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AMX PROJECT

Projetos para Amiga, Apple II e MSX

Entrevista: Claudio Richter


Publicado em 02/08/2016 por Daniel Campos

Pessoal,

Hoje trago um artigo diferente dos habituais na AMX Project. Desta vez venho com
uma entrevista exclusiva com o projetista original do micro CD-6809 da Codimex,
o Sr. Claudio José Richter. Para quem não conhece, o CD-6809 foi o primeiro
micro da linha TRS-80 Color produzido no Brasil, especificamente em Porto
Alegre-RS. Esse micro já foi protagonista em vários artigos deste blog no
passado. O próprio Claudio ainda é possuidor de um dos protótipos originais da
época.

Claudio Richter

Codimex CD-6809 pertencente ao entrevistado.

Além da entrevista, o Sr. Claudio nos presenteou com várias digitalizações dos esquemas do micro CD-6809 e
acessórios produzidos na época.
Diagrama de Blocos do CD-6809

Nota: Todo o material disponibilizado estará disponível para download no final deste artigo.

A entrevista:
Daniel Campos: Analisando o projeto do micro Codimex que foi apresentado a SEI na época, consta o seu
nome como o projetista principal. Como foi a questão de ser chamado para trabalhar na Codimex? Poderia
dissertar um pouco sobre esse histórico?

Claudio Richter: Na verdade, um amigo havia sido indicado para o cargo (Augusto Einsfeldt), mas tinha
outros compromissos e citou meu nome. Foi uma grande oportunidade para um estudante de engenharia de 21
ou 22 anos. Eu já havia trabalhado em outros projetos, como uma CPU por hardware (toda com CIs TTL), e
projetos com 8085.

DC: Antes de ingressar na Codimex, você já era familiar com a arquitetura da linha de micros TRS-80 Color da
Tandy Radio Shack?

CR: Não. A arquitetura é mais da Motorola do que propriamente da Radio Shack, já que o CI gerenciador de
memória (6883) e o de vídeo (6847) determinam em grande parte toda a estrutura. A originalidade está na
estrutura de I/Os (6821), com o conversor D/A por resistores, a leitura de fita cassette, etc.

DC: Conte-nos um pouco de como foi projetar o micro CD-6809. Quais as dificuldades encontradas ?

CR: De fato não projetamos propriamente um micro (como, de resto, nenhum dos subseqüentes clones lançados
por concorrentes). O que fizemos foi copiar um computador, o que, na época, já era um desafio razoável. É
preciso levar em conta que não havia ferramentas de CAD. A placa impressa era feita em plástico poliéster com
a colagem de fitas de diferentes larguras, para a confecção das trilhas (fitas Bishop). Todo o desenho era
elaborado em escala 2:1 e depois reduzido fotograficamente. E não possuíamos o mínimo instrumental, nem
mesmo um réles osciloscópio analógico. Até para programar as EPROMs tive de criar um programador (anexei
algumas fotos).
O maior desafio era converter o sistema de cor, de NTSC para PAL-M. Além da freqüência distinta do cristal, é
necessário inverter a fase do sinal de cor a cada linha.

Programador feito na época para gravar as EPROMs para o CD-6809.

Esquemático da parte de geração de video do Codimex.

DC: Você ficou somente responsável pela parte do projeto ou “meteu a mão” na produção e montagem do micro
também ?

CR: Montei apenas o protótipo (que está comigo até hoje). Neste a placa foi elaborada sem o solder resist e
máscara de componentes para facilitar a depuração. Mas na montagem em série não me envolvi.
Interior do micro do Sr. Claudio, mostrando uma das placas protótipo originais.

DC: Alguma lembrança de outro periférico ou equipamento que você tenha também projetado ou participado
da elaboração ?

CR: Havia um conversor serial-paralelo para impressora que projetei integralmente. Note que o TRS-Color
tinha apenas porta serial, e muitas impressoras da época usavam interface paralela. Encontrei documentação a
respeito, como podes examinar nos anexos.

Esquema do Conversor Serial/Paralelo.


DC: Analisando friamente a placa do Codimex, notamos que ela se assemelha e muito com a placa de um TRS-
80 Color Computer original. Pode nos confirmar se o micro foi baseado mesmo a partir de um micro da Tandy
Radio Shack ou vocês possuiam algum manual técnico da Tandy ?

CR: Sim, foi adquirido um TRS-Color e, a partir dele, feito o Codimex.

DC: Recentemente analisei uma interface de disco que foi produzida pela Codimex e a mesma também se
assemelha muito a uma interface de terceiros que foi feita nos EUA, teria alguma lembrança sobre isso?

CR: No caso da interface de disco não me envolvi diretamente com ela, mas acredito que tenha sido baseada em
uma placa importada, como no caso do computador. O problema é a dependência do software. Caso se
modificasse algum endereço ou configuração do hardware, muito provavelmente, o sistema operacional de
disco deixaria de operar, acarretando um grande esforço para adaptá-lo ao novo hardware. Isso sem contar
com os inúmeros programas em Assembler que usavam os recursos da máquina diretamente, e que ficariam
incompatíveis. Se não me engano, quem assumiu a confecção da interface de disco foi outro amigo, Ricardo
Dattelkremer.

Uma das interface de disco originais da Codimex e reformada por mim em um artigo anterior.

DC: Que outras curiosidades poderia nos contar sobre esse período que trabalhou na Codimex ?

CR: Foi uma época romântica (sim, o que pode ser mais romântico que passar todo o final de semana
praticamente insone, a base de cafeína, até que o circuito funcione…). Obter um manual (datasheet) era um feito
extraordinário, e os poucos que obtinhamos eram imediatamente replicados para os amigos. Pouquíssimas
lojas trabalhavam com processadores e CIs de lógica (lembro da Digital, aqui em Porto Alegre). A maioria
revendia peças para rádios e TVs.
Os circuitos eram montados em proto-boards e, com isso, havia um mercado para restos de cabos telefônicos.
Mais de uma vez recolhi na rua pedaços que sobravam destes cabos com múltiplas vias, para fazer as conexões
do proto-board. O instrumental era paupérrimo, muitas vezes não ultrapassava um multímetro analógico e
uma ponteira lógica (feita em casa…).
Com a Codimex essa situação não alterou significativamente em termos de instrumental, mas o acesso a
componentes foi muito facilitado. Também documentação técnica foi disponibilizada. Mas, na época, eu era
ainda mais direcionado às questões técnicas do que sou hoje e, com isso, temo ter me envolvido pouco com os
outros problemas da empresa.
Hoje lamento isso, embora análises do passado sejam pouco razoáveis (é como o analista de bolsa que sempre
acerta quando as ações vão subir… depois que subiram…).
Quem realmente levou a empresa nas costas foi o Davi Menda, que entrevistaste. Lembro que ele fazia
encontros aos sábados na Codimex para reunir aficionados, e nunca mediu esforços para alavancar a firma.

DC: Tem alguma opinião sobre a Reserva de Mercado que existiu na época e possibilitou a existência da
Codimex e outras empresas ?

CR: A reserva de mercado, pelas minhas convicções atuais, não deveria existir, porque acredito que governos
são como o rei Midas ao contrário, ou seja, todo ouro que tocam transformam em pó.
Qualquer dúvida vide Petrobrás, que lida com ouro negro e detém monopólio em um país continental. Assim
mesmo, está em uma situação lastimável. Então, seria muito mais produtivo que nossos governantes se
preocupassem em gerar condições favoráveis a um desenvolvimento técnico sustentável das empresas
nacionais, em vez de criar entraves para a concorrência externa. O que nos torna incapazes de competir é o
próprio Leviatã, que pretende nos proteger com leis e sanções à importação.
Cada empresa brasileira tem de lutar contra um mar de leis absurdas, impostos asfixiantes, infraestrutura
patética (exceto, naturalmente, no que concerne a estádios de futebol), perda crescente de liberdade de ação, e
burocracia digna de um país comunista. E a quem devemos todo este legado? Então, o que, na minha opinião,
realmente necessitamos para nos desenvolvermos como nação é eliminar o poder onipresente do estado
brasileiro, protegendo o cidadão e sua liberdade. Isso irá oxigenar o sistema, que naturalmente irá eliminar os
parasitas e inúteis, aumentando nossa pífia produtividade para níveis comparáveis as outras nações.

DC: Qual a melhor lembrança que você guarda dessa época? E qual a pior ?

CR: A melhor lembrança é, com certeza, quando finalmente o circuito de conversão para PAL-M funcionou,
gerando a cor vermelha, que insistia em aparecer verde.
A pior aconteceu na primeira sede da Codimex, na fase de confecção dos desenhos da placa impressa. Como
citei, o desenho era feito com fita adesiva de diferentes larguras, para gerar as trilhas. As ilhas eram feitas por
etiquetas de diferentes formatos, também coladas à folha de poliéster.
Eu estava em uma fase de finalização do desenho, e sempre deixava as folhas abertas sobre uma escrivaninha
(não era aconselhável mantê-las enroladas, pois as fitas poderiam assumir a curvatura e se deslocar ao reabrir
as folhas).
Imagine a surpresa ao chegar à empresa pela manhã, e encontrar literalmente uma poça d’água sobre meus
preciosos desenhos… Havia chovido durante a noite e havia uma goteira no teto, exatamente sobre esta
escrivaninha. Felizmente foi possível restaurar as áreas danificadas, mas o susto foi grande.

Espero que tenham apreciado esta entrevista exclusiva com o sr. Claudio Richter. Abaixo segue o link para
download do material exclusivo que ele disponibilizou, contendo esquemáticos e desenhos da época.

Esquemas Codimex CD-6809

Abs,
Daniel

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