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TRATAMENTO DE EFLUENTES LÍQUIDOS

ORGÂNICOS

SISTEMAS ANAERÓBIOS

PROFESSOR - Dr. ELSO VITORATTO

PROACQUA PROCESSOS DE TRATAMENTO DE EFLUENTES E


COM. LTDA (DIRETOR TÉCNICO)

FACULDADE OSWALDO CRUZ


PROF. DE ENGENHARIA AMBIENTAL
VER - 2004
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1.2 - PROCESSOS ANAERÓBIOS


Estes processos são largamente empregados no tratamento de efluentes
orgânicos sanitários e industriais, sendo que os principais sistemas utilizados são:
biodigestores de lodo, lagoas anaeróbias, fossa séptica e reatores de alta carga
orgânica como filtros anaeróbios, reatores de fluxo ascendente com leito lodo; etc.

1.2.1 - Microbiologia e bioquímica


A digestão anaeróbia é vista como uma fermentação simples, que ocorre num
único tanque, como numa fossa ou lagoa anaeróbia. Nas primeiras representações
esquemáticas da digestão anaeróbia, ela era discutida como uma fermentação
realizada por dois grupos de bactérias, onde o primeiro era caracterizado como o
das bactérias acidogênicas, responsável pela transformação de lipídios, proteínas e
carboidratos em ácidos graxos de cadeia curta, como acético, propiônico e outros,
álcoois, H2 e CO2. O segundo grupo de bactérias, chamadas de metanogênicas,
transforma estes produtos intermediários principalmente em gases CH4 e CO2
(PERES, 1982).
A evolução do conhecimento, no entanto, veio a demonstrar que as
metanobactérias não são capazes de utilizar álcoois exceto o metanol e não podem
catabolizar ácidos orgânicos exceto o acético e o fórmico.
Isso torna necessário representar o processo anaeróbio incluindo outras
populações intermediárias.
A degradação anaeróbia é hoje representada como um processo que ocorre
em uma série de etapas sucessivas, como pode ser visto na FIGURA 2.1
(McINERNEY e BRYANT, 1980), que apresenta um esquema simplificado do
processo anaeróbio, mostrando os principais grupos de bactérias: as hidrolíticas
fermentativas, as acetogênicas produtoras de hidrogênio, as homoacetogênicas e
as metanogênicas.

1.2.1.1 - Bactérias hidrolíticas fermentativas


Estas bactérias promovem a solubilização da matéria orgânica, ou seja, a
quebra dos polímeros transformando-os em compostos menores. Das proteínas
obtêm-se os aminoácidos, dos carboidratos complexos os monômeros de açúcar e
a partir das gorduras os ácidos graxos de cadeia longa. Essas reações ocorrem em
função da liberação, pelos microrganismos, de enzimas como amilase, celulase,
protease e lipase e suas velocidades dependem da superfície específica de contato
do substrato com as enzimas.
Em seqüência à fase de hidrólise, estas bactérias atuam na fermentação dos
produtos obtidos, com a formação de compostos orgânicos de moléculas menores,
tais como os ácidos fórmico, acético, propiônico, butírico, valérico, láctico, etanol,
amônia e gases CO2 e H2.
A etapa de hidrólise e fermentação tem sido objeto de estudo por diversos
pesquisadores, que estudaram por exemplo, a acidificação da glicose a vários
ácidos, em diversos valores de pH (SEGERS, 1981; ZOETEMEYER et al, 1979;
ZOETEMEYER et al, 1982), a acidificação de proteínas e aminoácidos pelos
microrganismos do gênero Clostridium (BREURE, 1986), a acidificação de
sacarose, lactose e proteínas em função da vazão específica (VITORATTO, et al,
1991).
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FIGURA 1.1 - Representação esquemática do processo anaeróbio com os principais


grupos de bactérias: (1) hidrolíticas fermentativas: (2) acetogênicas produtoras de
hidrogênio; (3) homoacetogênicas; (4) metanogênicas

A fase hidrolítica é a fase limitante da velocidade do processo global quando o


resíduo é constituído predominantemente de matéria orgânica não dissolvida, como
celulose, proteínas e gorduras; daí o grande interesse do estudo desta etapa do
processo e dos microrganismos responsáveis.
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O grupo trófico responsável pela hidrólise e fermentação envolve um grande


número de gêneros, entre os quais podem-se citar, como exemplos, os
Peptostreptococcus, Peptococcus, Eubacterius, Lactobacillus, Bacteroides,
Ruminococcus, Clostridium, Butyrivibrio, Succinimonas e Lachinospira, isolados de
biodigestores de lodo de esgoto e de rúmem bovino.

1.2.1.2 - Bactérias acetogênicas produtoras de hidrogênio


O nome do grupo se deve aos principais produtos formados, o acetato e o
hidrogênio, através do metabolismo das substâncias geradas pelo grupo anterior.
Na etapa de acetogênese alguns produtos da fase anterior, como o etanol,
propionato, butirato, valerato, e lactato, em baixa pressão parcial do gás hidrogênio,
são oxidados a acetato, com a formação de CO2 e H2 .

1.2.1.3 - Bactérias homoacetogênicas


Contrariamente das acetogênicas produtoras de hidrogênio, as bactérias deste
grupo são consumidoras de hidrogênio e produzem acetato a partir de dióxido de
carbono como fonte de carbono.
Teoricamente, 67 a 69% do CH4 formado provêm do acetato, mas alguns estudos
mostram que esta porcentagem pode chegar até 73%, graças à atividade das
bactérias homoacetogênicas.

1.2.1.4 - Bactérias metanogênicas


São as que apresentam a maior diversidade morfológica entre todos os grupos
responsáveis pelo processo anaeróbio.
São organismos anaeróbios obrigatórios e necessitam de um ambiente redutor com
potencial redox menor que -300 mV para o seu crescimento, razão pela qual o seu
isolamento não foi possível até o desenvolvimento de técnicas de cultivo em
anaerobiose eficazes, o que ocorreu somente em 1969.
Todas as bactérias metanogênicas têm uma característica em comum: utilizam um
grupo metil como receptor final de elétrons, formando o metano. Esta é uma reação
termodinamicamente favorável e serve como um reservatório de elétrons para as
reações de oxidação em meio estritamente anaeróbio.
As metanobactérias são divididas em dois grandes subgrupos, de acordo com o
substrato utilizado como fonte de energia.
As que utilizam hidrogênio são chamadas de hidrogenotróficas. A fonte de carbono
para elas é principalmente o dióxido de carbono. Algumas são capazes de crescer
também em formiato, metanol, monóxido de carbono e metilamina, que são
intermediários menos importantes dentro de um biodigestor. As hidrogenotróficas
são representadas por uma imensa diversidade de gêneros e espécies, como
Methanospirilum, Methanobacterium, Methanobrevibacter, etc.

1.2.2 - Influência de fatores na digestão anaeróbia


O processo de digestão anaeróbia pode ser seriamente afetado por diversos fatores
que estão relacionados com o substrato, com as características do digestor ou com
as condições de operação. Assim, se um determinado fator provoca um
desequilíbrio no processo, este se deve principalmente a uma maior sensibilidade
das bactérias metanogênicas, que deixam de produzir metano, ocasionando o
aumento na concentração dos ácidos orgânicos voláteis, que continuam sendo
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produzidos, causando a queda do pH do meio, além da redução da produção de


biogás. A redução da atividade das metanobactérias provoca também o acúmulo de
hidrogênio (H2) no meio, o que faz a rota metabólica desviar do caminho da
acetogênese para a formação de compostos mais reduzidos do que o acetato,
como os ácidos propiônico, butírico e outros, que funcionam como reservatório de
elétrons. A formação de ácido propiônico é particularmente problemática para o
processo anaeróbio global, pois sua conversão a ácido acético, etapa obrigatória
para a sua metanização, é uma reação termodinamicamente difícil, de modo que
acaba se acumulando no meio .

1.2.2.1 - Efeito do pH
A formação de metano pode ocorrer na faixa de pH de 6 a 8, sendo a faixa ótima
entre 6,7 a 7,4.
O efeito do pH em diversas concentrações de ácidos orgânicos voláteis também foi
estudado, havendo a recomendação de manter o pH do processo entre 6,8 a 7,2.
A faixa de pH ótima é diferente para as diversas populações que participam do
processo anaeróbio. Para a conversão de proteínas a aminoácidos, a faixa ótima é
entre 7,0 e 7,5, ao passo que para a conversão de aminoácidos a ácidos o valor
ótimo é em torno de 6,3.

1.2.2.2 - Importância da alcalinidade


A alcalinidade do sistema sendo suficientemente elevada, ocorre o tamponamento
do pH no reator, evitando assim que o acúmulo dos ácidos orgânicos voláteis
resulte na queda de pH. Uma faixa de alcalinidade entre 2500 a 5000 mg CaCO3/L
é considerada desejável, no entanto se o processo for operado sem acúmulo de
ácidos orgânicos, é possível trabalhar bem com valores da ordem de 500 a 1000mg
CaCO3/L, mesmo para efluentes industriais (SOUZA, 1984).

1.2.2.3 - Efeito da temperatura


Apesar da formação de metano poder ocorrer em condições extremas, como 0 a
97oC (ZEHNDER et al, 1981), a temperatura é um fator importante para se ter o
processo viável tecnologicamente, principalmente para o uso de reatores de alta
taxa, uma vez que as bactérias metanogênicas são bastantes sensíveis.
Pode-se enquadrar a maioria das espécies de bactérias metanogênicas na faixa
mesofílica, entre 20 a 40oC, e na termofílica, entre 50 a 60oC (PERES, 1982).
Existe uma correlação entre a temperatura, a máxima produção de biogás obtida a
partir de lodo de esgoto fresco, e o tempo de retenção hidráulica (TRH) usual: a
digestão anaeróbia é mais rápida em temperaturas mais elevadas e
consequentemente obtém-se maior produção de gás, podendo assim reduzir o
tempo de retenção hidráulica do processo (IMHOFF, 1966). A TABELA 1 mostra a
produção de biogás em função da temperatura, a partir de lodo de esgoto fresco.

TABELA 1 – Produção de biogás a partir de 1 kg de sólidos voláteis de lodo


de esgoto fresco (base seca) e TRH habitual obtidos em função de diversas
temperaturas (IMHOFF, 1966)
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Temperatura Produção de biogás TRH


°C L / kg de SV dias
10 430 90
15 530 60
20 610 45
25 710 30
30 760 27
50 - 15
55 - 13

Em trabalhos realizados em reator com lodo de esgoto operado a 35oC, este se


mostrou ser mais eficiente e mais resistente a choques de compostos tóxicos,
comparando-se com o mesmo sistema operado a 29oC.

1.2.2.4 - Influência da agitação


A agitação traz os seguintes benefícios: melhor contato entre a biomassa ativa e a
alimentação, uniformidade física, química e biológica em todo o reator, dispersão
rápida dos produtos metabólicos finais produzidos durante a digestão e de qualquer
substância tóxica que entre no sistema, minimizando os efeitos inibidores da
atividade microbiana (POHLAND, 1982).

1.2.2.5 - Efeito de nutrientes


Para que a fermentação e o crescimento microbiano ocorram em condições ótimas,
é necessário que haja macro e micronutrientes em concentrações adequadas.
Usualmente recomenda-se algo como uma relação carbono: nitrogênio de 20:1 a
30:1 em massa, e uma relação carbono fósforo de l00:1 a l50:1. Esta relação pode
ser expressa também em DQO: nitrogênio (menor que 100) e DQO: fósforo (menor
que 500).

1.2.2.6 - Efeito de inibidores


Alguns compostos químicos são biologicamente tóxicos quando se encontram em
solução e excedem uma dada concentração crítica, para a qual as bactérias ainda
são capazes de se aclimatar.
Metais pesados: vários metais pesados podem aparecer em efluentes industriais e
mesmo em esgotos municipais, podendo vir a exercer um efeito tóxico a
concentrações relativamente baixas como Zn (l63 mg/L); Cd (l80 mg/L); Cu (l70
mg/L) e Fe (2600 mg/L) (Souza, 1984; Anderson, 1982). Um agente eficiente para a
remoção de metais pesados da solução, por precipitação, é o íon sulfeto. Isso
ocorre naturalmente no caso dos efluentes que contêm fontes de enxofre, que é
transformado em sulfeto por ação das bactérias redutoras de enxofre. A adição de
sulfato ferroso para essa finalidade tem sido indicada, quando a água residuária
contém metais pesados e é carente de enxofre.
Ácidos orgânicos voláteis (AOV): os ácidos acético, propiônico e butírico são os
mais comuns num reator anaeróbio. Em situações de baixos valores de pH, parte
destes ácidos ficam na forma molecular. Nessa forma, podem passar pela
membrana celular, ao contrário de seus sais, e causar efeito tóxico. No entanto,
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concentrações tão elevadas quanto 6 a 8 g/L não exercem ação tóxica desde que o
pH do sistema seja mantido entre 7.0 a 7,5.
Sulfeto: em baixas concentrações é um nutriente fundamental para a atividade
metanogênica, por participar de um grande número de enzimas vitais. No entanto, a
partir de concentrações em torno de 150 - 200 mg/L passa a exercer efeito tóxico. A
adição de íons de ferro pode ser eficiente para contornar o problema (SOUZA,
1984)
Oxigênio: em cultura pura de anaeróbios, o oxigênio deve ser completamente
excluído. No entanto, em reatores operando com cultura mista, como é o caso de
biodigestores, a remoção de oxigênio não é necessária nem recomendada, pois é
prontamente utilizado pelos microrganismos facultativos, sempre presentes num
meio complexo . Até mesmo já se observou, em ecossistema complexo de lodos
granulados, a formação de metano em meios onde se manteve uma aeração, de
modo a ter concentrações de oxigênio dissolvido de 2 mg/L ou mais, fato explicado
como decorrente da existência, dentro dos grânulos, de micronichos anaeróbios
protegidos por bactérias facultativas.
Amônia: a toxicidade da amônia é dependente da concentração do nitrogênio
amoniacal e do pH, uma vez que o agente tóxico é mais o NH3 e não tanto o NH4+.
No entanto, quando a concentração de nitrogênio amoniacal excede cerca de 2,4
g/L, expresso em NH4+, já começa a exercer efeito tóxico sobre lodos não
aclimatados, independentemente do pH.
Metais leves: alguns metais leves (alcalinos, alcalinos terrosos), como o sódio,
potássio, cálcio, etc podem aparecer em altas concentrações em certos despejos
industriais. Estes íons não só podem ser estimulantes ou tóxicos, conforme a
concentração, como também seus efeitos podem ser aumentados ou diminuídos
pelos efeitos de sinergismo ou antagonismo por outros íons (HIRATA, 1991). O
sódio entre 0,l a 0,2 g/L é estimulante ao processo, na faixa de 3,5 a 5,5 g/L‚ é
moderadamente inibidor, e em concentrações superiores torna-se fortemente
inibidor (SOUZA, 1984; ANDERSON, 1982).

1.2.3.1 - Reatores de fluxo ascendente com leito de lodo


LETTINGA desenvolveu um reator com retenção interna de lodo, com a
incorporação de um separador diferente, para os sólidos suspensos e para o gás
(LETTINGA et al, 1980). Esse reator, denominado Reator Anaeróbio de Fluxo
Ascendente com Leito de Lodo (RAFA), cuja sigla original é UASB (Upflow
Anaerobic Sludge Bed reactor), de certa forma revolucionou a área de tratamento
de efluentes, pois passou a oferecer muitas vantagens que até então não se tinha,
como baixo custo operacional, baixo consumo de energia, maior estabilidade do
processo, entre outras.
No entanto, alguns problemas podem surgir, como a dificuldade de retenção de
lodo em seu interior quando há problemas na formação de lodo granular,
dependendo da composição do efluente a ser tratado e das condições de operação.
Este tipo de reator vem sendo empregado para o tratamento de esgoto doméstico,
sua eficiência tendo sido demonstrada para esgoto bruto, tanto a temperatura
controlada quanto sem controle de temperatura.
Com o desenvolvimento do reator de alta taxa, a digestão anaeróbia se apresenta
como forma de pré-tratamento dos efluentes contendo matéria orgânica em altas
concentrações, como no caso da vinhaça, chorume, efluentes de indústrias de
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queijo, etc., que podem chegar até a concentrações da ordem de 100.000 mg


DBO5/L, com a redução da maior parte da matéria orgânica, como uma etapa
prévia ao processo de polimento final, que pode incluir tanques aerados. Além
disso, o desenvolvimento do RAFA, que permite a redução drástica dos tempos de
retenção hidráulica, permitiu a ampliação das fronteiras do tratamento anaeróbio
para concentrações mais baixas, o que anteriormente era do domínio exclusivo dos
processos aeróbios.
O princípio do reator RAFA baseia-se no fluxo ascendente do efluente a ser tratado,
o qual é alimentado pelo fundo do reator e atravessa um leito de biomassa ativa,
sendo descartado após passar através de um sistema de placas defletoras
colocadas no topo do reator, separando as fases líquida, sólida e gasosa.
O decantador interno permite que as partículas de lodo retornem à zona de
digestão, assegurando o tempo de retenção adequado de sólidos e a obtenção de
altas concentrações de lodo anaeróbio no reator.
O reator RAFA, dotado de um sistema apropriado de distribuição da vazão de
alimentação, dispensa a recirculação do efluente para fins de fluidificação, pois o
contato necessário entre a água residuária e o lodo é eficiente, uma vez que próprio
gás gerado no seio da manta de lodo é suficiente para manter o lodo fluidificado e
garantir um bom nível de mistura.
O volume do reator RAFA, em relação a outros, é sensivelmente menor, o que o
torna extremamente eficiente, em virtude da retenção do lodo por períodos longos
(semanas, meses ou até mesmo anos), enquanto que o tempo de retenção
hidráulica pode ser bastante baixo (horas).
Para o dimensionamento deste reator, RAFA, emprega-se os seguintes parâmetros:
- Carga orgânica aplicada:
Para despejos concentrados valor máximo de 2 a 3 Kg DBO/m3.dia
Para despejos com baixa concentração, como o esgoto sanitário emprega-
se valores da ordem de 1 Kg DBO/m3.dia
- Altura do reator:
Para despejos concentrados: máxima altura de 5 a 6 m
Para despejos com baixa concentração: de 3 a 4 m
- Distribuição de fundo do reator deve ser a mais uniforme, assim:
Para despejos com alta concentração 1 ponto para 7 a 10 m2
Para despejos com baixa concentração 1 ponto para 1 a 3 m2
- Saída do líquido:
A saída do líquido ocorre pela parte superior, fluxo ascendente e deve ser a
mais uniforme possível. Recomenda-se vertedores reguláveis para o ajuste do
fluxo de líquido.

1.3 - Lagoa Anaeróbia convencional e de alta carga LAFA

São largamente empregadas como pré-tratamento para águas residuárias com


grande teor de sólidos em suspensão e são, por essa razão, também chamadas de
lagoas de decantação.
Os sólidos se depositam no fundo, onde sofrem uma digestão anaeróbia. O líquido
efluente, parcialmente clarificado, normalmente é enviado para outras lagoas, para
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o tratamento complementar adequado, normalmente para lagoas facultativas ou de


estabilização, usadas principalmente no caso do esgoto sanitário.
Carga orgânica aplicada (COA) é o parâmetro usualmente adotado para o
dimensionamento, principalmente no caso de lagoas empregadas no tratamento de
efluentes industriais nos quais a concentração da DBO5 é mais elevada do que o
esgoto sanitário. Os valores de COA mais usuais aplicados a esgoto sanitário estão
na faixa entre 0,1 a 0,3 kg DBO/m3 .dia, que são utilizados em função da
temperatura média a que a lagoa ficará submetida. .
Alguns autores empregam o parâmetro de carga orgânica superficial aplicada
(COSA), para o dimensionamento das lagoas anaeróbias, porém este parâmetro é
muito pouco empregado. As recomendações quanto os valores de COSA variam de
acordo com o autor, como, por exemplo, de 530 a 2.300 kgDBO/ha.dia, na faixa de
temperatura superior a 18 ºC e TRH de 4,3 a 10 dias podendo chegar a uma faixa
de 280 a 4.500 kg DBO/ha.dia (MENDONÇA, 1990).
As lagoas anaeróbias são dimensionadas para receber cargas orgânicas aplicadas
superiores aos valores aplicados em outros tipos de lagoas, dependendo das
condições de projeto poderá ocorrer a geração de odores desagradáveis devido
principalmente à presença de gás sulfídrico. Assim, recomenda-se a instalação
desse tipo de lagoas a uma distância mínima de 200 metros das zonas residenciais.
Os maus odores podem ser evitados pela adição de álcalis (Ca(OH)2),
aumentando-se o pH para cerca de 8. Nessas condições, o sulfeto formado estará
na forma de bissulfeto (HS-), inodoro. Alternativamente, pode-se empregar lagoas
mais profundas, onde se constata menos odor.

A TABELA 2 apresenta alguns parâmetros usuais de TRH, temperatura e


porcentagem de remoção de DBO5 para lagoas anaeróbias aplicadas ao tratamento
de esgoto sanitário.
No caso de esgoto sanitário, normalmente são utilizados valores de tempo de
retenção hidráulica (TRH) de 3 a 6 dias, conforme a temperatura média do esgoto
se situe acima ou abaixo de 20oC.
Uma vez definido o volume da lagoa, deve-se definir a altura de líquido, sendo que
se recomenda de 2 a 5 m, para que, por serem profundas, necessitem de menor
área para sua implantação. Para que haja menor penetração de oxigênio na parte
inferior, seria mais recomendável que a altura fosse de 4 a 5 m.
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TABELA 2 - Valores de TRH, temperatura e eficiência de remoção da DBO5 no


tratamento de esgoto sanitário.

REFERÊNCIA TRH (dia) TEMPERATURA (ºC) REMOÇÃO DE DBO


(%)
(Mara, 1979) 5 maior que 20 70
(Arceivala, 2,5 a 3 20 a 25 40 a 60
1981)
(Silva, 1979) 0,8 a 5 25 a 27 70 a 80
(Mendonça, 0,12 a 22 20 a 55
1990) 9,4
(CETESB, 5 10 0 a 10
1989) 4a5 10 a 15 30 a 40
2a3 15 a 20 40 a 50
1a2 20 a 25 40 a 60
1a2 25 a 30 60 a 80
(CETESB, 1,5 a 2,1 23,3 a 25,2 31 a 68
1989)

Na prática, no entanto, observa-se que muitas das lagoas empregadas para tratar
esgoto doméstico têm profundidades entre 1,5 a 3 metros. (CETESB, 1989).
Ao longo da operação desse tipo de lagoas, os sólidos sedimentáveis vão se
depositando no fundo, onde parte deles é biodigerida. A velocidade de acúmulo de
lodo nas lagoas anaeróbias, empregadas no tratamento de esgoto sanitário, varia
aproximadamente, de 0,03 a 0,04 m3/habitante.ano. Assim, é usual a limpeza a
cada período de 2 a 5 anos. (SILVA, 1979).
Os parâmetros usualmente empregados para o dimensionamento das lagoas
anaeróbias para esgoto sanitário, são apresentados na TABELA 3 a seguir:

TABELA 3 - Principais parâmetros empregados no dimensionamento das lagoas


anaeróbias (empregado pela PROACQUA).

Tempo de retenção hidráulica (TRH) 1 a 6 dias


Temperatura > 15 °C
Carga orgânica aplicada - COA. 0,1a 0,3 KgDBO/m3.dia
Carga orgânica superficial aplicada – 530 a 2300 kg DBO/ha.dia
COSA
Profundidade de líquido 3 a 5m
Velocidade de acúmulo de lodo 0,03 - 0,04 (m3/habitante.ano)
Eficiência de redução dos sólidos 40-70%
suspensos
Eficiência de remoção da DBO5 30-50%
Eficiência de remoção de patogênicos 25 a 50%
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2 - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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