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EXEGESE DO NOVO
TESTAMENTO
Guia para a exegese
Palmas-TO
Fev./2018
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CONSIDERAÇÕES INICIAIS
“Fazer exegese” é um trabalho fascinante. Por seu intermédio procuramos interpretar a
Bíblia. Quando nos lançamos a essa tarefa, percebemos com gratidão que existe um enorme
instrumental científico à nossa disposição, fruto do labor abnegado de inúmeros pesquisadores
e pesquisadoras em diferentes áreas. Simultaneamente, nos damos conta das lacunas na
ciência. Estas fazem nossos juízos permanecer modestos, porque nem sempre é possível
emiti-los com o necessário grau de seguranças e fundamentação.
Mas o fascínio do labor exegético não se deve unicamente àquilo que, através dele, é
possível descobrir sobre a Bíblia. Neste caso, esta não passaria de mero objeto de
interpretação. O fascínio da exegese reside também no fato de que a Bíblia nos interpreta. Ela
é também sujeito de interpretação. Como palavra de Deus, ela “penetra até dividir alma e
espírito”, julgando “as disposições e as intenções do coração” (Hb 4:12). Assim, à medida que
vamos descobrindo coisas na e da Bíblia, ela vai nos descobrindo também. É precisamente
esta dialética de interpretar e ser interpretado que dá ao labor exegético um gosto todo
especial.
a) Descubra tudo o que puder sobre os destinatários. Eles são judeus ou gentios? Ou
uma combinação de ambos? Que relação eles têm com o autor? Existem indícios
sobre a sua situação socioeconômica?
b) Descubra tudo o que puder sobre o propósito. O autor explicitamente diz algo a
respeito? O que está implícito?
d) Faça um esboço anotado de todo o livro (para ser visto no estudo mais adiante).
Depois de sentir-se mais à vontade com o livro como um todo, prossiga para os
próximos passos.
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Princípios de Tradução:
A tradução de textos antigos encerra uma série de dificuldades, especialmente quando
se trata – como no caso do NT – de um texto escrito há dois milênios, num lugar distante e
culturalmente diferente do nosso.
a) Ela nos familiariza com o texto grego que serve de base para a exegese, levando a
sério o fato de que o texto a ser interpretado foi escrito originalmente em língua diferente da
nossa;
b) Ela mostra que tradução implica sempre também interpretação. Isto ficará claro
principalmente em relação àqueles termos ou expressões para os quais os dicionários
apresentam diversas opções de tradução;
c) Ela aguça a nossa sensibilidade para o exame de outras traduções disponíveis, seja
em comentários, ou em modernas versões portuguesas do Novo Testamento.
A tradução literal procurará respeitar a inclusão ou omissão dos artigos, bem como a
ordem original das palavras, desde que, naturalmente, isso não produza, em português,
um sentido diferente do que havia no original grego.
É recomendável que intérpretes pouco familiarizados com o grego façam uma análise
gramatical e tradução de todas as palavras do texto, anexando-as à exegese em forma
de apêndice.
A tradução literal trará como resultado um texto muito parecido, em forma e conteúdo,
aos textos das traduções interlineares. Ela não visa apresentar o texto num “bom português”,
mas num português que consiga reproduzir, da melhor maneira possível, as construções
gramaticais, a ordem das palavras e a forma da língua original.
Por ser parte integrante do início da exegese, toda tradução literal terá um forte
caráter de provisoriedade. Ela necessitará de uma segunda tradução complementar ao final
da exegese.
o trabalho de interpretação, pode-se fazer uma segunda tradução, desta vez considerando os
destinatários atuais do texto e as particularidades do seu idioma. O princípio que rege este tipo
de tradução denomina-se de equivalência dinâmica, e a tradução assim efetuada de
idiomática. Por pressupor o trabalho interpretativo do texto, esta segunda tradução deverá ser
apresentada somente ao final da exegese.
Pressupõe-se que o princípio da equivalência dinâmica também procura traduzir os
textos de acordo com o seu significado original. Entende-se, contudo, que tradução fidedigna
implica mais do que reprodução fiel do conteúdo dos textos. É preciso que a tradução consiga
verter estes conteúdos com tal habilidade, que o impacto que o texto conseguiu produzir nos
primeiros leitores possa ser experimentado também pelos leitores ou ouvintes de hoje. Ou
seja: é preciso que a tradução comunique não apenas o conteúdo, mas também a dinâmica
linguística que originalmente revestia este conteúdo. Neste sentido, como afirmou Eugene A.
Nida, “traduzir é tentar estimular no novo leitor na nova língua a mesma reação ao texto que o
autor original desejou estimular nos seus primeiros e imediatos leitores”. Katherine Barnwell
resume da seguinte forma as qualidades de uma tradução segundo o princípio da equivalência
dinâmica.
Correta: A tradução deve dar o sentido o mais exato possível da mensagem original.
Clara: A tradução deve produzir um texto bem compreensível. Não deve ter
expressões confusas ou que possam ser entendidas erradamente.
Natural: A linguagem da tradução deve ser completamente natural. Não deve parecer
uma tradução, mas soar como se um falante nativo tivesse escrito aquele texto.
V.25: Sim, respondeu ele. Ao entrar Pedro em casa, Jesus se lhe antecipou, dizendo:
Simão, que te parece? de quem cobram os reis da terra impostos ou tributos:
dos seus filhos ou dos estranhos?
V.26 Respondeu Pedro: Dos estranhos. Jesus lhe disse: Logo, estão isentos os
filhos.
V.27 Mas, para que não os escandelizemos, vai ao mar, lança o anzol, e o primeiro
peixe que fisgar, tira-o; e, abrindo-lhe a boca, acharás um estáter. Toma-o, e
entrega-lhes por mim e por ti.
o A referência ao imposto das duas dracmas (v. 24) e ao estáter (v.27) não pode
ser compreendida pelo leitor atual, já que se trata de impostos e moedas não
mais conhecidas. A pesquisa exegética identifica no “imposto das duas
dracmas” um tributo devido anualmente ao templo de Jerusalem (cf. Ne
10:33). A dracma era uma moeda grega que correspondia a um denário
romano, ou seja, ao salário de um dia de trabalho (cf. Mt 20:2). Por fim, o
estáter era uma moeda de prata grega no valor de 4 dracmas – 4 denários.
Como traduzir estas referências? Uma sugestão para a tradução seria a
seguinte: “dirigiram-se a Pedro os que combravam um imposto anual a ser
pago para o templo, no valor de dois dias de trabalho. E perguntaram: Não
paga o vosso Mestre as duas moedas de prata [para o templo]? (v. 24). A
referência ao estáter no v. 27 poderia ser traduzida de forma idêntica:
“...abrindo-lhe a boca, acharás uma moeda de prata, chamada estáter...”
PASSO 7. ATUALIZAÇÃO
A atualização da mensagem do texto para dentro da situação do ou da intérprete é o
último passo que propomos neste guia para exegese. A tarefa da atualização é construir uma
ponte entre o significado do texto no passado e sua relevância para os dias atuais. A
dificuldade inerente a esta tarefa reside no fato de que o contexto cultural, sócio-político e
religioso dos tempos bíblicos não é o mesmo de hoje. Isto significa que muitas vezes não é
possível estabelecer analogias diretas entre o passado bíblico e nosso presente. É preciso,
pois, transpor o sentido do texto para uma realidade nova, diferente e, por vezes, até contrária
à realidade de então.
A atualização pressupõe que a palavra de Deus, a despeito de ser sempre situacional e
contextual, tem uma mensagem perene e válida para além da situação concreta em que foi
formulada, pelo simples fato de que a verdadeira identidade da pessoa humana frente a Deus,
aos seus semelhantes e ao mundo criado permanece igual hoje àquela que foi no passado e
também àquela que será no futuro. O mesmo poderíamos dizer em relação a certos
paradigmas com que é interpretada a revelação bíblica de Deus: o êxodo, a amorosa aliança
de Deus com o seu povo, o reino de libertação aos cativos, a cruz e a ressurreição não são
meros acidentes históricos da ação divina entre as criaturas, mas, sim, características perenes
de como Deus se apresenta e quer ser compreendido e crido no seio da humanidade. É esta a
razão última que justifica o nosso esforço em pretender atualizar um texto antigo, por um
lado, mas eminentemente verdadeiro e atual por outro.
Os princípios que orientam uma atualização coerente dos textos bíblicos geralmente
vêm enumerados e tematizados dentro dos manuais de hermenêutica bíblica. Para nosso
propósito gostaríamos de referir-nos só sucintamente a alguns destes critérios de atualização.
Para tal servimo-nos inicialmente da orientação prestada pelo manual de hermenêutica de
J.M. Martínez, que destaca seis princípios básicos para uma correta atualização de textos, a
saber:
o Que mensagem traz o texto para a comunidade da qual faço parte e para
a igreja à qual pertenço e na qual procuro viver o discipulado? A
comunidade e igreja estão vivendo sua mensagem? Que resistências e
dificuldades apresentam elas frente às propostas do texto?
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
STUART, Douglas. Manual de Exegese bíblica Antigo e Novo Testamento. São Paulo: Vida
Nova, 2008.