You are on page 1of 7

FLORA DOS CERRADOS MARGINAIS DO NORDESTE E ECÓTONOS

ASSOCIADOS: FLORACENE

Antonio Alberto Jorge Farias Castro1, Ruth Raquel Soares de Farias2, Samara Raquel de
Sousa3, Joxleide Mendes da Costa4, Geny Maria de Sousa5, Gisele Castelo Branco de
Andrade6 e Nívea Maria Carneiro Farias Castro7. 1. Pesquisador (Líder) do BIOTEN
(DB/CCN/UFPI), Coordenador Geral do Sítio 10 (PELD/CNPq) e Professor Associado
(Departamento de Biologia, CCN/UFPI) (albertojorge@ufpi.br); 2. Pesquisadora do Sítio 10
(PELD/CNPq); 3. Bióloga, Bolsista Apoio Técnico BIOTEN/PELD/CNPq; 4. Profª
Pesquisadora UFPI/CUPCE/GPFlora; 5. Bióloga, Estagiária do Laboratório de Biodiversidade
do Trópico Ecotonal do Nordeste (LabioTEN/UFPI); 6. Bolsista de Iniciação Científica
BIOTEN/PELD/UFPI; 5. Coordenadora de Extensão do Sitio 10 (PELD/CNPq).

Termos para indexação: biodiversidade, flora areal, antropização

Introdução
Um quarto do território brasileiro, pouco mais de 200 milhões de hectares, é ocupado
pelos cerrados. Deste total, cerca de 39 milhões estão no Nordeste, onde os cerrados
representam o segundo maior domínio florístico-vegetacional da região. No Piauí, um total de
11.856.866 ha (5,9% dos Cerrados do Brasil e 37% dos Cerrados do Nordeste) correspondem
ao Cerrado sensu lato, dos quais 70% encontra-se em sua área de domínio e 30% em sua área
de transição, isto é, área de contato (Castro e Martins, 1999). O Maranhão por sua vez
apresenta uma área de 328.366km2, sendo que mais da metade dessa área (60%) faz parte do
bioma Cerrado (Ibama, 1991). Embora possuindo uma estimativa mínima, para o Brasil, de
7.000 espécies lenhosas, a flora dos cerrados é pouco conhecida (com consideráveis
problemas de identificação botânica, científica) e, menos ainda o é conhecida no que diz
respeito ao seu enorme potencial sócio-econômico e cultural. Entretanto, ao contrário do que
se pensa de modo generalizado, a flora desses cerrados (marginais) é bastante diversificada,
tem alto grau de endemismo e é muito pouco conhecida. A falta do conhecimento
sistematizado e de uma política permanente de formação de pessoal, de fitotaxonomistas,
principalmente, tem contribuído negativamente para este quadro (Castro et al., 1999).
Para os cerrados do Piauí e do Maranhão as principais contribuições estão associadas
com Rizzini (1963, 1976), quando apresentou as idéias de “zona marginal” e de
“individualidade fitogeográfica do cerrado piauiense-maranhense”, importantes, mas
diferentes do contexto atual apresentado por Castro (1994a, 1994b), no qual define os
cerrados do Nordeste, principalmente do Piauí e do Maranhão, como “Cerrados Marginais
Distais”, marginais por estarem distribuídos nas margens do espaço geográfico ocupado pelos
cerrados brasileiros e distais por referir-se ao fato de que estes cerrados são a continuação
fisionômica e estrutural dos cerrados do Planalto Central de forma contínua. No lugar de
“individualidade florística” apresenta-se a idéia da existência, no Nordeste, de um dos
supercentros de biodiversidade do cerrado brasileiro, onde esta estaria relacionada a uma das
barreiras climáticas, como Polígono das Secas e/ou às cotas altimétricas de 400/500 m,
segundo Castro (1994a, 1994b) e Castro e Martins (1999).
Devido a ocupação desordenada que este Bioma vem sofrendo, principalmente na
região sudoeste do Piauí, atualmente sob forte pressão de desmatamento para fins agrícolas e
pecuários. Constituindo este um dos fatores que tornou o cerrado uma das 25 áreas do mundo
consideradas críticas para a conservação, devido à sua riqueza biológica e à alta pressão
antrópica a que vem sendo submetido (Brasil, 2002). A descrição da natureza do Cerrado, em
sua plena diversidade e punjança, destoa das imagens de grande vazio, emergindo outra
realidade, naturalmente complexa e heterogênea (Almeida et al., 1998; Castro et al., 1998;
Sano & Almeida, 1998; Castro et al., 1999; Felfili & Silva Júnior, 2001; Ribeiro et al., 2001;
Rodrigues & Carvalho, 2001; Silva et al., 2001; Ratter et al., 2003). Sendo assim, é premente
a necessidade de implantação de um programa para estudos ecológicos de longa duração nos
cerrados marginais do nordeste, com vistas à ocupação menos impactante dessa região e à
melhoria da qualidade de vida, com inclusão social das populações locais.
O Projeto de Biodiversidade e Fragmentação de Ecossistemas nos Cerrados Marginais
do Nordeste, vinculado ao Programa de Biodiversidade do Trópico Ecotonal do Nordeste
(BIOTEN) e ao Programa dos Cerrados Marginais do Nordeste e Ecótonos Associados
(ECOCEM), os dois, no âmbito do Programa de Pesquisas Ecológicas de Longa Duração
(PELD/CNPq), objetiva, dentre outros grandes objetivos, levantar e prospectar a
biodiversidade remanescentes desse cerrado regional.

Material e Métodos
A. Caracterização e Localização das Áreas de Estudo
A região-objeto do estudo compreende, áreas dos estados do Piauí e do Maranhão, em
um segmento contínuo com direção geral leste-oeste, abrangendo respectivamente parte da
região norte do Piauí e do nordeste do Maranhão e do Ceará e Pernambuco em manchas de
cerrado.
Foram consideradas três áreas focais, cujas implantações futuras de protocolos de
monitoramento serão de grande importância ecológica. As áreas focais são: Parque Nacional
de Sete Cidades (04°02-08’S, 41°40-45’W e 100/290 m), por se tratar de uma unidade de
conservação federal de proteção integral, corresponde à principal das “áreas focais”, para
atividades permanentes de inventário, de monitoramento e de educação/formação ambiental;
Fazenda Nazareth (04°47’S, 42°37’W e 129 m) e Fazenda Bonito (05°13’S, 41°41’W e 210
m), por serem propriedades privadas, correspondem a áreas permanentes de inventário,
monitoramento e experimentação.
A vegetação vem sendo analisada através do protocolo de “Avaliações
Fitossociológicas Rápidas (AFR)” (Castro, 2001), baseado no método de quadrantes (Curtis e
Mcintosh, 1950; Martins, 1991), de “Avaliações Fitossociológicas Mínimas (AFM)” (A.A.J.F.
Castro, aceito para publicação), que considera o mínimo de 1 (um) hectare de área amostrada
e/ou o mínimo de 30 unidades amostrais com tamanhos de área variável relacionada a um
número mínimo de 30 indivíduos por unidade, através do método de parcelas
(Müeller-Dombois & Ellenbergs, 1974) e de “Parcelas Permanentes (PP)” com parcelas
sistemáticas de 600 m2 (20x30m), ou diferente, desde que incluam um número mínimo de
também 30 indivíduos, com interdistanciamento entre parcelas de 30m. O protocolo PP vem
sendo adotado com intuito de ensaios de monitoramento a partir de premissas ecológicas mais
seguras e em parceria com a Rede Brasileira de Parcelas Permanentes do Cerrado e Pantanal
(Redeppcerradopantanal). Independentemente do método, universo e delineamento amostrais
e/ou protocolo, o critério de inclusão tem sido o mesmo, incorporando exemplares lenhosos
com diâmetro do caule ao nível do solo (DNS) igual ou superior a 3 cm.
A partir dos dados de campo, padronizados para todas as áreas amostradas,
encontra-se em construção um banco de dados da flora dos cerrados marginais do Nordeste
(FLORACENE), que reúne uma série de informações referentes ao estudo empregado (código
do levantamento, tipo de levantamento, tipo de amostragem, número de pontos/parcelas, área
amostrada, número de espécies amostradas e amostráveis, número de indivíduos amostrados,
coordenadas destes e data, local e autores do inventário).

Resultados e Discussão
O banco FLORACENE apresenta dados da flora dos cerrados do Nordeste obtidos em
69 levantamentos, dos quais 45 inventários botânicos no Piauí; treze (13) estudos no
Maranhão; quatro (4) levantamentos para o Ceará; quatro (4) para a Paraíba; dois (2) para o
rio Grande do Norte e um (1) para o estado de Pernambuco, envolvendo, portanto, 56
municípios nordestinos (Quadro 1). Somam-se, até o presente momento, 71.194 espécimes
catalogados, entre árvores, arbustos, subarbustos, ervas e cipós, além de alguns espécimes de
herbáceas, dispostos em 105 famílias botânicas, 627 gêneros e 1.624 espécies, com destaque
para quatro espécies novas (Bauhinia sp. n., Jacquemontia sp. n., Elephantopus sp. n. e
Stilpnopappus sp. n.). As populações da família Fabaceae mostraram-se as mais abundantes,
apresentando 124 espécies, sendo seguida pela Caesalpiniaceae (118), Myrtaceae (105),
Bignoniaceae (83) e Malpighiaceae (77), restando 18 famílias com apenas uma única espécie.
Vale ressaltar que as famílias mais populosas com relação às espécies desconhecidas foram:
Myrtaceae (com 20 espécies), Bignoniaceae (13) e Rubiaceae (9). Quanto às espécies que
mais se sobressaíram em termos de ocorrência nos levantamentos, aqui diagnosticados, foram:
Qualea parviflora Mart. (61 ocorrências), Caryocar coriaceum Wittm. (59), Qualea
grandiflora Mart. (57), Anacardium occidentale L. (48), Bowdichia virgilioides Kunth. (48),
Vatairea macrocarpa (Benth.) Ducke, dentre outras que estiveram presentes na maioria dos
inventários, consideradas de ampla abrangência para os cerrados marginais distais. Ressalva-
se que das 1.624 espécies registradas até o momento, 1.539 encontram-se identificadas, seja
totalmente determinadas (894) ou somente determinadas a nível de gênero (523) ou mesmo, a
nível de família (122), restando 85 espécies sem identificação botânica. Com relação aos
gêneros, Byrsonima, Myrcia, Andira, Erythroxylum e Hymenaea, são os mais representativos
quanto ao número de espécies, assim como também o são a nível de ocorrência nos
inventários supracitados.
Quadro 1. Alguns indicadores do Banco de Dados (FLORACENE).

Municípios Nº de Nº de Nº de Espécimes
Levantamentos
Envolvidos Famílias Gêneros Espécies Catalogados
69 56 105 627 1.624 71.194

Espécies Espécies Espécies Determinadas Espécies Determinadas ao


Conhecidas Desconhecidas ao nível de Família nível de Gênero
894 85 122 523

Conclusões
A análise da composição, abundância e freqüência das espécies amostradas confirmam
a existência de uma flora areal diferenciada. Os inventários continuam, principalmente porque
os níveis de secundarificação, isto é, de antropização, se estendem, colocando as populações
vegetais em risco, sob ameaça de extinção local, sem ao menos ter-se um domínio satisfatório
do seu conhecimento científico para aplicações futuras. Com base nas informações coletadas,
a confirmação das hipóteses científicas do Projeto BASE do Sítio 10 estão sendo testadas a
contento.

Referências Bibliográficas
ALMEIDA, S. P. de; PROENÇA, C. E. B.; SANO, S. M.; RIBEIRO, J. F. Cerrado: espécies
vegetais úteis. Planaltina: Embrapa – CPAC, 1998. 464 p.
BRASIL. Ministério do Meio Ambiente. Secretaria de Biodiversidade e Florestas.
Biodiversidade brasileira: avaliação e identificação de áreas e ações prioritárias para a
conservação, utilização sustentável e repartição de benefícios da biodiversidade nos biomas
brasileiros. Brasília, 2002. 404 p. (Biodiversidade,5).
CASTRO, A.A.J.F. 1994a. Comparação florístico-geográfica (Brasil) e fitossociológica (Piauí -
São Paulo) de amostras de cerrado. Tese de Doutorado, Curso de Pós-Graduação em Fisiologia
Vegetal, UNICAMP, Campinas.
CASTRO, A.A.J.F. 1994b. Comparação florística de espécies do cerrado. Silvicultura, v. 15, p. 16-18.
CASTRO, A.A.J.F. 1996. Cerrados do Brasil e do Nordeste:considerações sobre os fatores
ecológicos atuantes, ocupação, conservação e fitodiversidade. Revista Econômica do
Nordeste, v. 27, p. 183-205.
CASTRO, A.A.J.F., MARTINS, F.R. & FERNANDES, A.G. 1998. The woody flora of
cerrado vegetation in the state of Piauí, northeastern Brazil. Edinburgh Journal of Botany, v.
55, p. 455 – 472.
CASTRO, A.A.J.F.; MARTINS, F.R. Cerrados do Brasil e do Nordeste: caracterização, área
de ocupação e considerações sobre a sua fitodiversidade. Pesquisa em Foco, São Luís, v. 7, n.
9, p. 147-178,1999.
CASTRO, A.A.J.F., MARTINS, F.R., TAMASHIRO, J.Y. & SHEPHERD, G.J. How rich is
the woody flora of Brazilian Cerrados? Annual Missouri Botanical Garden, v. 86, p. 192-
224, 1999.
CURTIS, J.T.; MCINTOSH, R.P. 1950. The interrelations of certain analytic and
syntheticphytosociological characterers. Ecology, v. 31, p. 434-455.
FELFILI, J. M.; SILVA JÚNIOR, M.C. (Org.). Biodiversidade do bioma Cerrado: estudo
fítofisionômico na chapada do Espigão Mestre do São Francisco. Brasília: Universidade de
Brasília, 2001. 152 p.
IBAMA. Diagnóstico dos principais problemas ambientais do Estado do Maranhão. São
Luís: SEMATUR; Brasília: MMA, 1991. 194 p.
MARTINS, F.R. 1991. Estrutura de uma floresta mesófila. Campinas: Editora da
UNICAMPI, 246P.
MÜELLER – DOMBOIS, D. & ELLENBERGS, H. 1974. Aims and methods of vegetation
ecology. New York: John Wiley & Sons.
RATTER, J. A.; BRIDGEWATER, S.; RIBEIRO, V. F. Analysis of the floristic composition
of the Brazilian cerrado vegetation. III. Comparison of the woody vegetation of 376 areas.
Edinburgh Journal of Botany, v. 60, n. 1, p. 57-109, 2003.
RIBEIRO, J. F.; FONSECA, C. E. L. da; SOUSA-SILVA, J. C. (Ed.). Cerrado:
caracterização e recuperação de matas de galeria. Planaltina: Embrapa Cerrados, 2001.
899 p.
RIZZINI, C.T. A flora do cerrado. Análise florística das savannas centrais. In: SIMPÓSIO
SOBRE O CERRADO (M.G. Ferri, org.). Edusp, São Paulo, p.126-177, 1963.
RIZZINI, C.T. de. Contribuição ao conhecimento das floras nordestinas. Rodriguesia, v. 28,
p. 37-193, 1976.
RODRIGUES, V. E. G.; CARVALHO, D. A. Plantas medicinais no domínio dos cerrados.
Lavras: UFLA, 2001. 180 p.
SANO, S. M.; ALMEIDA, S. P. Cerrado: ambiente e flora. Planaltina: Embrapa Cerrados,
1998. 556 p.
SILVA, D. B. da; SILVA, J. A.; JUNQUEIRA, N. T. V.; ANDRADE, L. R. M. Frutas do
Cerrado. Brasília: Embrapa Informação Tecnológica, 2001. 178 p.

You might also like