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COLÉGIO MARISTA PIO XII

Capitais Culturais e a Comunicação Pedagógica.

Novo Hamburgo
2017
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Gustavo S. da Silva e Camila E. Almeida

Capitais Culturais e a Comunicação Pedagógica:

Relatório de pesquisa de campo


apresentado como parte das atividades
da PioTeC, no 3° ano do EM do Colégio
Marista Pio XII.
Orientador: Natalia Daniela Soares Sa
Britto

.
Novo Hamburgo
2017
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 3
1.1 Definição do Tema e Problema .......................................................................... 4
1.2 Objetivos .............................................................................................................. 4
1.2.1 Objetivo Geral ................................................................................................... 4
1.2.2 Objetivos Específicos ...................................................................................... 4
1.3. Justificativa ......................................................................................................... 5
1.4 Hipótese ............................................................................................................... 5
2FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA ................................................................................ 6
2.1 DOMINAÇÃO E IMPOSIÇÃO DE VALORES........................................................6
2.2 CAPITAIS SOCIAIS DOMINANTES......................................................................7
2.3 INSTITUIÇÕES REPRODUTORA E REPRODUÇÃO ESCOLAR......................10
2.4 PIAGET E O DESENVOLVIMENTO INFANTIL..................................................11
3 METODOLOGIA .................................................................................................... 13
4 RESULTADOS ....................................................................................................... 16
5 CONCLUSÃO ........................................................................................................ 22
6 REFERÊNCIAS ...................................................................................................... 23
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1 INTRODUÇÃO

A dominação e a imposição de valores são conceitos explorados na obra dos


sociólogos franceses Pierre Bourdieu e Jean-Claude Passeron (1970). Analisando a
vanguarda das lutas pela dominância social, Bourdieu e Passeron (1970)
desenvolvem os conceitos de violência simbólica e capitais sociais dominantes, tidos
como mecanismos de reprodução social. Segundo sua teoria a violência simbólica
causa dano indiretamente, sem coesão física, na moralidade e psique dos indivíduos.
Fenômenos de intolerância como o “bullying” (agressão moral contínua), racismo,
sexismo, preconceitos religiosos e intelectuais se encaixam perfeitamente nas
explicações Bourdieanas. Para Bourdieu (1970) os valores que regem a violência são
os mesmos das classes sociais que se encontram no poder, são chamados de
“Capitais Sociais Dominantes”. Seguindo este sistema de imposição/reprodução,
encontram-se as “Instituições Reprodutoras”, como as grandes corporações, a mídia,
organizações sociais e principalmente instituições acadêmicas como escolas e
universidades. Tendo como pressuposto este marco teórico-conceitual este projeto de
pesquisa tem como objetivo abordar a imposição acadêmica e como a mesma afeta
as “engrenagens sociais” em sua origem, pois para Bourdieu (1970, p. 26), “toda ação
pedagógica é objetivamente uma violência simbólica enquanto imposição, por um
poder arbitrário, de um arbitrário cultural”. Para tanto, além de uma profunda revisão
bibliográfica e conceitual acerca da produção teórica de Bourdieu, a pesquisa será
realizada através da aplicação do método de pesquisa social com estudantes do 6º
ano de uma escola particular de Novo Hamburgo-RS, onde, a partir de uma análise
quanti-qualitativa, examinará o grau e a intensidade dos processos de reprodução dos
padrões hegemônicos dos capitais acadêmicos e sociais dominantes na ação
pedagógica e a consequente reprodução de situações de violência simbólica no
ambiente escolar.
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1.1 Definição do Tema e Problema

Violência simbólica e a reprodução sistemática de capitais sociais pelas classes


dominantes, estabelecidos na teoria da “Reprodução” de Pierre Bourdieu (1970),
ecoam implacavelmente nos processos pedagógicos e carregam consigo todas as
consequências do domínio e legitimação das desigualdades. Para Bourdieu (1970,
p.26), como citado anteriormente, “toda ação pedagógica é objetivamente uma
violência simbólica[...]” e provar ou refutar essa afirmação teórica é o escopo deste
projeto enquanto abrange todas as repercussões sociais que acompanham a mesma.

1.2 Objetivos

1.2.1 Objetivo Geral

Cotejar a presença de reprodução de capitais dominantes nas ações


pedagógicas e esclarecer a intensidade e o grau de impacto dos mesmos ambiente e
vida social-escolar.

1.2.2 Objetivos Específicos

I. Identificar a presença de reprodução de valores e capitais sociais e culturais


dominantes na ação pedagógica e no ambiente escolar como um todo, a partir
da visão, falas e representações simbólicas dos estudantes do 6º ano.
II. Identificar situações de reprodução de violência simbólica na ação pedagógica.
III. Analisar dados e estabelecer o grau de ação reprodutora destes capitais
dominantes (culturais, econômicos e sociais) no ambiente escolar e na ação
pedagógica através da visão, falas e representações simbólicas dos agentes
sociais envolvidos no processo de ensino-aprendizagem.
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1.3. Justificativa

De acordo com Bourdieu e Passeron (1970) a presença de violência simbólica


nas ações pedagógicas é inevitável e é esse fator que legitima as desigualdades, pois
a escola é um ambiente de reprodução social e prepara indivíduos reprodutores de
valores das classes dominantes, que por sua vez contribuem ainda mais para o
funcionamento das instituições reprodutoras. Neste processo vicioso de produção e
reprodução de capitais sociais, a escola encontra-se no hipocentro do fenômeno e é
a instituição que mais fortemente concretiza o processo de opressão e dominação
sistemática. Nota-se também a presença de indivíduos doutrinados, porém não
reprodutores, que por sua vez irão se tornar alvos principais das ações dominantes.
Portanto é nas escolas que também se encontra a possível solução para a
desestruturação deste processo, expondo a violência simbólica nas ações
pedagógicas e no ambiente escolar, cessando assim a reprodução destes valores.

1.4 Hipótese

Partimos da hipótese de que a instituição escolar ainda hoje participa


decisivamente na reprodução dos capitais sociais dominantes, sendo possível
identificá-los nas representações simbólicas dos entrevistados a respeito das práticas
pedagógicas, do ambiente e do convívio escolar.
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2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1 DOMINAÇÃO E IMPOSIÇÃO DE VALORES

As teorias sobre dominação e imposição de valores formadas pelos sociólogos


franceses Pierre Bourdieu e Jean-Claude Passeron já podiam ser evidenciadas em
analises de filósofos ainda mais antigos.
J.-J. Rousseau (1792, p.14) em seus estudos já afirmava

“Não podendo o legislador empregar nem a força nem o raciocínio, é uma necessidade que ele
recorra a uma autoridade de outra ordem, que possa conduzir sem violência e persuadir sem
convencer. Eis que forçou em todos os tempos os chefes das nações a recorrer à intervenção do céu.”

Esta citação compôs, entre tantas, a base das teorias Bourdieanas. J.J.-
Rousseau explica perfeitamente a finalidade do meio de imposição simbólica ao expor
a religião entre as principais formas de dominação dos chefes de estado.
Caracterizando um poder que não agride fisicamente, porem castiga, não emprega a
razão, mas doutrina, e que age nas entrelinhas sociais, mesclando-se a própria cultura
daquela sociedade.
Na obra “A Reprodução” (1970), Bourdieu e Passeron expõem como essa
dominação simbólica se traduz na sociedade contemporânea a partir de crenças,
tradições, costumes e qualquer outro tipo de valor histórico que sobrevive ao passar
de gerações que por sua vez manifesta-se em forma de imposição social como o
machismo, homofobia, racismo, discriminação intelectual e cultural.
Bourdieu também comenta na legitimação desta violência que se concretiza
por meio da negação de sua existência. Um verdadeiro disfarce social acontece para
que a violência simbólica ajunte forças e somente com a cumplicidade, ou ignorância
da parte oprimida, entre oprimido e opressor que ela toma força.
Bourdieu (1996, p.16) afirma assim em
“A violência simbólica é uma violência que se exerce com a cumplicidade tácita daqueles que
a sofrem e também, frequentemente, daqueles que a exercem na medida em que uns e outros são
inconscientes de a exercer ou a sofrer. ”
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2.2 CAPITAIS SOCIAIS DOMINANTES

A ideia de capital para Bourdieu difere das teorias marxistas, por exemplo. Para
Bourdieu capitais não se baseiam na ideia econômica e sim como moedas de troca
social, onde o indivíduo que os possui ascende dentro da cadeia de dominância, assim
como um rico “homem de negócios’ possui mais capital econômico para investimento.
Estes capitais culturais, sociais e econômicos legitimam e justificam a ideia de
superioridade de quem os possui e que por sua vez são estabelecidos como valiosos
pelas classes que se encontram no poder econômico. Criando um processo vicioso
onde quem encontra-se no poder, dita o certo ou errado a partir dos valores os
mesmos compõem. Bourdieu sobre o capital social em:
“O capital cultural, que compreende o conhecimento, as habilidades, as informações etc.,
correspondente ao conjunto de qualificações intelectuais produzidas e transmitidas pela família, e pelas
instituições escolares, sob três formas: o estado incorporado, como disposição durável do corpo (por
exemplo, a forma de se apresentar em público); o estado objetivo, como a posse de bens culturais (por
exemplo, a posse de obras de arte); estado institucionalizado, sancionado pelas instituições, como os
títulos acadêmicos[...]”
Bourdieu separa estes capitais em três divisões onde expressam e dominam
partes distintas dos processos sócias. O “capital social” para Bourdieu é baseado na
influência exercida pelo indivíduo, determinada muitas vezes pelo seu alcance de
dominação perante as outras classes, ou seja, o quanto aquele indivíduo dita quais
são os capitais considerados importantes, dominantes. Bourdieu comenta brevemente
sobre o assunto:
“O capital social, correspondente ao conjunto de acessos sociais, que compreende o
relacionamento e a rede de contatos[..]”
Bourdieu também fala sobre o capital simbólico, conjunto dos três capitais, que
estabelece dominância através das atividades passadas do indivíduo, sua posição
econômica e sua propriedade intelectual, ou seja, cria a noção de mérito ou
merecimento de glorias ao indivíduo, como se suas ações o tornam-se melhor que os
outros. Bourdieu comenta:
“O capital simbólico, correspondente ao conjunto de rituais de reconhecimento social, e que
compreende o prestígio, a honra etc. O capital simbólico é uma síntese dos demais (cultural, econômico
e social). ”
O “capital econômico” da importância ao poder monetário do indivíduo, sua
acumulação de posses e riquezas que o caracterizam como mais poderoso que os
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demais. A presença de capital econômico muitas vezes se traduz no controle social
de indivíduos que não fazem parte desta classe social, criando uma grande relação
de patrão-operário dentro do ambiente social.
O “capital cultural” se baseia na propriedade intelectual do indivíduo, isto é, seu
nível de instrução, suas experiências passadas, seu engajamento com a cultura
erudita e principalmente seu relacionamento com a preservação destes
conhecimentos julgados superiores, ou seja, a luta para que o aprofundamento
intelectual continue nas mãos dos poderosos.
A dissipação de violência simbólica, dominação e imposição de valores é
apenas de interesse das classes dominantes, ativamente envolvidas nos processos
de reprodução de valores, em prol da sua permanência nesta posição social e
eventualmente a preservação do status quo. Estes valores reproduzidos são
exatamente os mesmos que as compõem sendo o modo como se portam, se vestem
e o que consumem, também mencionando suas experiências passadas e o que as
caracterizam como superiores – como venturas turísticas, opções de carreiras
profissionais e posição intelectual. Também considerando a posição de raça, religião,
sexualidade, sexo e entre outras características. Bourdieu denomina estes valores
como habitus que por sua vez é dividido em hexis, ethos e eidos.
Thiry-Cherques (2006) explica esta relação:
“O habitus constitui à nossa maneira de perceber, julgar e valorizar o mundo e conforme a
nossa forma de agir, corporal e materialmente. ”
Menciona os meios sociais do indivíduo, como é formado seu método de
absorção de informação e ele interpreta o ambiente a sua volta, como ele difere o
certo do errado e como são suas ações nos meios sociais, através de reprodução ou
imposição de seus próprios valores.
O ethos por Thiry-Cherques (2006):
“ [...] pelo ethos, os valores em estado prático, não-consciente, que regem a moral cotidiana
(diferente da ética, a forma teórica, argumentada, explicitada e codificada da moral, o ethos é um
conjunto sistemático de disposições morais, de princípios práticos) [...] “
Ou seja, o ethos expressa a formação moral do indivíduo, as ações no ambiente
social que ele se encontra consideradas morais ou imorais, exemplo disso é a
homofobia na sociedade, onde o comportamento homossexual por muitas vezes é
consideras imoral por classes que possuem certos capitais culturais.
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Thiry-Cherques (2006) continua sua interpretação do habitus:
“[...] pelo hexis, os princípios interiorizados pelo corpo: posturas, expressões corporais, uma
aptidão corporal que não é dada pela natureza, mas adquirida [...]”
O hexis expressa o comportamento físico adquirido na formação,
caracterizando os modos de agir do indivíduo como certos ou errados, o ato de “portar-
se educadamente” estabelecido pela sociedade. Esta ideia compõe os modos à mesa,
em encontros sociais, na comunicação e etc.
O eidos abordado por Thiry-Cherques em seguida:
“[...] pelo eidos, um modo de pensar específico, apreensão intelectual da realidade, que é
princípio de uma construção da realidade fundada em uma crença pré-reflexiva no valor indiscutível
nos instrumentos de construção e nos objetos construídos [...] ”
O eidos traz a ideologia ao âmbito social. Pode ser exemplificado como uma
religião, é uma ideia predeterminada das ações morais sociais, criando verdades
absolutas, ideias irrefutáveis que através delas ocorrerão a interpretação da realidade
e do mundo a volta.
Capitais sociais dominantes baseiam-se nas expressões sociais e culturais que
as classes que estão no poder, com maior poder aquisitivo, expõem e que
eventualmente são expostos como valores morais superiores às outras classes.
Esmagando assim indivíduos que não se adequam nestas definições, agredindo-os
simbolicamente.
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2.3 Instituições reprodutoras e reprodução escolar

Para Bourdieu (1970) a violência simbólica se concretiza através de intuições


reprodutoras dos valores das classes no poder. Estas classes compõem os órgãos de
organização social sendo a escola, universidades, hospitais, organização militar, o
próprio estado, a mídia, corporações e até mesmo grupos sociais de indivíduos
independentes propagadores destes valores. Bourdieu (1998, p. 41) da grande ênfase
na importância da escola como instituição reprodutora.
“É provável por um efeito de inércia cultural que continuamos tomando o sistema escolar como
um fator de mobilidade, segundo a ideologia da “escola libertadora”, quando, ao contrário, tudo tende
a mostrar que ele é um dos fatores mais eficazes de conservação social, pois fornece a aparência de
legitimidade às desigualdades sociais, e sanciona a herança cultural e o dom social tratado como dom
natural. ”
Afirma que a escola tem como função social principal “passar a frente” os
valores dominantes que por sua vez são impostos pelas classes no poder. De acordo
com Bourdieu (1970) a escola é obrigada a doutrinar de modo que ignore as
diferenças sociais dos alunos presentes em aula e qualquer outra realidade social
presente no exterior da sala de aula. Assim é possível afirmar que “toda ação pedagógica
é objetivamente uma violência simbólica enquanto imposição, por um poder arbitrário, de um arbitrário
cultural. ”
A autoridade pedagógica é processo de ilusão onde a instituição pedagógica
se estabelece como monopolizadora da verdade, onde as ideias, comportamentos e
saberes são estabelecidos, impostos e separado entre importantes e inúteis, sendo
os importantes aqueles que a escola prega.
Bourdieu ressalta sua posição sobre a autoridade pedagógica
“Enquanto poder de violência simbólica se exercendo numa relação de comunicação que não
pode produzir seu feito próprio, isto é, propriamente simbólico, do mesmo modo que o poder arbitrário
que torna possível a imposição não aparece jamais em sua verdade inteira [...]”
Para Bourdieu estes processos se legitimam através da ignorância de sua
presença, para ele a violência simbólica acontece quando sua presença é negada,
onde as ações impositoras da escola são ignoradas e que atitudes de doutrinação e
esforços em prol da reprodução social são ignorados.
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2.4 Piaget e o desenvolvimento infantil

Marcia Regina Terra, doutorada em linguística aplicada, explica a importância


dada à faixa etária dos 12 anos por Piaget.
“Nesta fase a criança, ampliando as capacidades conquistadas na fase anterior, já consegue
raciocinar sobre hipóteses na medida em que ela é capaz de formar esquemas conceituais abstratos e
através deles executar operações mentais dentro de princípios da lógica formal. Com isso, conforme
aponta Rappaport (op.cit.74) a criança adquire "capacidade de criticar os sistemas sociais e propor
novos códigos de conduta: discute valores morais de seus pais e constrói os seus próprios (adquirindo,
portanto, autonomia)".
Para Piaget é nesta fase que a criança constrói os alicerces que um dia irão se
tornar a base de seu pensamento adulto. Nesta fase que seu método interno de
interpretação de conhecimento e experiência é criado. Preparando-o para o começo
de processos intelectuais complexos. Portanto o funcionamento social e intelectual do
indivíduo nesta fase de vida ira refletir diretamente em quem ele se tornara quando
adulto.
Durante os 12 anos é onde Piaget localiza a formação moral do indivíduo, que
estabelece e cria seu pequeno “manual de regras” interno onde separa o que
considera certo do que considera errado. Estabelecendo também sua relação com
autoridade, criando indivíduos questionadores ou não de imposições autoritárias. Para
Piaget é aqui que há legitimação das regras, criação de autonomia e pensamento
individual. A criança parte da ideia de reciprocidade moral onde os processos sociais
devem ser bons para ambos os lados, uma formação do conceito de justiça, onde o
indivíduo possa analisar o quão justa as situações que se encontra são e o seu
respeito as regras é determinado através de as quão favorecedoras elas serão para
ambos os lados.
Para Piaget "toda moral consiste num sistema de regras e a essência de toda moralidade
deve ser procurada no respeito que o indivíduo adquire por estas regras". Ou seja, a moralidade
do indivíduo é criada a partir de seu entendimento ao o quão justas são as regras de
se ambiente, as respeitando-as ou não. Logo indivíduos que habitam ambientes
injustos são mais suscetíveis à imoralidade.
Assim sendo evidente a importância da faixa etária de 12 anos e o por que dela
ter sido analisada. Ao estabelecer o grau de reprodução de indivíduos nesta idade é
possível ter um reflexo de seu futuro adulto como cidadão reprodutor, pois afinal, é
nesta fase que são estabelecidas as relações éticas e morais, que por sua vez
12
refletem diretamente nos processos de reprodução, ou não, dos capitais culturais
dominantes.
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3 METODOLOGIA

Como procedimento metodológico, a pesquisa se fundamenta na análise


quanti-qualitativa com filiação na pesquisa social em educação, tendo como principal
instrumento a aplicação de entrevista estruturada. Nesse sentido, foi aplicado
questionário em um grupo focal, formado por estudantes do 6º ano de uma escola
particular da cidade de Novo Hamburgo-RS, tendo como objetivo determinar a
composição do capital de cada indivíduo de acordo com a teoria Bourdieana. O
questionário primeiramente visa estabelecer a posição social (analisando o número
de banheiros e aparelhos eletrônicos que possuem), opção religiosa, etnia e grau de
instrução dos guardiões dos entrevistados sendo estabelecidas afirmações graduadas
de 1 a 4 sendo 1- concordância total e 4- discordância total. Desta forma é foi possível
estabelecer o posicionamento do entrevistado perante situações sociais “chave”,
determinando seu nível de reprodução sociocultural.
O grupo focal foi composto por 78 alunos do 6° ano do EF, selecionados devido
a sua faixa etária de 11 a 12 anos de idade, já que esta fase representa um período
de transição no seu processo de aprendizado e socialização. De acordo com Jean
Piaget (1980) é nesse período etário que os processos de raciocínio dedutivo, abstrato
e formação da ética e identidade estão em seu afloramento.
As questões aplicadas foram agregadas em 5 categorias equivalentes aos
capitais sociais específicos, visando uma análise quanti-qualitativa do grau de
reprodução, conforme o quadro a seguir (quadro 1):
Quadro 1. Categorias, especificações e questões aplicadas ao grupo focal
Capitais Sociais: Questões:
I. Relação com  O professor sabe o que é melhor para mim
 Meus pais sabem a melhor religião para seguir;
autoridade; Visa  As opiniões dos meus pais são as mesmas que as minhas;
 Colegas que concordam com as opiniões dos professores são bons
estabelecer a relação alunos;
que o indivíduo possui  Posso falar tudo o que penso dentro da sala de aula;
 Minha opinião é importante dentro da sala de aula;
com as figuras
 Obedecer é respeitar.
autoritárias em seu
ambiente e o quão
condicionado ele está a
seguir seus comandos e
reproduzir seus
comportamentos;
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II. Hierarquia de  Cálculos são mais fáceis para mim;
 Saber a história da humanidade é o que considero mais importante;
inteligências;  Aprender sobre a natureza e o corpo humano é o que mais me atrai;
 As outras matérias são legais, porém as matérias mais importantes
Determina os tipos de são português e matemática;
inteligências, lógica,  Artes e filosofia são tão importantes quanto ciências;
 É natural que alunos bons em cálculos tenham melhores notas em
linguística, corporal, que geral;
o indivíduo considera  Primeiro estudo matemática e português, depois outras matérias;
 É normal que alunos com melhores notas recebam mais atenção do
como importante assim
professor;
sistematicamente  O aluno que consegue fazer um trabalho em grupo sozinho deve ser
muito inteligente;
expondo quais formas
 Alunos que não ajudam o grupo são péssimos estudantes;
de aprendizado a  Trabalho em grupo é importante, mas aprendo melhor sozinho;
instituição reprodutora  É natural alguns alunos serem menos inteligentes.

determina como ideal;

III. Auto percepção;  Trabalho em grupo é importante, mas aprendo melhor sozinho;
 O correto é meninos gostarem de meninas e meninas gostarem de
Avalia a opinião que o meninos;
indivíduo demonstra de  Meninos jogam bola enquanto meninas fazem outras brincadeiras;
 Meninas são mais fracas que meninos;
si mesmo e como os  Posso falar tudo o que penso dentro da sala de aula;
processos reprodutores  Minha opinião é importante dentro da sala de aula;
 Às vezes é melhor não falar minha opinião;
podem inflar ou diminuir
 Não me sinto confortável em responder perguntas em voz alta;
sua autovalorização;  Na maioria das vezes me sinto errado;
 Se não concordo com a maioria, provavelmente estou errado.

IV. Habilidade de  Trabalhos em grupo são divertido e aprendo melhor com eles;
 É natural alguns alunos serem menos inteligentes;
socialização;  Alguns colegas possuem opiniões erradas;
 Posso falar tudo o que penso dentro da sala de aula;
Esclarece o quão apto o  Engraçado quando alguém erra uma pergunta.
indivíduo encontra-se
para realizar processos
sociais e como lida com
situações em grupo,
assim determinando
habilidade empática do
mesmo.

V. Reprodução de  Primeiro estudo matemática e português, depois outras matérias;


 Bons alunos permanecem quieto e atentos durante a aula;
valores. Nível de  Alunos não comportados merecem receber notas baixas;
 Alunos que não ajudam o grupo são péssimos estudantes;
reprodução dos capitais  Eu chamo atenção dos colegas que falam muito;
dominantes que o  Sempre deixo claro quando acho que outro colega está errado;
 Alguns colegas possuem opiniões erradas;
indivíduo apresenta.
 Colegas que concordam com as opiniões dos professores são bons
Isso implica sua alunos;
 O correto é meninos gostarem de meninas e meninas gostarem de
participação nos
meninos;
processos de violência  Meninos jogam bola enquanto meninas fazem outras brincadeiras;
simbólica e seu impacto  É engraçado quando alguém erra uma pergunta;
 Na maioria das vezes me sinto errado;
nos indivíduos da sua  Se não concordo com a maioria provavelmente estou errado;
volta.  O único papel da escola é ensinar conteúdo;
 Obedecer é respeitar.
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O cálculo para determinação das categorias foi feito da seguinte forma:

I) Somaram-se os pontos das respostas de cada categoria, dividindo


pelo número de afirmações das mesmas, obtendo assim uma média
específica para cada entrevistado.
II) Determinou-se que alunos com médias maiores se encontram mais
cientes dos processos reprodutivos dos capitais dominantes,
enquanto os que possuem médias menores fazem parte ativa dos
processos de reprodução.
III) Para a média geral, foram somadas as médias específicas e depois
divididas pelo número de alunos entrevistados (universo focal),
obtendo assim um entendimento maior do grau reprodutivo dos alunos
do 6° ano.
16
4 RESULTADOS

Os resultados quanti-qualitativos da pesquisa de campo das três turmas do 6°


ano do EF foram analisados em conjunto devido as grandes semelhanças entre as
turmas. Apresentando resultados claros no alto nível de reprodução de capitais sociais
dominante.
4.1. Analise demográfica e cultural dos entrevistados
I) Analise demográfica

ETNIA DOS ENTREVISTADOS


Brancos - 55 Pardos - 18 Indígenas - 4 Negros - 0 Asiáticos - 0

5%

23%

72%

Gráfico 1: A primeira analise evidencia o grande número de alunos de raça branca


sobre alunos de outras etnias como negros, pardos, indígenas, brancos e
asiáticos. Bourdieu exemplifica a representação social como um dos principais
fatores reguladores das hierarquias sociais. A alta representação social da raça
branca funciona com um condicionador à desigualdade social. Criando como
padrão, um capital social dominante, ser branco. Devido a dominância
representativa de uma denominada raça, se torna “justificável” os processos
impositores e opressores diante os indivíduos que não compõem esta
caracterização, ou seja, a origem do racismo no ambiente social. Para Bourdieu o
racismo é uma das ferramentas que constroem a violência simbólica, criando
indivíduos que não possuirão voz ou impacto nas interações sociais. Assim
indivíduos brancos terão maior imposição social, tendo mais oportunidades
financeiras, maior acesso de informação, exposição a capitais culturais eruditos,
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estabelecendo uma vantagem para indivíduos brancos na corrida social imposta
pelas classes dominantes, explicando a dominância branca em um ambiente
escolar de classe alta.

II) Analise econômica-social:

POSIÇÃO SOCIO-ECONÔMICA DOS ENTREVISTADOS


Classe média Classe média alta Classe alta

0%

26%

74%

Gráfico 2: A maioria dos alunos (74%) compõem a categoria de classe média alta
na organização de poder econômico enquanto 24% possuem poder econômico
maior, compondo a categoria de classe alta. As teorias Bourdieanas
contextualizam-se na análise de instituições pedagógicas estatais e gratuitas,
que naturalmente compõem-se de alunos de diversas origens. Nesta analise
leva-se em consideração o processo de privatização escolar que sofre imposição
direta, pois, como qualquer instituição privada, se mantém ativa através de
capital econômico, que é concentrado evidentemente nas classes dominantes.
Deste modo a escola é distorcida e corrompida a um negócio, onde há seleção
sistemática de seus clientes, estudantes, através de seu poder econômico, seu
nível de dominância social. Esclarecendo a ausência de alunos de classe baixa,
ou até mesmo classe média, no ano letivo analisado.
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OPÇÃO RELIGIOSA DOS ENTREVISTADOS


Catolicismo Outra

19%

81%

Gráfico 3: A opção religiosa dos alunos se apresenta em paralelo com a religião


empregada por sua escola particular, sendo 81% católicos e apenas 19% de outras
religiões. Através das análises feitas anteriormente, é possível partir do pressuposto
que a escola em questão é composta por alunos que compõem a classe dominante
brasileira, possuindo alto capital econômico, cultural e social. De acordo com
Bourdieu, a religião faz parte destes capitais é um dos inúmeros fatores envolvidos na
dominância e reprodução social. Entre as classes dominantes brasileiras, a religião
católica se encontra como mais proliferada, explicando o grande número de alunos
católicos e de classe alta. Possibilitando por sua vez, uma possível explicação ao
paralelo entre religião e capital econômico, pois o nível superior de influência social
que escolas privadas e religiosas possuem em relação a outras escolas é diretamente
ligado ao seu nível reprodutor. A classe dominante é católica, logo escolas financiadas
e compostas pela mesma, terão maior nível de reprodução e imposição social.
19
4.2 Analise do grau reprodutivo dos entrevistados

I. Capitais dominante e níveis de reprodução:

Grau de reprodução
2,85
2,8
2,75
2,7
2,65
2,6
2,55
2,5
2,45
2,4
2,35
Relação com Hierarquia de Auto percepção Habilidade de Violência simbólica
autoridade inteligências socialização
Grau de reprodução

Gráfico 4: Quanto menor a média dos entrevistados, maior é o grau de


reprodução apresentado por eles. A média ideal sendo 4 enquanto o resultado
irregular 1. O resultado evidencia alto nível de reprodução e imposição de
capitais culturais dominantes entre os alunos. As turmas do 6° ano do EF do
colégio particular em tópico, pontuaram em média 2,5 em cada categoria. Todos
os capitais escolhidos visam expressar as engrenagens sociais que compõem
os processos de violência simbólicas. Para Bourdieu a violência simbólica
depende da ignorância da sua presença, algo que o capital “III”, visa analisar. O
capital “I” demonstra o grau de reprodução que o indivíduo exerce em relação a
sua autoridade, Bourdieu expressa isso nas instituições dominantes e como são
elas, como entidades reguladoras da sociedade, que fazem parte do incentivo
a reprodução dos valores das classes dominantes. Já no capital “II”, analise
baseia-se em estabelecer quais são os capitais culturais dominantes no
ambiente escolar em questão. Os alunos entrevistado possuem uma concepção
hierarquizada de inteligência, onde aqueles que desprezam a fala coloquial e
possuem aptidão em exercícios de logica matemática são merecedores de
maior aprovação e mérito no ambiente escolar. Nos capitais “IV” e “V” o
processo de imposição feito pelo próprio estudante é analisado, pois para
20
Bourdieu é inevitável que indivíduos que compõem as classes dominantes não
participem, ao menos indiretamente, dos processos de imposição de valores.
Assim criando uma noção, quase exata, de como os processos sociais
acontecem nesse ambiente escolar, de acordo com a influência simbólica que
são exercidos sob.
21
II. Cruzamento de dados:

Gráfico 5: A última análise visa estabelecer a relação que os dados arrecadados


durante a pesquisa possuem um com o outro. É possível visualizar neste gráfico
todas as minorias e maiorias sócias, culturais e econômicas entre os
entrevistados. Através do que é apresentado é evidente que ambientes sociais
compostos por indivíduos da classe dominantes apresentam níveis de
reprodução dos capitais sociais dominantes extremamente altos. A escola
analisada apresenta um ambiente mono cultural, onde a diversificação social
quase não se encontra presente, legitimando assim as desigualdades sociais.
Quanto mais encontra-se indivíduos que possuem capitais culturais,
econômicos e sociais maior será seu condicionamento à violência simbólica,
normalizando e dessensibilizando sua relação com processos reprodutores.
Para Bourdieu além de a escola incentivar atitudes impositoras, contanto que
sejam a favor de seus capitais dominantes, ela destrói a ideia de
individualização e genuinidade pessoal que cada aluno possui, deste modo
invadindo, corrompendo, impondo e por fim condicionando os alunos que não
possuem os capitais escolares dominantes à uma vida de submissão e culpa.
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5 CONCLUSÃO

Quanto maior a concentração de indivíduos que compõem a classe dominante


no ambiente escolar, maior serão os níveis de reprodução dos capitais sociais
dominantes. Bourdieu já afirmava que a ação pedagógica é inevitavelmente uma
violência simbólica, porém neste projeto pode-se analisar um ambiente que vai além
desta afirmação. A escola privada não é somente um ambiente de legitimação das
desigualdades, mas também tem potencial de se tornar a origem do “viés de
confirmação social”.
É no ambiente escolar onde as primeiras interações sociais com indivíduos
distintos acontece, porém em escolas privadas há o processo de seleção social
especifica onde, devido as altas taxas de mensalidade, apenas os indivíduos com alto
capital econômico terão acesso. Quando o ambiente escolar não proporciona tal
diversidade, o processo de justificação e legitimação das desigualdades se
potencializa, criando um viés de confirmação, onde tudo a volta do indivíduo é
selecionada a partir de sua familiaridade, não há choque cultural. Todos os alunos,
valores, origens, comportamentos e gostos são iguais. Um processo de confirmação
de seus comportamentos, logo idealizando-o como correto. Deste modo distorcendo
a visão do diferente que por sua vez é visto como uma aberração, como errado.
A violência simbólica parti disso, os esforços para dominar e impor seus
próprios valores aos indivíduos que não os compõem. Na escola privada os níveis de
reprodução dos capitais sociais dominantes são extremante altos, pois a própria
natureza da instituição pedagógica privada já impõe a valorização de capital
econômico dominante, como qualquer outra instituição privada que visa o lucro. Assim
não impõe tanto aos estudantes seus valores, quanto confirma os valores já possuídos
pelos alunos e indiretamente incentiva ações de violência e imposição dos mesmos,
já que a grande maioria dos indivíduos na escola privada já fazem parte da classe
social dominante.
Por fim a escola privada não cria tantos indivíduos condicionados à violência
simbólica como a escola pública gratuita faz, mas cria indivíduos ativamente
reprodutores, fontes da dominação social. Através do desenvolvimento de indivíduos
condicionados a dominar e impor que tomarão os lugares de suas autoridades como
agentes dominantes classe dominante perpetua-se no poder.
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6 REFERÊNCIAS

BOURDIEU, Pierre; PASSERON Jean-Claude. A Reprodução. Elementos


para uma teoria do sistema de ensino. 7. ed. Rio de Janeiro: Editora Vozes, 2008.

TERRA, Márcia Regina. O desenvolvimento humano na teoria de Piaget.


Universidade Estadual de Campinas, 2014. Dissertação de Mestrado.

VELASCO, Clara. Desigualdade diminui, mas renda de negros ainda é


metade da de brancos no Brasil, aponta estudo. G1 Notícias, 2017. Relatório de
IPEA, FJP E PNUD.
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ANEXO 1 – Questionário quanti-qualitativo aplicado aos alunos do 6° ano do
EF.

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