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LEIA A DECISÃO ABAIXO EM JULGAMENTO DE RECURSO DE APELAÇÃO EM CASO DE TORTURA.

AO FINAL, RESPONDA AS QUESTÕES PROPOSTAS.

Acórdão

APELAÇÃO CRIME Nº 96.921-5, DE CÂNDIDO DE ABREU.


APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ
APELADO: FERNANDOFURLANETTO
RELATOR : DES. CARLOS HOFFMANN
SENTENÇA - CRIME DE TORTURA PRATICADO POR DELEGADO DE POLÍCIA CONTRA ADOLESCENTE
INFRATOR, OBJETIVANDO EXTRAIR INFORMAÇÕES - IMPUTAÇÃO LASTREADA SOMENTE NA
PALAVRA DO ADOLESCENTE - ABSOLVIÇÃO DECRETADA - INSUFICIÊNCIA PROBATÓRIA - APELAÇÃO
NÃO PROVIDA.
Incerta a autoria, a absolvição do réu deve prevalecer.

VISTOS, relatados e discutidos estes autos de Apelação Crime nº 96.921-5, de CÂNDIDO DE


ABREU, em que é apelante MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ e apelado FERNANDO
FURLANETTO.
1. O Ministério Público, na Comarca de Cândido de Abreu, ofereceu denúncia contra LEANDRO
SIQUEIRA GONÇALVES, Investigador de Polícia 4ª classe, FERNANDO FURLANETTO, Delegado de
Polícia, e JOSÉ LÚCIO IENE, auxiliar administrativo, incursionando-os em artigos da Lei
nº 4.898/65, vindo o segundo denunciado a ser acusado, especificamente, no art. 3º, alínea a, da
Lei nº 4.898/65 e no art. 4º, alíneas a e b, da Lei nº 4.898/65, nos moldes do art. 29 do CP, assim
como no art. 4º, alínea c, da Lei nº 4.989/65, no art. 320 do CP, no art. 3º, alínea a, da Lei
nº 4.898/65 (outras duas vezes), no art. 4º, alíneas a e b, da Lei nº 4.898/65 (outras duas vezes), e
no art. 1º, inc. I, alínea a, e inc. II, e § 1º, c/c o § 4º, incs. I e II, da Lei nº 9.455/97.
2. Narra a inicial acusatória que os acusados, no dia 12.01.99, cometeram os seguintes atos
ilegais: 1) Leandro Siqueira Gonçalves, às 2h30min, recolheu à Cadeia Pública, sem as
formalidades legais e com abuso de poder, Sidnei Ramalho dos Santos, que encontrara caído em
razão de mal súbito no asfalto existente na localidade de Faxinal de Catanduvas, sendo que o
Delegado Fernando Furlanetto, além de deixar de comunicar a detenção ao juiz competente, não
responsabilizou seu subordinado pela infração praticada; 2) referida detenção foi prolongada até
às 10h20min, quando, estando para ser liberado, Sidnei foi retido face a notícia de que, perto do
local onde havia sido encontrado caído, fora subtraído do sr. Edwin Wujastik um cartão
magnético; 3) os três denunciados cometeram abuso de autoridade ao deter, sem as
formalidades legais, os adolescentes João Carlos Ribeiro e Vilmar Martins dos Santos, que
estavam trabalhando na lavoura, os quais, segundo declarações prestadas por Sidnei, já teriam
praticado outras subtrações contra o sr. Edwin; 4) Fernando Furlanetto submeteu João Carlos
Ribeiro a constrangimento ilegal na localidade de Faxinal de Catanduvas, consistente em tortura
através de socos na cabeça e de um disparo de revólver próximo ao seu ouvido, submetendo-o a
intenso sofrimento físico e mental, com emprego de violência e grave ameaça. Finalizou-se
afirmando que o indigitado cartão magnético foi encontrado numa gaveta da residência do sr.
Edwin.
3. Recebida a denúncia (fls. 47), os réus foram interrogados (fls. 68/73) e apresentaram defesa
prévia.
4. Foram inquiridos as vítimas, um informante e seis testemunhas (fls. 79/92, 118 e 120).
5. As partes apresentaram suas alegações finais. O Ministério Público pugnou pela procedência
parcial da denúncia, para que apenas o réu Fernando Furlanetto fosse condenado pelo crime de
tortura, com perda do cargo ou função pública.
6. Sentenciando, o dr. Juiz de Direito julgou improcedente a denúncia, absolvendo os réus com
fulcro no art. 386, inc. II, do CPP. Assim decidiu por entender que as provas produzidas não eram
suficientes para fundamentar um decreto condenatório, de vez que os depoimentos são
contraditórios e não foi provada a materialidade do delito de tortura, face a inexistência de laudo
de lesões corporais.
7. Inconformado, apelou o Ministério Público requerendo a reforma parcial da r. sentença a fim
de que o réu Fernando Furlanetto seja condenado como incurso nas sanções do art. 1º, inc. I,
alínea a, do seu inc. II edo § 1º da Lei nº 9.455/97, combinados com as causas especiais de
aumento previstas no § 4º, incs. I e II, da referida Lei, que define os crimes de tortura, com a
imposição, ainda, do efeito extrapenal previsto no art. 1º, § 5º, da Lei nº 9.455/97 (perda do
cargo ou função pública). Sustenta o recorrente que nenhum ato ilegal ou abusivo fora
perpetrado até o momento em que o Delegado Fernando Furlanetto passou a agredir, física e
psicologicamente, o adolescente João Carlos Ribeiro, cujo depoimento, mesmo que se acatado
com cautela, é válido como prova em seu contexto geral.
8. Fernando Furlanetto contra-arrazoou o apelo.
9. A douta Procuradoria Geral de Justiça emitiu parecer opinando pelo improvimento do recurso,
sugerindo, porém, a correção da fundamentação legal da r. sentença, para que se assente no
art. 386, inc. VI, do CPP, e não no seu inciso II.
É o relatório.

VOTO.
11. A peça inicial diz que o recorrido Fernando Furlanetto, delegado de polícia, no dia do evento,
prevalecendo-se de sua autoridade e do adolescente João Carlos Ribeiro, o qual se encontrava
sob sua guarda, teria submetido-o a tortura, desferindo-lhe socos na cabeça e detonando um tiro
com arma de fogo bem próximo ao seu ouvido, objetivando extrair informações sobre um cartão
magnético que teria sido subtraído de Edwin Wujastik, causando sofrimento mental e físico ao
adolescente.
Toda acusação funda-se exclusivamente na palavra do adolescente João Carlos Ribeiro (fls.
118/119). Não foi ele, porém, submetido a qualquer perícia e suas declarações não encontram
apoio em nenhuma prova dos autos. Seu próprio pai para o juiz da instrução disse que, visitando
seu filho na delegacia, ele não lhe contou que tivesse levado algum soco ou se tinham disparado
uma arma de fogo perto do seu ouvido, nem a isso se referindo em outras conversas (fls. 81).
Nenhuma testemunha, da acusação ou defesa, faz qualquer menção ao fato atribuído ao
recorrido, a não ser o outro adolescente Vilmar Martins dos Santos que somente disse ter João
Carlos Ribeiro lhe contado que o delegado tinha disparado um tiro bem perto do seu ouvido (fls.
120), esclarecendo, porém, que quando João retornou à delegacia não aparentava nenhum
ferimento.
Analisando-se as provas, entendo inexistiram suficientes elementos de convicção para condenar
o réu. Na sempre lembrada lição de Camargo Aranha, ... a condenação criminal somente pode
surgir diante de uma certeza quanto à existência do fato punível, da autoria e da culpabilidade do
acusado. Uma prova deficiente, incompleta ou contraditória, gera a dúvida e com ela a
obrigatoriedade da absolvição, pois milita em favor do acionado criminalmente uma presunção
relativa a inocência (in: Da Prova no Processo Penal, pág. 60, Saraiva, 2ª edição).
Nesse sentido a jurisprudência: Em matéria de condenação criminal, não bastam meros indícios.
A prova da autoria deve ser concludente e estreme de dúvida, pois só a certeza autoriza a
condenação no juízo criminal. Não havendo provas suficientes, a absolvição do réu deve
prevalecer (RT. 708/339 - TJMT).
Diante dessas considerações, nego provimento ao recurso ministerial, mantendo a sentença
recorrida, retificando, porém, o fundamento legal da absolvição que passa a ser o do
art. 386, VI, CPP, e não do inciso II como constou.
ACORDAM os Desembargadores integrantes da Segunda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça
do Paraná, à unanimidade de votos, em negar provimento à apelação, nos termos do voto do
Desembargador-relator.
Estiveram presentes: o eminente Desembargador NEWTON LUZ (Presidente, sem voto), e
acompanharam o voto do Relator, o eminente Desembargador TELMO CHEREM e o eminente Juiz
Convocado PAULO HABITH.
Curitiba, 23 de novembro de 2000
CARLOS HOFFMANN - Relator

QUESTÕES:
1- Quais crimes foram imputados aos acusados? Você considera que tal imputação está
juridicamente correta?
2- Transcreva a conduta imputada a cada um dos réus que você consegue identificar na
decisão e relacione com o dispositivo penal em que se enquadra.
3- Identifique os meios de prova existentes no processo, conforme relatado no voto, e faça
uma apreciação crítica sobre a valoração dos mesmos pelo magistrado.
4- Leia a decisão abaixo, exarada pelo Ministro Joaquim Barbosa em sede de julgamento
de habeas corpus impetrado em favor de condenado - mas com decisão ainda não
transitada em julgado - por crime de tortura, e confronte a qualidade das provas
existentes nos autos e sua valoração feita no STJ e ratificada pelo aludido ministro com a
qualidade das provas e sua valoração como constatado no caso primeiro examinado.

DECISÃO: Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado em favor de


ESTANISLAU DANTAS MONTENEGRO, contra acórdão proferido pela Quinta Turma do
Superior Tribunal de Justiça no HC nº 214.770/DF.
Consta da petição inicial que o paciente foi condenado pelo Tribunal de Justiça do Distrito
Federal e dos Territórios, em sede de apelação interposta pelo Ministério Público, à pena
de 2 anos e 4 meses de reclusão e à perda do cargo público de Agente da Polícia Civil, pela
prática do crime previsto no art. 1º, inc. I, ‘a’, e §§ 4º e 5º, da Lei nº 9.455/1997 (tortura).
Inconformada, a defesa interpôs recursos especial e extraordinário, que não foram
admitidos pela Corte Distrital.
Em seguida, impetrou-se habeas corpus ao Superior Tribunal de Justiça, que denegou a
ordem pretendida.
Daí o presente habeas corpus, no qual os impetrantes sustentam que a “condenação
imposta ao ora paciente carece de justa causa, tendo em vista a atipicidade da conduta
que lhe foi imputada”, uma vez que “não há nos autos qualquer prova que comprove que
a vítima teria passado por intenso sofrimento, requisito indispensável para a
caracterização do tipo penal da tortura”.
Alegam, ainda, inadmissibilidade de execução provisória da pena antes do trânsito em
julgado da sentença condenatória, haja vista que fora expedida carta de sentença para
fins de cumprimento de pena não obstante a existência dos Embargos de Declaração nos
Embargos de Declaração no Agravo Regimental no Agravo de Instrumento nº 845.962
pendentes de julgamento por este Supremo Tribunal.
Por tais razões, os impetrantes requerem a cassação do acórdão condenatório e,
subsidiariamente, que o paciente permaneça em liberdade até o trânsito em julgado de
eventual condenação.
É o relatório. Decido.
Não há como acolher a pretensão deduzida no presente writ.
De saída, não é possível conhecer da impetração no ponto concernente à suposta falta de
provas para a condenação do paciente pela prática do crime de tortura.
Isto porque o habeas corpus, por não ser um segundo recurso com efeito devolutivo, não
se presta a analisar a validade ou a pretensa falta de provas para a condenação, uma vez
que nessa via processual não se admite a realização de amplo e apurado reexame do
conjunto fático-probatório dos autos de origem.
Ainda que fosse superado o óbice quanto à admissibilidade, melhor sorte não adviria à
impetração, haja vista que o acórdão impugnado demonstra com suficiente clareza os
fundamentos que embasaram a condenação do ora paciente, merecendo destaque os
seguintes trechos:
“Por outro lado, o Desembargador Relator do voto condutor na Corte de origem
consignou que "apesar de toda dificuldade que apresenta a produção probatória em
crimes dessa natureza, entendo que existem provas suficientes de que Silas de Araújo
Galvão foi vítima do crime de tortura praticado por Estanislau Dantas Montenegro e José
Maria da Rocha", frisando que "as lesões e ameaças narradas pela vítima são suficientes
para comprovar seu intenso sofrimento, especialmente, quando lhe foi colocado um
saco plástico na cabeça, asfixiando-a" (e-STJ fl. 350).
Ora, considerando-se que o ilícito em tela caracteriza-se pela inflição de dores ou
sofrimentos agudos, físicos ou mentais, em qualquer pessoa, com a finalidade de dela
obter informação ou confissão, tendo em conta que na denúncia o órgão acusatório
narrou que a vítima teria sido submetida a intenso sofrimento físico e mental, pois
agredida com murros, tapas e golpes de cassetete, bem como asfixiada com um saco
plástico, e que o aresto objurgado considerou provadas nos autos tais agressões, não se
pode falar em atipicidade da conduta imputada ao paciente.
Com efeito, o simples fato de o laudo de exame de corpo de delito não haver atestado a
presença de lesões corporais graves no corpo da vítima, bem como a circunstância de a
confissão não ter sido obtida pelo paciente e outro corréu, não são suficientes para se
concluir pela não configuração do delito de tortura, como pretendem os impetrantes.
Isso porque, consoante consignado alhures, o crime previsto no artigo 1º, inciso I, letra a,
da Lei 9.455/1997 pressupõe o suplício físico ou mental da vítima, não se podendo olvidar
que a tortura psicológica não deixa vestígios, não podendo, consequentemente, ser
comprovada por meio de laudo pericial, motivo pelo qual a materialidade delitiva
depende da análise de todo o conjunto fático-probatório constante dos autos,
principalmente do depoimento da vítima e de eventuais testemunhas”.
Já em relação à alegação de inadmissível execução provisória da pena ante a existência
dos Embargos de Declaração nos Embargos de Declaração no Agravo Regimental no
Agravo de Instrumento nº 845.962 pendentes de julgamento por este Supremo Tribunal,
verifico que tal feito foi rejeitado pela Segunda Turma desta Corte na sessão realizada na
presente data (06.03.2012), ocasião em que também foi determinado o imediato
cumprimento do acórdão independentemente de sua publicação, fato este que prejudica
a impetração nesse ponto.
Por todo o exposto, nego seguimento ao writ (art. 21, § 1º, do RISTF, e 38 da Lei nº
8.038), sobretudo por ser manifestamente inadmissível.
Publique-se.
Brasília, 06 de março de 2012.

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