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CULTURA

CAO HAMBURGER | DIRETOR E ROTEIRISTA

Cao Hamburger: “A elite vive apartada da sociedade


brasileira. Ela precisa ir para a escola pública”
Autor da última temporada de 'Malhação', que alcançou uma das
melhores audiências da série, fala sobre o desafio de fazer novela e o
“apartheid” da escola pública e privada
MARINA ROSSI

São Paulo - 3 MAR 2018 - 20:13 BRT

Em março do ano passado, o diretor de cinema Cao Hamburger afirmou que se as


histórias que havia pensado para a nova temporada da novela juvenil Malhação
fossem, de fato, para o ar, ele se beliscaria. A desconfiança não era à toa. Pela
primeira vez em mais de duas décadas, o programa da TV Globo sairia do Rio de
Janeiro e iria para São Paulo, ganharia um cunho mais social e substituiria o casal
protagonista por cinco meninas como personagens principais. 

O diretor Cao Hamburger. GLOBO / RAMON VASCONCELOS.


MAIS INFORMAÇÕES Viva a Diferença, o subtítulo da última temporada do folhetim
que estreou em maio passado e termina nesta segunda-feira
5, daria o tom dos roteiros que tratariam de diversidade
social, diferenças de classes, tribos e gênero. “O sucesso foi
muito gratificante, conseguimos aliar os temas mais
Estudantes de classe relevantes a uma história que agradou e fez com que o
média vão à escola
público se identificasse com ela”, disse o autor, por telefone,
pública por
economia e para sair ao EL PAÍS, quase um ano depois de lançada a aposta.
da “bolha” social

De fato, a temporada sob a batuta de Cao Hamburger


registrou uma média de audiência de 22 pontos no Painel
Nacional de Televisão. Isso significa um alcance diário de 27,4
milhões de espectadores, uma marca que o programa não
Quando os filhos dos conquistava desde 2009. Apesar do sucesso, a próxima
mais pobres
chegaram à
temporada, Vidas Brasileiras, terá autor, diretor e atores
universidade, a novos.
Espanha mudou

Em retrospecto, pode-se dizer que o resultado de Viva a


Diferença foi do tamanho do desafio. Para construir um
roteiro tão diferente de tudo o que já foi proposto em
Malhação, o cineasta nascido em São Paulo fez uma profunda
A professora das
pesquisa por diferentes escolas e diversas turmas de
crianças perdidas
adolescentes. O trabalho, além de se refletir no sucesso dos
episódios da novela juvenil, também fez com que o diretor se
interesse por um universo que hoje abriga mais de 80% dos estudantes
brasileiros: a escola pública. “Percebi, fazendo algumas visitas, que não é sempre
que a escola privada é melhor que a pública em termos educativos”, diz.

Na visão do diretor, que estudou alguns anos na rede pública, incluindo um ano no
Ensino Médio, a instituição é pintada como muito pior do que realmente é. “A
 
estrutura do ensino público, assim como o número de escolas, instalações, muita
coisa já está pronta. Não falta muito [para ficar boa]”, diz. A tese do diretor é que
hoje a oferta do ensino públicogratuito é universal, diferente de antigamente, que
mesmo as instituições do Estado eram acessíveis somente para as elites. “A
educação pública no Brasil tem muitas falhas, mas é muito melhor do que já foi,
porque hoje é para todo mundo”, diz. “Numa visão otimista, a gente está
caminhando”.

“Esta divisão [entre alunos da rede pública e privada] é o


verdadeiro apartheid. A elite vive apartada da sociedade
brasileira desde a escola. E aparentemente, como se nada
estivesse acontecendo”

Para ele, dois pontos são importantes para a melhora na qualidade do ensino
gratuito: vontade política e a apropriação da escola, principalmente por parte das
classes mais altas da população. “Esta divisão [entre alunos da rede pública e
privada] é o verdadeiro apartheid. A elite vive apartada da sociedade brasileira
desde a escola. E aparentemente, como se nada estivesse acontecendo”, afirma.
"Por isso, passei a fazer campanha em casa, para os meus netos, quando eles
nascerem, para que a elite vá para a escola pública”.

A trama abraçou estes dois universos, passando-se em duas instituições: o Grupo


(a escola privada) e a Cora Coralina (a pública). As escolas foram palco para a
maioria dos conflitos, envolvendo preconceito, diversidade, racismo, feminismo e
desigualdade. Por causa dos temas, os capítulos desta temporada receberam
críticas por estarem fazendo merchandising social. O título é repelido pelo diretor,
que rebate. “Isso não faz sentido pra mim porque as histórias estão todas dentro
do universo dos jovens”, diz. “Achei interessante fazer sucesso com esses tipos
de histórias, porque mostra que o jovem está interessado em pensar na vida
dele”.

A temática sobre a escola pública ficou tão central na trama que no capítulo da
última
  quarta-feira foi lançada a campanha Você é o público da escola pública. O
movimento é liderado pela Globo em parceria com entidades como a Unicef e a
Associação Nova Escola. O objetivo é tentar mobilizar a sociedade por uma
educação pública e de qualidade.

Novela x série
Embora nunca tivesse passado pela experiência de fazer novela antes, o diretor
tem no currículo programas como o sucesso geracional Castelo Rá-Tim-Bum (TV
Cultura, 1994 – 1997). Além das séries Cidade dos Homens (Globo, 2002 – 2005),
Pedro e Bianca (TV Cultura, 2012) e dos longas O ano em que meus pais saíram de
férias (2006) e Xingu (2012).

Ele afirma que “o tamanho e a rapidez” com que os roteiros são feitos foram as
maiores dificuldades para se adaptar ao formato de novela. “Em média,
demoramos dois dias para escrever e um dia para revisar um capítulo de
Malhação”, diz. “Numa série, um capítulo pode demorar até duas semanas para
ficar pronto”, compara. Por isso, afirma que nem sempre a estrutura e qualidade
dos capítulos ficaram como ele gostaria. Por outro lado, a mensagem é
propagada com muito mais profundidade. “Temos uma conexão maior com esse
Brasil mais profundo. Não estamos falando só com a elite”, diz. “Essa força que a
TV aberta tem, e, em especial a Globo tem, compensam”.

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