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B R ASÍL I A
1982
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
B R ASÍL I A
1982
Palavras do Ministro
Xavier de Albuquerque, Presidente
o dia 15 do corrente mês de outubro marcou a passagem do centenário
de nascimento do saudoso Ministro José de Castro Nunes.
Na forma do seu estilo e nos termos regimentais, o Supremo Tribunal
Federal comemora a efeméride na primeira parte desta sessão, prestando a
devida homenagem ao seu ínclito juiz.
Para falar em nome da Corte, convidei o eminente Ministro Decio Mi
randa, a quem concedo a palavra.
Discurso do Senhor Ministro
Decio Miranda
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Juiz Federal e depois Juiz dos Feitos da Fazenda, entre 193 1 e 193 8,
buscou-o nesse último cargo o decreto presidencial que o fez Ministro do
Tribunal de Contas da União, cargo que exerceu com a altitude, o brilho, e
a segurança costumeiros, até 1940.
Aí o encontrou o Decreto de 10 de dezembro de 1940, do Presidente
Getulio Vargas, que o nomeava Ministro do Supremo Tribunal Federal, na
vaga do grande magistrado Ministro Carvalho Mourão.
Já nos idos de 1920, teve início sua vasta produção na literatura jurídi
ca, principalmente no campo do Direito Constitucional.
Antes da publicação de sua célebre « A Jornada Revisionista», escrita
em setembro e outubro de 1922 na versão original, já Castro Nunes discuti
ra os mais variados temas de Direito Constitucional em trabalhos esparsos:
«Do Estado Federado e sua Organização Municipal» ( 1920); « As Constitui
ções Estaduais do Brasil» ( 1922); sobre a « Unidade do Processo», um dos
temas de sua predileção; « Aspectos do Federalismo Contemporâneo», «Pa
tente de Invenção», « Os projetos não sancionados e o art. 40 da Constitui
ção»; « A proibição de entrada de negros no Brasil»; .«Da Conceituação
Jurídica da Lei Orgânica do Distrito Federal»; « O poder de polícia e a loca
lização das indústrias»; «Dos bens públicos de uso comum e da proteção
possessória» .
Todavia, foi « A Jornada Revisionista», entre todos os trabalhos até
então publicados, o ponto mais alto da consagração de Castro Nunes, nessa
fase. Valeu-lhe o prêmio de medalha de ouro do Instituto dos Advogados.
Obra dos quarenta anos de idade, nela sedimentaram-se em plano lógi
co e coerente, e cristalizaram-se em concisão e brilho, as idéias que o autor
vinha cultivando sobre a organização constitucional brasileira.
Na versão original, submetida ao Instituto dos Advogados Brasileiros
em concorrência ao prêmio «Carlos de Carvalho», a Constituição de 1 89 1,
obra sábia e vigorosa que então já experimentara trinta e um anos de emba
tes da vida republicana, submete-se ao contraste mais sistemático que até
então se lhe opusera.
Bem o revela o parecer com que a comissão julgadora do Instituto pro
pôs o primeiro prêmio para o trabalho de «Gamaliel», pseudônimo com
que o apresentara, para guarda do sigilo, o concorrente José de Castro Nu
nes.
Signi ficativa, da importância do prêmio, a composição da Comissão
Julgadora: Ministro Viveiros de Castro, presidente, e membros os Senhores
Desembargadores Caetano Pinto de Miranda Montenegro, Presidente da
Corte de Apelação; doutores Homero Baptista e Eugenio Valladão Catta
Preta, representantes da Faculdade de Direito da Universidade do Rio de
Janeiro, este último relator geral da Comissão; doutores Milciades Mario de
Sá Freire, Carvalho Mourão, Rodrigo Octavio, Esmeraldino Bandeira, Ze
ferino de Faria e Edmundo de Miranda Jordão.
Vê-se, do longo e minucioso relatório da Comissão, que Castro Nunes
abordou todas as ingentes questões que a prática republicana suscitara.
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E acrescenta:
«A revisão constitucional terá de traduzir necessariamente
certa convergência de vistas entre a União e os Estados, uma
«colaboração mais viva», na frase do Presidente Epitácio Pes
soa, certa coordenação de movimentos a bem da eficiência admi
nistrativa da União e da unidade econômica do país, sem que pa
ra isso se faça sujeitar os Estados à tutela federal, como in
divíduos que, tendo usado mal da liberdade, devam expiar as
suas culpas com sentinela à vista.» (Páginas 32-3).
Extenso é o elenco de matérias que, no programa revisionista de Castro
Nunes, são consideradas suscetiveis de reforma, entre elas a partilha tribu
tária entre a União e os Estados.
Uma curiosa interpretação constitucional favorecia as chamadas barrei
ras interestaduais. Porque a Constituição declarava «da competência exclu
siva dos Estados decretar impostos sobre a exportação de mercadorias de
sua própria produção», e porque, em se tratando de importação, à União
só coubesse o tributo sobre a mercadoria «de procedência estrangeira»,
passou-se a admitir poderem os Estados tributar a entrada de mercadorias
nacionais em seu território.
Castro Nunes, que, por sua vez, lhe oferece «A Jornada Revisionista»,
comunga do mesmo fervor.
«Senhor Presidente,
Senhores Ministros,
Quando da sessão comemorativa do centenano de nascimento do sau
doso Ministro Goulart de Oliveira, realizada em 8 de setembro do corrente
ano - a primeira, no gênero, de que participamos como Procurador-Geral
da República -, tivemos a oportunidade de afirmar que nos associávamos
àquela homenagem não apenas por considerá-la devida à memória do ilus
tre Juiz, mas também como preito de reconhecimento a esta Corte Excelsa e
aos Ministros que a integram, pelos relevantes serviços prestados à causa do
Direito, da Justiça e da preservação das liberdades públicas, que o Supremo
Tribunal Federal tem sabido resguardar e defender, a despeito de todas as
crises, dificuldades e, não raro, incompreensões.
Na sessão de hoje, em que a Corte rtverencia a memória do igualmente
saudoso Ministro CASTRO NUNES, pelo transcurso do primeiro centenário
de seu nascimento, ocorrido em 15 de outubro próximo passado, mais uma
vez o Ministério Público Federal vem externar a sua justificada adesão à
mais que merecida homenagem.
Jurista emérito, dos mais ilustres que o País ostenta em sua galeria de
publicistas notáveis, o saudoso Ministro CASTRO NUNES dedicou quase uma
década de sua fecunda existência aos trabalhos da Corte, em que ingressou
em 1940, dela se afastando em 1949.
«Senhor Presidente
Egrégio Tribunal
Senhor Procurador-Geral da República
Colegas advogados
Senhoras e Senhores,
Incumbiu-me o ilustrado Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil
de associar-me, em nome da instituição, à homenagem que a Alta Corte
presta hoje, data de seu centenário, à memória de Castro Nunes, um dos
seus juízes mais justamente renomados.
Cumpro, neste momento, a missão, sumamente honrosa.
Lamento, porém, ter de fazê-lo, sem poder contribuir, nesta solenida
de, com nada mais que o testemunho desalentado de uma frustração.
que deu testemunho a sua passagem pelo Tribunal impõem que, antes se
confesse o desalento do fracasso da reflexão projetada, do que se aventure
à formulação de conclusões superficiais.
Se renuncio, assim, 'nesta oportunidade, a qualquer ensaio de com
preensão mais detida de seu pensamento, não devo calar, entretanto, uma
circunstância de fato, documentada nos anais da jurisprudência desta Casa.
O homem se filiou explicitamente à doutrina autoritarista do Estado Novo.
Mas, o juiz, este não se dobrou às arbitrariedades da Ditadura. São nume
rosas as provas da afirmação. Relembro ao acaso os seus votos, o primeiro,
de 194 1, sobre a subsistência, malgrado o silêncio da Carta de 37, das ga
rantias do direito adquirido e da coisa julgada (Soluções de Direito Aplica
do, p. 327 e 65); ou aquele, ainda em princípio de 1945, onde defendeu o
necessário conhecimento do pedido de habeas-corpus, ainda que na vigência
do Estado de guerra (ob. cit., p. 4 89).
Somada à sua enorme qualificação intelectual - que votou cada uma
de suas obras ao destino de converter-se em marco definitivo na construção
do instituto jurídico versado - essa tranqüila independência do juiz - que,
conforme às melhores tradições desta Casa Augusta, jamais converteu em
submissão ao poder da ditadura a sua proclamada filiação filosófica, à épo
ca, ao autoritarismo que a informava -, explica por si só que a Ordem dos
Advogados - será embora com a pobreza envergonhada das palavras deste
seu intérprete - venha trazer a sua solidariedade real à homenagem desta
comemoração. »
Palavras do Ministro Xavier de Albuquerque,
Presidente, encerrando a sessão
As palavras dos nobres oradores desta tarde documentarão, nos Anais
da Corte, a celebração, que se acaba de fazer, da passagem do centenário
de nascimento do saudoso Ministro José de Castro Nunes.
Dou por encerrado este ato comemorativo.