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oath A EDUCAGAO COMO DIREITO CONSTITUCIONAL Visdo de um Educagao, direito de todo: Gestor Publico Professor Ms. Moacir Feltosa, Economista, Professor do Departamento de Economia da UFMA, Secretario Municipal de Educagao de Sao Luis/MA |A declaragao do Direito & Educagao ¢ particularmente detalhada na Constituigéo Federal da Republica Federativa do Brasil, de 1988, representando um salto de qualidade em relagao ao sistema constitucional anterior, sendo mais precisa ‘em sua redacao quanto ao conceito, principios, objetivos, preceitos, organizacao do sistema e financiamer {o, introduzindo, até mesmo, instrumentos juridicos para a sua garantia (OLIVEIRA, 1998). Etetivamente, a CF/88, enuncia o direito & educagao como um direito social (art. 6.°); especifica a competéncia legislativa (arts. 22, XXIV e 24, IX); dedica toda uma parte do Titulo da Ordem Social ao tema (arts. 205 a 214), definindo responsabilidades para 0 Estado e para a familia, talando do acesso e da qualidade, organizando o sistema educaci- ‘onal, vinculando 0 financiamento e distribuindo encargos e ‘competéncias para os entes da federagao (RAPOSO, 2002), Além do regramento minucioso, a grande inovagao do modelo constilucional de 1988 em relagao ao direito & educagdo decorre de seu cardter democralico, especial- mente pela preocupacéo em prever inslrumentos vollados para sua efelividade (RAPOSO, 2002). © Direito a Educagao na Constituigéo de 1988 Conceito Para Celso de Mello 0 conceito de educagao “é mais abrangente que o da mera instrugao. A educacao objeliva Propiciar a formacao necessaria ao desenvolvimento das aptiddes, das potencialidades e da personalidade do edu: ‘cando. O proceso educacional tem por meta: (a) qualificar 9 educando para o trabalho; (b) preparé-lo para 0 exercicio ‘consciente da cidadania. O ‘acesso & educagao é uma das formas de realizagéo concreta do ideal democratico” (MELLO, 1986. p. 533). Andlise dos Dispositivos Constitucionais 1. Educagao: Direito Fundamental e Direito Social (art. 6.°) A declaragao do Direito & Educagao surge no rol dos Direitos Sociais presentes no artigo 6." da Consliluicao, sendo de se observar que lal evento é inédito na Historia Constitucional brasileira. De fato, ¢ a primeira vez que se explicta a declaragao dos Direilos Sociais, destacando-se, com primazia, a educacao. Tal previséo merece acurada andlise, na medida em que se torna essencial, para captar toda ‘a dimensao do direito a educagao, silud-lo previamente no contexio dos direitos sociais, econdmicos e culturais, os chamados di reitos de 2° dimenséo, no Ambito dos direitos humanos ou fundamentais. Com efeito, so direitos que encontram seu funda- mento de validade na preservacao da condigao humana. Sao direitos reconhecidos pelo ordenamento juridico como indispensaveis para a propria manutengao da condigo humana. O sentido do direito & educagao na ordem constitucio- ‘nal de 1988 esta intimamente ligado ao reconhecimento da dignidade da pessoa humana como fundamento da Rept- 411 FUNDAMENTOS LEGAIS E TEORICOS DA EDUCAGAO biica Federativa do Brasil, bem como com os seus objet- vos, especificamente: a construgao de uma sociedade livre, justa e solidéria, o desenvolvimento nacional, a erradicagao a pobreza e da marginalidade, reducao das desigualda- des sociais e regionals © a promogao do bem comum Numa palavra, o tratamento constitucional do direito educagao esta intimamente ligado a busca do ideel de igual- dade que caracteriza os direitos de 2* dimensao. Os direi {os socials abarcam um sentido de iqualdade material que se realiza por meio da atuagdo esiatal dirgida & garantia de padrées minimos de acesso a bens econdmicos, sociais © Culturais a quem nao conseguiu a eles ter acesso por mei- 8 proprios. Em iltima andlise, representam o olerecimen- to de condigdes basicas para que 0 individuo possa efetiva- ‘mente se ullizar das liberdades que o sistema the outorga. Nesse contexto, oportuno tragar em linhas gerais a distingao entre a perspectiva subjetiva e objetiva dos direi- tos fundamentais. A idéia atrelada & perspectiva subjetiva dos direitos fundamentais, segundo Sarlet (1998, p. 152), consiste na “possibilidade que tem o titular (..) de fazer valer judicial ‘mente os poderes, as liberdades ou mesmo o direito de ‘ago ou as apdes negativas ou positivas que the foram ou- torgadas pela norma consagradora do direito fundamental em questao”, Essa perspectiva tem como referéncia a {un- ‘go precipua dos direitos fundamentais, que consiste na protego do individuo. A perspectiva objetiva implica o reconhecimento dos direitos fundamentais como “decisées valorativas de natu- Teza juridico-objetiva da Constituigo, com eficacia em todo 9 ordenamento juridico @ que fornecem direlrizes para os 6rgdos legislativos, judiciérios ¢ executives" (Sariel, 1998, .140). Transcende-se a dimensdo de protegao do indivi duo, implicando nova fungo para os direitos fundamentais, que abrange a tulela da propria comunidade. A dimensio axiolégica dos direitos fundamentais im- plica a adogao do ponto de vista da sociedade na valoracao da eficacia’ dos direitos tundamentais. O reconhecimento social coloca-se como elemento condicionante do exerci- clo de direitos fundamentais. Dai decorre inegavel limita- (940 dos direitos fundamentais em ua perspectiva individu al quando contrapostos ao interesse da comunidade, pre- Servando-se, em todo caso, 0 seu niicleo essencial Além disso, da perspectiva objetiva decorre o cardter Vinculativo dos direitos fundamentals em relagao ao Esta- do, impondo-Ihe o dever de promover sua concretizagao, A perspectiva objeliva representa a autonomia dos di reitos fundamentais, apontando Sarlet (1998, p.145/147) ‘como principais coroiarios a sua eficacia irradiante, ou seja, a capacidade de servir de diretrizes para o entendimento do direito infraconstitucional, constiluindo modalidade de in- terpretaao conforme a Constituigdo; a eficacia horizontal, que implica na oponibilidade de direitos fundamentais nao 86 frente ao Estado, mas também nas relagées privadas: a ‘conexao com a temética das garantias instilucionais, lraduzidas como 0 reconhecimento da relevancia de deter: minadas instituigdes piblicas e privadas, através de prole- {go contra intervengdo deletéria do legislador ordinario, que ‘Ao obstante, se mostram incapazes de gerar direitos indi- viduais; criagao de um dever geral de prolecao do Estado voltado para'o efetivo resguardo dos direites fundameniais ‘em carater preventivo, tanto contra 0 proprio Estado, como contra particulares ou mesmo outros Estados e, finalmen- te, a fungao dos direitos fundamentais de aluar como pardmetro para criag&o e conslitui¢ao de organizagées es- fatais, No contexto da sociedade da informagao e da globalizagao, o trago de direito fundamental do direito & edu: cago se acentua. Sob a perspectiva individual, potencializa- lade direla pelo cidadao e no plano objetivo FUNDAMENTOS LEGAIS E TEORICOS DA EDUCAGAO: solidifica-se o dever do Estado em promover sua efetividade. Se no plano subjetivo se resguarda 0 desenvolvimento da personalidade humana e mesmo a qualificagao profissio- ral, no plano objetivo o direito & educagao se afirma indis- pensavel ao préprio desenvolvimento do Pais. Educagao como fonte de promogao do desenvolvimento ‘A Educagio Basica 6 composta pela Educagao Infan- |, Ensino Fundamental e Ensino Médio, ¢ tem como objet- vo assegurar a todos os brasiiros uma formagéo comum indispensavel para o exercicio da cidadania, s principais documentos que orientam a Educagio Basica sao: a Lei de Diretrizes e Bases da Educagao Naci- onal - LDB, Lei n? 9.394, de 20 de dezembro de 1996e 0 Plano Nacional de Educagao -PNE,Lei n® 10.172/2001, ‘ambos contidos e regidos pela Consiituigao da Repablica Federativa do Brasil. ‘A.LDB tem como fung&o regularizar em ambito nacio- nal as questdes basicas educacionais como: a carga hora fia, a base comum do curriculo, as formas de promogao de série; cabendo aos estados e municipios normatizarem-as de acordo com as suas peculiaridades locais e regionais. © PNE cria metas nacionais decenais para todos os is de educago, que serviréo de base para que os mu- nicipios e estados criem planos compativeis a fim de al- cangarem as metas. (© grau de instrugdo da populagao é um requisito es- sencial que garante 0 exercicio da cidadania e promove a igualdade de oportunidade na sociedade. © acesso ao Ensino Fundamental ja esta praticamento: Universalizado (97% das criangas e adolescentes entre 7 & 14 anos freqdentam a escola). Mesmo assim, a média de ‘anos que o aluno permanece na escola ainda esté muito baixa no pais, sendo 6,8 a média de anos de estudos em 2004, ao passo que neste mesmo ano a obrigaloriedade era de 8 anos. Hoje em dia esta obrigatoriedade esté em 9 anos, esta mudanga foi feita com o intuito de acompanhar os de- mais paises, tanto os j4 desenvolvidos, como os em pro- cesso de desenvolvimento, ja que 6 comprovado que a edu- cago esta diretamente relacionada com o desenvolvimen- lo ‘socioeconémico da nagao, sendo a Educagao um dos fatores que compée o indice de Desenvolvimento Humano (IDK). Nota-se que quanto maior a média de anos de estu- do da populago, maior 0 sucesso socioecondmico do pals. No Brasil existem diversas desigualdades educacio- nais, Desigualdades estas entre esiados e regides, faixa flaria, ragas e entre areas urbanas e rurais. Varios so os problemas que atingem o campo edu- cacional, como exemplos temos: a baixa qualidade da Edu- cago Basica; a questao do anaifabetismo que atinge cerca de 11,2% da populagao brasileira (sendo esta uma taxa muito Superior & taxa argentina @ chilena); além do acesso testrilo aos niveis de ensino ndo obrigatsrios: infantil, mé- dio e superior. (RADAR SOCIAL 2006) Através de resultados obtidos pelas avaliagbes reali- zadas pelo Sistema Nacional de Avaliagdo da Educagao Basica (Saeb) em 2003, revela-se que a Educagao Basica ainda esté com o desempenho inadequado, mesmo tendo uma melhoria em relacdo aos anos anteriores. Isto estd relacionado com a qualidade do ensino, mostrando que os, alunos néo estéo sendo adequadamente allabetizados. Varios fatores contribuem para a precéria qualidade do ensino no pais, sendo estes fatores tanto internos como extemos escola, como por exemplo: as condigdes socioeconémicas das familias das criangas, que as levam muitas vezes a lerem um mau rendimento escolar ou até 112. seth mesmo a largarem os estudos para se dedicarem ao tra- balho; a falta de preparo da prépria escola para lidar com estudantes sem o “capital cultura’; a ma remuneracdo dos professores que acaba por desestimulé-los em suas fun- ($628; entre outros. Por isso é necessarlo que se faga cumprir todos os incisos do Art, 214 da Constituigao da Republica Federativa do Brasil, que do as condigdes necessarias para o desen- volvimenio do ensino em seus diversos niveis. Os incisos de | ao V contém respectivamente o seguinte: erradicarao do analtabetismo; universalizacdo do alendimento escolar; melhoria da qualidade do ensino; formacao para o traba- Iho; promogao humanistica, cientifica e tecnolégica do pais. Esles incisos colocados 100% om pratica levara & erradicacao dos problemas do campo educacional e con- seqienlemente contribuird para 0 desenvolvimento socloeconémico do nosso pais, promovendo assim a igual- dade de oportunidade na sociedade. Educagao: um direito que ainda se ‘mantém fundamental Por Monica Herman Caggiano © ingresso no século XX! passou a demandar especi- al atengo diante de uma série de inovadores conceitos a impactar 0 mundo filosofico, juridico e politico. Novas ideias, nova terminologia, enfim, um cendrio que passa a abrigar as figuras da “desconstrugao", do “logocentrismo", do “neoconstitucionalismo”, etc. Um panorama em que o pragmatismo anuncia o fim das ideologias, da historia e da Utopia. E, nesse ambiente, emerge o debate sobre a relalivizagao ou, até mesmo, o fim dos direitos fundamen lais. E 0 que, registra com perspicacia, Costas Douzinas: *O fim dos direitos chega quando eles perdem o seu fim utépico". Em verdade, os direitos fundamentais representam uma das mais nobres inslituicbes oriundas da politica libe- ral. Encampados pelo constitucionalismo, esse movimen- to 08 alberga como um de seus mais proeminentes ele- mentos. A seu tuino, a doutrina que vem sendo construida ‘em seu entomo continua configurando, talvez, 0 mais rele- vante dos segmentos da teoria constitucional, certamente aquele que maior preocupagao e esforco requer para a sua permanente atualizacao ¢ o atingimento de elevados niveis, de eficdcia, No entanto, ainda que transcorridos mais de duzen- tos anos do impacto das primeiras declaragdes de direitos @ apesar dos inimeros documentos internacionais direcionados & protegao dos direitos fundamentais, direi- tos do homem e do cidadéo, certo é que pouco se avangou ‘em termos faticos. A imprensa e a midia se encarregam de denunciar, cotidianamente, profundos pontos de vulnerabilidade: discriminagao racial, discriminagao da mulher, discriminagao religiosa, a educacao contemplando poucos (uma elite); enfim, uma colegao de atrocidades que Penelram neste século e que desautorizam perder a bus- sola da utopia que impulsiona a luta em prol de um sistema cada vez mais aprimorado de tutela desses direitos, O direito & educago, nesse conturbado contexto, con- quanto venha trlhando uma espinhosa trajetéria, surge como um dos mais significativos direitos a impor defesa, exatamente por se apresentar como condigéo insuperavel para se alcangar a cidadania, o status civitatis que iré con- correr para a insercao do individuo, coneretamente, na so- iedade e no mercado que lhe é préprio. Na aldeia global que descortina grupos € forgas sociais em continua com- Petigdo, parece-nos que a atual tarefa dos homens consubstancia-se em edificar um sistema de tutela mais adequado e preordenado & elicaz delesa do direito & edu- ‘cago e, primordiaimente, a promogao da educacao, inciu- sive pelo direito, Dai o renovado interesse no debate sobre esse ‘especialissimo topico. O seu adequado enquadramento num mundo atingido pelo processo de globalizagao nao ha {que ignorar um recrudescimento de aliludes @ @ imposi¢ao de um novo tratamento desse velho e sempre presente pro- blema. Evolugéo e fundamentalidade do direito 4 educagao A trajetoria histérica da doutrina dos direitos humanos 6 ingicador preciso da clara preocupagao do homem — ou dos mais conscientes dos homens = com a sua instrugao. J a declaracao francesa de 1789, inroduzia no seu pream- bulo a imposiliva necessidade de se assegurar acesso & educarao © aos meios direcionados & emancipacéo ine- lectuat’e politica do ser humano, e videnciando hostlidade em relagdo & ignoréncia, ao registrar “que a ignorancia, 0 esquecimento 0 desprezo pelos direlios humanos s&0 28, Uinicas causas dos males publicos © da corrupgao dos go- vernos”. A declaraeao jacobina, também francesa, de 1793, avanga para, expressamente, envolver o tépico educago sob 0 seu brago protetor, identificando-o como “uma neces sidade para todos” (art. 22). E, ainda, em terreno francés, a Constituigao de 1848 cuida da matéria em dois diferentes arligos: ait 9, que declara aliberdade do ensino, e 0a. 13, a dispor sobre a graluidade do ensino primario Profissionalizante, Sob a égide da Declarago Universal dos Direltos do Homem, de 10 de dezembro de 1948, a instrugdo passa a ser concebida como condigao do “pleno desenvolvimento da personalidade humana e do fortalecimento do respeito pelos direitos do homem” (Art. XXVI. 2). Reparo merece, alias, 0 disposto no inciso_desse artigo, que alribui a edu: cago um peculiar sentido social, ao outorgar aos pais, tam- bém, responsabilidade pela insirucao da prole. A familia, ois, emerge como fator coadjuvante no processo educaci- ‘onal preconizado como meio operativo de garantia do direi- to a educagao. E, em 1960, emerge a primazia da promogao do dire to a educagao para todos, por intermédio de um primeiro instrument internacional, com o perfil de convengao, apro- vvado pela Unesco em 14 de dezembro. A seu turno, relevan- te marco nesse percurso, a "Recomendagao sobre a edu- cago para a compreensio, a cooperacdo e a paz interna onais ¢ a educagao relativa aos direitos humanos e as berdades fundamentais", documento resultante da Confe- réncia Geral da Organizagao das NagGes Unidas de 1974, dedicada ao tema educagao, assim a define: “Para os el tos da presente Recomendagdo, a palavra ‘educapao' de- signa 0 processo global da sociedade, por via do qual as pessoas e 0s grupos sociais apreendem a desenvolver Conscientemente, no interior da comunidade nacional e in- temnacional e em beneficio destas, a totalidade de suas ca- Pacidades, atitudes, aptiddes e conhecimentos". Em verdade, a idéia da impositiva presenga e da efetivagdo do direito a instrugdio nas sociedades politica- mente organizadas vem vinculada, cada vez mais, & propria evolugéo da sociedade, preordenada a viabilizar um clima de respeito a dignidade humana. Multiplicam-se, pois, os documentos que buscam servir de instrumento & sua ga- rantia, Nesse diapasao, dentre outros, poderiamos enunci- ar: 0 Pacto Internacional Relativo aos Direitos Econdmicos, Sociais e Culturais, de 1966; a Convengao Sobre os Direi- tos da Crianea, aprovada pela Comissao de Direitos Hi manos da ONU, em 8 de marco de 1989; a Declaragao Mundial sobre Educagao para Todos, adotada na Conferén- cia Mundial de 9 de margo de 1990, na Tailéndia, que recla- ma por uma renovacao do compromisso com a educagao, ea Carta dos Direitos Fundamentais da Unidio Européia, resultante do tratado de Nice, de 7 de dezembro de 20002, que cuida deste tema por iniermédio dos seus artigos 14 (Direito & Educagao), 21 (A Nao-Discriminagaio) 24 (Direi- 113. FUNDAMENTOS LEGAIS E TEORICOS DA EDUCAGAO tos da Crianga), buscando-se robustecer a prevaléncia do interesse da crianga e o dever das autoridades e da socie- dade na observancia dessa imposiedo de privlegiamento. Extenso 0 elenco de atos cercando 0 fortalecimento dos principios vetores do direito & educagdo, no seu status de direito fundamental; amparado por um quadto juridico- constitucional que vem Ihe assegurar, também, um siste- ma de garantias, sua fundamentalidade decorrs, primeiro, por se consubstanciar em prerrogativa prépria a qualidade humana, em razao da exigéncia de dignidade, e, depois, porque é reconhecido e consagrado por instrumentos inter: hacionais e pelas constituigdes que o garantem, O direito & educagao, destarte, inserido no nicho dos, direitos fundamentais, apresenta-se revestido das qualida- des que a estes so proprias. Esses caracteres, alias, con- ‘sagram a postura dos direitos fundamentais ©, conseqlien- temente, do direito & educagao, como elementos da essén: cia de uma constituiedo, assumindo, como anota Robert Alexy, a natureza de “direitos morals’, porquanto contam com a “universalidade” na sua estrutura e a postura de direitos de todos contra todos; a qualidade de “direitos preferenci- ais’, porquanto fundamentam, exatamente, 0 direito dos hontens a sua tutela pelo direito positivo; @ 0 carater de “{undamentalidade do interesse ou caréncia protegida’, que exige e implica na “necessidade de respeito, sua protecéo ou 0 seu fomento pelo direito”. E mais até, no mundo atual, 0 direito a educagao com- parece nas suas duas facetas (como direito de primeira e de segunda geragao), enquadrado como uma realidade social @ individual, Insutlado e robustecido pelos caracteres de indole coletiva, extraidos das duas ultimas geragdes de direitos, vislumbra-se o direito & educacdo com contetido multfacetado, envolvendo nao apenas 0 direito a instrugao ‘como um processo de desenvolvimento individual, mas, também 0 direito a uma politica educacional, ou seja, a um Cconjunto de intervengdes juridicamente organizadas @ exe culadas em termos de um proceso de formacao da socie- dade, visando oferecer aos integrantes da comunidade so- cial instrumentos para alcangar os seus fins. O direito a educagao e a realidade brasileira Em teritério doméstico, brasileiro, 0 diteito @ educa- 40 fol acolhido desde a primeira das consiuigdes, a im- Berial de 1824. inaugura sua presonea sob a roupagom répria da época, ou seja, preconizando-se “a gratvidade a ensino primario a todos 0s cidadaos" (art. 179, inciso 32) e a inslalagdo de “colégios @ universidades, onde se- ‘do ensinados os elementos das cléncias, belas-artes © aries" (ar. 179, inciso 33). A Constitugéo republicana, de 1881, cuida desse tema no capitulo devicado & declaracso dos direitos, preconizando no seu art. 72, § 6°, de forma Tacénica, “a laicidade do ensino ministrado nos estabelec mentos piblices". O documento constitucional de 1934, no qual esiréiam os direitos sociais © econémices, dedica & educagao um capitulo a parte e a erige a direito, nos termos do seu art. 149. O texto de 1937 ampla 0 tratamento da quesiao educacional, acentuando a necessidade de lutela da infancia @ da juventude, Dedica ao toma os artigos 129, 130 0 131, instalando “a obrigatoriedade. do ensino prima: @ forialécendo a garantia da graluidade".A Garta de 1957, no entanto, do papel nao salu, Nunca fo! apicada om razao de sua suspensao, na conformidade da regra permissiva Contida no seu art. 171, uma norma a viabilizar a instalagao 4 period autortio de Getdio Vargas entre nés. A Cons: tiuipdo de 1946, a seu tummo, cuidou do tema, mantendo a edubagdo no statis de direito de todos, alem de "se Insp far nos principios de liberdade de solidariedado humana (en. 166). Reconheceu, ainda, a liberdade de inclativa do paricular, fortalecendo a garantia do ensino privado (art 167). a Consttuigso de 1867, esta com a Emendan. 1/69, tratou da educagao no seu Titulo IV, sob a rubra “da fami: FUNDAMENTOS LEGAIS E TEORICOS DA EDUCAGAO—— 08 dificulta o acesso & educagdo escolar no campo. Se- undo pesquisadora da UnB, de 2,3 vagas existentes nos {anos iniciais do ensino fundamental, apenas uma ¢ ofere- ciida para os anos finais. Ela aponta que "esse mesmo raci- ‘ocinio pode ser feito com relagao ao ensino médio, quando a siluagdo é mais grave, com Seis vagas nos anos finals do ‘ensino fundamental para uma vaga no ensino médio". Como resultado, temos uma taxa de analfabelismo de 23,3% no campo, trés vezes maior do que o das areas urbanas, de 7,6%. Paralelamente, a escolaridade média das pessoas com mais de 15 anos 6 de 4,5 anos, comparados aos 7,8 anos no meio urbano. Nas palavras de Ménica Molina, ‘a efetiva promocao da equidade educacional com garantia de acesso e permanéncia com sucesso e qualidade, em todos os niveis de ensino, para as populagées do campo, requer a adocao de politicas @ programas que sejam capa- zes de traduzir, na pratica da aco do Estado, os principios da igualdade formal e material presentes na Constitui¢ao Federal Brasileira de 1988", Dessa forma, é possivel dimi nuir a grande diferenga entre a abrangéncia do sistema de ensino rural e utbano e proporcionar a todos direito iguali- trio @ educagao. E 0 que dizer dos cidadaos brasileiros mais distantes das escolas utbanas néo apenas geograficamente? O que dizer da educagao para populagbes que, mullas vezes, per manecem isoladas por fatores culturais e histéricos, que datam da ocupagao das terras brasileiras pelo colonizador, europeu? Segundo lara Taliana Bonin, pesquisadora e pro- fessora da Universidade Luterana do Brasil, existem hoje ‘no Brasil duzentos © quarenta povos indigenas diferentes, falando aproximadamente 180 linguas. Esses indigenas, pelo censo do Instituto Brasileiro de Geogratia e Estatistica (IBGE) de 2000, somavam 730 mil pessoas, e devem ter chegado a um milhdo este ano. Para lara Bonin, educacao de qualidade " para alguns povos isolados é aquela que se pratica em suas culturas e tradiedes". A escola, para esses. grupos, pode oferecer formas de acesso a alguns conhec Mentos necessérios, de modo que essas populagdes se relacionem com grupos de seu interesse, como comerc- antes, instituigdes civis ou até mesmo érgdos governamen- fais, como a Fundagao Nacional do Indio (Funai). lara Bonin, enfatiza que a populagao indigena brasileira vive em con- lexios sociais e cullurais bastante distintos. Alguns grupos tiveram contato permanente com os conquistadores euro- pus desde 0 inicio da colonizagao, enquanto que outros ‘grupos permanecem pralicamente isolados alé os dias de hoje. Segundo Bonin, para que a educagao indigena seja especifica e de qualidade, as escolas indigenas devem ter seu proprio sistema de regras e ordenamento juridico, além de autonomia administrativa e financeira. Assim, os povos paderiam organizar um sistema de educagéo compativel com suas tradigdes e costumes, como previsto na Const luigdo Federal Brasileira. Ela considera que uma dotacéo orgamentaria especitica seja necessaria para o funcion mento dessas escolas, que garanta formagao e capacitacao dos professores indigenas. Embora a Conslituigo de 1988 tenha garantido o di- reito a educagao para as populagSes indigenas, durante nossa histéria 0 respeito as diferencas @ tradigdes cultu- rais dos povos indigenas nem sempre foram levados em consideragao. Na avaliagdo de Gersem Baniwa, coordena- dor geral de educagao escolar indigena, “historicamente, © governo nao teve a preocupagao de respeilar as culturas focais, mas essa postura vem sendo modificada nos ulti- mos vinte anos”. Por conta desse alraso, parcerias de res- ponsabilidade partithada entre governo © comunidades in- digenas demoram um pouco para se desenvolver plena- mente. Baniwa acredita que o Estado brasileiro tem que estar mais presente, pois “muitas politicas sao pensadas para cidadaos com perfil diferente dos indigenas, ndo so pensadas para a sua realidade”. Para ele, o programa Ter- ‘itérios Etnoculturais, da Secretaria da Educagao Continua- da, Allabetizagao e Diversidade (Secad) tem procurado olhar 116. para essas realidades, mas 6 um processo a médio prazo. Ele enfatiza, ainda, que hoje, por exemplo, 95% dos protes: sores nas escolas indigenas sdo indigenas, ou seja, os professores néo-indigenas, aos poucos, vo sendo subs! tuidos por professores indigenas. O que explicita que oxis- te um estorgo do Estado, a0 longo dos uillimos governos, em consolidar as politicas e acdes criadas. lara Bonin também concorda que a legislagao exis- tente hoje no Brasil, que visa garantir 0 respeito as formas de educagao, tradi¢ao, crengas, linguas e costumes indige- nas, 6 bastante avangada. Entretanto, ela enfatiza que ha“ desrespeito a esses principios legais. No cotidiano da maioria das escolas indigenas, constata-se 0 descaso, 0 abandono e [alta de investimenios governamentais”. Bonin responsabiliza parte do problema a falta de preparo profi sional nas administragdes locais e regionais dos sistemas ublicos, e & alitude autoritaria de secretarias de educagao municipais e estaduais nas relagdes com as escolas ind genas. Os esforgos para o estabelecimento de politicas edu- ceacionais, que leven em conta as diferentes culturas, como as indigenas, por exemplo, tém se mostrado um exercicio lento e, por vezes, frustrante para as populagdes que espe- ram ser atendidas. lara Bonin acredita que “os povos indi- genas t8m o direito de partcipar néo apenas exercendo 0 Controle social, como também na definicéo, organizacao ¢ ‘estruturaggo das pollicas educacionais", para que essas reflitam 0s seus “interesses, necessidades e projetos de futuro”. Esse deveria ser, na opiniao de Bonin, o caraler da | Conferéncia Nacional de Educagao Escolar Indigena, que sera realizada em outubro deste ano. “Espera-se que’ seja tum amplo férum de discussdes, avaliagdes e deliveracoes, sobre as polilicas publicas de atencdo diferenciada @ edu: cago", que possibillem "aos povos indigenas o direito de sefom protagonistas na formulagao de novas propostas’. Segundo os entrevistados. 0 problema educacional para as comunidades das zonas rurais, seja para filhos de Agricullores, de assenlados da reforma agraria ou de indi- ‘genas, persiste e esta longe de se extingulr. Com eleito, um estudo elaborado para o inep/MEC, e coordenado por Alvana Maria Bot, aponia que ‘a maior parte dos municipios bra leiros nao’ desenvolve agées especiticas em relagao a pro- vis&o educacional nas Zonas rurais", seja para filhos de agrcultores, de assentados da reforma agraria ou de in sgenas. Destaca-se no estudo que, para além das cidades, Porsiste a esiratégia da nucleacdo, que consiste na desalivaao de escolas rurais menores e na criagao de escolas-polo, com o transporte das criancas para essa escola, ou, simplesmente, o transporte das criangas que residem nas teas rurais para escolas existentes no nu: cleo utbano. Alsm de problemas de ordem logistca ¢ finan- ceira, essa estratégia parece gerar também problemas pedagégicos, particularmente no que concerne a qualida de da escola @ do ensino e as relagdes do curriculo com valores cullurais das comunidades énvolvidas. Ha consenso, entre os entrevistados, de que é neces- sério conjugar esforgos dos governos federal, estaduais e Municipais e da sociedade para desenvolver estratégias ‘educacionais adequadas, para reverler a situagao de ca- tencia @ iniguidade exislente em relagdo a educagto de criangas e jovens que residem em areas isoladas do Bra- sil. Fonte: - hltov/www webartigas.comvartcles/ -de- direito-constitucional-sobre-a-educacao-basica-no-brasil/ pagina I html -http-//www.comeiencia.br/comciencias 2section=B4edicao=498id=608 -http://www.oei.es/divulgacioncientiticas teportaies020.him of Hi PRINCIPIOS FILOSOFICOS DA EDUCAGAO ESCOLAR BRASILEIRA A reflexao filosofica na educacao Resumo Na disciplina de Filosofia da Educago atuo com alu- nos dos mais diversos cursos que néo pretendem, via de regra, dirgir seus estudos para uma formacao filosética especializada. Este texto ¢ parte de minhas experiéncias ocentes na disciplina de Filosofia da Educagao. Experién- Gias relatadas e posteriormente discutidas com os demais professores do Departamento de Filosofia da Universidade e Caxias do Sul proporcionaram-me a oportunidade de elaborar esta rellexdo visando ampliar a discusséo, envol- vendo os alunos das licenciaturas. Este texto tem a propos- la de questionar as reais necessidades de um ensino vol- tado para uma reflexao rigorosa e radical que permitiia passar-se do senso comum a uma alilude filosdfica pela {qual o professor poderia adquirir ou reformular pressupos- tos e conceitos que fundamentem uma boa argumentagao ocente sinalizando com novas perspectivas para a forma- 940 de professores em nossas licenciaturas. Recorrendo & Fistéria da Educagao no Brasil e a conceltes gerais de Edu cago @ Filosolia, exponho elementos para amplar a cis- cusséo e justificar o estudo da Filosofia da Educagdo nas escolas de formagao de professores. Palavras-chave: Educagao // Filosofia // Formagao de Professores © oficio docente na disciplina Filosofia da Educagao pressupde dialogar com alunos de diferentes cursos uni- versitarios, especialmente nas Licenciaturas, que ndo pre- tendem, em geral, dirigir sous estudos para uma formagao filosética mais especializada. No entanto, o exercicio da rellexdo poderé contribuir para o desenvolvimento de uma geragao de educadores conscientes dos temas que envol- ‘vem suas ages na educagao, com a capacidade de formu- lar de maneira reflexiva suas questées e de procurar ele- mentos proprios para sua solugao. Tenho procurado junto ‘20s meus alunos a cada inicio de semesire, buscar conce!- los de Filosofia trazidos de sua escolarizagao basica ou da vivancia na pratica escolar, ou ainda, no dia-a-dia. As res postas, obtidas junto a calouros, em sua maioria, demons- tram que a Filosolia 6 pouco conhecida conceitualmente & vista de maneira muito distinta por aqueles que nao convi- vem com 0 pensamento filosético. Com relacdo a cénsulta, respostas como: “néo sei, ‘nada conhego de Filosofia, “é a ndo aceilagao de uma res- Bosla Unica ‘esta presenie no cardia’ algo novo que {gostaria de conhecer’; © estudo do conhecimento", tei de Filosofia’; “estuda os grandes pensadores”, trazem davidas em relagao aos objetivos e eficiéncia do estudo da disciplina no Ensino Fundamental e Médio e poderiamos nos interrogar aqui, a respeito de como é tralada a Filosofia no Brasil Historicamente a influéncia estrangelra trouxe consi- go a dominagdo cultural. A preocupagao dos pensador pola colonizagao de nossa cultura, fol estranha em relagao 8 ela. A filosofa assim praticada no Brasil nao reflete estu- dos dos problemas internos tomando-a distante da reali dade, Provavelmente o desinteresse dos estudantes das, Licenciaturas, de um modo geral, possa se evidenciar por ‘no se vollar a Filosofia para os problemas hisléricos da vida do pais, dentre eles 0s politicos, 0s educacionais e os relacionados & propria educagao, produzindo estudos abs Aeatas,-istantes.e de difici compreensao. 117. FUNDAMENTOS LEGAIS E TEORICOS DA EDUCAGAO ‘Como entdo motiva-los a éstudar uma disciplina que, na compreensdo da maioria iniciante, vive retirada do mun: do, distante do conereto, do cotidianio, estando disponivel para "preencher curriculo"? Poderlamos nos interrogar so- bre a fungao da Filosolia no proceso educacional e nos, processos de ensino © aprendizagem. Poderiamos também estabelecer relagdes entre os, sistemas filosdficos e as teorias educacionais e ainda como nos atos de ensinar @ aprender se efeliva o ato de educar e como educar, na compreensao de Santos, “implica uma dimensao radicalmente ética e politica” (2004, p.46). Para que se estabelegam essas relagdes poderia- mos iniciar pasando da alilude do senso comum para uma aitude retlexiva, critica e filoséfica. A Filosofia da Edu- cago ndo se limita apenas ao estudo de textos flosoficos pols poderia, num primeiro momento, afastar a compreen- S80 © 0 direcionamento para estudos mais abrangentes. A ela cabe entao investigar as quesioes relevantes que di- zem respeilo a um que-lazer humano: a educagao. E tam bém por ela que o educador poderd adquiric pressupostos @ conceitos, gerals ou especticos, que fundamentem uma boa argumentagao docente, passando da educagao do senso comum para uma alilude critica e filosdfica em rela- 40 as questdes que envolvem o ensino e os processos Sducacionais. Diante da diversidade de conceitos relacionados & Filosofia registrados pelos estudantes, acredito essencial estabelecer alguns parametros para bem desenvolver a ‘compreensao do tema e entendo que 0 ponto de partida ‘estoja relacionado ao estudo das origens, do sentido e das relagdes que se possam estabelecer entre a Filosofia e a Educagao. Aeducagao ‘A educagio como meio de transmitr a visdo de mu do, num processo de perpeluacao da cultura, ja se mat festava juntamente com a formulagao das primeiras teorias Ilosétieas. Os primeiras flbsotos do Ocidente tiveram pre- ‘ocupagao com 0 aspecto educacional. Os pré-socralicos, 05 solislas, Sécrales, Plaléo e Arisioleles apresentam sua €ergumentagao no sentido do auto-desenvolvimento de cada tm a partirda educagao. ‘A educacdo para os gregos pertencia por esséncia & ‘comunidade, nao sendo propriedade individual e, sim, re- sullado da consciéncia viva de uma norma a que rege, pro- movendo a participagao na vida e no crescimento da socie- dade. Para esse povo, conforme JAEGER, Uma educagao consciente pode até mudar a nature za fisica do Homem e suas qualidades, elevando-Ihe a ca- pacidade a um nivel superior, conduzindo a descoberta de si mesmo e criando, pelo conhecimento do mundo exterior § interior, melhores formas de xisencia humana (1995, p. ). © ato de educar pode entao ser conceituado como uma atividade sistemdtica de interagao entre seres soci- ais, ocorrendo essa interagao lanto no nivel do intrapessoal como no nivel da influéncia do meio, interagao essa que se configura numa agdo exercida: sobre sujeitos ou grupos de sujaios visando provocar neles mudangas tao eicazes que 08 tornem elementos alivos desta propria agao exercida (ARANHA, 2002, p. 50). Polo seu trabalho 0 homem faz cultura. Transforma a nalureza e a si mesmo. Mediante a educagao aperfeigoa suas alividades, fator para sua humanizagéo e socializa- 0. A educagao nao consiste apenas na transmissao des- Sa heranga cultural, mas num processo de constate ruptura e de reorganizagao do velho. Vida e educagao estao imbricadas, sem antecedéncia ou posterioridade, aos de- mais fenémenos como o social, 0 politico e o cultural. A feducacao pode entao sor também entendida como elemen- {o integrado ao processo social e histérico nao permitindo seu distanciamento da familia e da sociedade. FUNDAMENTOS LEGAIS E TEORICOS DA EDUCA¢AO————_———.. A educagdo esta em todos os lugares, dentro e fora da escola. O texto de Brandao diz bem dos lugares de presen- ga da escola: Ninguém escapa da educago. Em casa, na rua, na igreja ou na escola, de um modo ou de muitos,todos nés envolvemos pedagos da vida com ela: para aprender, para ensinar, para aprender-e-ensinar. Para saber, para lazer, ppara ser ou para conviver, todos os dias misturamos a vida com a educagao (2001, p’7) A escola nao tem o privilégio de lugar Unico para a tarefa da edueagao formal por nao poder ignorar a cultura do aluno, compreendenda 0 mundo e 0 meio em que vive. Vista como fato isolado, a escola e a educacao esto muito provavelmente no centro das crises observadas no ensino 0 longo das uilimas décadas. Das experiéncias iniciais tragmentadas e contusas 0 ‘educando vai ser levado @ um proceso de organizacao dessas experiéncias possibiltando-Ihe 0 desenvolvimento integral que ¢ 0 de sua capacidade fisica, intelectual e mo- ral visando desenvolver habilidades, o cardter e personali- dade social. Na Grécia antiga a educagao passou do pre- parar 0 guerreiro para a formagao do cidadao. Para Aristételes a educagao deve ter fim pacifico e a “educagao das criangas se revela um dos primeiros cuidados do le- gislador" (1991, p.68). Na Idade Média os valores terrenos eram submetidos. 0s divinos, considerados superiores. Quais seriam os fins, da educagao no mundo de hoje? A educacao vem perpas- sando milénios com 0 objetivo de formar o homem para assumir-se integralmente, portanto, autogovernar-se. A aulogestéo ¢ a “tradugdo moderna da Paidéia” (GADOTTI, 1995, p.107). Na educagao antiga havia a preo- upagao com a formagao do homem integral. Na moderna, para Gadott (1994), "0 pressuposto basico 6 a hegemonia, 2 universalizacao de sua visio de mundo. O pressuposio basico da educagao pés-modema é a aulonomia, capaci- dade de autogoverno de cada cidadao” (p.32). Para Rousseau os objetivos da educagéo compor- tam dois aspectos: o desenvolvimento das polencialidades naturais da crianga @ seu afastamento dos males sociais. A ‘eduucacao deveria ter ares progressisias, de forma que cada etapa do proceso pedagégico devesse ser adaplada as necessidades individuais do desenvolvimento. ‘Quem ¢ 0 educador e quem é o educando no contexto escolar? Como docentes nos perguntamos em algum mo- ‘mento do olicio o real significado dessa atividade ou, ainda, quem & 0 educando e qual o seu papel no processo de construgao do conhecimento? Para ser professor, para os ditigidos pelo senso co- mum basta apresentar certo conteudo, estar em sala de aula com alunos, avalié-los e administrar alguns outros aspectos como limites e disciplina. A atividade docente, segundo Luckesi tornou-se uma rolina comum, sem qué se pergunte se ela implica ou néo decisoes continuas cons- tanies e precisas, a partir de um conhecimento adequado das implicagbes do processo educative na sociedade (1994, p.97) Para Ruben Alves professores ha aos milhares e pro- fessor 6 profisséo ¢ educador ndo é prolisséo, ¢ vocacao. Para ele os educadores habitam um mundo em que 0 que vale é a relagdo que os ligam aos alunos, sendo que cada aluno é uma ‘entidade’ ‘sui generis’, portador de um nome, também de uma ‘histéria’, sofrendo ‘ristezas e alimentando esperangas. E a educagao 6 algo para acontecer neste es- ppago invisivel e denso que se estabelece a dois (1986, p. 18}. E qual entao a dimensao do educando? Na escola tradicional, como chamamos um modelo de ensino 118 vivenciado ha algumas décadas @ nao arraigado’totalmen- le de nossas escolas, 0 educando est ali para receber instrugdes, ser avaliado e aprovado ou no ao final de um periodo de estudos, aparecendo como elemento depen- dente das ages dos professores. Incapaz de criar ele ne- cessita reer e repelir conteuidos prontos, acabados, tendo ouco ou nenhum espago para expressar sua crialividade. Qual escola propicia a seus alunos a oportunidade de criagao, de desenvolvimento do seu modo de pensar para além dos conteudos didaticos? Seu campo de alua- {go © aco parece limitado por barreiras intransponiveis, ditadas por regulamentos docentes ou oriundos da entida- de mantenedora. O educando extrapola esses conceilos do senso comum. Tem inteligéncia reflexiva de dificil mensuragao, com habilidades e capacidade de conheci- mento que dependem muito de sua experiéncia de vida palrocinada especialmente pelo seu ambiente social. Com- preender o educando para propiciar-ine uma educagao para a vida requer a compreensao quanto a sua aulonomia, quan- to a sua Criatividade e quanto 4 sua capacidade de tomar decisées, Tanto 0 educador como o educando, sao suieitos ali- vos que, pela praxis se constroem ao mesmo tempo em que se alienam. Como humanos, pertencem a uma socie- dade e, ao educador, cabe o papel de criar condigdes para que o educando aprenda @ se desenvolva. Nessa perspec- tiva teriamos dificuldades para determinar com relativa pro- ximidade os fins da educagao na contemporaneidade, Que valores encontram-se hoje associados ao proceso? Para Aranha, "é inadequada a procura de fins t&o gerais, validos fem todo 0 tempo e lugar” (2002, p.51). Em sociedade com estruturas organizacionais to di- vergentes em relagao a interesses de classes, os fins no podem ser abstratamente considerados. Baseiam-se, por- tanto, em valores provisérios "que se alteram conforme al- cangamos 0s objelivos imediatos propostos e também en- quanto muda a realidade vivida’ (idem, p. 52). A Lei de Diretizes © Bases da Educacdo Nacional de 29 de dezembro de 1996 traz, em seu Tituo Il, art. 2°. Dos Principios e fins da educagao nacional, 0 sequinte texto: “A educagao, dever da familia e do Estado, inspirada nos prin- cipios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercicio da cidadania e sua qualilica: 40 para 0 trabalho”. Caberia a indagagao: em que consiste essa forma- 0? ue agdes seriam necessérias para tomé-la efetiva? bre que valores seria construida? O conceito de cidada- nia vem sofrendo mudangas. No mundo moderno exerci cio da cidadania implica na possibildade de cada individuo Partcipar das esferas da vida publica, Para propiciar essa oportunidade de vivéncia na vida piblica é fundamental que nosso jovem tenha a capacidade de refltir, tomando posi- Gao diante dos diferentes problemas que afetam a vida so- Cial e sua vida pessoal. Para SANTOS, é importante que a escola desenvalva em seus alunos habllidades de pense: mento critco, incluindo a capacidade de analiser e solucio- nar problemas. Seria ainda de fundamental importancia que, nessa escola, fossem formados valores socials relaciona: dos ao homem e & nalureza, valores que orientassem os jovens no sentido do respeito a vida humana e as dileren- gas cullurais (1997, p. 26) Outro objetivo no menos essencial ao desenvolvi- mento educativo 6 0 da re-significacao e enriquecimenio dos valores culturais @ morais comuns. Sobre esses valo- res, “os individuos e a sociedade fundamentam sua identi- dade e a sua dignidade” (TORRES, 2001, p. 19) Um programa de ensino pode ser viabilizado em uma escola a partir de uma definieao precisa de seus fins e asia implica em seguir determinada diregao. Ha a possibilidade de distinguir-se o individual do coletivo, © pablico do priva- do. Existem cédigos morais que permitem essa distingao e {que possibilitam a convivéncia a partir de normas que valo- rizem o homem e o bem-estar social. O processo educativo 6 uma tolalidade e uma educagao escolar organizada e transmitida em sala de aula tem os componentes da edu- cago que se realiza na familia, na rua, na Igreja e nas comunidades. Para uma formagéo que valorize o homem @ o bem estar social ¢ imporlante que a escola se organize como lum amplo espaco para estudos, como espago democrati- co, possibilitando pelo dilogo e pelo questionamento crit- co, uma educagao efetivamente emancipatoria compreen dendo que ela é uma forma de intervengo no mundo. Intervengao que nos dizeres de FREIRE, além do co- nhecimento dos conteudos bem ou mal ensinados e/ou aprendidos implica tanto 0 esforgo de reprodugao da ideo- logia dominante quanto 0 seu desmascaramento. Dialética Contradiléria, nao poderia ser a educagao s6 uma ou sO a ourta dessas coisas. Nem apenas reprodutora, nem ape- nas desmascaradora da ideologia dominante (1997, p. 110- 1m) Se pretendermos construir um projeto educacional comprometido com a formagao do aspectos do curriculo da formagao de professores ganham importancia. Dentre eles esta'0 falo de que 0 curticulo néo apenas dissemina ‘9s conhecimentos repassados em diversas disciplinas mas forma objetividades ao criar predisposigdes e formas de raciocinio, Qual entao o sentido de uma Filosofia da Educagao? Em que a Filosofia poderé nos auxiliar na compreensao dessa atividade estritamente humana e entender o fené- ‘meno da educagdo? Para uma reflexdo inicial necessitaria- mos revisitar alguns conceitos de Filosofia. Por uma filosofia na educagao No inicio de todo estudo de Filosofia surgem inevita- velmente indagagdes sobre o que ela é. Ao buscarmos con- ceilos percebemos a existéncia nao apenas de um, mas de varios significados alribuidos a Filosolia apresentando, num pprimeiro momento, respostas que parecem contradizer-se. (0 que é entao a Filosofia? Se perguntarmos a dez fisicos ‘o que é a fisica”, eles responderdo, provavelmente, de maneira parecida. O'mes- ‘mo se passara, provavelmente, se perguntarmos a dez qui- migos °o que 6 a quimica?’, Mas se perguntarmos a dez fildsofos ‘0 que é a flosofia?, ouso dizer que trés ficarao fem siléncio, tr8s darao respostas pela tangente, e as res- posias dos outros qualro vao ser to desenconiradas que 86 mesmo oulro fildsofo para entender que 0 siléncio de Uns e as respostas dos outros sao todas abordagens pos- siveis @ questao proposta (REZENDE, 1992, p.12) ‘Segundo a tradi¢ao a palavea “flo-sofia’ teria sido cri ‘aco de Pitégoras. Para REALE, o termo foi certamente cu- nhado por um espirito religioso que pressupunha sé ser possivel aos deuses uma sofia (sabedoria), ou seja, uma posse certa @ tolal do verdadeiro, uma continua aproxima- ‘s40 ao verdadelro, um amor ao saber nunca saciado tolal- Mente, de onde, justamente, 0 nome ‘filo-sofia’, ou seja, ‘amor pela sabedoria (190, p.21). Iniciaimente a Filosofia pretende explicar as coisas, ‘em sua tolalidade, toda a realidade, sem excluir partes ou momentos dela. A Filosofia, quanto a0 método, visa a ser ‘uma explicagao racional para aquela totalidade e seu obje- tivo esta no desejo de conhecer e contemplar a verdade. A Filosofia grega ¢ 0 amor desinteressado pela verdade. As disparidades dos conceitos tratadas em ABBAGNANO (2000, p.442) raduzem uma variedado de sig- rificages e, segundo o autor, o que mais se presta a rela- 119. FUNDAMENTOS LEGAIS E TEORICOS DA EDUCACAO cionar e articular as diferentes concepgdes do termo esta ‘em Platao (Eutidemo):"8 0 uso do saber em proveito do homem".. No livro Convite a Filosofia Marilena Chaui traz pelo menos quatro definigdes gerais do que seria a Filosofia 1) Visio de mundo de um povo, de uma civilizagao, de uma cultura. Identificando aqui Filosofia e Cultura poderiamos definir Filosofia como um Conjunto de idéias, valores ¢ praticas pelas quais, a sociedade aprende e compreende o mundo ea ‘si mesmo, definindo tempo e espago, o sagrado @ 0 profanio, o contingente @ 0 necessario, etc. ‘Sabedoria de vida onde a Filosofia ¢ identiticada ‘com a agao de algumas pessoas que pensam sobre a vida moral, dedicando-se a contempla- ‘p40 do mundo para ‘com ele aprender e controlar Suas vidas ética e sabiamento, Esforgo racional para conceber 0 Universo como uma totalidade ordenada e dotada de sentido, iniciando-se a distinggo entre Filosofia e Religiao. 2) 3) 4) Fundamentagao teérica e critica dos conhecimen- tos e das praticas ocupando-se a Filosofia com as condigdes e os principios do conhecimento que pretenda ser racional e verdadelto; com a ‘origem, a forma e os contetidos dos valores éti- 08, politicos, culturais, etc. Filosofia 6 tomada também como uma reliexdo sobre a totalidade das coisas a partir de problemas impostos pela realidade sobre nés, os individuos, ou ainda tudo aquilo que a realidade nos coloca como seres socials, A dimensdo social de uma problematica atinge a cada um de uma forma particular, mas ao mesmo tempo alinge a todos como componentes de um grupo, de ma entidade, de uma familia (OLIVEIRA, 1990, p.16). A Filosofia tem a caracteristica, entéo, de uma reflexao buscando compreender o sentido da realidade, do homem @ suas relagdes com 0s outros e com a natureza, do traba- Iho, da cullura e da histéria do préprio homem. Indepen- dente de conceituagao, passar do senso comum para a atitude filosética significa passar de uma concepgao simplista a uma alitude reflexiva intencional, coerente, dir- indo Indagagdes ao mundo que nos rodeia e as relagées que com ele temos, E refletir significa voltar atras, significa fazer retroce- der num movimento de retorno no qual o pensamento volta- _S® para si mesmo, um repensar capaz de avaliar o “grau de ‘adequagdo que mantém com os dados objetivos de medir- se com o real” (SAVIANI, 1980, p.23). Reflelir esta ligado dessa maneira, ao relornar, examinar com cuidado e aten- G0 € “isto ¢ filosotar" (idem, p.23). Ainda no mesmo autor (p. 24-25) encontramos que a reflexdo 6 propriamente filoséfica quando ¢ “radical, rigoro- sa @ de conjunto’. Para Saviani, a Filosofia é radical pois fexige que o problema seja colocado em termos radicais, isto é, que se busque as raizes das questies, até seus fundamentos. € rigorosa, procedendo-se sistematicamen- tee segundo mélodos determinados, questionando-se as conclusées do senso comum e as generalizacdes apres- ‘sadas que a ciéncia pode produzir. A Filosofia desenvolve uma reflexdo de conjunto na medida em que é globalizante, ndo se podendo examinar um problema de modo parcial Enquanto as ciéncias examinam partes da realidade, a Fi- losofia visa atingir a totalidade. Aqui a presenga do elo entre a Filosofia © as diversas formas do agir e saber humanos: a interdisciplinaridade. © homem esté em contato com o mundo que o cerca a parlir de circunstancias, necessidades e da cultura onde FUNDAMENTOS LEGAIS E TEORICOS DA EDUCACAO- se insere tendo destaque as abordagens religiosas, do senso comum, filosoficas, artisticas, cientificas, elc. A reali- dade contatada pelo homem nao se limita apenas aos ob- jelos naturais ou artifciais, consistentes fisicamente, mas ela ¢ 0 préprio significado resultante das relacdes sociais dentro de um contexto determinado. Ao criticé-la, projeta um {uluro em que outra realidade seré construida. Para PAVIANI, a percepgdo e a transformacao da reali- dade, 0 modo de pensar, agir e sentir a realidade enquanto proceso fundamental das relagdes sociais se identifica perfeitamente como processo educacional. Isto signilica que a educagao, antes de ser uma atividade formal ¢ prolissio- nal, em outras palavras, algo distinto da realidade, algo jus- taposto a realidade, constitui-se com ela um Unico fenéme- no (1986, p. 41). A realidade pragmatica do mundo contemporaneo voltado para a praticidade e imediata aplicago dos conhe- cimentos pode identificar a Filosofia como uma ocupagao inutil, Mas é pela reflexo filosética que ao homem toma-se possivel adquirir postura diferente do agir imediato comum do colidiano. E a Filosofia que nos faz questionar e avaliar ‘com 0 necessério distanciamento os fundamentos dos alos humanos e os fins a que se destinam. Entendidas essas formulagdes, poderemos expres- sar 0 concelto que SAVIANI (1860, p. 27) expressa para a Filosofia: “uma reflexao (radical, igorosa e de conjunto) sobre os problemas que a realidade apresenta’. © mesmo ‘ulor conclu, a respeito do significado de Filosoa da Edu- cago: *Reflexao (racical, rigorosa e de conjunto) sobre os problemas que a tealidade educacional apresenta’ (p.27) © somente serd indispensavel para a formagéo do educador “se ela for encarada tal como estamos propondo” (idem). Poderiamos nos perguntar, a partir da necessidade de rellexdo para um bom exercicio da Filosofia ¢ da Educa- G0: Quais sao os fins da educagao? Para que educar? Quais os objelivos da educagao brasileira? Como ¢ possi- vel superar os condicionantes de uma educagéio nacional sabidamente problematica? O que 6 uma boa educacao? (0 que ¢ ser um bom professor? O que entendemos por uma boa aula e uma boa escola? Quais os requisitos para ‘uma formago voltada para a cidadania? Como interpreta- ‘mos as diferentes nogdes de cidadania? Quem ¢ 0 edu- cando? Quem ¢ o educador? Perguntas como essas pode- ‘iam auxiliar na construgao de um sentido critico as ativida- des docentes, fugindo do espontaneismo e do senso co- ‘mum, possibiltando uma a¢ao educacional mais coerente eeficaz. Se compactuarmos dos conceitos de Saviani em re- ago ao radical, rigoroso ¢ de conjunto na investigagao filosofica a partir dos problemas de nossa existéncia ¢ ine- vitével que, dentre eles, estejam os relacionados & educa- G0. O carater problematico da atividade educacional pode Ser mensurado a partir das questdes acima levantadas, 0 que faz da rellexao filosdfica, a prinefpio, uma necessidade ara 0 educador. Cabe ao professorffilésofo acompanhar a agéo pedagdgica de maneira a promover a passagem de lumna educacao “assistematica (guiada pelo senso comum) para uma educapao sistematizada (algada ao nivel da cons- Giéncia filosética}” (SAVIANI, 1980, p.54). Para uma ago pedagdgica mais humana como enfatizado por Paulo Freire na "Pedagogia da Autonoma” e ara uma educagao mais licida e coerente, os envolvidos No proceso de formagao necessitam acompanhar critica e rellexivamente a alividade educacional para explictar a res- peito de que homem se quer formar e dos pressupostos de apropriagao © construgdo do conhecimento que esto subjacentes aos métodos e procedimentos utlizados. A tareta da Filosofia da Educagao estara assim, orien- tada a olerecer aos docentes uma possibilidade de refle- x0 diante dos problemas educacionais e encaminhando 120. solugdes. Cabe a ela examinar a partir de qual concepeao de homem se deseja educar. Nao ha como direcionar obje- tivos educacionais se nao tivermos claros os valores determinantes de nossa ago. No entender de FULLAT a perlinéncia da Filosofia da Educacao adquire sua real im- orldincia se formos capazes de ver que o fenémeno educa- ional estd fortemente ligado & questo: 'O que é um ser humano? (1988, p. 78). Existem, como vimos,ferentes maneiras de se con cober a Ecucagao. a Flosola, As grandes ungées da Fio. solia.e da Educapdo nao podem se limiar ao estudo Tepettve dos texts Hosotegs 8 andie dos concetos oo Srunclados, ou maneira ‘ita prolunda de entender as estes que a cinolaignora ou nao fem mois para Vestgar (PAVIANI, 1986, 9.17) Questionando sobre a Educacéo, tem-se como im: Porlante que a Filosofia nao permila a dogmatizacao da Pedagogia nem que a educagdo se “transforme em ades- tramento ou qualquer outro tipo de pseudoeducagao” (ARA- NHA, 2002, p. 108). Para além da qualificagao técnica e cienttica espera- se que a lormacao do professor contemple profundos pres: supdstos filosdlices e disciplinas como Filosofia da Edu: ‘cago sdo justiicévels a partir do amadurecimento huma- nno'do educador. A preparagdo do pedagogo deverd entao, cestar voltada a um projeto’existencial para a comunidade brasileira englobando aqui, a poiilizagao e a fundamenta- {0 filoséfica de sua atividade. Ditcil ¢ entender um projeto educacional fora de um projeto politico, antropologieo, que atcule o destino das pessoas ao de uma comunidade hu: ‘mana afastado de uma visdo de totaidade, A filosofia da educagao no Brasil A histéria da educagao brasileira tem seu marco inici- ‘alno ano de 1549 com a chegada de Tomé de Souza e, com le, quatro padres e dois irmaos jesuitas comandados por Manoel da Nébrega. Este elabora um plano de instrugao {ue iniciava pelo aprendizado da lingua portuguesa, desti- ‘nado aos natives e seguia com a evangelizacao crista, a escola para ensinar a ler e a escrever e o estudo da grama- tica latina para os jovens destinados a frequentar cursos, superiores na Universidade de Coimbra © plano de Nébrega tinha duas orientacdes, uma universalista pois se tratava de um modelo adotado por todos os jesuitas em todos os lugares onde eslivessem, Uma outa elitista, acabando por se destinar aos filhos dos colonos exciuindo, de inicio, os indigenas. Os colégios je suitas foram assim convertidos em meios para a formacao da elite colonial. Inicialmente comegariam com curso de Humanidades seguindo-se com Filosofia e Teologia e pos- terior viagem de estudos para a Europa, Os cursos de Filosofia e Teologia viram-se limitados formagao de padres catequistas. O que foi organizado, na Pratica, ‘esteve ligado as humanidades, com duragao de seis anos e com contatidos relacionados ao trivium da Ida- de Média: gramética (quatro anos); dialética e retérica (um ano cada). A gramatica tinha a fungao de garantir a expres- sdo clara e precisa; a dialética para assegurar a expressio rica e a retorica para uma expresso convincente. ‘Até a expulsio dos jesuitas em 1759, esta concepgio humanista tradicional, com vertente religiosa, e caracteriza- da por uma viséo essencialista de homem, constituido por uma esséncia universal e imutével, dominou a educagao brasileira. No aspecto religioso, o homem tendo sido feito & imagem e semethanga de Deus é, em esséncia, criagao divina devendo se empenhar em alingir a perfeicdo huma- nna na vida natural para merecer a vida sobrenatural. Essa proposta vem inspirada no tomismo, uma articulagao entre © pensamento aristotélico e a tradigao crista. sash Mesmo com a expulsdo dos jesuitas a linha religiosa ndo deixou de influenciar a educagao no Brasil. Espacos foram abertos para oulras correntes, podendo ser agrupa- das em quairo concepcdes fundamentais (SAVIANI, 1998, P. 20): Concepgao humanista tradicional;- Concepgao humanista moderma; Concepgao analitica e Concepeao alética A corrente humanista tradicional mantém a visio essencialisia de homem. Essa esséncia humana, em lu- gar de ser entendida como criagao divina, ¢ associada a nalureza humana. © homem 6 uma esséncia imutavel, ca- bendo @ educacdo"conformar-se a essa esséncia huma- nna” (SAVIANI, 1898, p. 24). Nesta corrente a presenga do tomismo e da vertente leiga, centrada esta na idéia de nalureza humana e inspiradora da consirugao dos sistemas piblicos de ensi- licas da laicidade, obrigatoriedade e graluidade, O século XVIII traz consigo a crenga nas luzes da razo © 0 movimento iluminista vem associado a pro- posta de uma escola publica gratuita, leiga e obrigatoria. 0 Brasil nao chega a ser grandemente influenciado pelo mo- vimento iluminista. Aperias no século seguinte tomam cor- po idéias cada vez mais distanciadas da influéncia religio- sa © positivismo tem presenga influente na educagao brasileira no final do século XIX ¢ inicio do século XX. Pare- ‘eres de Rui Barbosa e Benjamin Constant procuram intro- duzir disciplinas cientificas nos curriculos escolares. Na Republica formaliza-se a separacao entre Igreja e Estado declarando este sua neutralidade em relagao ao cullo reli- gioso. Em decorréncia, o ensino religioso suprimido nas escolas publicas. No periodo da primeira Republica os pio- neiros da nova proposta educacional terao como oponen- tes 05 representantes da corrente religiosa, constituindo- 8e 08 caldlicos os defensores do tradicionalismo pedagé- gico. AAs primeiras décadas do século XX caracterizams pelo debate de idéias com base na extensao universal, atra- vés do Estado, do processo de escolarizagao considerado instrumento de participagao polica. © centro do entendi- mento leigo 6 a transformagao pela escola, dos individuos ignorantes em cidadaos esclarecidos. E nesse periodo que 23 pedagogia tradicional 6 superada pela concepgao mo- derma revelando sua forga na capacidade de organizagao abrangendo correntes como 0 pragmalismo, 0 exislencialismo, 0 historicismo ¢ a fenomenologia Diferente da concepeao tradicional, a visdo de homem ver centrada na existéncia, na vida, na alividade. A existén- Gia precede a esséncia nao se encarando mais a existén- cia como mera atualizacao das potencialidades contidas a prior na esséncia. Jé ndo hé uma natureza humana, a naiu- reza humana 6 mutavel, determinada pela existéncia. Na visdo tradicional dé-se éniase ao adulto considerado pron- tg, acabade, por opesigao @ cianga, ser imaturo e incom pleto ‘A educagio aqui ¢ centrada no educador, no intelecto, ‘no conhecimento. Na visdo moderna, o adulto ndo pode se constituir em modelo uma vez que nasce completo e per- manece inacabado até morrer. A educagao passa a centrar- se no educando, na vida, na atividade, tratando-se de uma teoria pedagégica onde o importante 6 aprender a apren- der. Admitem-se formas descontinuas de educagao deter- minadas pelo ritmo vital de cada um, pelas diferencas exi tenciais e também na medida em que os momenios real- mente educativos so considerados raros, instantaneos, passageiros. Como diz SAVIANI, “séo momentos de ple tude, porém fugazes e gratuitos" (1998, p. 26). Se considerarmos equilibradas as primeiras déca- das do século passado em relagdo as tendéncias da con- 121 FUNDAMENTOS LEGAIS E TEORICOS DA EDUCACAO cepgdo humanista tradicional (representada especialmen- te pelos catdlicos) e humanista moderna (representada pelos inovadores - Anisio Teixeira) tem-se a partir do final da Segunda Grande Guerra a predominancia da concep- Go humanista moderna de filosofia da educacao. A con- Cepgao humanista modema predominou no pais a partir de 1945 e, no inicio dos anos cingienta ha um empenho muito, grande das escolas calélicas em estar presentes no movi mento renovador das idéias pedagégicas, ‘No final do mesmo periodo 0 proceso de mobilizagao popular ¢ intensificado tornando-se temas presentes a cul- {ura e a educago popular. No inicio dos anos setenta, onde © tecnicismo busca a reordenagao do processo educativo de maneira a torné-lo operacional e objetivo, a concepgao analitica da educagdo passa.a ter maior desenvolvimento, Esta nao pressupde uma viséio de homem nem um siste- ma filos6tico geral mas pretende levar para a filosolia a tarefa da andlise logica da linguagem educacional Tanto a concepedo tecnicista como a analitica de Filo- sofia da Educagdo se baseiam nos mesmos pressupos- tos de racionalidade, de objetividade e de neutralidade, co- locados como condigao de cientificidade A concepgao dialética interessa 0 homem conereto ‘como “sintese de miltiplas determinagdes” (SAVIANI, 1980, B. 27). 0 homem, visto como conjunto das relagées sociais. Esta concepcao esta presente desde 0 inicio em todas as correntes e movimentos sociais, por serem compreendi- das no contexto histérico da estrutura da sociedade. Momento para uma reflexéo na educagao ‘Atendéncia atual na educacao brasileira procura inte- {rar os aspecios formais e maieriais do ensino com os direcionados as transformagées sociais. Valoriza a escola tenquanto mediadora entre 0 aluno e a cultura desempe- nhando seu papel pela transmissao e assimilagao dos conhecimentos inseridos na prética social. Parlindo da com- preensio das diferentes visdes da pedagogia, a pedago- gia dos conteddes procura proceder a uma analise histor Ca do contexto e seus condicionantes, que aluam na forma- $80 do ser social A-escola é considerada como resultado de neces dades e exigéncias sociais dando-ihe cardter de transitor edade de cada modalidade e aco formativa existente. Se analisarmos a educacdo brasileira a partir do que encon- ramos em nossas escolas, podemos dizer que as tendén- cias aqui abordadas estado presentes, de alguma maneira, nna pratica pedagdgica dos educadores. Como esses professores analisam sua pratica pe- dagégica? A tarela docente nao se reduz a um mero repas- se de contatides e na crenga de que ocorre uma apropria- ‘edo espontnea pelos alunos. A pratica educaliva revesie- Se de uma transmissao ¢ assimilagdo simulténeos, onde 0 professor atua trazendo um conhecimento sistematizado @ onde o aluno 6 capaz de reconstrui-lo com os recursos disponiveis para a siluagao de aprendizagem. © ponte de partida e o de chegada nesse processo & a pratica social. Supde-se um trabalho competente do pro- fessor, tanto no dominio metodolégico, como no dominio dda maiéria @ seu conhecimento do grupo social da escola e de onde esta esté inserida, para que sua tarefa tenha efei {os formativos relevantes para as pretensas transformagoes sociais. A Filosofia da Educagao cabe refletir sobre os cami- hos da educagao. Nao tem como finalidade fixar principios e objetivos, do se reduzindo a uma “teoria geral da educagdo enquan: to sistemalizagao dos seus resultados’ (SAVIANI, 1980, 30). Sua funeao, sera a de acompanhar como é produzida a realidade humana no seu conjunto, que significado tem FUNDAMENTOS LEGAIS E TEORICOS DA EDUCACAO: certos conteuidos, mélodos e eventos pedagégicos no am- bilo das relagdes socials, de maneira critica e retlexiva, de modo a explicitar os seus fundamentos, entender a contri= buigdo das disciplinas pedagogicas e avalié-las quanto & sua significagao, Com a disciplina de Filosofia da Educagéo

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