o
a s e m p r e s a s a rever s e u s p r o g r a m a s d e p r o d u ç ã o e investimento e o s b a n c o s a
racionar crédito. O s p r o c e s s o s d e ajustes ao equilíbrio n o s m e r c a d o s d e t r a b a -
lho, p r o d u t o e capital r e v e l a m - s e e x t r e m a m e n t e lentos e às v o l t a s c o m
multiplicidade e histerese.
- por q u e i n v e s t i m e n t o s , e m g e r a l , e e s t o q u e s e c o n s t r u ç ã o civil, e m p a r t i -
cular, f l u t u a m m a i s d o q u e o produto. E m o u t r a s p a l a v r a s , por q u e , e m
recessões, durante as quais os custos marginais da construção ou pro-
d u ç ã o t e n d e m a s e r b a i x o s , c o m o t a m b é m a s t a x a s d e j u r o s reais, n ã o
o b s e r v a m o s p r o d u ç ã o regular: a c u m u l a ç ã o d e e s t o q u e s n a r e c e s s ã o e
desacumulação nos booms.
O p o n t o d e partida p a r a a c o m p r e e n s ã o do m o d e l o h e u r í s t i c o d e Stiglitz
e s t á e m e n t e n d e r q u e a causa causans para as falhas nos mercados d e capi-
tais s ã o , p a r a o autor, a s assimetrias d e informações e os c o n s e q ü e n t e s proble-
m a s d e s e l e ç ã o a d v e r s a e r i s c o moral.^
A s s i m e t r i a s d e i n f o r m a ç õ e s entre d u a s partes q u e t r a n s a c i o n a m o c o r r e m
q u a n d o u m a parte d e t é m m a i s i n f o r m a ç õ e s d o q u e a o u t r a , s e j a ex ante em
r e l a ç ã o à s características do q u e está s e n d o c o m p r a d o ou v e n d i d o , seja expost
e m r e l a ç ã o a o c o m p o r t a m e n t o d o s indivíduos d e p o i s d e f i r m a d o o c o n t r a t o . O s
modelos de seleção adversa tratam de problemas d e informações imperfeitas
a s s o c i a d a s a o p r i m e i r o c a s o , e n q u a n t o o s d e risco m o r a l a b o r d a m o s p r o b l e -
m a s d e i n f o r m a ç õ e s r e l a c i o n a d o s a o s e g u n d o ( S T I G L I T Z , 1 9 8 5 a , p.23).
' Não só para os mercados de capitais como para os mercados de produtos e trabalho
(STIGLITZ, BOADWAY, 1994, caps, 19 e 20).
D e s s e m o d o , a c h a v e p a r a o m o d e l o d e ciclos e c o n ô m i c o s d e Stiglitz e s t á
em sua explicação de c o m o as assimetrias de informações afetam os merca-
d o s d e a ç õ e s e d e crédito. E m o u t r a s p a l a v r a s , c o m o o s r a c i o n a m e n t o s n o s
m e r c a d o s d e capitais e x e r c e m i m p a c t o s o b r e a s e x p e c t a t i v a s d o s a d m i n i s t r a -
d o r e s d a s e m p r e s a s q u a n t o a arcar c o m o s riscos d e c o r r e n t e s d o s p r o c e s s o s
d e produção e investimento, principalmente quando esses riscos são exacerba-
d o s p e l a a u s ê n c i a d e m e r c a d o s futuros e "(..•) a s f i r m a s n ã o p o d e m v e n d e r s e u
produto no período d e produção" ( G R E E N W A L D , STIGLITZ, W E I S S , 1987, p. 125).
A s s i m , o e n t e n d i m e n t o d o m o d e l o heurístico d e Stiglitz s u p õ e a c o m p r e e n s ã o
d o s m i c r o f u n d a m e n t o s , q u e s ã o d e s e n v o l v i d o s p a r a explicar o s f e n ô m e n o s d o
d e s e m p r e g o e dos ciclos econômicos.'
' Ao fazer a crítica à esquizofrenia criada pela síntese neoclássica entre micro e
macroeconomia, Stiglitz observa q u e " ( . ) há dois modos pelos quais as duas subdisciplinas
[micro e macroeconomia] poderiam ser reconectadas. A macroteoria poderia ser adaptada
à microteoria; e vice-versa. A economia novo-clássica escolhe o primeiro enfoque (.,,)
[Quanto ao] outro enfoque que busca adaptar a microteoria à macroteoria {.,.) podemos
referir-se a ele como economia novo-keynesiana (,,.)" (GREENWALD, STIGLITZ, WEISS,
1987, p.120; ver, também, a esse respeito, STIGLITZ, 1992b, p,39-40),'
d e i n f o r m a ç õ e s irredutíveis, c o m o é o c a s o d o d e Stiglitz, é o c u s t o a s e r a s s u -
m i d o por u m a g e n t e e c o n ô m i c o , pelo f a t o d e n ã o ter c e r t e z a q u a n t o à s c o n s e -
q ü ê n c i a s d e s u a s a ç õ e s ("incerteza i n s t r u m e n t a l " n o s t e r m o s d e Stiglitz) e e m
r e l a ç ã o à i n c e r t e z a a s s o c i a d a a o valor d o s v á r i o s ativos (em f u n ç ã o d o q u e
c h i a m a r e m o s d e "incerteza ambiental") ( S T I G L I T Z , 1993a, p.28), c o m o t a m b é m
por p o s s u í r e m i n f o r m a ç õ e s imperfeitas.^
No c a s o d a "incerteza instrumental", Stiglitz observa q u e u m a firma, a o c o n s i -
derar qual estratégia d e ajuste adotar n a presença d e riscos — se preços, salários
ou quantidades — , "(...) p e r c e b e r á maior incerteza sobre as c o n s e q ü ê n c i a s d e
a j u s t a m e n t o s d e preços e salários d o q u e sobre ajustamentos n a quantidade —
porque aquelas conseqüências d e p e n d e m d a s respostas incertas das firmas rivais,
c o n s u m i d o r e s e trabalhadores". O u seja, os riscos (custos) a serem a r c a d o s pela
e m p r e s a s ã o maiores nos ajustamentos d e preços e salários e m relação a o s ajustes
pelas quantidades, porque há, naquele primeiro caso, incerteza quanto a o compor-
t a m e n t o d o s outros agentes e c o n ô m i c o s . " E m geral, firmas s a b e m m a i s s o b r e o
status quo d o q u e s o b r e as coisas q u e poderiam acontecer caso elas m u d a s s e m
s u a s a ç õ e s " ( G R E E N W A L D , S T I G L I T Z , W E I S S , 1993a, p.28,37).
A l é m d a " i n c e r t e z a i n s t r u m e n t a l " (incerteza c o m p o r t a m e n t a l á Ia S i m o n ) ,
Stiglitz f a z m e n ç ã o , t a m b é m , à i n c e r t e z a a s s o c i a d a a o valor f u t u r o d o s a t i v o s
("incerteza ambiental"). P a r a ele:
"(...) t r o c a s n o s m e r c a d o s d e c a p i t a i s s ã o i n t e r t e m p o r a i s , p o s t o
q u e o c o r r e m ao longo do t e m p o . Por esta razão, fiá t a m b é m risco
p o r q u e i n d i v í d u o s e f a m í l i a s q u e r e n u n c i a m [liquidez] (...) h o j e p a r a
outros indivíduos e firmas, deparam-se com a incerteza sobre o
m o n t a n t e q u e será restituído no futuro e e m q u e circunstâncias.
Nos m e r c a d o s de capitais, questões de t e m p o e risco estão
profundamente interligadas, porque muitos dos relevantes riscos
não p o d e m ser segurados através de u m a companhia de seguros.
O m o d o c o m o o capital é levantado determina q u e m arca c o m os
r i s c o s " (ibid., p.156).
" O c o m p o r t a m e n t o d a s f i r m a s é i n f l u e n c i a d o por s u a s p e r c e p ç õ e s
d e r i s c o s , t a n t o a t r a v é s d a i n c e r t e z a i n s t r u m e n t a l (a i n c e r t e z a
concernente às conseqüências de qualquer ação), como da
incerteza a s s o c i a d a ao valor dos vários ativos. A o m e n o s três
fatores influenciam os riscos c o m os quais as firmas s e d e p a r a m ,
bem c o m o seus desejos de arcar com aqueles riscos. O primeiro
fator é o de que quando a e c o n o m i a entra em recessão, e firmas
c o m e n t a m sobre seu pessimismo ou incerteza, estas percepções
t ê m c o n s e q ü ê n c i a s reais, U m s e g u n d o fator é a p o s i ç ã o d e s a l d o s
m o n e t á r i o s d a f i r m a (ou a t i v o s l í q u i d o s ) . M u d a n ç a s n a p o s i ç ã o d e
saldos monetários da firma afetam a magnitude do montante a
tomar c o m o empréstimo para manter suas atividades de produção.
[Por s u a v e z ] , a posição de saldos monetários da firma é afetada
p e l o s l u c r o s , e, d a d o q u e o s l u c r o s s ã o o r e s í d u o , pequenas
m u d a n ç a s n o s p r e ç o s p o d e m ter g r a n d e s e f e i t o s s o b r e t a i s s a l d o s
e, a s s i m , s o b r e a l i q u i d e z d a f i r m a , p a r t i c u l a r m e n t e p a r a f i r m a s
a l t a m e n t e a l a v a n c a d a s . E v i d e n t e m e n t e , o s m e n o r e s lucros t a m b é m
a f e t a m a d v e r s a m e n t e o patrimônio líquido d a firma. Um terceiro
fator i m p o r t a n t e é a m u d a n ç a n o nível d e p r e ç o s . D a d o q u e q u a s e
todos os débitos são denominados em termos nominais, tais
m u d a n ç a s t ê m g r a n d e s efeitos s o b r e a r i q u e z a e a liquidez reais d a
firma".
' stiglitz cita o caso dos mercados de seguros, cujos problemas de incentivos relacionados a
risco moral explicam porque companhias de seguros náo oferecem cobertura para riscos
de negócios. Nesse caso, uma companhia poderia encontrai enormes dificuldades de com-
prar um seguro que lhe garantisse um nível de lucro mínimo, em razão do desestímulo que
isso poderia criar junto aos administradores da empresa, já que há um trade-off positivo
entre incentivos e riscos (STIGLITZ, BOADWAY, 1994, p.159). Isso significa que os riscos
associados às decisões de produzir e investir não são seguráveis, o que justifica —
conjuntamente com a aversão a riscos de empresas e bancos, como será visto — o papel
atribuído a fiscos de falência na explicação dos ciclos econômicos por Stiglitz.
to limitado d e informações. Em outras palavras, assimetrias de informações
não redutíveis entre os agentes econômicos implicam formação circuns-
crita d e expectativas, mas plenamente racionais, ou seja, o conjunto
limitado d e i n f o r m a ç õ e s é totalmente utilizado. Isso coloca, e m tese, a
p o s s i b i l i d a d e d o e r r o ser d o m i n a n t e e m f r e q ü ê n c i a , a d e s p e i t o d a s ex-
pectativas s e r e m racionais.
A r e l a ç ã o e s t a b e l e c i d a a c i m a entre a s s i m e t r i a d e i n f o r m a ç õ e s , i n c e r t e z a
e risco ajuda-nos a entender c o m o o risco entra na f o r m a ç ã o de preços e m
condições d e incerteza num ambiente e m que os agentes p o s s u e m diferentes
p e r c e p ç õ e s d e r i s c o s , m e s m o c o m e x p e c t a t i v a s r a c i o n a i s . É o q u e Stiglitz
d e n o m i n a d e " c u s t o m a r g i n a l d e f a l ê n c i a " (marginal bankruptcy cost o u " p r ê -
m i o d e r i s c o " ) , isto é, o c u s t o a s s o c i a d o à p r o b a b i l i d a d e d e f a l ê n c i a , q u a n d o
s e t o m a e m p r e s t a d o um dólar adicional ( G R E E N W A L D , S T I G L I T Z , W E I S S ,
1988b, nota 20).
C o n s i d e r a r e s s e custo significa dizer q u e a f i r m a irá p r o d u z i r n ã o até o
p o n t o o n d e a utilidade marginal d o retorno líquido é zero, m a s a u m ponto a b a i x o
d a q u e l e ( S T I G L I T Z : 1992a, p.281). À g u i s a d e e x e m p l o , s e t o m a r m o s o nível d e
e m p r e g o c o m o a variável decisão, temos, no caso convencional:
PF-tn = O (A)
PF'-ro - V (B)
E m o u t r a s p a l a v r a s , no curto p r a z o , a s v a r i a ç õ e s n a p r o d u ç ã o p a s s a m a
s e r e x p l i c a d a s pela volatilidade d o s c u s t o s m a r g i n a i s d e f a l ê n c i a o u " p r ê m i o d e
risco", q u e a f e t a m d i r e t a m e n t e a s d e c i s õ e s d a s f i r m a s d e v i d o a s u a s p o s t u r a s
d e a v e r s ã o a r i s c o s d e falência. G r a f i c a m e n t e , a relação e n t r e v|; e a p r o d u ç ã o
p o d e s e r e x p r e s s a c o m o no G r á f i c o 1.
EnsaiosFEE, PortoAlegre, v.20, n2, p. 7-42 1999
Gráfico 1
01 02
PF'-r,
D e s s e m o d o , o s d e t e r m i n a n t e s d o s custos m a r g i n a i s d e f a l ê n c i a r e v e l a m -
-se c r u c i a i s p a r a a d e t e r m i n a ç ã o d a s f l u t u a ç õ e s e c o n ô m i c a s . E s s e s c u s t o s
s ã o a f e t a d o s por v a r i a ç õ e s n o p a t r i m ô n i o l í q u i d o d a f i r m a e e m s u a s ex-
pectativas quanto às m u d a n ç a s no ambiente econômico (percepção de
risco). A m b o s — o p a t r i m ô n i o líquido e as e x p e c t a t i v a s — s o f r e m a l t e r a ç õ e s
d e c o r r e n t e s d e c t i o q u e s e c o n ô m i c o s , o c a s i o n a d o s por c h o q u e s d e p r e ç o s ( m u -
d a n ç a s n ã o a n t e c i p a d a s n a d e m a n d a , s e j a por f a t o r e s reais, s e j a por m o n e t á -
rios) o u c h o q u e s d e "incerteza" — e m relação aos preços futuros ( G R E E N W A L D ,
S T I G L I T Z , W E I S S , 1993b, p.107-108).
D a d a a s i g n i f i c â n c i a q u e t e m a p e r c e p ç ã o d e risco p a r a a s d e c i s õ e s d e
portfolio d o s agentes econômicos, o próximo passo é apresentar c o m o o s agentes
s e c o m p o r t a m p e r a n t e riscos n a a b o r d a g e m d e Stiglitz.
D e m a n e i r a g e r a l , o c o m p o r t a m e n t o d o s indivíduos p e r a n t e riscos é o d e
evitá-lo ou procurar minimizá-lo. De acordo c o m Stiglitz e B o a d w a y (1994, p.151),
"(...) p s i c ó l o g o s t ê m e x t e n s i v a m e n t e e s t u d a d o este ' c o m p o r t a m e n t o d e evitar
riscos', f o c a l i z a n d o , por e x e m p l o , a a n s i e d a d e q u e a i n c e r t e z a suscita". Entre-
t a n t o G r e e n w a l d , Stiglitz e W e i s s (1993a, p.27-33) a p o n t a m a l g u m a s o u t r a s
razões para a aversão das empresas e bancos a riscos, as quais
microfundamentam as explicações dos racionamentos nos mercados de ações
e d e c r é d i t o . A n t e s , p o r é m , a l g u m a s qualificações g e r a i s no t o c a n t e à p o s t u r a
d o a g e n t e "stiglitziano" p e r a n t e riscos s ã o n e c e s s á r i a s .
A aversão a riscos, que caracteriza o comportamento dos agentes econômicos,
a o longo d o ciclo econômico, n a a b o r d a g e m d e Stiglitz, deve-se tanto à estrutura d e
preferência d o s agentes c o m o às próprias assimetrias d e informações n o s m e r c a -
d o s d e capitais e d e seguros. E m outras palavras, a teoria d a a v e r s ã o a riscos d e
Stiglitz é diferente d a s mais tradicionais, v e j a m o s , a seguir, c o m o .
O c u s t o m a r g i n a l d e falência, a d i c i o n a l m e n t e à e s t r u t u r a d e p r e f e r ê n c i a
d o s agentes, t a m b é m induz, no m o d e l o (teoria d o s ciclos e c o n ô m i c o s ) d e Stiglitz,
a u m tipo d e c o m p o r t a m e n t o a v e s s o a riscos: o c o m p o r t a m e n t o d o s a d m i n i s t r a -
d o r e s d e evitar falência e m f u n ç ã o d a s penalidades sofridas por eles neste e v e n -
t o (STIGLiTZ:1992a; G R E E N W A L D , STIGLITZ, W E I S S , 1988a; 1988b;1993a;
1 9 9 3 b ) . P a r a Stiglitz, h á u m a r e l a ç ã o d i r e t a e n t r e c u s t o d e f a l ê n c i a e a v e r s ã o a
r i s c o s por p a r t e d o s a d m i n i s t r a d o r e s , p r i n c i p a l m e n t e p o r q u e o p r i m e i r o c r e s c e
linearmente c o m a escala de produção, e a firma tem que financiar o aumento
d a p r o d u ç ã o a t r a v é s d e e n d i v i d a m e n t o externo ( a u m e n t a n d o a probabilidade d e
f a l ê n c i a n a o c o r r ê n c i a d e u m c h o q u e e c o n ô m i c o ) . A a v e r s ã o a r i s c o s s ó diminui
e m termos absolutos quando a base de riqueza da firma aumenta. Entretanto
c o m o a s a s s i m e t r i a s d e i n f o r m a ç õ e s irredutíveis n o s m e r c a d o s d e a ç õ e s i m p e -
d e m q u e o s riscos s e j a m integralmente transferidos, o u f o r t e m e n t e c o m p a r t i l h a -
d o s (os m e r c a d o s d e capitais n ã o s ã o perfeitos), m e s m o c o m a u m e n t o no esto-
q u e d e r i q u e z a d a f i r m a , o c u s t o m a r g i n a l d e f a l ê n c i a é s e m p r e positivo.
Stiglitz (1992a., p.282-283) salienta as diferenças entre s u a teoria
m i c r o e c o n ô m i c a e a t e o r i a p a d r ã o n e o c l á s s i c a , a o afirmar:
b) r i s c o m o r a i - l e v a n t a m e n t o d e capitais nos m e r c a d o s d e a ç õ e s t a m b é m
e n v o l v e p r o b l e m a s d e incentivos e m o n i t o r a m e n t o [expost). O s proble-
m a s d e incentivos o c o r r e m , p o r q u e o s gestores d a s firmas, por t e r e m d e
dividir s e u s esforços c o m o s acionistas através d e dividendos, s e s e n t e m
m a i s e s t i m u l a d o s a d e s v i a r e m - s e d o s interesses d a s e m p r e s a s (proble-
m a s d e c o m p o r t a m e n t o renf-seeWnfir inclusive). H á , t a m b é m , u m trade-
-off positivo entre incentivos e riscos: m e n o r e s riscos implicam m e n o r e s
incentivos p a r a o s a d m i n i s t r a d o r e s . A d e m a i s , existe u m p r o b l e m a d e
free-rider, a s s o c i a d o a o fato d e q u e o s acionistas q u e b u s c a m monitorar
o s a d m i n i s t r a d o r e s beneficiam t o d o s o s outros c o m o m e l h o r d e s e m p e -
n h o d a s e m p r e s a s . Dito d e o u t r o m o d o , c o l ç c a m - s e p r o b l e m a s d e
externai idades relacionados ao monitoramento (STIGLITZ, 1993b).
E s s e s p r o b l e m a s , d e s e l e ç ã o a d v e r s a e d e risco m o r a l , s ã o r e s p o n s á -
v e i s pelos r a c i o n a m e n t o s nos m e r c a d o s d e a ç õ e s . Isto p o r q u e limitam os f i n a n -
ciamentos por ações, através d o s quais a s firmas partilham o s riscos c o m os
a c i o n i s t a s . C o m o c o n s e q ü ê n c i a , i m p õ e m a o p ç ã o d e crédito p a r a níveis a c i m a
d a s p r e f e r ê n c i a s d a s f i r m a s . C o m isso, l e v a m a q u e a p r o b a b i l i d a d e e o s c u s t o s
d e falência s e tornem ainda mais decisivos n a percepção d e riscos das empre-
s a s , riscos e s t e s q u e , j u n t a m e n t e c o m m u d a n ç a s no p a t r i m ô n i o líquido, a f e t a m
d i r e t a m e n t e a p r o d u ç ã o e o investimento.^"
O s b a n c o s , s e g u n d o Stiglitz, s ã o e m p r e s a s q u e e x e r c e m o p a p e l d e
intermediação entre tomadores e fornecedores de recursos financeiros. C o m o
c o m p r o m i s s o s d e restituição d e e m p r é s t i m o s p o d e m não ser h o n r a d o s , o s b a n -
c o s d e v e m s e l e c i o n a r e m o n i t o r a r s e u s clientes. T a r e f a s , a l i á s , dificultadas e m
função das assimetrias de informações existentes entre empresas e bancos.
Desse modo, assim como n o mercado d e ações, há t a m b é m nos mercados d e
c r é d i t o p r o b l e m a s d e s e l e ç ã o a d v e r s a e d e risco m o r a l .
N e s s e contexto, o s b a n c o s p o d e m optar por racionamento d e crédito, q u a n -
d o h á e x c e s s o d e d e m a n d a por f u n d o s , " a o invés d e a u m e n t a r a s t a x a s d e j u r o s
(seja r e d u z i n d o a o f e r t a d e créditos, s e j a a l t e r a n d o a s c o n d i ç õ e s d e e m p r é s t i -
m o s — c o m o a e x i g ê n c i a d e colaterais o u m u d a n ç a s n o s p r a z o s d e m a t u r a ç ã o
d o s e m p r é s t i m o s ) ( S T I G L I T Z , 1988a; 1992a). O risco d e falência é a e x p l i c a ç ã o
para esse comportamento. Vejamos por quê.
À m e d i d a q u e o s b a n c o s t ê m i n f o r m a ç õ e s imperfeitas a c e r c a d o s projetos
d o s c a n d i d a t o s a e m p r é s t i m o s — n ã o p o d e n d o , ex-ante, diferenciar a q u e l e s d e
b a i x o d o s d e alto risco, m a s s ó o risco m é d i o (ou seja, h á u m p r ê m i o lemon à Ia
A k e r l o f ( 1 9 7 0 ) n e s s e m e r c a d o ) — , u m a u m e n t o n a s t a x a s d e j u r o s p a r a equili-
brar a o f e r t a e a d e m a n d a p o r f u n d o s (equilíbrio w a i r a s i a n o ) t e m d o i s e f e i t o s .
P r i m e i r o , a f e t a a d v e r s a m e n t e o m/x d e c a n d i d a t o s , a f a s t a n d o o s p r o j e t o s d e
' Há várias definições de racionamento de crédito, entretanto Stiglitz adota o que chama pure
credit rationing: "(...) pode haver momentos em que alguns indivíduos obtêm empréstimos,
embora indivíduos aparentemente idênticos, que estejam requerendo empréstimos
precisamente nos mesmos termos, náo o conseguem" (JAFFEE, STIGLITZ, 1990, p.859).
m e l h o r q u a l i d a d e e m e n o r risco; s e g u n d o , incentiva (efeito r i s c o m o r a l ) a s
e m p r e s a s a e m p r e e n d e r projetos d e alto risco. E s s e s efeitos p o d e m diminuir o s
retornos e s p e r a d o s d o s b a n c o s e m f u n ç ã o d a maior p r o b a b i l i d a d e d e f a l ê n c i a
d o s t o m a d o r e s d e e m p r é s t i m o s . Por e s s a r a z ã o , s o b c e r t a s c i r c u n s t â n c i a s ,
p r e f e r e m r a c i o n a r crédito, c o n f o r m e os t e r m o s d e G r e e n w a l d , Stiglitz e W e i s s
(1993a, p.31):
" R e c o n h e c e - s e a g o r a q u e u m a u m e n t o d a s t a x a s d e j u r o s p o d e ter
efeitos a d v e r s o s s o b r e o mix d e candidatos a e m p r é s t i m o s e s o b r e os
incentivos d e t o m a d o r e s d e e m p r é s t i m o s a e m p r e e n d e r atividades d e
risco, b e m c o m o q u e e s t e s efeitos d e s e l e ç ã o e incentivo a d v e r s o s
p o d e m ser fortes o b a s t a n t e p a r a q u e o s r e t o r n o s e s p e r a d o s d o s
e m p r e s t a d o r e s p o s s a m , n a realidade, diminuir c o m o a u m e n t o d a s
t a x a s d e j u r o s c o b r a d a s . Isto p o d e levar ao r a c i o n a m e n t o d e crédito,
c o m a t a x a d e juros c o b r a d a s e n d o a q u e l a q u e m a x i m i z a o r e t o r n o
e s p e r a d o d o s e m p r e s t a d o r e s , à qual p o d e r á haver u m e x c e s s o d e
d e m a n d a por crédito".
Gráfico 2
R e t o r n o e s p e r a d o dos b a n c o s {^)
G rupo tipo 2
T a x a de juros
O g r u p o d o tipo 1 é d e n o m i n a d o por J a f f e e e Stiglitz d e rediined, ou seja,
d a d a a c l a s s i f i c a ç ã o d e risco p a r a q u a l q u e r t a x a d e j u r o s o s e m p r e s t a d o r e s
o b t e r ã o r e t o r n o s por s e u s e m p r é s t i m o s a b a i x o d o s q u e m a x i m i z a m o s lucros.
Por e s s a r a z ã o , a e s s e g r u p o s e r á n e g a d o crédito, seja q u a l for a t a x a d e j u r o s .
O contrário o c o r r e c o m o s t o m a d o r e s d e e m p r é s t i m o s d o g r u p o d o tipo 2, c o m
s u a s d e m a n d a s por crédito s e n d o p l e n a m e n t e satisfeitas. N e s s e c a s o , o s b a n -
c o s d i s p u t a m , c o m p e t i t i v a m e n t e , o f o r n e c i m e n t o d e crédito, f a z e n d o c o m q u e o
retorno e s p e r a d o por s e u s e m p r é s t i m o s t e n d a a igualar-se à t a x a d o s d e p ó s i t o s
(5). Por f i m , s e g u n d o J a f f e e e Stiglitz, o g r u p o d o tipo 3, ou marginalgroup, é o
q u e s o f r e r a c i o n a m e n t o d e crédito no s e n t i d o forte d o t e r m o . E m o u t r a s p a l a -
v r a s , e n q u a n t o a l g u n s m e m b r o s d e s s e g r u p o r e c e b e m crédito, este é n e g a d o a
o u t r o s a p a r e n t e m e n t e idênticos (em t e r m o s d e c a r a c t e r í s t i c a s o b s e r v a d a s ) .
A s s i m , " ( . . . ) o s b a n c o s o b t ê m os retornos requeridos d o s m e m b r o s d e s s e g r u p o
m a r g i n a l crítico, c o b r a n d o - l h e s u m a t a x a d e juros q u e m a x i m i z a s e u s r e t o r n o s
e s p e r a d o s " ( J A F F E E , S T I G L I T Z : 1990, p.860).
A i n d a c o m relação a r a c i o n a m e n t o d e crédito, Stiglitz c h a m a a t e n ç ã o p a r a
dois a s p e c t o s : primeiro, r e d u ç õ e s a c e n t u a d a s na disponibilidade d e crédito i m -
plicarão m u d a n ç a s n o g r u p o m a r g i n a l , o u seja, o v e l h o g r u p o m a r g i n a l s e r á
t o t a l m e n t e e x c l u í d o , t r a n s f o r m a n d o - s e e m rediined, e o novo grupo marginal
s e r á parcialmente excluído dos empréstimos; segundo, q u a n d o h á u m continuum
d e g r u p o s , c o n f o r m e Stiglitz e W e i s s (1992), o s g r u p o s d o tipo 1 [redlined) e do
tipo 3 (racionamento puro d e crédito) p o d e m ser quase indistinguíveis. Isto porque
A c o n c l u s ã o q u e t i r a m o s disso é a d e q u e , no c a s o de u m continuum d e g r u p o s ,
a u m e n t a m a s a s s i m e t r i a s d e i n f o r m a ç õ e s entre b a n c o s e t o m a d o r e s d e e m -
p r é s t i m o s . D e s s e m o d o , no limite, o ú n i c o critério d e s e l e ç ã o p a s s a a s e r o
r a c i o n a m e n t o p u r o d e crédito.
A relevância d a m o e d a para a atividade econômica, na abordagem d e Stiglitz,
e s t á n a relação entre m o e d a e crédito, p o r q u e "transação n ã o requer m o e d a , s ó
crédito", pelo m e n o s apriori (STIGLITZ, 1988a, p.307). O f o r n e c i m e n t o d e crédi-
to, por s u a v e z , d e p e n d e do conjunto d e i n f o r m a ç õ e s q u e o s b a n c o s têrn a c e r c a
d e s e u s clientes e pode ser facilmente destruído:
D e s s e m o d o , s o b r e a r e l a ç ã o i n f o r m a ç ã o - c r é d i t o , s e n t e n c i a Stiglitz
(1988a,p.312):
A esse respeito, afirma Stiglitz (1988a, p.310): "( .) com poucas exceções — a Grande
Depressão e os anos 80 —, poderíamos tratar a taxa de juros real como uma constante. E
constantes não fornecem a base de uma boa teoria das flutuações"
Stiglitz ( 1 9 8 8 a , p.314~315) t a m b é m m o s t r a , d e f o r m a sucinta, a s interações q u e
e x i s t e m e n t r e r a c i o n a m e n t o n o s m e r c a d o s d e a ç õ e s e d e crédito e s u a s c o n s e -
qüências:
" H á a l g u m a s i m p o r t a n t e s i n t e r a ç õ e s e n t r e r a c i o n a m e n t o d e crédito e
de ações. Primeiro, os mais sérios temores das firmas estão
associados à falência. Falência não é exatamente determinada por
fluxos de caixa. Firmas vão à falência quando falfiam e não p o d e m
encontrar emprestadores desejando emprestá-las. O temor de
r a c i o n a m e n t o d e crédito é u m a d a s r a z õ e s p a r a q u e f i r m a s a j a m d e
m o d o c o n s e r v a d o r hoje.
D e s t e i t e m , p o d e - s e concluir q u e , p a r a Stiglitz;
a) h á u m a ligação muito p r ó x i m a entre m o e d a e crédito e e n t r e e s t e e a
a t i v i d a d e e c o n ô m i c a , o q u e significa q u e a s r e l a ç õ e s f i n a n c e i r a s t ê m
u m p e s o p r e p o n d e r a n t e n a d e t e r m i n a ç ã o do i n v e s t i m e n t o ;
b) a a v e r s ã o a r i s c o s d o s b a n c o s l e v a a o u s o d e m e c a n i s m o s d e d e f e s a
tais c o m o r a c i o n a m e n t o d e c r é d i t o e c o l a t e r a i s . Por e s s a r a z ã o ,
s ã o a oferta d e crédito e a s c o n d i ç õ e s e m q u e s ã o c o n c e d i d o s ( p r a z o s
e colaterais) — e n ã o a s t a x a s d e j u r o s reais, c o n s i d e r a d a s relativa-
m e n t e c o n s t a n t e s a o longo d o ciclo e c o n ô m i c o — q u e t ê m i m p l i c a ç õ e s
diretas s o b r e o s níveis d e atividade e c o n ô m i c a , o u seja, o s i s t e m a b a n -
cário e o m e r c a d o d e crédito t a m b é m r e p r e s e n t a m m e c a n i s m o s d e
propagação dos choques econômicos; e
c) a r e l a ç ã o c r é d i t o - i n v e s t i m e n t o e s t á sujeita a p r o f u n d a s a l t e r a ç õ e s , à
m e d i d a q u e o capital i n f o r m a c i o n a l d a s e m p r e s a s e d o s b a n c o s s e j a
a f e t a d o n a o c o r r ê n c i a d e c h o q u e s e c o n ô m i c o s . Isto p o r q u e , q u a n d o
u m a e m p r e s a o u u m b a n c o vai à falência, u m a parte significativa d e s e u
capital i n f o r m a c i o n a l é destruída.
E s t a m o s a g o r a e m c o n d i ç õ e s d e discorrer s o b r e a s flutuações e c o n ô m i c a s
na a b o r d a g e m d e Stiglitz, visto q u e s e b a s e i a m n o s m i c r o f u n d a m e n t o s a p r e s e n -
t a d o s até a q u i .
' Ao ttatat das externalidades que as rupturas no sistema financeiro provocam sobre o
sistema econômico, Stiglitz (1993b, p.27) argumenta que, mesmo sendo o caso de uma
instituição financeira em particular, pode ter conseqüências macroeconômicas significati-
vas. Isto porque a falência de um banco tem implicações diretas e indiretas: diretamente, a
perda de grande parte do capital informacional da instituição, ativo este que não é facilmente
transferido para outros proprietários, pode interromper o fluxo de crédito para os clientes
daquele banco; indiretamente, isso tem efeitos indiretos sobre fornecedores e consumido-
res das firmas que têm que paralisar suas atividades por falta de crédito.
' Os pontos discutidos no restante do modelo heurístico estão desenvolvidos em Greenwald,
Stiglitz e Weiss (1988b e 1988c e 1993a) e Stiglitz (19883; 1992a)
' Há duas fontes básicas de choques no modelo de Greenwald, Stiglitz e Weiss de preços
(resultante de mudanças não antecipadas na curva de demanda) e o proveniente do aumen-
to da incerteza relativa aos níveis de preços futuros.
' Para Stiglitz, as conseqüências macroeconômicas decorrentes dos choques econômicos
devem-se à distribuição entre ativos e passivos das firmas e não à distribuição de riqueza
entre famílias (GREENWALD, STIGLITZ, WEISS, 1993b, p.107)
emprestadores e tomadores, levando, como conseqüência, à diminui-
ção na oferta d e fundos disponíveis para investimento; de outro, cho-
q u e s arrefecem o ímpeto das firmas e m arcar c o m maiores riscos, dimi-
nuindo a demanda por investimentos a qualquer taxa de juros
( G R E E N W A L D , S T I G L I T Z , W E I S S , 1988b, p.146-147).
V e j a m o s e s s e p r o c e s s o m a i s d e perto a n a l i s a n d o , inicialmente, c o m o a s
f i r m a s s e c o m p o r t a m n a o c o r r ê n c i a d e c h o q u e s c o m o o d o petróleo, p o r e x e m -
plo. D e p o i s , c o m o o s b a n c o s r e a g e m e, f i n a l m e n t e , c o m o s e c o m p o r t a m a
oferta e a d e m a n d a a g r e g a d a s .
U m c h o q u e e c o n ô m i c o , q u a l q u e r q u e s e j a s u a n a t u r e z a (real, m o n e t á r i o
o u e x p e c t a c i o n a l ) , p r o v o c a , c o m o j á foi m e n c i o n a d o , redistribuição d e r i q u e z a
e n t r e f i r m a s e e n t r e e s t a s e investidores o u e m p r e s t a d o r e s . N o c a s o d o c h o q u e
d o petróleo, foi s o b r e o s patrimônios líquidos d a s f i r m a s q u e u s a m e s s e i n s u m o
q u e recaiu o f a r d o d o distúrbio, o u seja, h o u v e u m a u m e n t o no c u s t o efetivo d e
produção, afetando, negativamente, a s m a r g e n s d e lucros d a s e m p r e s a s usuárias
d e petróleo.
Stiglitz e x p l i c a q u e , n a a u s ê n c i a d e m e r c a d o s f u t u r o s c o m p l e t o s , h á u m
h i a t o e n t r e a d e c i s ã o d e investir e a realização d o s f r u t o s d a q u e l e i n v e s t i m e n t o
q u e p r e c i s a s e r f i n a n c i a d o , s e j a c o m r e c u r s o s p r ó p r i o s , s e j a c o m capital d e
t e r c e i r o s . Isto p o r q u e n ã o h á c o m o a s s e g u r a r m e r c a d o (antecipar a receita d e
v e n d a ) p a r a u m produto e m fabricação. D e s s e m o d o , h á u m risco inerente a o
p r o c e s s o d e produção, d a d o q u e a s e m p r e s a s t ê m que pagar os fatores d e produ-
ç ã o a n t e s q u e o s p r o d u t o s p r o d u z i d o s por a q u e l e s f a t o r e s s e j a m v e n d i d o s .
No q u e t a n g e a o s g r a n d e s projetos d e capital fixo, q u a n d o financiados c o m
r e c u r s o s e x t e r n o s , " ( . . . ) o s c o m p r o m i s s o s d e p a g a m e n t o (e o s t e r m o s d e p a g a -
m e n t o ) p o d e m ser d e t e r m i n a d o s m u i t o s a n o s antes d o p r o d u t o s e r v e n d i d o "
{ibidem). D e s s e m o d o , q u a i s q u e r a l t e r a ç õ e s não a n t e c i p a d a s n a l u c r a t i v i d a d e
das firmas q u e impliquem redução dos seus fluxos d e caixa, neste interregno,
p r e c i s a m s e r a b s o r v i d a s pelo e s t o q u e d e r i q u e z a d a s f i r m a s , s o b p e n a d e irem
à f a l ê n c i a c a s o isso n ã o s e j a p o s s í v e l . A s s i m , d i f e r e n t e m e n t e d o q u e s u s t e n t a
Crotty (1996), como sendo o caso dos novos-keynesianos em geral, as deci-
s õ e s d e i n v e s t i m e n t o , e m Stiglitz, n ã o p o d e m s e r r e v e r t i d a s a u m c u s t o
n e g l i g e n c i á v e l , c o m o s u p õ e a hipótese d a existência d e m e r c a d o s s e c u n d á r i o s
p a r a d a r l i q u i d e z ' ' a b e n s d e capital fixo.
b) o s b a n c o s t a m b é m p o d e m a u m e n t a r a s e x i g ê n c i a s d e colaterais p a r a
o s q u e o b t ê m f u n d o s , c o m o t a m b é m exigir u m e n c u r t a m e n t o n a m a t u -
r i d a d e d o s e m p r é s t i m o s e/ou diminuir a q u a n t i d a d e e m p r e s t a d a ; e
c) finalmente, o s b a n c o s p o d e m m u d a r as c o m p o s i ç õ e s d e s e u s portfolios,
a u m e n t a n d o a p a r t i c i p a ç ã o d e ativos, c o m o títulos p ú b l i c o s e m s u a s
carteiras, e m detrimento d e crédito ( G R E E N W A L D , S T I G L I T Z , W E I S S ,
1988b, p.147-150).
D e s s e m o d o , e m f u n ç ã o d o s riscos d e inadimplência, a s r e a ç õ e s d o s b a n -
c o s à s m u d a n ç a s e m s u a s p e r c e p ç õ e s d e riscos e p a t r i m ô n i o s líquidos refletir-
- s e - ã o , d i r e t a m e n t e , n a oferta d e f u n d o s (crédito) p a r a a s e m p r e s a s .
F i n a l m e n t e , Stiglitz ( 1 9 9 2 a , p.293-294) a p r e s e n t a q u a t r o r a z õ e s p a r a a
d e t e r i o r a ç ã o d a s o p o r t u n i d a d e s d e e m p r é s t i m o s dos b a n c o s e m u m a r e c e s s ã o :
"a) a u m e n t a a p r o b a b i l i d a d e d e f a l ê n c i a p a r a c a d a c a n d i d a t o a
e m p r é s t i m o s (o efeito 'direto' risco c r e s c e n t e ) ;
"b) d i m i n u i o n ú m e r o d e clientes r e g u l a r e s d o b a n c o s o b r e o s q u a i s
e s t á i n f o r m a d o (o efeito d i m i n u i ç ã o d a s i n f o r m a ç õ e s ) ;
N o s p r o c e s s o s descritos acima, n a e v e n t u a l i d a d e d e c h o q u e s e c o n ô m i c o s
negativos, as variações nas percepções d e riscos e patrimônios líquidos d e
e m p r e s a s e b a n c o s p r o p a g a m o s efeitos r e c e s s i v o s s o b r e a e c o n o m i a , d a d a a
a v e r s ã o a r i s c o s d e s s a s instituições, o u seja, o s ajustes realizados n a c u r v a d e
o f e r t a , e m nível d a f i r m a , s ã o t r a n s m i t i d o s p a r a o u t r a s f i r m a s , a u m e n t a n d o o s
r i s c o s d e p r o d u ç ã o e d i m i n u i n d o o ímpeto e a c a p a c i d a d e d a s firmas d e a r c a r e m
c o m a q u e l e s r i s c o s . Stiglitz ( 1 9 9 2 a , p . 2 8 7 - grifo n o s s o ) s u s t e n t a q u e h á
interdependência entre oferta e demanda:
' A crítica de Crotty (1996) de que os modelos novos-keynesianos são de equilíbrio parcial e
estruturalmente desprovidos de spillovers, não podendo, assim, analisar as transmissões
dos choques de demanda agregada para o investimento, via mercados financeiros, não
parece válida para o ramo novo-keynesiano liderado por Stiglitz.
' stiglitz reconhece que sua abordagem teórica tem lacunas, como o fato de que "(...) a teoria
desenvolvida até agora não fornece um ciclo econômico completamente endógeno. Só
explica como a economia responde a certos choques. [Entretanto] mantém-se a controvér-
sia: se uma teoria do ciclo econômico completamente endógeno é requerida, ou se devería-
mos estar satisfeitos com uma teoria que transforma certos tipos de choques em distúrbios,
em que a economia persiste abaixo do 'pleno emprego' por um número de períodos. Não
temos uma posição sobre (...) [esta] questão aqui" (GREENWALD, STIGLITZ, WEISS, 1987,
p ; nota 10).
- n ã o há c o n v e r g ê n c i a inexorável a u m e s t a d o ó t i m o n o longo p r a z o —
inclusive a a u s ê n c i a d e d e s e m p r e g o involuntário — , p a r t i c u l a r m e n t e s e
a s e s p e r a n ç a s q u a n t o a isso s e d e p o s i t a r e m e m p r e ç o s n o m i n a i s (salá-
rios, inclusive) flexíveis; e
^° o uso do modelo Arrow-Debreu como referência de argumentação por Stiglitz cria outro
paralelo com Keynes, no campo da "persuasão". Reconhece-se hoje que Keynes buscou
formatar seu argumento de modo a afastar-se o mínimo possível da ortodoxia marshalliana-
-pigouviana de então, com o objetivo de realçar e fortalecer suas idéias principais. Parte do
esforço de alguns pós-keyneslanos se constituiu em depurar Keynes dessa sua proximidade.
G r e e n w a l d , Stiglitz e W e i s s (1987, p.121) identificam quatro q u e s t õ e s c o m o
cruciais para a explicação do desemprego e das flutuações econômicas:
"(...) u m a t e o r i a g e r a l d e v e explicar a p e r s i s t ê n c i a d o d e s e m p r e g o ;
u m a teoria geral deve explicar as flutuações no desemprego; p o u p a n ç a
e investimento d e v e m ser c u i d a d o s a m e n t e distinguidos; [e] distúrbios
n a d e m a n d a , n ã o n a oferta, estão n a b a s e d o c o m p o r t a m e n t o cíclico
dos agregados macroeconômicos".
"(...) e v o c a m u d a n ç a s n a d e m a n d a por i n v e s t i m e n t o ; p o r é m p r e c i s a
t a m b é m explicar p o r q u e o s p r e ç o s e, e m particular, a s t a x a s d e j u r o s
f a l h a m e m m u d a r o b a s t a n t e para c o m p e n s á - l o s . E m A T e o r i a G e r a i ,
[ K e y n e s ] a r g u m e n t o u q u e a t a x a d e j u r o s n o m i n a l cairia p o u c o s e a
d e m a n d a por m o e d a fosse altamente elástica à t a x a d e juros. U m a
dificuldade aqui é s e é a t a x a d e juros real, não a n o m i n a l , q u e d e v e r i a
importar para o investimento (...) D e fato, o colapso d o s a n o s d a d é c a d a
d e t r i n t a m o s t r o u q u e d a n o s p r e ç o s , e a t a x a d e j u r o s real s u b i u u m
tanto. D e v e haver, t a m b é m , dúvidas (levantadas pelo próprio K e y n e s ,
a i n d a q u e c o m maior ê n f a s e no Treatise on Money d o q u e n a General
Theory) sobre quanto investimento extra u m a dada queda nas taxas
d e j u r o s p o d e r i a a s s e g u r a r (e q u a n d o ) " .
A e x p l i c a ç ã o alternativa d e Stiglitz é a d e q u e r a c i o n a m e n t o s n o s m e r c a -
d o s d e capitais, e m f u n ç ã o d e assimetrias d e informações irredutíveis, q u e i n d u -
z e m a u m t i p o d e c o m p o r t a m e n t o d e a v e r s ã o a riscos d e f a l ê n c i a por p a r t e d e
f i r m a s e b a n c o s , e x e r c e m u m a influência d e c i s i v a s o b r e a d e t e r m i n a ç ã o n o s
níveis de investimento, de p r o d u ç ã o e de e m p r e g o , ou seja, s ã o os
microfundamentos que explicam a propagação das flutuações econômicas, a
partir d e u m c h o q u e e c o n ô m i c o ( d e n a t u r e z a real, m o n e t á r i a o u e x p e c t a c i o n a l ) .
Quanto à distinção feita por Keynes entre poupança e investimento, expressa-
ria t a m b é m , na opinião de Greenwaid, Stiglitz e W e i s s (1987, p.122), a distinção
"(...) entre fundos dentro d a firma e fundos à disposição das famílias". A f i r m a m que
K e y n e s faz referência ao amplo significado econômico d o racionamento d e crédito
(que c h a m o u d e Fringe of Unsatisfied Borrowers no seu Treatise on Money^'), e m -
bora este insight t e n h a praticamente sido eclipsado e m A Teoria Geral. Afirmam
que s e pode racionalizar a influência que a renda exerce sobre os gastos d e consu-
m o n a teoria d e Keynes d e dois modos: "(...) a renda corrente pode ser t o m a d a
c o m o u m a b o a previsão d e (não observadas) rendas futuras, o u t a m b é m imperfei-
ç õ e s no m e r c a d o d e capitais p o d e m ser acrescentadas para explicá-las".
Por fim, a s flutuações econômicas teriam sido explicadas por Keynes através
d e v a r i a ç õ e s n a d e m a n d a , pois m u d a n ç a s t e c n o l ó g i c a s e n a oferta n ã o poderi-
a m explicar a G r a n d e D e p r e s s ã o . G r e e n w a i d , Stiglitz e W e i s s , por o u t r o lado,
c h a m a m a t e n ç ã o p a r a o fato d e que K e y n e s , devido à influência d o p e n s a m e n t o
marshalliano, analisava distúrbios na d e m a n d a e oferta separadamente. O u seja,
"a c o n f i a n ç a d e K e y n e s no p a r a d i g m a d e d e m a n d a / o f e r t a d e M a r s h a l l c o l o c o u
p r o b l e m a s q u e ele e s e u s s e g u i d o r e s n u n c a r e s o l v e r a m s a t i s f a t o r i a m e n t e (...)"
{ibidem). S u s t e n t a m , a l t e r n a t i v a m e n t e , q u e n ã o há u m a c l a r a d i s t i n ç ã o entre
oferta e d e m a n d a , m a s , s i m , i n t e r d e p e n d ê n c i a .
P a r a o s a u t o r e s , o u s o por K e y n e s d e i n s t r u m e n t a i s n e o c l á s s i c o s e
m a r s h a l l i a n o s c o m p r o m e t e u , e m parte, s u a teoria, "particularmente e m s e u tra-
t a m e n t o d a f i r m a e d o p a p e l d a m o e d a , e, s u b j a c e n t e a e s t e s , s u a s a n á l i s e s
d o s m e r c a d o s d e c a p i t a i s " ( G R E E N W A L D , S T I G L I T Z , W E I S S , 1 9 9 3 a , p.128).
Ver, t a m b é m , Stiglitz ( 1 9 9 2 a ; 1988a), d e n t r e outros.
Keynes no Treatise on Money (1971, p 326-327) afirma que "(...) o relaxamento ou contra-
ção de crédito pelo sistema bancário não opera, contudo, simplesmente através da taxa
cobrada a tomadores de empréstimos; também funciona através de uma mudança na abun-
dância de crédito. Se a oferta de crédito fosse distribuída em um mercado competitivo
absolutamente livre, estas duas condições — quantidade e preço — seriam univocamente
correlacionadas uma com a outra e não necessitaríamos considerá-las separadamente.
Mas na prática fiá contingências a serem consideradas em que as condições de um livre
mercado competitivo para empréstimos bancários são imperfeitamente realizadas (...) Há
(...) na Grã-Bretanha um sistema habitual de racionamento na atitude dos bancos em relação
a tomadores de empréstimos — a quantidade emprestada a qualquer indivíduo sendo gover-
nada não só por segurança [colaterais] e a taxa de juros oferecida, mas também por
referência aos piopósitos do tomador de emp(éstimos e sua reputação com o banco como
um valoroso ou influente cliente. Assim, há normalmente uma margem de tomadores de
empréstimos insatisfeitos que não são considerados como dispondo da prioridade first
claim] nos favores dos bancos, mas para quem o banco facilmente emprestaria se estives-
se ele próprio em condições de emprestar mais".
Stiglitz ( 1 9 9 2 a , p.299) a p o n t a tambénn q u e K e y n e s , a o a g r e g a r títulos d e
l o n g o p r a z o e a ç õ e s , e s t a v a a g r e g a n d o d o i s ativos, q u e , d o p o n t o d e v i s t a d o
investidor, s ã o substitutos a l t a m e n t e imperfeitos, d a d o q u e p o s s u e m p r o p r i e d a -
d e s d e r i s c o s d i f e r e n t e s . O u s e j a , n a s r e c e s s õ e s , o s títulos a u m e n t a m s e u
valor, e as ações c a e m . Além do mais — conforme vimos anteriormente — , do
p o n t o d e v i s t a d a f i r m a , h á significativas d i f e r e n ç a s , e m t e r m o s d e c o m p r o m e t i -
m e n t o d o s f l u x o s d e r e c e i t a s futuras — e n t r e l e v a n t a r r e c u r s o s n o m e r c a d o d e
a ç õ e s e n o m e r c a d o m o n e t á r i o (seja a t r a v é s d e títulos, s e j a d e e m p r é s t i m o s ) .
D e s s e m o d o , K e y n e s t e r i a negligenciado a distinção e n t r e a s f o n t e s d e finance,
ou seja, entre obrigações e ações.
O u t r a "fragilidade" d e A T e o r i a G e r a l d e K e y n e s , s e g u n d o Stiglitz, é a d e
q u e ( d a d a s a s e x p e c t a t i v a s ) o principal d e t e r m i n a n t e d o nível d e i n v e s t i m e n t o
s e r i a a t a x a d e j u r o s . O c o r r e q u e , "(...) c o m p o u c a s e x c e ç õ e s — a G r a n d e
D e p r e s s ã o e o s a n o s 8 0 — , p o d e r í a m o s tratar a t a x a d e j u r o s real c o m o u m a
c o n s t a n t e . E c o n s t a n t e s n ã o f o r n e c e m a b a s e d e u m a b o a teoria d a s f l u t u a ç õ e s "
( S T I G L I T Z , 1 9 8 8 a , p.310). A d e m a i s , a t e o r i a d o i n v e s t i m e n t o d e K e y n e s — n a
q u a l a s f i r m a s i n v e s t e m até o p o n t o e m q u e o r e t o r n o m a r g i n a l e s p e r a d o s e
i g u a l a à t a x a d e j u r o s — p a r e c e ter i g n o r a d o o s r i s c o s e a s " i m p e r f e i ç õ e s " n o
m e r c a d o d e crédito. A s s i m , n ã o evidencia"(...) p o r q u e risco n ã o p o d e ser evita-
d o , e p o r q u e racionamento d e crédito pode prevalecer" (STIGLITZ, 1992a, p. 199).
R a c i o n a m e n t o s n o s m e r c a d o s d e a ç õ e s e d e c r é d i t o , c o n f o r m e Stiglitz, expli-
c a m t a m b é m p o r q u e e s t o q u e s s e r v e m p a r a e x a c e r b a r — e m lugar d e a m o r t e -
cer, c o m o n a t e o r i a k e y n e s i a n a - n e o c l á s s i c a — a s f l u t u a ç õ e s e c o n ô m i c a s .
A i n d a s e g u n d o Stiglitz, o t e r c e i r o " e q u í v o c o " d e K e y n e s , d e c o r r e n t e d o s
d o i s a n t e r i o r e s , foi f o c a l i z a r n a t a x a d e j u r o s o m e c a n i s m o a t r a v é s d o q u a l a
política m o n e t á r i a a f e t a a e c o n o m i a . Isto p o r q u e a ê n f a s e d e K e y n e s estaria n a
p r e f e r ê n c i a p e l a liquidez ( d e m a n d a por m o e d a ) e n ã o s o b r e o crédito (oferta d e
f u n d o s d i s p o n í v e i s p a r a o investimento). P a r a Stiglitz (ibidem), a ênfase no cré-
dito justifica-se porque,"(...) e m r e c e s s õ e s a g u d a s , é a f a l t a d e í m p e t o (e i n c a p a -
cidade) d o s b a n c o s p a r a fazer e m p r é s t i m o s q u e c o m p r o m e t e o s efeitos d a políti-
c a m o n e t á r i a , e não a e l e v a d a elasticidade d a d e m a n d a d e m o e d a d a s famílias".
A l é m d o m a i s , Stiglitz identifica p r o b l e m a s n a f o r m a c o m o a s a u t o r i d a d e s
m o n e t á r i a s a f e t a m o nível d e a t i v i d a d e e c o n ô m i c a n a a n á l i s e d e K e y n e s , q u a l
seja, s e o g o v e r n o altera a oferta d e m o e d a — d a d a a f u n ç ã o d e m a n d a dos indiví-
d u o s por m o e d a (uma f u n ç ã o p r e s u m i v e l m e n t e d a r e n d a e d a t a x a d e juros) — , a
t a x a d e j u r o s m u d a e, por e s s a razão, m u d a t a m b é m o investimento. P r i m e i r o ,
problema é q u e há substitutos próximos — quase-moedas, ao menos para
t r a n s a ç ã o — , o q u e , e m parte, c o m p r o m e t e a c a p a c i d a d e d o g o v e r n o para afetar
a e c o n o m i a a t r a v é s d a oferta d e m o e d a (ou seja, h á u m certo c o m p o n e n t e
e n d ó g e n o n a oferta d e m o e d a ) . S e g u n d o , e m m u i t a s t r a n s a ç õ e s , a m o e d a n ã o
é r e q u e r i d a , m a s s ó o c r é d i t o . T e r c e i r o , a relação entre t r a n s a ç õ e s e r e n d a é
t ê n u e , o u seja,
"(...) m u i t a s t r a n s a ç õ e s , t a l v e z n a m a i o r i a d o s c a s o s , s ã o t r o c a s d e
ativos, e o s t i p o s d e m u d a n ç a s e c o n ô m i c a s a s s o c i a d a s a o s c i c l o s
e c o n ô m i c o s s ã o f r e q ü e n t e m e n t e a c o m p a n h a d o s por m u d a n ç a s n a
riqueza, e daí n a distribuição d e ativos (...) [Deste m o d o , se] a d e m a n d a
por m o e d a é b a s e a d a e m ativos, o q u e é relevante, e v i d e n t e m e n t e ,
não é a renda, m a s a riqueza" ( G R E E N W A L D , STIGLITZ, W E I S S ,
1987, p. 129-130).
Esses pontos, con-i exceção da imperfeita substitutibilidade entre crédito e ações, consti-
tuíram exatamente parte do objeto da extensão do paradigma keynesiano formulada por
Minsky (1975; 1982; 1986; 1991).
Stiglitz afirma que, não obstante "(...) alguns novos-keynesianos reivindicaram que a insis-
tência em microfundamentos é o que os distingue de Keynes e outros velhos Keynesianos
(...) [e o fato de que] muitas das análises macroeconômicas na tradição Keynesiana dos
anos 1950 e 1960 teriam se afastado de sólida base em microfundamentos, o próprio
Keynes claramente baseou cada uma de suas relações macroeconômicas a partir de aná-
lises microeconômicas. De fato, argüitíamos que Keynes fez o melhor que pôde com os
microfundamentos que estavam disponíveis no momento. Macroeconomistas dos anos 1950
ei 960 depararam-se com um dilema: a microeconomia que estava em moda naquele tempo —
supondo informação perfeita, mercados completos, e assim por diante — era obviamente
Inconsistente com o espírito do modelo keynesiano, Fazia sentido para eles [deste modo]
ignorar aquele tipo de microeconomia" (GREENWALD, STIGLITZ, WEISS, 1993a, p.25; nota 3).
S o b r e o d e b a t e q u a n t o à viabilidade e à p r o f i c u i d a d e d e i n t e g r a ç ã o n o s
rumos aludidos por Fazzari e Variato, t e n d e m o s a concordar c o m Crotty, Dimsky,
Poilin e c o m o s d e m a i s c é t i c o s q u a n t o a s u a s d i f i c u l d a d e s e m nível analítico,
d a d a a d i v e r g ê n c i a entre o s atuais p r o g r a m a s d e p e s q u i s a envolvidos. Por outro
l a d o , c o n f o r m e b u s c a m o s ilustrar n o p r e s e n t e t r a b a l h o , h á u m a c o m p l e -
m e n t a r i d a d e no sentido d e q u e , no caso d e Stiglitz, se trata d e e x t e n s ã o t a m b é m
d a v i s ã o d e K e y n e s , por o u t r o s c a m i n h o s analíticos a p a r e n t e m e n t e m e n o s
p r ó x i m o s a o s originais.
A d i v e r s i d a d e d e p a r a d i g m a s , n o c a s o , a u m e n t a a p r o b a b i l i d a d e d e ocor-
rência d e p r o g r e s s o científico. D e u m lado, h á a a p o s t a d e q u e — e m d e c o r r ê n -
cia de potencial inexplorado e/ou de intrínseca l o n g e v i d a d e — o modelo heurístico
original d e K e y n e s a i n d a p o d e ser l o n g a m e n t e e s t e n d i d o e m d i r e ç ã o a o s é c u l o
X X I ( D A V I D S O N , 1994). De outro, retém-se, particularmente, a visão d e K e y n e s ,
com a busca de novos métodos considerados necessários para novos proble-
mas. Q u e digam, então, "somos todos keynesianos!"
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Abstract
This paper approaches the controversy — among Post Keynesian
authors — of whether Joseph Stiglltz's work may be classified as a true
Keynesian one. The paper concludes that, notwithstanding deep
differences that can betraced in Keynes's and Stiglitz's heuristical models,
both authors share dose "Vislons" regarding the basic operating features
of market economies. Stiglitz is formally "non-Keynesian", but "Keynesian"
In the essence of his arguments.