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[Transsexuality and public health in Brazil]

Article in Ciencia & saude coletiva · August 2009


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Daniela Murta
Rio de Janeiro State University
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Transexualidade e saúde pública no Brasil

ARTIGO ARTICLE
Transsexuality and public health in Brazil

Márcia Arán 1
Daniela Murta 1
Tatiana Lionço 2

Abstract The article aims to discuss transsexuality Resumo O artigo tem como objetivo discutir a tran-
in the context of the Brazilian public health poli- sexualidade no contexto das políticas de saúde públi-
cies. Firstly, it questions the necessity of the diagno- ca no Brasil. Para isto, num primeiro momento, pro-
sis of Gender Identity Disorder as a condition of blematiza-se a necessidade do diagnóstico de trans-
access to treatment in the public health service, torno de identidade de gênero como condição de aces-
searching to understand the historical construction so ao tratamento na rede pública, buscando compre-
of transsexuality as a pathological phenomenon. Af- ender de que forma se deu historicamente a patologi-
ter that, it analyzes the debate on public health pol- zação da transexualidade. Em seguida, analisa-se o
icies for transsexuals, considering the process of le- debate sobre as políticas de saúde para transexuais,
galization of the reassignment surgery in the coun- considerando o processo de legalização da cirurgia de
try, the resolutions of the Federal Council of Medi- transgenitalização no país, as resoluções do Conse-
cine and the constitution of representative forums lho Federal de Medicina e os fóruns que se constitu-
of the Health Ministry, as well as professionals of the íram com representantes do Ministério da Saúde,
area and representatives of the social movement. profissionais da área e representantes do movimento
Finally, considering the references available that social. Finalmente, tendo como referência trabalhos
emphasizes the critics on the analysis of transsexu- que se destacaram pela crítica à patologização da
ality as a pathological phenomenon in the areas of transexualidade nas áreas da saúde coletiva e das
the Public Health and Social Sciences, it intends to ciências sociais, pretende-se destacar a importância
emphasize the importance of understanding the di- de compreendermos a diversidade de formas de sub-
versity of subjectivity’s forms and gender’s construc- jetivação e de construção de gênero na transexuali-
tion considering transsexuality. In this context, it dade. Discute-se a questão da autonomia dos transe-
1
Departamento de Políticas discusses the question of transsexuals’ autonomy and xuais e sugerem-se políticas públicas que, embora
e Instituições de Saúde,
suggests public policies that, even following an assis- sigam um protocolo de assistência, não tenham como
Instituto de Medicina
Social, UERJ. Rua São tance protocol, do not have as its only therapeutical única referência terapêutica a realização do diag-
Francisco Xavier 524, reference the accomplishment of the diagnosis and nóstico e a cirurgia de transgenitalização.
Pavilhão João Lyra Filho,
7º andar, blocos D e E,
the reassignment surgery. Palavras-chave Transexualidade, Saúde pública,
Maracanã. 20550-900 Key words Transsexuality, Public health, Sexuali- Gênero, Subjetividade
Rio de Janeiro RJ. ty, Gender, Subjectivity
marciaaran@terra.com.br
2
Anis - Instituto de
Bioética, Direitos
Humanos e Gênero.
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Arán M et al.

Introdução tada pela psiquiatrização da transexualidade. Ten-


do como a referência a norma do Conselho Federal
Em 1997, o Conselho Federal de Medicina (CFM), de Medicina, parte-se do pressuposto de que a tran-
através da Resolução nº 1.4821, autorizou a reali- sexualidade é uma doença, sendo o transtorno de
zação de cirurgias de transgenitalização em pacien- identidade de gênero (TIG) condição de acesso à
tes transexuais no país, alegando seu caráter tera- assistência médica e jurídica para transexuais4. Desta
pêutico. Esta resolução parte do princípio de que forma, seguindo uma tendência internacional, a
“o paciente transexual é portador de desvio psico- institucionalização da prática assistencial dirigida a
lógico permanente de identidade sexual, com rejei- transexuais no Brasil está condicionada a um diag-
ção do fenótipo e tendência à automutilação ou nóstico psiquiátrico, o que permitiu o acesso ao
auto-extermínio”. A intervenção cirúrgica passou tratamento e, muitas vezes, significa o próprio exer-
a ser legítima no Brasil, desde que o paciente apre- cício de cidadania. No entanto, esse mesmo diag-
sente os critérios necessários para a realização da nóstico pode ser considerado um vetor de patolo-
mesma e o tratamento siga um programa rígido, gização e de estigma, pois atribui uma patologia ao
que inclui a avaliação de equipe multidisciplinar e paciente sem questionar as questões históricas, po-
acompanhamento psiquiátrico por no mínimo líticas e subjetivas dessa psiquiatrização2.
dois anos, para a confirmação do diagnóstico de Diante disso, o artigo pretende problematizar
transexualismo. o diagnóstico de TIG como condição de acesso ao
Diante disso, houve aumento da demanda de tratamento e cuidado na rede pública no Brasil,
auxílio médico por parte de transexuais que, rela- buscando compreender de que forma se deu his-
tando intenso sofrimento e demandando tratamen- toricamente a patologização da transexualidade.
to médico-cirúrgico, impulsionaram a organiza- Em seguida, analisaremos o debate sobre as políti-
ção de programas assistenciais2. Conforme obser- cas de saúde pública para transexuais no Brasil,
vado na I Jornada Nacional sobre Transexualida- desde o processo de legalização da cirurgia de trans-
de e Saúde: a Assistência Pública no Brasil3, pro- genitalização no país, as resoluções do CFM e os
movida pela Coordenação de Saúde Mental do fóruns que se constituíram representantes do Mi-
Ministério da Saúde e pelo Instituto de Medicina nistério da Saúde, profissionais da área e represen-
Social da UERJ, estes serviços apresentam formato tantes do movimento social para discutir o pro-
diferenciado de atendimento, com práticas cirúr- cesso transexualizador no SUS. Finalmente, tendo
gicas e terapêuticas distintas, destacando que al- como referência trabalhos que se destacaram pela
guns já se constituíram como programas consoli- crítica à patologização da transexualidade na área
dados, atendendo a um grande número de pacien- da saúde coletiva e das ciências sociais, pretende-
tes, com vasta experiência na área de assistência e mos destacar a importância de compreendermos
pesquisa, como o Hospital das Clínicas da Univer- a diversidade de formas de subjetivação na transe-
sidade Federal do Rio Grande do Sul e o Hospital xualidade. Para isto, pretendemos discutir a ques-
das Clínicas da Faculdade de Medicina da Univer- tão da autonomia dos transexuais e sugerir políti-
sidade de São Paulo. cas públicas que, embora sigam um protocolo de
Em geral, o processo assistencial compreende assistência, não tenham como única referência te-
as seguintes etapas: avaliação e acompanhamento rapêutica a realização do diagnóstico e a cirurgia
psiquiátrico periódico para confirmação do diag- de transgenitalização.
nóstico; psicoterapia individual e de grupo; hor-
monioterapia, com o objetivo de induzir o apare-
cimento de caracteres sexuais secundários compa- Algumas considerações críticas
tíveis com a identificação psicossexual do paciente; sobre a psiquiatrização da transexualidade
avaliação genética; tratamento cirúrgico. Além dis-
so, vários desses serviços já estabelecem contato O discurso atual sobre o transexualismo na sexo-
com uma assessoria jurídica, para indicação de logia, na psiquiatria e em parte na psicanálise faz
pacientes operados no processo de mudança de dessa experiência uma patologia – um “transtor-
nome. Vale destacar que, na transexualidade, a no de identidade” – dada a não-conformidade en-
importância do acesso aos serviços de saúde con- tre sexo biológico e gênero. Nota-se que o que de-
siste não apenas no cuidado do processo de saúde- fine o diagnóstico de transexualismo é uma con-
doença, mas fundamentalmente numa estratégia cepção normativa dos sistemas de sexo-gênero,
de construção de si. fundamentados numa matriz binária heterosse-
A partir deste primeiro contato, percebemos xual que se converte em sistema regulador da se-
que, na maioria das vezes, a prática clínica é orien- xualidade e da subjetividade5. Assim, por contrari-
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ar a coerência essencial entre sexo biológico e gêne- Porém, o surgimento do que Bento10 denomi-
ro, não se encaixando em nenhum dos modelos na de dispositivo da transexualidade não se deu a
propostos de identidade sexual em conformidade partir do debate sobre o diagnóstico, mas sim a
com as práticas discursivas do século XIX, obser- partir da primeira intervenção terapêutica tornada
vamos que restou exclusivamente à transexualida- pública: a cirurgia do ex-soldado do exército ame-
de ocupar o espaço que foi aberto pela psiquiatri- ricano George Jorgensen realizada por Christian
zação da homossexualidade: o de uma patologia Hamburger, em 1952, na Dinamarca11. Neste con-
da identidade sexual4. texto, as novas teorias médicas e sociológicas con-
Esta premissa foi bastante problematizada por duziram muitos pesquisadores para uma nova
autores como Michel Foucault e Judith Butler. Se- definição do conceito de transexualismo e para a
gundo Foucault, o dispositivo da sexualidade, o defesa do tratamento dos transexuais através de
qual surgiu na aurora da modernidade, só pode intervenções corporais. Seus personagens centrais
ser compreendido através dos mecanismos de po- são: Harry Benjamin, endocrinologista alemão,
der e saber que lhes são intrínsecos. Falar de sexu- radicado nos Estados Unidos da América; John
alidade é também se referir à produção dos sabe- Money, psicólogo, professor do Hospital Univer-
res que a constituem, aos sistemas de poder que sitário John Hopkins e Roberto Stoller, psicanalis-
regulam suas práticas e às formas pelas quais os ta e psiquiatra americano.
indivíduos podem e devem se reconhecer como Harry Benjamin, considerado até hoje uma das
sujeitos sexuados6. Em outras palavras, sexo – principais referências na teorização sobre o tran-
homem, mulher – não é um simples fato ou uma sexualismo, afirma que há uma relação entre o
condição estática, e sim “uma construção ideal for- transexualismo e a endocrinologia. Apoiado nos
çosamente materializada através do tempo”7. avanços dos estudos biológicos do século XX, em
Antigamente, convivíamos mais livremente com especial os estudos genéticos, propõe que não ha-
a possibilidade da mistura dos sexos. Somente a veria uma divisão absoluta entre “masculino” e “fe-
partir do século XVII é que as teorias biológicas da minino”, sendo inadequada a determinação do sexo
sexualidade e as condições jurídicas impostas aos do indivíduo baseada puramente nas diferenças
indivíduos conduziram pouco a pouco à refuta- anatômicas. Para ele, o sexo é composto por diver-
ção da idéia da mistura de dois sexos em um só sos componentes, de modo que a etiologia do tran-
corpo e restringiram “a livre escolha dos indivídu- sexualismo e a origem do desejo de mudar o sexo
os incertos”6. Assim, o dispositivo da sexualidade ultrapassariam os aspectos psicológicos, podendo
instaurou a necessidade de saber, através da medi- estar associadas a uma causa biológica – genética
cina, qual o sexo determinado pela natureza e, por ou endócrina4.
consequência, aquele que a justiça exige e reconhe- Além da definição proposta por Benjamin, os
ce. Ser “sexuado” é estar submetido a um conjunto estudos sobre a transexualidade tomaram força
de regulações sociais, as quais constituem uma nos Estados Unidos, através de investigações só-
norma que, ao mesmo tempo em que norteia uma cio-antropológicas sobre os fatores que influenci-
inteligibilidade e uma coerência entre sexo, gênero, avam na definição da identidade sexual. Tais estu-
prazeres e desejos, funciona como um princípio dos, retomando as discussões entre natureza e cul-
hermenêutico de auto-interpretação7. Neste senti- tura, entre inato e adquirido, promoveram a sepa-
do, “o verdadeiro sexo” é o efeito da naturalização ração conceitual entre sexo (biológico) e gênero
de uma norma materializada5. (social), apresentando uma nova possibilidade de
Retomando historicamente a constituição do se compreender fenômenos onde se expressa uma
discurso científico sobre o sexo, podemos perce- discordância entre eles, favorecendo a consolida-
ber como a norma heterossexual e reprodutiva ção de um campo assistencial e teórico voltado
culminou na constituição do saber psiquiátrico do para esses casos.
século XIX e, consequentemente, na psiquiatriza- Um dos autores que se destacaram nesta pro-
ção do prazer perverso e na problematização da posição foi o psiquiatra John Money, que desen-
homossexualidade8. A partir disso, foi construída volveu pesquisas com crianças intersexuais, com o
uma semiologia dos comportamentos definidos objetivo de esclarecer quais as relações entre a iden-
como anormais. Com efeito, na obra de Von Kra- tidade nuclear de um indivíduo, sua anatomia, sua
fft-Ebing9 podem ser observadas as primeiras re- fórmula cromossômica e seus hormônios, bus-
ferências sobre transexualismo e a descrição de cando demonstrar a independência radical entre o
outras alterações das características psicossexuais social e o biológico. Para Money12, o comporta-
da personalidade, como a metamorfose psicosse- mento masculino ou feminino é construído social-
xual e o hermafroditismo4. mente, sendo a educação o principal aspecto mo-
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delador do gênero. A partir disso, a noção de gêne- Nota-se que, embora a transexualidade já fos-
ro para diferenciar o sexo biológico da identidade se um fenômeno reconhecido desde o final do sé-
sexual foi consolidada, sendo que, segundo o au- culo XIX, as discussões em torno da temática tive-
tor, esta última seria construída ao longo dos pri- ram início apenas a partir da possibilidade de in-
meiros anos de vida, teria caráter irreversível e só tervenção médica sobre esses casos, viabilizando a
alcançaria sua completa expressão com a maturi- constituição de um campo assistencial, em especial
dade sexual12. nos serviços públicos de saúde, voltado para seu
Outra referência importante para a definição tratamento em diversos países. Porém, como afir-
de transexualismo são as teses de Robert Stoller. mamos, o diagnóstico de transtorno de identida-
Para esse autor, a definição de transexualismo se de de gênero, produto de uma exigência médico-
baseia principalmente em três aspectos: (1) um legal, reproduz um sistema normativo de sexo e
sentimento de identidade permanente, uma crença gênero que não condiz com os modos de subjeti-
(no caso do transexualismo masculino) numa es- vação ou a diversidade das formas de construção
sência feminina sem ambiguidades (diferentemente de gênero na transexualidade.
do transvestismo); (2) uma relação com o pênis
vivida “como horror”; (3) uma especificidade na
relação com a mãe que o autor chama de simbio- A assistência a transexuais na rede pública
se. Porém, o autor ressalta que essa relação não de saúde no Brasil: a questão do acesso
pode ser considerada psicotizante, principalmente e o cuidado integral
porque a capacidade de integração social dessas
pessoas permanece intacta, contrariando teoriza- A legalização da cirurgia de transgenitalização e de
ções como as da psicanálise lacaniana, nas quais se procedimentos afins foi um processo longo e cer-
destaca a relação entre a transexualidade e a com- cado de diversas discussões que tiveram início em
preensão lógica e estrutural da psicose5. 1979, quando o CFM foi consultado pela primeira
Frente a isso, a apropriação desse fenômeno vez sobre a inclusão de próteses mamárias em pa-
pela medicina, através da proposição de tratamen- cientes do sexo masculino (Protocolo nº 1.529/79
tos, deu origem a um problema médico-legal, já CFM15). Tais discussões, sempre amparadas no
que esse tipo de intervenção médica não era permi- Código de Ética Médica e no Código Penal, coloca-
tido em todos os países e estava gerando pedidos vam em pauta a licitude ética e penal da “cirurgia
de redefinição do sexo civil13. Nesse contexto, foi de conversão sexual”, já que se considerava inicial-
necessário que as redesignações sexuais estivessem mente a mesma “mutilação grave” e “ofensa à inte-
inseridas em processos terapêuticos formais que gridade corporal”. Além disso, foram problemati-
culminaram na criação de centros de transgenitali- zadas as possíveis implicações jurídicas que tal in-
zação e na elaboração de protocolos de atendimen- tervenção geraria, podendo a alteração da genitá-
to, com base na Escala de Orientação Sexual criada lia servir como argumento para a modificação da
por Harry Benjamin. Assim, em 1973, Norman Fisk identidade sexual, o que poderia estar relacionado
fundamentou uma nosografia psiquiátrica para o ao crime de atribuição de falsa identidade, confor-
transexualismo, ancorada fundamentalmente num me Artigo 307 do Código Penal.
autodiagnóstico e, em 1977, essa condição foi in- Entre os diversos debates ocorridos nesse perío-
corporada à categoria psiquiátrica de disforia de do, destacamos o I Encontro Nacional dos Conse-
gênero, um “híbrido psiquiátrico-sociológico” que lhos de Medicina, nos quais pela primeira vez hou-
tinha como único objetivo responder a necessida- ve uma manifestação favorável à realização da ci-
des funcionais, apenas reproduzindo o autodiag- rurgia. Nesse contexto, a cirurgia de transgenitali-
nóstico numa definição médica da síndrome13. zação foi considerada a etapa mais importante no
Em 1980, a condição transexual finalmente teve tratamento de transexualismo, pela possibilidade
seu lugar formalizado na psiquiatria e na medici- de adaptar a morfologia genital ao sexo com o qual
na, sendo agregada ao manual diagnóstico psiqui- o indivíduo se identifica. Esse procedimento foi jus-
átrico DSM III (Manual Diagnóstico e Estatístico tificado, inicialmente, através do princípio de bene-
das Desordens Mentais). Posteriormente, em 1994, ficência, já que possibilita a integração entre o cor-
com a publicação do DSM IV14, o termo transexu- po e a identidade sexual psíquica do interessado,
alismo, utilizado até então, foi substituído por unido aos princípios de autonomia – direito da
transtorno de identidade de gênero (TIG), delimi- autodeterminação e de dispor do próprio corpo – e
tando mais claramente o fato de ser considerado de justiça – o direito de a pessoa não ser discrimi-
um estado psicológico no qual a identidade de gê- nada no pleito à cirurgia. Tal premissa deu origem
nero está em desacordo com o sexo biológico. à proposta da Resolução PC/CFM 39/9716, que su-
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gere a adoção deste procedimento cirúrgico, a títu- do registro civil da realização da cirurgia de trans-
lo experimental, nos casos de transexualismo e, genitalização, já que a permissão para troca de
posteriormente, à Resolução nº 1.4821. Esta define nome e sexo no registro civil resolveria o problema
que a cirurgia de transgenitalização e procedimen- mais agudo da vida cotidiana dos transexuais19,20.
tos afins poderiam ser realizados no Brasil em hos- Essas premissas tiveram eco no I Encontro Na-
pitais universitários ou públicos a título experimen- cional de Transexuais, realizado em novembro de
tal, desde que algumas definições fossem seguidas, 2005, em Brasília, do qual se originou o Coletivo
destacando-se o acompanhamento psiquiátrico por Nacional de Transexuais. Embora o movimento
no mínimo dois anos. Em 2002, a primeira resolu- social de transexuais só tenha se constituído efeti-
ção foi revogada pela Resolução nº 1.65217 que, con- vamente em 2005, podemos observar que desde 2003
siderando o estágio atual de tratamento dos casos e existem discussões sobre a formulação de políticas
o bom resultado estético e funcional das neocolpo- inclusivas para toda a população LGBT (lésbicas,
vulvoplastias e/ou procedimentos complementares, gays, bissexuais, travestis e transexuais), no Brasil,
resolve que as cirurgias para adequação do fenóti- que culminaram nos debates atuais sobre atenção
po masculino para o feminino podem ser pratica- integral a transexuais no Ministério da Saúde. A
das em hospitais públicos ou privados, indepen- partir da definição desse grupo como vulnerável à
dentemente da atividade de pesquisa, mas seguin- exclusão social, pelo Conselho Nacional de Com-
do os critérios de acompanhamento já estabeleci- bate à Discriminação (CNCD), o mesmo passou a
dos. No caso da neofaloplastia, faloplastia, metoi- fazer parte da pauta dos gestores de políticas públi-
dioplastia, antes de e/ou procedimentos comple- cas e foi incluído em programas que tivessem como
mentares, a realização se manteve condicionada à objetivo garantir os direitos de lésbicas, gays, trans-
prática em hospitais universitários ou hospitais gêneros e bissexuais21.
públicos adequados para a pesquisa. Nesse contexto, a Secretaria Especial de Direitos
A partir dessas resoluções, alguns hospitais uni- Humanos, atualmente vinculada à Presidência da
versitários do país constituíram programas inter- República, iniciou reuniões ambulantes, com o in-
disciplinares para atender à crescente demanda de tuito de apresentar essa demanda a diversos ór-
usuários transexuais. Mesmo considerando o ine- gãos governamentais, assim como sensibilizar e es-
gável benefício que alguns serviços têm prestado a clarecer representantes do governo quanto à neces-
usuários transexuais, vale destacar que a exigência sidade de formulação de políticas inclusivas aos
do diagnóstico como condição de acesso ao trata- grupos definidos pelo CNCD.
mento vem sendo continuamente problematizada, Além disso, ainda em 2003, o Ministério da Saúde
através das contribuições realizadas no campo da foi solicitado a tomar uma posição em relação à
saúde coletiva, das ciências sociais e da bioética. população LGBT, contemplando dois aspectos: que
A partir do relato de experiências assistenciais, a inclusão da população LGBTno SUS se efetivasse
alguns autores destacam que a certeza quanto ao segundo seus princípios fundamentais, a saber,
pertencimento ao gênero oposto, a qual às vezes se universalidade, integralidade e equidade; e que o
expressa pela crença numa identidade fixa, se repe- Ministério da Saúde consolidasse uma Política Na-
te no cotidiano do atendimento a pacientes transe- cional de Saúde para a População LGBT (lésbicas,
xuais. Porém, afirmam que a transexualidade não gays, bissexuais, travestis e transexuais).
necessariamente fixa uma posição subjetiva e des- Nesse sentido, em 2004, o Governo Federal, atra-
tacam a importância de deslocar a manifestação vés dos encaminhamentos do CNCD, lança o Brasil
social da transexualidade da necessidade de tradu- sem homofobia - programa de combate à violência e à
zi-la imediatamente numa patologia, numa estru- discriminação contra GLTB e de promoção da cida-
tura ou num modo de funcionamento específico, dania homossexual, explicitando o compromisso es-
o que nos permitiria escapar da sua psiquiatriza- tatal com a promoção de políticas públicas que ga-
ção. A experiência transexual, neste sentido, com- rantissem a efetividade dos direitos a essa popula-
portaria várias formas singulares de subjetiva- ção. O programa, elaborado a partir das contribui-
ção2,4,7,18. Além disso, discute-se também que não ções de lideranças do movimento LGBT, represen-
existe um processo específico de construção das tou uma conquista da sociedade brasileira decor-
identidades de gênero nos transexuais e desta for- rente de mais de duas décadas de mobilização social,
ma não se deve esperar de transexuais um com- apresentando propostas de ações nos setores Saúde,
portamento fixo, rígido, adequado às normas de Educação, Cultura, Trabalho e Segurança Pública,
feminilidade ou de masculinidade12,20. Outra pro- sendo coordenado pela Secretaria Especial de Direi-
posição que tem se destacado no debate é a impor- tos Humanos. De qualquer modo, este programa
tância de desvincular a possibilidade da mudança governamental se estrutura em torno do eixo da
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violência, enfatizando o combate à discriminação e à Partindo do fato de que não há nenhuma regu-
homofobia como estratégias fundamentais para a lamentação do processo de redesignação sexual no
promoção da cidadania, permanecendo a necessi- SUS (visto que o fornecimento de medicamentos
dade de implementação de políticas de saúde22. específicos é irregular), que a cirurgia de transgeni-
Diante disto, ainda em 2004, o Ministério da talização não estava, na ocasião, incluída na tabela
Saúde, através da Portaria nº 2.227/GM23, criou o de procedimentos financiados pelo mesmo e que
comitê técnico para a formulação da proposta de existem programas de atendimento a transexuais
Política Nacional de Saúde da População LGBT. em funcionamento em diversos estados brasilei-
Este comitê técnico teve seu processo de efetiva ins- ros, foram colocados em pauta pontos relevantes
titucionalização prejudicado por mudanças na ges- para a elaboração de protocolos de acompanha-
tão do Ministério da Saúde, já que desde a data de mento e avaliação de transexuais orientados pelo
sua formalização (novembro de 2004) até o pre- Ministério da Saúde.
sente, mudanças contínuas no corpo técnico da Além disso, foram discutidos os critérios para
instituição, aliadas a entraves na gestão, compro- realização de outras intervenções somáticas – como
meteram o seu efetivo exercício. implante de silicone nos seios, eletrólise, redução
Cabe ressaltar, no entanto, que avanços signifi- do pomo de Adão, mastectomia e histerectomia –,
cativos nas discussões sobre saúde de transexuais a inclusão de previsões de distribuição de medica-
vêm se consolidando, através de sólida pactuação ções específicas, a inclusão da cirurgia de transgeni-
de interesses entre o movimento social de transexu- talização na tabela do SUS, a promoção da inclusão
ais e o Ministério da Saúde. Como efeito da articu- desses indivíduos como cidadãos de direitos e a in-
lação política entre o governo e o movimento de clusão de transexuais no SUS de forma mais ampla
transexuais no Brasil, decidiu-se, durante o XII que a questão da cirurgia de redesignação sexual18.
EBGLT, através de fórum de discussões ampliado Sendo assim, evidenciou-se a necessidade de
entre representantes do Ministério da Saúde e lide- considerar a transexualidade para além da questão
ranças do movimento LGBT, estender um assento pré e pós-operatória, sendo a questão mais com-
no Comitê Técnico Saúde da População GLTB para plexa e danosa a própria representação social sobre
transexuais, passando a diferenciar e reconhecer a a transexualidade, que patologiza e estigmatiza este
especificidade de suas demandas, anteriormente segmento populacional. A cirurgia de transgenitali-
associadas e confundidas com as de travestis. zação, comumente apresentada como central na
Segundo já explicitaram Costa e Lionço24, a demanda de transexuais, foi problematizada como
busca pela efetivação dos princípios de universali- solução não-consensual entre as diferentes pessoas
dade e integralidade, preconizados constitucional- transexuais. Existindo realidades distintas, há tam-
mente desde 1988 e afirmados pela Lei nº 8.080, de bém necessidades distintas quanto à característica
1990, encontram na idéia de equidade sua condição das intervenções somáticas que seriam satisfatóri-
de possibilidade, sendo as políticas de promoção as para cada indivíduo. É interessante notar que a
da equidade efeito ou consequência da participação discriminação e a conotação patologizante que re-
social na gestão das políticas públicas. A gestão par- cai sobre transexuais foram apresentadas como
ticipativa e o protagonismo do movimento social central para o segmento, demandando iniciativas
são fundamentais para que ações em saúde venham que primem pela humanização do atendimento e
a responder e espelhar as reais necessidades e os pela viabilização e qualificação do acesso dessas
valores específicos de diferentes grupos sociais, con- pessoas ao sistema de saúde.
sumando a proposição de modelos de atenção jus- Paralelamente à institucionalização do Comi-
tos rumo à equidade. Portanto, é necessário reco- tê Técnico Saúde da População GLTB, ainda em
nhecer a unidade dos diferentes segmentos LGBT 2004, como efeito de uma ação do Ministério Pú-
numa luta comum por visibilidade, ao mesmo tem- blico do Rio Grande do Sul, foi instituído, sob a
po em que se considera sua pluralidade interna. responsabilidade da Coordenação Geral de Alta
Nesse sentido, o Ministério da Saúde, através Complexidade da Secretaria de Atenção à Saúde
do Comitê Técnico Saúde da População GLTB, de- do Ministério da Saúde, grupo de trabalho para
sencadeou, em fevereiro de 2006, reunião sobre o discutir a inclusão da cirurgia de transgenitaliza-
Processo Transexualizador no SUS, articulando, em ção e procedimentos complementares sobre gôna-
um mesmo espaço de formulação, representantes das e caracteres sexuais secundários na tabela de
do Ministério da Saúde, do Coletivo Nacional de procedimentos do SUS.
Transexuais, profissionais da rede pública de saúde As recomendações decorrentes da reunião so-
que atuam com transexuais e pesquisadores que se bre o Processo Transexualizador no SUS refletem
dedicam ao tema. os anseios do movimento social. Como efeito des-
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se processo, o grupo de trabalho da Coordenação implementação e qualificação dos serviços de aten-
Geral de Alta Complexidade foi rearticulado, aco- ção a transexuais no SUS, prevendo credenciar, junto
lhendo representantes de sociedades médicas, do ao Ministério da Saúde, Centros de Referência para
Conselho Federal de Medicina, do Ministério Pú- a Atenção Integral ao Processo Transexualizador
blico do Rio Grande do Sul, da Defensoria Pública do SUS, um por macrorregião. A definição dos ser-
do DF, representante transexual da sociedade civil viços a serem credenciados deveria levar em consi-
e representantes de áreas técnicas do Ministério da deração a existência de programas já existentes na
Saúde. Nessa circunstância, foram analisadas a si- rede pública de saúde e a operacionalização dos ser-
tuação atual da saúde dos transexuais e a assistên- viços seria organizada em rede integrada.
cia dos mesmos nos serviços de saúde pública, a As discussões empreendidas no Seminário Na-
fim de se definirem as diretrizes da assistência a cional Saúde da População GLBTT na Construção
esse público sob a perspectiva da integralidade, da do SUS, em agosto de 2007, denunciam a atualida-
equidade e da humanização da atenção, além de se de deste posicionamento por parte do Coletivo
discutir a inclusão da cirurgia de transgenitaliza- Nacional de Transexuais, de pesquisadores e de
ção nas tabelas de procedimentos do SUS. representantes do Comitê Técnico Saúde da Popu-
As discussões técnicas subsequentes se orien- lação GLTB do Ministério da Saúde. Ainda que
tam para a proposição de diretrizes comprometi- comemorando a decisão do Tribunal Regional Fe-
das com a superação do estigma associado à con- deral da 4ª Região, o temor de transexuais frente à
dição transexual, tendo como objetivo delimitar compulsória liberação das cirurgias no SUS con-
os critérios para o acompanhamento a transexu- siste na falta de normatização do processo transe-
ais no SUS, assim como definir as estratégias de xualizador em sua perspectiva integral, bem como
avaliação, implementação e credenciamento de pela patologização de sua condição ser a porta de
Centros de Referência de Assistência à População acesso ao sistema de saúde.
Transexual no Brasil. Além disso, o combate à dis- Neste sentido, espera-se que o processo de in-
criminação, que foi considerado fator determinante clusão do procedimento na tabela do SUS possa
da condição de sofrimento de transexuais, foi con- levar adiante as recomendações coletivamente cons-
templado como estratégia de promoção da saúde, truídas por profissionais de saúde, pesquisadores,
não sendo mais a saúde de transexuais uma ques- do Coletivo Nacional de Transexuais e dos técnicos
tão exclusivamente médico-cirúrgica21. Nesse con- do Ministério da Saúde envolvidos diretamente com
texto, outros aspectos, como o uso do nome social a promoção da equidade na saúde deste segmento.
nas unidades de saúde, tornaram-se uma estraté-
gia de promoção de acesso aos serviços, benefici-
ando diretamente transexuais e travestis, já que O debate atual sobre a trans-autonomia
um dos principais fatores da exclusão do sistema é
a própria precariedade no acolhimento. Embora a associação do diagnóstico de transexu-
De qualquer modo, como efeito das recomen- alismo à redesignação sexual tenha viabilizado a
dações oriundas da reunião sobre o Processo Tran- institucionalização do debate sobre a assistência
sexualizador no SUS, as subsequentes discussões dessa clientela na rede pública de saúde, devemos
internas do referido grupo de trabalho considera- considerar a complexidade que envolve compre-
ram a pertinência de reformular e atualizar a mi- ender a condição transexual como uma anormali-
nuta de portaria proposta em 2004, atendendo às dade, colocando em pauta o paradoxo de que, se
demandas do segmento de transexuais pela inte- por um lado o diagnóstico torna legítima a de-
gralidade da atenção no processo transexualiza- manda por redesignação sexual e possibilita o aces-
dor, bem como à premente exigência de humani- so aos serviços de saúde, por outro é raiz de restri-
zação e qualificação da atenção, para além da ques- ções sociais e estigma que afetam diversos níveis
tão cirúrgica, embora sem dela prescindir. da vida desses indivíduos, reforçando sua condi-
Neste sentido, e visando a garantir a universali- ção de exclusão social.
dade e a integralidade na atenção à saúde desse seg- Como mencionado antes, o debate em torno
mento populacional, optou-se pelo esboço de Di- da compreensão patologizante do fenômeno tran-
retrizes do Ministério da Saúde para o Processo sexual tem sido largamente realizado nos dias de
Transexualizador no SUS, processo este em discus- hoje, em especial por aqueles que se opõem a sua
são quando da recente ação do Ministério Público definição como uma categoria psiquiátrica. Segun-
Federal para a pronta inclusão da cirurgia de rede- do Butler25, podemos observar que há um campo
signação sexual na tabela do SUS. Essas diretrizes de tensão entre aqueles que estão tentando obter
esboçadas acompanham a proposta estratégica de autorização e assistência financeira para realizar a
1148
Arán M et al.

cirurgia de transgenitalização e aqueles que consi- siderando que a mesma não é um conceito, mas
deram que o diagnóstico deve ser eliminado com- uma prática socialmente condicionada; e de outro,
pletamente, considerando que usuários transexu- há a argumentação que sugere que nesta situação a
ais têm total condição de dispor sobre seu corpo. prática da trans-autonomia seria enfraquecida, ou
Nesta discussão, para os defensores do transe- até mesmo comprometida, ao estar sujeita a deter-
xualismo como categoria nosológica, entre os quais minado tipo de avaliação e enquadramento psi-
estão alguns membros da comunidade LGBT, psi- quiátrico e psicológico.
quiatras, psicólogos e pesquisadores, essa defini- No entanto, ao fazer uma revisão sobre os as-
ção tem função de extrema importância, pois ga- pectos que constituem o transtorno de identidade
rante o reconhecimento do direito do paciente tran- de gênero, podemos perceber que a definição do
sexual de utilizar o serviço de saúde para realizar a diagnóstico reitera as interpretações normativas
conversão sexual. Segundo esta posição, através do sobre o gênero masculino e o feminino de nossa
diagnóstico psiquiátrico, o desejo de realizar a ci- sociedade, medicalizando as condutas desviantes a
rurgia de transgenitalização e procedimentos afins partir das supostas “verdades” de cada sexo. Além
pode ser concretizado a partir de uma necessidade disso, parte-se do pressuposto de que existe uma
médica, possibilitando, assim, uma modalidade de identidade transexual universal, a qual é revestida
exercício de autonomia25. A argumentação crítica de uma série de preconceitos, os quais invariavel-
ao diagnóstico se baseia na tese de que a qualifica- mente afetam a vida desses indivíduos e interferem
ção deste fenômeno não está relacionada a qual- na determinação de si. Assim, mesmo diante da
quer alteração de função, mas à percepção de uma proposta de uma utilização puramente estratégica
inadequação às normas de gênero. Para eles, a tran- do diagnóstico, podemos notar que o dilema refe-
sexualidade deve ser compreendida como uma en- rente às consequências da definição da transexua-
tre muitas possibilidades humanas de determina- lidade como uma desordem não se esgota – seja
ção do próprio gênero, considerando que, quando pelos sacrifícios envolvidos em assumir a condição
é associada a uma compreensão patológica, enfra- de doente, seja pelo risco de internalização de al-
quece o que Butler25 denomina de trans-autono- guns desses aspectos patológicos.
mia. Desse modo, questionam a avaliação médico- Portanto, consideramos de fundamental im-
psicológica como condição de acesso ao tratamen- portância manter um campo de reflexão sobre o
to, além de problematizarem as consequências ine- tema, a fim de promover um deslocamento que
rentes à definição dessa condição como doença. permita aos serviços de assistência a pacientes tran-
Observamos que existem duas formas diferen- sexuais acolher integralmente esses indivíduos, va-
tes de abordar a questão da autonomia, que se lorizando sua diversidade e sem estar fixados ape-
expressam na forma como cada uma compreende nas na exigência institucional de confirmação do
a autodeterminação e a medicalização. De um lado, diagnóstico.
há uma visão que admite a necessidade de condi- É importante levar sempre em conta que certos
ções específicas para o exercício da autonomia ple- tipos de “identidade de gênero” parecem ser meras
na, ou seja, que não é possível pressupor o exercí- falhas do desenvolvimento, ou impossibilidades
cio da autonomia numa população que se encon- lógicas, porque não se conformam às normas da
tra numa situação de extrema vulnerabilidade, con- inteligibilidade cultural vigente”7.

Colaboradores

M Arán, D Murta e T Lionço trabalharam em to-


das as etapas do estudo e fizeram a revisão final do
artigo. M Arán foi responsável pela concepção do
artigo e escreveu as primeira e terceira partes em
conjunto com D Murta. T Lionço escreveu a se-
gunda parte.
1149

Ciência & Saúde Coletiva, 14(4):1141-1149, 2009


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