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Puxar os fios. Ligar os pontos. Desatar os nós. Montar uma trama: com palavras, idéias,
histórias, imagens, pensamentos. Tecer um texto. Um movimento que resgata a origem etimológica
da palavra “texto”1 - que deriva do verbo tecer2. A experiência de produção do presente texto, em
especial, é, em si mesma, um desafio de tessitura da escrita: unir fios de diferentes origens para
tecer uma única trama. Foi assim que um grupo formado por nove pessoas - com suas experiências,
interesses, histórias e matizes – começou a se organizar em torno de dois temas: a narrativa e seu
potencial para a produção de conhecimento no cotidiano escolar.
Começamos observando os nossos pontos em comum: somos professores e
pesquisadores. Ainda assim, como nossos interesses de pesquisa são diferentes, tentamos encontrar
os pontos em comum para a produção do texto, isto é, encontrar o fio da meada. As primeiras
questões levantadas foram as seguintes:
1
TEXTO Etimologia lat. téxtus,us 'narrativa, exposição', do v.lat. téxo,is,xùi,xtum,ère 'tecer, fazer tecido, entrançar,
entrelaçar; construir sobrepondo ou entrelaçando', tb. aplicado às coisas do espírito, 'compor ou organizar o pensamento
em obra escrita ou declamada'; ver text-
2
TECER Etimologia lat. texo,is,ui,tum,ère 'tecer, fazer tecido, entrançar, entrelaçar, construir sobrepondo ou
entrelaçando'; ver text-; f.hist. sXIII teçudo, sXIV tecer, sXIV teçer, sXIV teixer, sXIV texer
Fizemos menção a várias leituras Clarisse Lispector, Foucault, Benjamin (mônadas)
entre outras, foi sugerida uma leitura da Glace Perlim sobre surdos e repensarmos a nossa pergunta,
por que precisamos ouvir o outro, para perceber o outro, sentir o outro...
Foi um ganho as meninas entrarem no nosso grupo porque estamos ampliando nosso
campo de visão no sentido de perceber o mundo do outro e o nosso mundo, das transformações que
podem ocorrer quando "ouvimos" o outro.
I Narrativa:
Através dos encontros no grupo, das leituras de narrativas e das nossas produções,
experimentamos a produção de escritas narrativas. Ainda assim, não temos segurança e convicção
de que haja um conceito formal que delimite o que é narrativa. Não sei se conseguiremos colocar,
mas adensar o que já foi dito por outros, pensado por outros e ressignificado por nós.
Gostaríamos de pensar a narrativa como uma possibilidade de “capturar” movimentos,
encontros, saberes, relações, acontecimentos, experiências tecidas no cotidiano da escola. e como
uma possibilidade de esvaziamentopreenchimentoesvaziamento do currículo.
Assim, para mim até então, a narrativa é a produção oral, escrita ou mesmo imagética que
tem por objetivo inicial contar algo a alguém. Pressupõe, então, a dialética inerente ao discurso: há
quem fala e quem ouve. Há também uma história a ser contada.
A narrativa da qual estamos falando vai além de um mero recurso discursivo. Estamos
falando da produção de um texto como um artefato, algo trabalhado com olhos, mãos, alma. Como
Benjamin diz, em o narrador: uma relação entre o narrador e sua matéria-prima, a vida humana,
transformando em um produto sólido, útil e único. Cito Benjamin (1994):
A idéia de artefato pode ser útil para relacionar as diversas imagens que pensamos, tais
como:
Tecido - trama produzida a partir de fios. Objeto que será usado por
outros.
Tijolo – feito para ser parte de algo maior, só tem função no conjunto
ainda que seja definido por sua unidade.
Procurei o que o próprio professor Guilherme já pensou e disse sobre a narrativa. O que
eu encontrei foi o seguinte:
O professor e sua busca por se expressar através de narrativas nas palavras do professor
Guilherme:
-traz o coletivo
“O quanto dessas linhas minhas são fiadas no encontro com outros fios que passam a
compor e a fazer parte dos meus? O quanto que a linha do outro traz consigo partes,
pedaços, fios de tantos outros? O quanto na roca da vida vamos compondo nossos fios
através dos encontros que permitem a mistura e o embaralhamento das meadas?” (Luisa)
“As múltiplas vozes que formaram esse coro da vida, às vezes desafinado, às
vezes sem baixo, às vezes forte, às vezes harmonioso, às vezes silêncioso. Os
ecos dentro de mim mostraram que o outro ou os outros estão aqui dentro.” (Bete)
-narrar-se é constituir-se
“O que tudo isso possibilita que nós sejamos e o que damos conta de ser/de se tornar nas
tramas em que estamos envolvidos?” (Luisa)
“As múltiplas batidas de corações que estão em mim, sons que se misturam
nessa música louca, nessa professora que pesquisa, ou nessa pesquisa que faz a
professora.” (Bete)
-produz conhecimento que nos faz “deslocar”, ver com outros olhos, refazer
o pensamento, sentir de outro modo, refletir a partir do outro,
“O exercício maior de ser professor é ouvir a palavra do outro ou dos muitos outros,
palavras que se misturam, e, já não sou mais eu, somos nós, as inúmeras pessoas que
compõe o cotidiano escolar.”(Bete)
“Começo pensando nas palavras, palavras de mudam de lugar, palavras que giram palavras
que paralisam palavras que gritam palavras que sussurram palavras que sopram vida.
Quanto ouço a palavra do outro, me refaço, me desfaço.” (Bete)
“Queremos ouvir, pois queremos transformar. Além de nos fazer refletir, nos faz
modificar e buscar o melhor para os envolvidos nesse cotidiano escolar.” (Deise)
Com a Bete: