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Sequências Didáticas no Ensino Fundamental: da teoria para a prática

Drª Lucienne Espíndola /UFPB (lucienne_@hotmail.com)

RESUMO: Este artigo apresenta os resultados relativos ao uso de sequências didáticas


(SD) em aulas de língua portuguesa do Ensino Fundamental II. O corpus resulta do
projeto “Ações de Linguagem: uma proposta de integração teórico-prática para o
ensino de língua portuguesa no município de João Pessoa - PB”, do qual fiz parte,
como professor formador. O referido projeto objetivou aproximar o professor que está
em sala de aula das atuais teorias que têm alicerçado as práticas de ensino de língua
materna, principalmente aquelas embasadas na abordagem sociointeracionista, Bakhtin
(2000 [1979]) e nas contribuições mais recentes de Schneuwly e Dolz (2004). Meu
objetivo é verificar como os professores (alunos) fazem a transposição das aulas
presenciais para as suas aulas ‘reais’, mais precisamente como eles adotam (se adotam!)
a SD em suas aulas.
Palavras-chave: ensino de língua, gêneros textuais, sequência didática.

ABSTRACT: This article presents the results of the didactic sequences use in English
language classes in the Secondary School. The corpus results from the project “Ações
de Linguagem: uma proposta de integração teórico-prática para o ensino de língua
portuguesa no município de João Pessoa - PB”, which I have taken part as a professor.
The project aimed to bring the teacher who is in the classroom of current theories that
have supported the teaching practice of mother tongue, especially those which are based
on the social-interactionist approach, Bakhtin (2000 [1979]), and the last contributions
of Schneuwly and Dolz (2004). My goal is to verify how the teachers (students) do the
transposition of the lessons for their 'real' classes, more precisely as they adopt (if they
take!) the didactic sequences in their classes.
Keywords: language teaching, textual genre, didactic sequence.
1. INTRODUÇÃO

Os resultados aqui apresentados são provenientes da minha atuação, como professor


formador, no projeto “Ações de Linguagem: uma proposta de integração teórico-
prática para o ensino de língua portuguesa no município de João Pessoa - PB”,
durante seis meses no ano de 2008.
O referido projeto tinha como objetivos: 1) aproximar o professor que está em sala de
aula das atuais teorias que têm alicerçado as práticas de ensino de língua materna,
principalmente aquelas embasadas na abordagem sociointeracionista de Bakhtin (2000
[1979]) e nas contribuições mais recentes de Schneuwly e Dolz (2004); 2) incentivar o
professor (aluno) a usar (ousar) essa nova abordagem em sua prática de sala de aula.
O projeto estava centrado, principalmente, na sequência didática definida como
“conjunto de atividades escolares organizadas, de maneira sistemática, em torno de um
gênero textual oral ou escrito”. (SCHNEUWLY & DOLZ, 2004, p. 97).
Essa escolha deu-se em função de acreditarmos, o grupo, que essa opção teórico-
metodológica permitia-nos estar, conjuntamente, trabalhando o gênero textual, a
gramática em uso em um projeto com etapas predefinidas e com objetivos claros para a
produção textual.

2. O PROJETO
Do projeto faziam parte nove professores formadores e o coordenador, sendo os
professores oriundos da UFPB (a maioria), da UEPB e do CEFET. Cada professor
formador ficou responsável por um polo (conjunto de escolas a serem atendidas), que
era visitado por seu respectivo professor responsável uma vez por mês, após o encontro
coletivo no centro de formação continuada. Eu estava responsável pelo pólo 3, com 4
escolas e 12 professores que deveriam participar da formação, porém o número de
professores que frequentavam os encontros no polo nunca ultrapassava 5.
Encontrávamo-nos, eu e o grupo, também uma vez por mês para prepararmos o próximo
encontro coletivo e discutirmos o encontro no pólo da semana anterior. Saliente-se que a
proposta era assim dividida: primeira semana - aula presencial para todos os professores
(alunos) com o assunto daquele dia; segunda semana – visita ao polo, com planejamento
para a colocação em prática do assunto da aula presencial; quarta semana – reunião dos
professores formadores (relato, discussão e decisões acerca do próximo encontro).
O conteúdo a ser trabalhado nos encontros foi previamente estabelecido no projeto
apresentado na prefeitura e estava estruturado em três pontos: Sequência Didática (SD)
e Gêneros Textuais e Análise Linguística, sendo que, ao longo da execução, houve
adaptações por sentirmos necessidade de trazer alguns pontos teóricos que julgamos
necessários para o desenvolvimento das atividades propostas. O projeto estava dividido
entre aulas presenciais e orientação individualizada nas escolas. Apresentávamos, nas
aulas presenciais, a sequência didática, que tem como ponto de partida e de chegada um
gênero textual, como proposta a ser implantada nas aulas de língua portuguesa e, nas
visitas às escolas, dávamos as orientações complementares relativas tanto à teoria
quanto à prática.

3. A SEQUÊNCIA DIDÁTICA: NA TEORIA


A formação continuada propriamente dita começou com o tópico alvo Sequência
Didática, o que é em que consiste. A partir dos pressupostos teóricos de Schneuwly e
Dolz (2004, passim), apresentamos a definição, estrutura e os princípios teóricos da
sequência didática:

1) Escolhas pedagógicas
 Inclui possibilidade de avaliação formativa;
 Insere-se em um projeto que motiva os alunos a escrever ou tomar a palavra;

2) Escolhas psicológicas
 A atividade de produção de textos é trabalhada em toda sua complexidade;
 O procedimento proporciona ao aluno uma consciência mais ampla de seu comportamento de
linguagem em todos os níveis;
 A transformação no modo de falar e de escrever é possível porque diferentes instrumentos de
linguagem são propostos aos alunos.

3) Escolhas linguísticas
 A atividade de linguagem produz textos e discursos;
 A linguagem não é abordada como objeto único, mas algo que se adapta às situações de
comunicação;
 O objeto do procedimento são os gêneros textuais.

4) Finalidades Gerais
 Preparar os alunos para dominar sua língua nas situações mais diversas da vida cotidiana;
 Desenvolver no aluno uma relação consciente e voluntária com seu comportamento de
linguagem;
 Construir nos alunos uma representação da atividade de escrita e de fala em situações
complexas. (Resumo elaborado para uso no projeto)

A partir da apresentação dos pressupostos teóricos que alicerçariam toda a formação


continuada, desenvolvemos todo o programa, tanto nas aulas presenciais quanto nos
encontros nos polos, tendo como princípio organizador a SD.

4. SEQUÊNCIA DIDÁTICA: NA SALA DE AULA (relatórios e observações)


As observações acerca do uso da SD pelos professores (alunos) em atividades de
produção de textos são decorrentes de 34 relatórios feitos por professores no final da
formação continuada e das anotações feitas durante os encontros no polo (03), sob
minha responsabilidade. Saliente-se que esse número constitui mais ou menos 50% do
grupo que participou da formação continuada.

4.1 Observações do professor-formador no polo


Nos encontros amplos, em que os professores-formadores ministravam conteúdos,
sempre relacionados com a SD, havia, com certa expressividade, a participação dos
professores alunos, perguntando muito sobre essa nova perspectiva de ensino de língua,
inclusive com depoimentos em favor do uso da SD na prática de produção de texto.
No polo sob minha responsabilidade, desde o início da formação, também constatei uma
boa aceitação dos pressupostos teóricos, sendo que o tema SD já era conhecido de
alguns, porém o domínio ainda era mínimo, havia muitas dúvidas, e carência de leitura
sobre o assunto.
No entanto, quando começamos a insistir para que fosse elaborada uma SD para ser
posta em prática nas turmas em que os professores estavam atuando, as dificuldades
começaram a ser postas na mesa: a maioria dos professores alegava problemas de
naturezas diversas como empecilhos para a adoção da SD em suas práticas pedagógicas.

4.2 Relatórios escritos elaborados pelos professores (alunos)


Na avaliação da formação feita pelos professores (alunos), o item 3 buscava identificar
as dificuldades encontradas pelos cursistas em dois pontos: no trabalho com os gêneros
e na elaboração das sequências didáticas. Detive-me no segundo ponto, sem perder de
vista o primeiro, uma vez que, muitas vezes, revela o uso ou não da SD na produção de
gêneros textuais.
As respostas aqui analisadas foram dadas à pergunta do questionário:
“Aponte as dificuldades encontradas:
1) No trabalho com os gêneros.
2) Na elaboração das sequências didáticas.”
Analisando as respostas dadas, é possível dividir o total de professores que entregaram
o questionário em dois grupos: os que não elaboraram uma SD (ou não a levaram para a
sala de aula) e os que elaboraram e tentaram desenvolver uma SD em suas aulas.
Do primeiro grupo sete professores simplesmente não responderam à pergunta. Esse
silêncio pode ter várias leituras, sendo que o contexto leva-me à leitura de que não
levaram a SD para a sala de aula, porém é somente uma hipótese com base também nas
observações feitas na visita aos polo.
Ainda desse grupo onze professores deram uma resposta aparentemente não adequada à
ao que fora perguntado:

“Desinteresse por parte dos alunos. Preguiça de refazer os trabalhos.”


“Um trabalho apresentado para o professor sem a mínima possibilidade de trabalhar com o
aluno.”
“Rapidez.”
“Foi mostrada e elaborada a sequência didática.”
“A dificuldade está na realização, por falta da aceitação em sala e a própria inexperiência do
professor.”

Para dar um sentido a essas respostas (fazer uma das inferências possíveis), recorremos
a Grice (1972,1976), que propôs “algumas regras” que regem as interações, para
entender por que em algumas situações o locutor pode dizer mais do que é dito na
estrutura linguística e qual(is) o(s) princípo(s) que permite(m) que o interlocutor
entenda essa informação extra.
Para essa investigação, Grice (1972:86) apresentou um princípio geral que rege a
conversação: “Faça sua contribuição conversacional tal como é requerida, no momento
em que ocorre, pelo propósito ou direção do intercâmbio conversacional em que você
está engajado.”.
E da aceitação desse princípio quatro máximas foram propostas:
da quantidade:”não dê mais informações do que o requerido para a situação”;
da qualidade: “seja verdadeiro e tenha evidência para o que diz”;
da relação: “seja relevante”;
do modo: “seja claro, sem ambiguidades, conciso e ordenado”.
Para Grice, uma interação bem sucedida é aquela em que os participantes respeitam
essas máximas cooperativamente. No entanto, em algumas situações, mesmo que os
participantes estejam participando cooperativamente, quebram uma dessas máximas
deliberadamente, gerando as implicaturas conversacionais, as quais verificaremos nos
questionários em análise.
As respostas do bloco, aparentemente, não são relevantes para a pergunta feita (Aponte
as dificuldades encontradas na elaboração da sequência didática). No entanto, a partir
da resposta dada, tem-se a confirmação do desejo que tem o professor de ser
cooperativo, porém quebrando da máxima da qualidade, com uma determinação
intenção. Nessa perspectiva, tem-se o desafio de entender essa informação extra deixada
pelos professores (alunos) para nós formadores.
A partir da vivência na formação presencial e nas visitas ao polo (conhecimento
partilhado), é possível dizer que a quebra da máxima da relevância, ou seja o professor
não querer falar sobre as dificuldades na elaboração da SQ, pode ser um alerta para:
 o real alcance do curso por nós oferecido;
 o desestímulo da categoria por fatores diversos;
 as condições contextuais desfavoráveis;
 a formação desse professores, muitos tiveram sua formação há mais de 10 anos;
 a falta de leitura;
 a dificuldade de implantar o novo, o diferente que pode ameaçar a
“estabilidade”.
No segundo grupo estão os que elaboraram a SD e a levaram (ou tentaram) para a sala
de aula. Dentre esses professores, onze declararam que tiveram alguma dificuldade na
elaboração ou na realização da SQ:

“Senti muita dificuldade a respeito desse assunto e ainda não me sinto muito segura.”
“Um pouco de limitações da preparação dos módulos.”
“Tempo para preparar um bom trabalho utilizando a sequencia didática.”
“A segunda parte em que módulos para a etapa de preparação para a reescritura devem ser
elaborados.”
“Falta de prática. Falta de material apropriado.”
“Tenho que treinar bastante para melhorar mais, pois ainda tenho dificuldades.”
“No início foi difícil, mas por conta de uma nova proposta.”

As respostas desse grupo trazem à tona os problemas que levantamos como hipóteses
nas respostas em que houve a quebra da máxima da qualidade, aparentemente respostas
não relevantes para a pergunta.
Nas respostas desse grupo, constatamos que houve, pelo menos, a tentativa de utilizar a
SD na sala de aula, porém o que mais nos chama a atenção são os entraves apontados
por esses profissionais para o não sucesso:
 o desconhecido
 a falta de conhecimentos suficientes
 a gramática em uso (assistemática)
 a insegurança
Alguns professores desse grupo desconheciam a proposta da SD didática antes do curso
de formação, outros já tinham tido contato com a proposta, porém de forma superficial
sem leituras sobre os pressupostos teóricos que sustentam a SD e sem qualquer tentativa
de elaboração e aplicação. Outros conheciam a SD, tinham leituras, mas ainda tinham
reserva quanto a adotarem como forma de trabalhar a leitura e a produção de textos.
Esse desconhecimento pode ter sido, em parte, o responsável pela baixa adesão a nova
concepção de ensino de língua materna.
A maioria do público do curso é fruto de um momento em que os cursos de Letras
estavam organizados sob a concepção de linguagem como espelho fiel do pensamento; e
que a maior unidade de análise e de ensino era a frase, sendo que o vocábulo (palavra)
constituía, na maioria das abordagens, a unidade de análise e de ensino
consequentemente.
A partir da década de 1970, uma nova concepção de linguagem surge entre os
especialistas da área: a linguagem passa a ser concebida como forma de interação, e,
nesse novo contexto, o texto passou ser a unidade de análise e de ensino, porém essa
perspectiva só recentemente tem sido a norteadora dos currículos dos cursos de Letras,
sendo que ainda encontramos, nos cursos de graduação, práticas de sala de aula
pautadas na frase e no vocábulo. Apesar dos avanços na área, as pesquisas demoram a
chegar à sala de aula, e, algumas vezes, chegam de forma inadequada, e outras vezes, os
maiores interessados não têm acesso a essa literatura em decorrência de vários fatores,
como condições não adequadas de trabalho, falta de condições financeiras, dificuldade
de manterem-se em formação continuada.
O carro-chefe nas aulas de língua portuguesa tem sido o ensino de regras gramaticais
em uma perspectiva tradicional (regras, exercícios de análise de frases). Conceber a
linguagem como interação é trabalhar os gêneros textuais/discursivos como formas
socialmente instituídas de interação. O ensino de leitura e produção de texto a partir dos
gêneros requer uma nova postura em relação à língua e à gramática normativa: aquela
não será mais concebida como estrutura previamente estabelecida, mas em uso e
realizada linguisticamente de formas diferentes de acordo com a função social de um
gênero, dos interlocutores; esta (a gramática normativa) não mais será o carro-chefe de
uma aula de língua materna, mas constituirá a ferramenta para a produção/leitura de um
determinado gênero; a gramática estará a serviço da produção/leitura de um gênero.
Na SD didática a gramática normativa poderá/deverá entrar em dois momentos: na
apresentação do gênero a ser produzido como produto da atividade (quais os
conhecimentos gramaticais (microestruturais) necessários para ler/produzir determinado
gênero) e na reescritura a partir do levantamento das dificuldades apresentadas nas
produções. Nesse momento, deve-se abordar somente aqueles conteúdos gramaticais
que apareceram como problemas na construção do texto.
Essa prática, mesmo nos cursos de Letras, ainda não é totalmente adotada. Na maioria
das disciplinas apresentam-se disciplinas, mas não se aborda como deverão ser
abordadas nos níveis fundamental e médio ou de que forma contribuirão para a prática
de sala de aula. Nos cursos de formação o que mais se ouve é “Como na prática se
trabalha a gramática em uso?”. Sabe-se que não há receita pronta, pois cada situação
vai requerer uma performance diferente, no entanto os professores solicitam que sejam
levadas situações práticas, para os cursos de formação continuada, produções reais de
alunos; que sejam organizados os módulos necessários para ‘resolver’ os problemas
recorrentes revelados na produção textual.
A insegurança citada em alguns questionários advém de todos os problemas elencados,
fazendo com que o professor arrisque-se pouco por ter pouca leitura, formação anterior
às abordagens cuja unidade de análise seja o texto, e pouca audácia na hora de implantar
mudanças por desmotivação salarial, entre outras.
No segundo grupo, estão também sete professores que declararam ter elaborado e/ou
levado a SD para a sala de aula sem quase nenhum problema:

“Não tive dificuldades, pois já trabalhava com SD antes de conhecer essa


habilidade/terminologia.”
“As sequências didáticas (como já fazia parte da minha prática) não houve muita dificuldade.”
“Nenhuma.”
“Também não. As sequências didáticas tem sido bem ministradas pelos formadores.”
“Nenhuma. O professor formador soube orientar seu desenvolvimento. E além disso , a
elaboração das sequências didáticas são direcionadas as necessidades da turma, facilitando a
compreensão.”
“Sempre procurei trabalhar com sequências didáticas, embora me depare com alguns entraves,
tais como: reprodução de material, aula extraclasse.”

Esse bloco de respostas relata que alguns professores elaboram e, mesmo com
dificuldades, a adotam em sala de aula, porém deixam claro que essa prática não tem
início com o nosso curso de capacitação, o que confirma o que levantamos, como
hipótese, anteriormente: o pouco contato com essa nova perspectiva de ensino dificulta
a adoção dessa prática; os que a adotaram e declararam pouca ou nenhuma dificuldade
já tinham tido contato com a SD e com os respectivos pressupostos teóricos.

A partir dos dois blocos de respostas dos professores, retomamos nosso objetivo -
investigar como a SD didática é adotada pelos professores em sala de aula – e
constatamos que uma quantidade muito pequena dos professores em curso de
capacitação está elaborando e levando para a sala de aula a SD, porque os pressupostos
teóricos que precedem a elaboração de uma SD ainda estão distantes da maioria dos
professores por vários motivos. A SD nas aulas do ensino fundamental ainda está
distante, porém observa-se, a partir, da interação com esses professores que há, hoje,
consciência entre eles da ineficiência das aulas de língua materna pautadas na gramática
tradicional e vontade de mudar sua prática de sala de aula, pois o próprio contexto está
‘gritando’ por isso.
Outro fator que tem favorecido essa conscientização de necessidade de mudança é o
livro didático. Um grande número de livros vem adequando-se às novas tendências
teóricas. Isso pode ser observado em livros didáticos que trazem vários gêneros tanto na
produção de leitura quanto na escrita. Esses livros, de certa forma, têm contribuído para
que o professor procure capacitar-se nessa nova perspectiva, levando-os a procurar
cursos de capacitação que trabalhem o gênero na sala de sala, bem como a SD.
Essa constatação leva-nos a dizer que, as universidades, têm um papel importante na
transformação de uma prática em cima de regras de gramática, sem contextualização,
para um ensino de língua que a considere em seu uso, porque tomar como
responsabilidade nossa a atualização dos professores do ensino fundamental. É
necessário colocar em prática o tripé: ensino, pesquisa e extensão, assumindo o papel
social da universidade fora dos seus portões, através de cursos de capacitação,
assessoria, enfim manter um diálogo constante com o nível fundamental e o médio, de
forma que as muitas pesquisas feitas para diagnosticar esses dois níveis de ensino sejam
devolvidas à sociedade em forma de propostas que resolvam os problemas detectados
ou apontem soluções.

5. ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
A partir das observações nas visitas aos polos e dos números quanto ao uso da SD na
prática de sala de aula de professores do ensino fundamental II, é possível, senão
necessário, tecer algumas ponderações.
Embora tenha usado números para quantificar as respostas dadas pelos professores ao
questionário, tenho dúvida quanto a esse número de professores que utilizaram sem
problema a SD e dos que tentaram, pelo menos, uma, mas não revelam se a concluíram.
Esse percentual ficou em torno de 30%, sendo que minhas observações de campo
levam-me a concluir que esse grupo não concluiu nenhuma SD, podendo ser somado ao
grupo que não respondeu e ao grupo que quebrou a máxima da relevância, conforme
leitura feita no item 4.2.
Essa leitura é possível tendo por base as observações feitas por mim em visitas ao polo
sob minha responsabilidade. O professor (aluno) assiste às aulas, se interessa pelas
propostas apresentadas, porém, na escola, onde atua, a maioria continua com a prática já
consolidada por várias causas:
 as novas propostas requerem muito mais tempo para preparar as aulas, pois
quase todo material tem de ser elaborado pelo professor; não há disponível nos
livros didáticos;
 o programa já em andamento pelo professor está praticamente todo no livro
didático adotado pela escola;
 o professor do ensino fundamental II geralmente atua em mais de uma escola,
não tendo nenhum turno destinado à preparação de aulas, portanto ele opta por
adotar uma proposta cujo material esteja, de alguma forma, pronto e disponível;
 a maioria dos professores teve sua formação profissional alicerçada em uma
concepção de linguagem, de texto, de sentido que vai de encontro com a
concepção que alicerça os orientações curriculares em vigência;
 alguns cursos de graduação também ainda não estão afinados com a concepção
de linguagem que alicerça essa nova prática de ensino de leitura e produção de
texto;
 a formação continuada não consegue oferecer todo o arcabouço teórico
necessário para habilitar o professor a uma prática pedagógica - a
sociointeracionista no caso da formação da qual fiz parte;
 o professor que não participasse da formação de que fiz parte teria descontos
salariais. Portanto, havia uma presença significativa, porém nem sempre
espontânea, pois não há, geralmente, um atrativo que dê retorno financeiro ao
professor;
 a formação continuada, na maioria das vezes, não resulta em uma titulação, por
isso ele não é avaliado. Se houvesse uma avaliação, talvez o professor, em
formação, fosse forçado a elaborar, pelo menos, uma SD e desenvolvê-la em sua
sala de aula.
Por esses motivos, a participação à formação continuada para uma parte dos professores
não é buscada, mas imposta pelos seus superiores (a instituição). Dessa forma, as
mudanças na sua prática de sala de aula são pouco visíveis.
Saliente-se que a oferta de formação continuada pelas instituições é feita com as
melhores das intenções; tanto a instituição quanto o professor formador (ou grupo)
pretendem capacitar o profissional que, muitas vezes, está longe das pesquisas da sua
área. Porém, o que estou mostrando e questionando são os resultados advindos de
respostas do próprio professor (aluno) e de observações feitas no espaço onde o
professor (aluno) atua.
Diante das constatações, penso que a formação continuada tem de ser repensada tanto
por nós, professores formadores, quanto pelas instituições que solicitam essa formação.
Esse repensar precisa contemplar a modalidade dos cursos a oferecer, a repercussão
desses cursos em nível de aperfeiçoamento profissional como também em nível de
ganhos financeiros (plano de carreira, competência das instituições (prefeitura).
A formação continuada pode ser pensada em termos de cursos que ofereçam titulação
aos professores, como especialização ou mestrado. O profissional passaria do papel de
um ouvinte (sem compromisso) para um ouvinte participativo, que terá de realizar
atividades, que será avaliado. Enfim, sua presença não mais seria monitorada pela sua
instituição, mas ele teria de apresentar resultados em um determinado prazo. Esses
resultados não seriam somente para prestar conta com a instituição, mas também
representariam titulação, portanto ascensão profissional. As instituições públicas de
nível superior também precisam repensar seu papel junto à sociedade, adequando seus
cursos de licenciatura às novas orientações curriculares e oferecendo cursos com reais
condições de capacitar o professor para as novas tendências teóricas para o ensino de
língua materna, condição sine qua non para uma prática de sala que dê conta da língua
em uso.
“Não pode haver uma prática eficiente sem fundamentação num corpo de princípios teóricos
sólidos e objetivos. Não tenho dúvidas: se nossa prática de professores se afasta do ideal é
porque nos falta, entre outras condições, um aprofundamento teórico acerca de como
funciona o fenômeno da linguagem humana. O conhecimento teórico disponível a muitos
professores, em geral, se limita a noções e regras gramaticais apenas, como se tudo o que é
uma língua em funcionamento coubesse dentro do que é uma gramática. Teorias lingüísticas
do uso da prosódia, da morfossintaxe, da semântica, da pragmática, teorias do texto,
concepções de leitura, de escrita, concepções, enfim, acerca do uso interativo e funcional
das línguas, é o que pode embasar um trabalho verdadeiramente eficaz do professor de
português.” (ANTUNES, 2003, p. 40-41)

A reflexão sobre a transposição da teoria (através da formação continuada) para a


prática de sala de aula revela-se pouco eficiente na capacitação do professor que está em
sala de aula, porém não invalida essa modalidade para professores que já conhecem esse
aparato teórico e objetivam somente uma atualização de bibliografia ou de técnicas de
ensino ou para outras categorias profissionais. A formação continuada não tem
funcionado quando tem por objetivo preencher uma grande lacuna teórica advinda da
formação do professor, pelo menos nos moldes que tem sido oferecida.
6. REFERÊNCIAS
ANTUNES, Irandé. Aula de português: encontro e interação. São Paulo: Parábola, 2003.
_______. Avaliação da produção textual no ensino médio. In: BUNZEN, C. e MENDONÇA,
M.(orgs.). Português no ensino médio e formação do professor. São Paulo: Parábola, 2006.
_______. Lutar com palavras: coesão e coerência. São Paulo: Parábola,
BAKHTIN, Mikhail. Estética da Criação Verbal (trad. M.E.G. Gomes). São Paulo:Martins
Fontes, 1992.
DOLZ, Joaquim & SCHNEUWLY, Bernard. Gêneros orais e escritos na escola /Tradução e
organização Roxane Rojo e Glaís Sales Cordeiro. Campinas, SP: Mercado de Letras, 2004.
GRICE. H. Paul. Lógica e Conversação. In: DASCAL, M. Fundamentos metodológicos
da lingüística – vol. IV: Pragmática. Campinas, 1982.

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