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15/11/2017 Arthur Danto: A Transfiguração do lugar-comum | Reinventar Alternativas

Reinventar Alternativas

Arthur Danto: A Transfiguração do lugar-comum

(h ps://reinventaralternativas.files.wordpress.com/2014/04/transfigurac3a7c3a3o.jpg)O que é uma


obra de arte? Esta é, por assim dizer, a questão central da ontologia da arte. Obviamente, tal pergunta
tem recebido as mais distintas respostas ao longo do tempo, e não foram poucos os que não só não
chegaram a uma definição como ainda concluíram que tal definição seria simplesmente impossível. O
que, afinal de contas, faria com que as coisas mais distintas entre si pertencessem a uma mesma
categoria? Quais critérios permitiriam elencar num mesmo conjunto uma catedral gótica e um
romance expressionista, mas que permitiriam também excluir um dicionário de alemão ou um prédio
antigo qualquer? Uma das respostas mais elaboradas a tal questionamento foi aventada pelo filósofo
Arthur Danto em seu livro A Transfiguração do lugar-comum, publicado originalmente em 1981.

Mas antes de apresentar a resposta convém remeter ao texto que o tornou conhecido. Um artigo
intitulado “O Mundo da arte” (que pode ser lido aqui
(h p://www.raf.ifac.ufop.br/pdf/artefilosofia_01/artefilosofia_01_01_mundo_arte_arthur_danto.pdf)),
publicado dezessete anos antes. Neste artigo, Danto nota, em primeiro lugar, que a ideia de que a arte
é basicamente uma imitação não serve mais nem como condição suficiente, nem como necessária para
saber reconhecer quais objetos são arte e quais não são. Na verdade, alguém que acreditasse ainda
que as obras são um tipo de imitação teria que considerar toda a arte pós-impressionista como inepta
ou malfeita. Mas se a arte não se diferencia da realidade por ser uma imitação dessa, o que diferencia

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15/11/2017 Arthur Danto: A Transfiguração do lugar-comum | Reinventar Alternativas

uma obra de arte de um objeto ordinário? Tal diferenciação, na verdade, se tornou muito difícil com o
advento da arte moderna, ou, mais precisamente, de Duchamp (embora Danto não o cite no artigo,
apenas no livro).

Ora, como conseguir diferenciar o urinol de Duchamp, a famosa obra La Fountaine [A Fonte] de um
urinol semelhante, tomado ao acaso? Não são os dois objetos exatamente similares? Esta obra,
revolucionária em praticamente todos os aspectos, marca a separação entre estética e arte, uma vez
que a arte passa a não visar mais necessariamente à contemplação estética. É certo que não poucas
pessoas contemplaram a beleza do urinol, sua altivez, brancura, seu reluzir. Mas sabemos que
Duchamp pretendia fazer uma arte antirretiniana; isto é, ele, ao menos, não pretendia chamar atenção
à beleza de um objeto comumente ignorado, mas antes questionar o próprio mundo da arte.

(h ps://reinventaralternativas.files.wordpress.com/2014/04/duchamp10.jpg)E eis que apresento, de



supetão, um dos conceitos centrais de Danto. O conceito de mundo da arte. Ele próprio, infelizmente,
não define com muita clareza em que consiste o mundo da arte, mas dá indicações suficientes para
imaginarmos que se trata do mundo que está no entorno da arte, o qual inclui a obra, o museu, a
galeria, o marchand, o conoisseur, etc. E tal conceito é de fundamental importância porque é ele que
servirá de crivo, ao menos neste momento, para decidir o que pertence ao conjunto das obras de arte
e o que não pertence.

“Ver algo como arte requer algo que o olho não pode repudiar – uma atmosfera de teoria artística, um
conhecimento da história da arte: um mundo da arte.”

Em outras palavras: não há nada, absolutamente nada de estético, perceptivo, que diferencie a obra
de arte de um objeto ordinário. Mas isto não significa que tal distinção seja inexistente ou arbitrária.
La Fountaine de Duchamp não é um mero urinol, por mais que todas as propriedades físicas de um
pertençam também a outro. A tese de Danto, no artigo, é que uma obra como La Fountaine pertence ao
mundo da arte, isto é, se relaciona com a história da arte, com as teorias da arte, com o contexto da
arte modernista de tal forma que é reconhecido como obra de arte, ao passo que um urinol, mesmo
que esteja situado no próprio museu de belas-artes, não. É o mundo da arte que pinça objetos banais e
os transfigura em uma espécie de existência segunda, na qual convivem com os outros objetos
tomados como arte.

Não sem razão, a teoria de Danto passou a ser conhecida como uma teoria institucional da arte, uma
vez que o crivo para algo ser uma obra de arte era ser reconhecido por uma instituição, o mundo da
arte. De fato, os teóricos que desenvolveram tal teoria (por exemplo, George Dickie) claramente se

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identificaram com o artigo e viam-se como seguidores das teses ali expostas. No entanto, no livro A
Transfiguração do lugar-comum o próprio Danto deixa claro que não está advogando uma teoria
institucional.

“Aprender que um objeto é uma obra de arte é saber que ele tem qualidades que faltam ao seu símile não
transfigurado e que provocará reações estéticas diferentes. E isso não é institucional, mas ontológico – estamos
lidando com ordens de coisas completamente diferentes.”

(h ps://reinventaralternativas.files.wordpress.com/2014/04/arthur_c_danto_-
_photograph_by_d_james_dee_1990.jpg)

“A teoria institucional da arte não explica, embora permita justificar, por que a Fonte de Duchamp passou de
mera coisa a obra de arte, por que aquele urinol específico mereceu tão impressionante promoção, enquanto
outros urinóis obviamente idênticos a ele continuaram relegados a uma categoria ontologicamente degradada.”

Estas duas citações deixam claro a rejeição por parte de Danto da Teoria institucional. Ele se vê, ao
menos, como um essencialista. Para ele, há algo intrínseco nas obras que as diferenciam das meras
coisas, mas este algo não é algo perceptível por meio dos sentidos.

Na verdade, ele fala que para um objeto ordinário ser uma obra de arte é necessário que um
significado seja aposto a ele. Mais precisamente, ele fala que o objeto precisa preencher três
características (mas características, outra vez, que não são estéticas, isto é, perceptíveis por meio dos
sentidos!): expressar algo, ter um estilo, e ser retórico (o que significa, quase sempre, ser metafórico).
Isto faz algo deixar de ser apenas uma coisa existente para, concomitantemente, passar a estar no
terreno das coisas que precisam ser interpretadas.

É certo que o mundo das coisas que precisam ser interpretadas é superpovoado, que nele estão
muitas coisas que não são obras de arte (como este próprio post, por exemplo). A característica
específica das obras de arte seria a de serem coisas retóricas, metafóricas, carecendo assim de um tipo
de identificação similar, em parte, à religiosa ou mágica, um tipo de decifração simbólica distinto.

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(h ps://reinventaralternativas.files.wordpress.com/2014/04/brillo_blum_pasadena.jpg)

“As causas das caixas comuns de Brillo eram práticas: o produto tinha de ser transportado das fábricas para os
galpões de depósitos e dos depósitos para os supermercados, onde era desempacotado, colocado em prateleiras e
vendido. (…) A cadeia causal a que pertencia a Brillo Box de Warhol não era dessa ordem: ela descendia da
evolução da teoria da obra de arte, bem como da história recente da arte. Para considerar um objeto como obra de
arte era preciso conhecer essa história, ter participado dos vários debates ocorridos.”

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18 de abril de 2014 amarofleck Arte, Arthur Danto, Ontologia


da arte

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