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No livro, Paim explora, denuncia e aponta so- O autor aqui apresenta uma preocupação
luções para as distorções que o SUS vem sofrendo fundamental em relação aos usos que governos,
ao longo dos anos. Relaciona, sobretudo, seus políticos e partidos políticos fazem do SUS nas
impasses com o cenário político e econômico suas diversas esferas de atuação (federal, estadual
das últimas décadas, bem como com a cultura e municipal), não seguindo os princípios, dire-
política e o histórico de malversações do erário trizes, resoluções de impacto orçamentário e ad-
público e os diversos interesses econômicos e ministrativo que dão forma e conteúdo ao SUS.
ideológicos que estão em jogo na arena da segu- Pelo contrário, observa-se com muita frequên-
ridade social brasileira. cia o desvio de recursos para fins distintos do
De um lado, há o evidente interesse do fa- setor saúde e a adoção de ações e serviços que
migerado complexo médico-industrial brasileiro não atendem, por exemplo, a universalidade e
na transformação de toda e qualquer ação e ser- integralidade da atenção à saúde. Além disso,
viço de saúde numa relação de mercado, de con- entraves burocráticos e administrativos da ges-
sumo e de acúmulo de capital por parte de em- tão pública impedem a resolubilidade e a qua-
presas nacionais e internacionais. Isso faz com lidade do SUS, que muitas vezes requerem agi-
que, muitas vezes, ‘em defesa do SUS’, estraté- lidade e inteligência para atuar com rapidez
gias de gestão público/privado sejam colocadas e estrategicamente.
em cena, fazendo do sistema um mero distri- Por outro lado, o que Paim chama de blin-
buidor de recursos e um regulador das relações dagem política do SUS, com todas as razões coe-
entre público e privado. rentes e necessárias que argumenta, poderia
Além disso, em nome da equidade e da es- colocar em xeque o processo político e social
cassez de recursos para o setor público de saú- inerente à própria constituição democrática do
de no Brasil, o SUS transmuta-se numa expres- SUS. Cabe à sociedade e ao Estado fortalecer as
são focalizada das políticas sociais voltadas para instituições sociais e radicalizar as formas de
pobres e desassistidos de toda a sorte. Isso não representação e participação para fazer cumprir,
quer dizer que não se devem priorizar os que de forma democrática e dialógica, os objetivos
mais necessitam, mas reduzir as ações e servi- e as estratégias para o direito à saúde no Brasil.
ços de saúde a uma classe social é fazer do Em relação a isso, no terceiro momento que
SUS o amortecedor social para a delimitação das destacamos, Paim conclama a sociedade para lu-
áreas livres para exploração dos planos de saú- tar, novamente e ininterruptamente, pela eman-
de privados e do livre mercado no setor saúde. cipação social que o SUS representa.
Este SUS é o oposto da proposta de direito à
saúde que está inscrita na constituição de 1988 “Daí a pertinência de revisitarmos a refor-
e que foi resultado de uma histórica e ampla ma sanitária e ampliarmos suas bases sociais
conquista popular. e políticas, no sentido de radicalizar a demo-
Estas reflexões nos levam ao segundo grande cracia e lutar pelas mudanças prometidas
momento que pretendemos destacar. no seu ‘projeto’. Nessa perspectiva, reto-
mar mobilizações em prol do desenvolvi-
“A constituição estabelece que a saúde é mento de uma consciência sanitária na po-
um direito de todos e dever do Estado, mas pulação e entre os trabalhadores do SUS
em nenhum momento condena o SUS a ser parece-nos inadiável. Informar, comunicar,
refém da ‘administração direta’. Novas ins- conscientizar, mobilizar, organizar e pres-
titucionalidades podem ser concebidas e sionar são verbos que conotam ações fun-
pesquisadas no âmbito da ‘administração damentais para a defesa do SUS e o avanço
indireta’ que, além de garantir maior efe- da reforma sanitária” (p. 132).
tividade e qualidade dos serviços presta-
dos, facilitem uma ‘blindagem’ contra o Com esta chamada para retomar o movimen-
predomínio de interesses político-partidá- to sanitário, ampliando suas bases, sofisticando
rios e corporativos na gestão do sistema e na seus dispositivos e fortalecendo a consciência
gerência de programas e serviços” (p. 131). política coletiva, Paim retoma sua trajetória,