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Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul

Faculdade de Física

A TERMOLOGIA PRESENTE NA PRODUÇÃO DE CERVEJA

PROCESSO DE RESFRIAMENTO DE MOSTO

Gabriel Ribeiro de Bicca Canals

Porto Alegre, Novembro de 2015


INTRODUÇÃO

Em qualquer lugar do mundo, a cerveja é descrita como a bebida socializante por


excelência. Se há um grupo de pessoas reunidas conversando, rindo e se divertindo, é
muito provável que haja uma cerveja para acompanhar o agradável momento.

Não é apenas uma bebida. Ela traz um conjunto de valores culturais capaz de
promover no cotidiano a disseminação de conceitos importantes de cooperativismo,
tradição e confraternização: o encontro de pessoas. Não é apenas pelo preço
relativamente barato, pelo baixo teor alcoólico ou por ser refrescante que a cerveja é tão
popular, e sim porque ela traz consigo tradição e sabor, e, desde que dela não se abuse,
provoca descontração e alegria.

Diferente do vinho, a cerveja não é uma bebida com características regionais.


Enquanto as referências vinícolas estão ligadas à origem da uva e, consequentemente, à
região em que ela é produzida, a cerveja tem uma personalidade mais cosmopolita,
relacionada principalmente aos costumes do consumidor. E com as tecnologias atuais, é
possível produzir um determinado tipo ou estilo de cerveja em qualquer época do ano e
em qualquer lugar do mundo.

Mas não é apenas na visão macroscópica a fim de atender às necessidades do


consumo que a tecnologia está relacionada com a fabricação de cerveja. Embora
aparentemente simples, a produção de cerveja requer muito conhecimento e prática, pois
envolve várias e complexas reações químicas e bioquímicas que devem ocorrer
necessariamente sob controle rigoroso de temperatura, tempo, pressão, ph etc. Ou seja, o
conhecimento de física é fundamental do início ao fim do processo.

Para aprofundar mais no objetivo deste trabalho, é preciso conhecer um pouco


sobre os processos de produção da cerveja até chegarmos no ponto principal:
O foco principal deste trabalho será com base no processo de FERVURA.

PROCESSO 1 – PRÉ-FERVURA

O açúcar presente nos grãos, que irá alimentar a levedura durante a


fermentação, encontra-se preso nas moléculas complexas de amido. Para que ocorra
essa liberação, o cervejeiro molha os grãos e aquece lentamente para estimular a
germinação (Este é o processo de Maltagem). Em seguida, inicia-se o segundo processo
chamado de moagem, onde a quebra do grão facilitará a liberação dos açúcares no
processo posterior, chamado de brassagem.

A Brassagem também é conhecida como mostura, que é quando os grãos


quebrados se misturam com água quente fazendo com que as enzimas que se
desenvolveram durante a maltagem comecem a transformar o amido em açúcares
fermentescíveis. Temos então o que provém do próprio nome da fase: o Mosto (uma papa
resultante da mistura de grãos e água quente).

PROCESSO 2 – FERVURA

O mosto, rico em açúcar, é coado através de um “fundo falso” ou fundo de


resíduos. Conforme o mosto sai, o grão é lavado com mais água quente para liberar os
açúcares finais. Depois, passa para uma panela de fervura, onde será aquecido
intensamente.

Alguns aspectos nesta etapa são determinantes para o resultado final da cerveja.
A fervura deve ser intensa, como mencionado anteriormente, pois é responsável pela
esterilização do mosto, eliminando micro organismos que poderiam concorrer com a
levedura pelos nutrientes do mosto. Ela também exerce uma função importante definindo
a cor e o sabor da cerveja.

15h10min – Em uma panela de 40 litros há aproximadamente 37 litros de


mosto em uma temperatura de aproximadamente 65ºC. O objetivo é aquecê-
lo até 100ºC. Para isso, será utilizado um fogareiro de 12 caulings, acesos a
fogo alto.

15h25min – É verificada a temperatura, atualizada: 80ºC.


15h35min – É perceptível que o ambiente próximo à panela torna-se muito
quente e o mosto começa a reagir causando agitação e uma intensa fumaça.
É verificado novamente a temperatura e enfim a temperatura fora atingida.
100ºC.

A partir deste momento inicia-se oficialmente o processo de fervura: o mosto será


fervido durante uma hora à 100ºC. Enquanto o processo ocorre e o mosto mantém sua
temperatura, os cervejeiros dão os toques finais à cerveja adicionando lúpulos, que são a
matéria prima fundamental para dar à cerveja aroma e amargor.

Durante a fervura, aromas indesejáveis que lembram alguns legumes cozidos


são formados e evaporados, assim, além da fervura intensa, é também necessária uma
boa exaustão dos vapores para evitar que a condensação faça retornar ao mosto.

16h20min – É finalizado aos poucos o processo de fervura.

O volume final de mosto é relativamente menor do que o volume inicial. Isso


ocorre porque a água presente na mistura evaporou durante o processo.

16h30min – Neste momento, os cervejeiros precisam resfriar o mosto até


uma temperatura ideal para a fermentação. (30ºC)

Uma importante observação a ser feita sobre este processo, é que a panela não
pode estar com a tampa fechada. Se a evaporação ocorrer em um recipiente fechado,
as moléculas que escapam do líquido acumulam-se na forma de vapor acima do líquido.
Quando isso ocorre, o recipiente fica saturado e o vapor e o líquido exerceriam a mesma
pressão um sobre o outro. Esse fator é denominado: Vapor Saturante.
fig. 1 – Desenho representativo de Vapor Saturante. (Fonte:
GUIMARÃES, Osvaldo & CARRON, Wilson, “As faces da Física”, Editora MODERNA, Volume Único)

RESULTADOS DO PROCESSO 2:

𝑉𝑜 ≅ 38,5 𝑙𝑖𝑡𝑟𝑜𝑠 𝑑𝑒 𝑚𝑜𝑠𝑡𝑜

𝑉𝑓 ≅ 34,5 𝑙𝑖𝑡𝑟𝑜𝑠 𝑑𝑒 𝑚𝑜𝑠𝑡𝑜

𝑉𝑜𝑙𝑢𝑚𝑒 𝑝𝑒𝑟𝑑𝑖𝑑𝑜 ≅ 4 litros


𝑇𝑒𝑚𝑝𝑜: 60𝑚𝑖𝑛

𝑇𝑒𝑚𝑝𝑒𝑟𝑎𝑡𝑢𝑟𝑎: 100º𝐶 𝑉𝑓 < 𝑉𝑜

PROCESSO 3 – PÓS FERVURA (RESFRIAMENTO)

Após o processo de fervura, vêm a penúltima fase da produção da cerveja: a


fermentação. Para isso, o mosto, que se encontra fervendo a 100ºC precisa resfriar
rapidamente (para evitar a formação de aromas indesejáveis e o risco de contaminação)
até a temperatura ideal de fermentação, que é 30ºC. O procedimento a ser feito é na base
do princípio dos trocadores de calor.

O instrumento utilizado chama-se CHILLER DE IMERSÃO, que é um tipo de


solenoide (de tamanhos variados) utilizado para auxiliar no resfriamento do mosto. É feito
de alumínio porque além de ser um metal leve, macio (porém resistente), é um ótimo
condutor térmico, ideal para ser utilizado neste processo.

O chiller possui uma entrada e uma saída onde fará o transporte de água líquida
para auxiliar na transferência de calor do alumínio para o mosto e vice versa.

Uma mangueira de água corrente é conectada a uma das entradas do


instrumento e ligada para testar o seu funcionamento (para ver se não há, por exemplo,
algo bloqueando a passagem de água). A água corrente entra no chiller, auxilia no
processo térmico e sai pelo outro lado em uma temperatura maior, pois a água recebeu
calor durante o processo.

16h40min – o Chiller de alumínio é imerso no mosto à 100ºC.

16h50min – A água corrente continua atuando entre o chiller para ajudar na


troca de calor entre o alumínio e o líquido.

𝑇𝑒𝑚𝑝𝑒𝑟𝑎𝑡𝑢𝑟𝑎 𝑑𝑜 𝑚𝑜𝑠𝑡𝑜 ≅ 70ºC


Saída da água corrente.
(Temperatura de saída
𝑇𝑒𝑚𝑝𝑒𝑟𝑎𝑡𝑢𝑟𝑎 𝑑𝑎 á𝑔𝑢𝑎 𝑛𝑎 𝑠𝑎í𝑑𝑎 ≅ 50ºC
aproximadamente 80ºC)

O calor é uma quantidade de energia que é trocada entre dois ou mais corpos
Entrada dequando
água corrente.
há uma diferença de temperatura entre eles. Neste caso, temos apenas dois
(Temperatura ambiente
corpos no
aproximadamente sistema: o alumínio e o mosto. (A água corrente serve apenas para auxiliar no
20ºC)
equilíbrio). A quantidade de calor cedida por um deles é, de maneira forçada, recebida
pelo outro.

Lembrando que a quantidade de calor trocada é uma grandeza algébrica, essas


quantidades não são iguais e sim opostas, então algebricamente temos que: 𝑄1 = −𝑄2
ou 𝑄1 + 𝑄2 = 0. No caso de mais corpos trocando calor entre si, podemos descrever que
∑ 𝑄 = 0. Se nosso sistema não fosse isolado e houvesse troca de calor com o ambiente,
poderíamos descrever essa equação como: 𝑄1 + 𝑄2 + 𝑄𝑎𝑚𝑏𝑖𝑒𝑛𝑡𝑒 = 0.

17h00min – A água corrente continua atuando entre o chiller para ajudar na


troca de calor entre o alumínio e o líquido.

𝑇𝑒𝑚𝑝𝑒𝑟𝑎𝑡𝑢𝑟𝑎 𝑑𝑜 𝑚𝑜𝑠𝑡𝑜 ≅ 40ºC


𝑇𝑒𝑚𝑝𝑒𝑟𝑎𝑡𝑢𝑟𝑎 𝑑𝑎 á𝑔𝑢𝑎 𝑛𝑎 𝑠𝑎í𝑑𝑎 ≅ 35ºC

Quando dois ou mais corpos trocam calor há uma transferência de energia


térmica do corpo mais quente para o corpo mais frio. O equilíbrio térmico vai ocorrer
quando já não houver um corpo mais quente ou um mais frio, ou seja, quando os corpos
atingirem a mesma temperatura. Porém, o objetivo deste processo não é fazer com que
ocorra um equilíbrio térmico entre os fatores em questão e sim que um dos corpos se
resfrie.

 17h10min – A água corrente que sai agora possui uma temperatura


aproximada da água corrente que entra.
𝑇𝑒𝑚𝑝𝑒𝑟𝑎𝑡𝑢𝑟𝑎 𝑑𝑜 𝑚𝑜𝑠𝑡𝑜 ≅ 30ºC
𝑇𝑒𝑚𝑝𝑒𝑟𝑎𝑡𝑢𝑟𝑎 𝑑𝑎 á𝑔𝑢𝑎 𝑛𝑎 𝑠𝑎í𝑑𝑎 ≅ 25ºC

RESULTADOS DO PROCESSO 3:

Podemos concluir que somente após trinta minutos de resfriamento o resultado


foi obtido. Se o chiller de imersão não tivesse sido utilizado, e ao invés disso o
resfriamento ocorresse através da temperatura ambiente, o processo teria demorado o
dobro de tempo (dependendo da temperatura do ar no dia), além de prejudicar a
produção, uma vez que o resfriamento precisa ocorrer rapidamente.

Para que o processo ocorresse corretamente, a temperatura da água corrente


deveria ser relativamente menor do que a dos outros fatores em questão. Abaixo pode-se
observar como o sistema funciona com relação à transferência de calor entre eles.

𝑀𝑂𝑆𝑇𝑂
𝑇𝑒𝑚𝑝𝑒𝑟𝑎𝑡𝑢𝑟𝑎 𝑖𝑛𝑖𝑐𝑖𝑎𝑙 ≅ 100ºC

𝑇𝑒𝑚𝑝𝑒𝑟𝑎𝑡𝑢𝑟𝑎 𝑓𝑖𝑛𝑎𝑙 ≅ 30ºC


𝑇𝑒𝑚𝑝𝑜 𝑑𝑒 𝑟𝑒𝑠𝑓𝑟𝑖𝑎𝑚𝑒𝑛𝑡𝑜 ≅ 30 minutos
∆T=Tf-T𝑜
∆𝑇 = 30 − 100 ∆𝑇 = −70º𝐶 em 30minutos
120

100

80

60
Temperatura do mosto

40

20

0
16h40min 16h50min 17h00 17h10min

CONCLUSÃO

Este trabalho teve como objetivo apresentar a importância da física térmica em


um dos processos de produção de cerveja e representar os resultados da influência que a
temperatura causa no processo através da transferência de calor. Para um processo
complexo como o da fabricação de cerveja, é fundamental que haja total controle das
temperaturas e do tempo de atuação de cada uma delas, pois cada uma tem um papel
significativo que pode influenciar cada transformação termoquímica que ocorre durante o
processo.

Os resultados seguiram dentro dos parâmetros ideais para a finalização do


processo graças à atuação e do controle correto da temperatura e seu tempo de
atividade. Após este processo, o mosto (na temperatura de 30ºC) foi adicionado à baldes
fermentadores, onde descansará por mais ou menos 7 dias e então será engarrafado
para transformar-se em cerveja.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CARRON, Wilson & GUIMARÃES, Osvaldo – “As Faces da Física” – Volume


Único, Editora Moderna.

MORADO, Ronaldo – “Larousse da Cerveja” – Editora Larousse.

HAMPSON, Tim (Com a contribuição de Stan Hieronymus, Sylvia Kopp e Adrian


Tierney-Jones) – “O Grande Livro da Cerveja” – Informações atualizadas sobre cervejas
e as grandes cervejarias em todo o mundo. – PubliFolha.

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