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H2 Especial

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SEGUNDA-FEIRA, 9 DE AGOSTO DE 2010 O ESTADO DE S. PAULO

O EMERGENTE
PEDE PASSAGEM
Como pode o Brasil, num sistema internacional em transição, aumentar sua influência?

Gabriel Manzano mo, em 1991, o mundo bipolar foi trocado ções mil para discutir sistema financeiro, 22% para 45% o volume de matérias-primas
pelo domínio americano, unipolar. Bem de- segurança nuclear, mudanças climáticas, nas nossas exportações.
rata-sede uma felizcoincidên- pressa, porém, este se desmantelou. Não re- energias limpas, lavagem de dinheiro, direi- Como adverte o economista Marcelo de

T
cia e o melhor que os candida- sistiu ao espetacular crescimento da China, tos humanos, migrações, controle da inter- Paiva Abreu, professor da PUC-Rio, se qui-
tos à Presidência podem fazer aos estilhaços da crise financeira mundial e net. Uma tarefa para diplomatas de todos os ser livrar-se desses grilhões o próximo go-
é aproveitá-la. O Brasil ganha à virada americana com Barack Obama – ministérios. verno “não pode ignorar a urgência de maci-
importância e sonha com cujo subproduto imediato era o fim do go- Que mundo pode sair desse feirão de de- ça renovação da infra-estrutura e inovações
mais espaço na política mun- verno Bush e de sua obcecada guerra ao ter- bates, com seus quilômetros de documen- tecnológicas”. Isso combina com a incômo-
dial no exato momento em que uma crise ror. É do presidente do Banco Mundial, Ro- tos? Para saber, o Conselho Nacional de Se- da previsão do Global Trends, segundo o
financeira abala o sistema e obriga as gran- bert Zoellick, uma das melhores definições gurançados EUA reuniu centenas de cientis- qual o Brasil “tem limitada habilidade para
des potências a reavaliar as regras do jogo e desse furacão: “As placas tectônicas da eco- tas e montou, em 2008, uma futurologia de projetar-se além do continente, como
aceitar novos sócios. A multipolaridade, pa- nomia e da política estão se deslocando. As primeira – o estudo Global Trends 2025: A player importante no cenário mundial”. O
lavrada modaentre diplomatas ehistoriado- categorias desatualizadas do Primeiro e do Transformed World (Tendências Globais americano Peter Hakim, do Diálogo Intera-
res, abre as portas do clube para novos só- Terceiro Mundo, doador e credor, líder e 2025,Um MundoTransformado). Éum nun- mericano, vai mais longe. Veterano estudio-
cios – os países emergentes. liderado, já não servem mais.” ca acabar de alertas, a exigir das diplomacias soda América Latina, ele afirma queo poten-
Uma tarefa a mais, portanto, paraos presi- Buscar vantagens para o Brasil, nesse um guia de sobrevivência. cial do Brasil para liderar o continente é “li-
denciáveis: entender de política externa. O quintal de incertezas, não é tarefa simples. Seu primeiro lembrete é que o Ocidente mitado por sua falta de disposição para ar-
tema entrou no caldeirão das prioridades Primeiro, porque não há mais consenso so- tem hoje 18% da população mundial – um car com os custos financeiros e políticos”
nacionais e está obrigando cada um deles a bre política externa. Como adverte a profes- número que convive com o rápido cresci- de tal empreitada. E os vizinhos, diz ele com
esclarecer aos 135 milhões de eleitores, até sora Maria Hermínia Tavares, do Instituto mento da Ásia e do Islã. A riqueza se transfe- alguma ironia, “não têm um desejo particu-
outubro, duas questões: de que modo farão de Relações Internacionais da USP, o País re, em ritmo inédito, para a Ásia. Daqui a 15 lar de serem representados pelo Brasil”.
o País tirar vantagem desse novo cenário? E ficou importante e os temas da diplomacia anos cerca de 25 nações saberão fabricar Em meio a tudo isso, a escolha moral e
por quais caminhos pretendem definir esse jánão cabem nos salões e saletas doItamara- uma bomba nuclear. As alterações climáti- p0lítica sobre valores. A busca do “Brasil
novo lugar do Brasil no mundo? ty. “Eles ganharam o Congresso, as empre- cas vão desarrumar a vida de muitas nações. potência” vale o afastamento das tradicio-
Essasperguntasnão faziam o menorsenti- sas, a mídia. Tornaram-se um tema contro- É preciso começar já a construir uma econo- nais alianças ocidentais? Onde fica o ponto
do nos tempos do chamado mundo bipolar, verso”, diz ela. mia sem petróleo. ótimo entre direitos humanos e negócios?
o da Guerra Fria. Aquele era um mundo no Polêmica aqui dentro, polêmica lá fora. O O Brasil, nessa avaliação, vale mais do que Nenhum presidenciável escapará dessas es-
qual não cabia mais ninguém além de Esta- mundodito multipolar onde a políticaexter- antes e menos do que se proclama. Embala- colhas cruciais, assim que subir a rampa do
dos Unidos e União Soviética, com seus mís- na tem de se aventurar virou um quebra-ca- do pelo agronegócio e pelo petróleo em alto- Planalto. E de muitas outras: como dar alen-
seis, seus espiões e o som de seus tambores beça de novos temas, novos fóruns, novos mar, pode sonhar com dias gloriosos – mas a to ao Mercosul? Dá para aplicar um choque
de guerra. O nome do jogo era “mundo livre riscos. Dos grandes salões oficiais, como a precariedade da educação e uma tecnologia de realidade no bolivarianismo? Como reto-
versus cortina de ferro” e a diplomacia dos ONU e a OMC, o debate escapou para o de principiante o impedem de decolar. Dis- mar o clima de confiança com os EUA? Os
tristes trópicos, tão desimportante, dormia G-20, os BRICs, os BASICs, o Caricom, a cursos e euforia à parte, o que os números BRICs têm futuro como aliança? Seria opor-
sossegada durante os comícios eleitorais. Unasul... Cúpulas informais, às vezes gigan- dizem é que o País patina no 85º lugar nos tuno o País ousar um pouco mais na política
Isso passou. Sepultado com o comunis- tescas, reúnem governos, ONGs e institui- índices de educação da ONU e que saltou de ambiental?

FAISAL MAHMOOD/REUTERS

Protestos de estudantes da Venezuela de Chávez: o bolivarianismo é um dos


desafios no debate sobre o lugar do Brasil no mundo. Mas os sonhos de
potência dependem de um salto em educação e tecnologia que não está à vista

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