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O futuro precário do estado-nação (3)

(partes 1 e 2, aqui e aqui)

As destruições da II Guerra, com particular


incidência na Alemanha e na URSS, obrigaram a
um enorme esforço de reconstrução e de
reconstituição das economias que irmanaram
ambos os blocos numa intervenção muito
profunda do gasto público, no âmbito do que se
veio a chamar políticas keynesianas para
aumentar o PIB.

Tudo parecia correr bem, os trabalhadores


pensavam mais no consumo do que na
revolução, o desemprego era marginal, os EUA
eram o grande padrinho do sistema de Bretton
Woods e um grande beneficiário da
descolonização que remetera as antigas
potências colonizadoras para um quadro
regional.

Até que… o modelo implodiu por razões internas


e externas, como se verá na continuação deste
texto.

C - Os trinta gloriosos anos do capitalismo

13 - A reformulação do pensamento político e o esplendor keynesiano

14 - A reconstrução das infraestruturas e o início da integração europeia

15- Instituições supra-nacionais configuram a globalização

16 – A descolonização e o declínio das nações colonizadoras

17 - A aceitação pelos trabalhadores da ordem capitalista

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grazia.tanta@gmail.com 7/01/2018 1
C - Os trinta gloriosos anos do capitalismo

Todos os ciclos de negócios têm uma fase ascendente, que se manifesta


em termos de criação de riqueza, de mais emprego e optimismo; e que
dura enquanto um conjunto de novas tecnologias, outros modelos de
negócio e outros figurinos políticos se desenvolvem. A esse período,
sucede um outro, em que surge o esgotamento da conjugação daqueles
factores, até aí geradores de optimismo, bem dos seus efeitos benéficos.
Nesse período de declínio surgem ou vão-se afirmando outros fatores
tecnológicos, financeiros e políticos que tenderão a estabelecer um novo
paradigma de acumulação de capital, através de uma outra conjugação, o
que relançará a economia para uma nova fase ascendente.

Assim se construíram as ondas de Kondratiev, mesmo para além da sua


morte e que temos vindo a utilizar para caraterizar o capitalismo, desde
que se afirmou como estrutura económica dominante no planeta. Não se
deve inferir do atrás referido que o capitalismo é o destino final da
Humanidade; como qualquer outro modo de produção, apresenta uma
duração que vai muito para além do tempo de uma geração, para grande
e justa impaciência de quantos, sentindo os seus nefastos efeitos, se não
contentam com as suas modificações conjunturais ou superficiais, mesmo
quando favoráveis à multidão. Por exemplo, a esmagadora maioria de
uma população não desdenhará um aumento salarial; porém, só um idiota
irá retirar daí qualquer alteração estrutural do capitalismo.

É um facto que as teses tradicionais, históricas, de abordagem crítica do


capitalismo menosprezaram as suas evidentes capacidades de
aproveitamento de oportunidades e adaptação às inovações tecnológicas,
a sua habilidade quanto à gestão social, política e dos negócios, de
expansão para um mercado global, de criação de crédito e estabilidade
monetária. Menosprezaram também o facto de os níveis de acumulação
de capital terem permitido a afetação de meios financeiros e tecnológicos
à criação e manutenção de meios repressivos dos corpos e das mentes;
numa primeira linha, através de um consumismo, tornado lúdico e
compulsivo e, numa segunda linha, mediante um genocídio silencioso de
povos e camadas sociais ou do método ancestral da guerra. Como diz
Zygmunt Bauman “ o Holocausto nasceu e foi executado na nossa
moderna sociedade racional, num estádio elevado da nossa civilização,
em cima do patamar cultural humano e, por essa razão, é um problema

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da nossa sociedade, da nossa civilização e da nossa cultura”1; tal como o
aprisionamento do povo palestiniano pela entidade israelita, aceite sem
vergonha pela “comunidade internacional”.

Pouco antes da I Guerra, as divisões entre as potências e a força dos


movimentos de trabalhadores admitiam um próximo desmoronamento do
capitalismo, concepção que se acentuou com a Revolução Russa de
1917. Esse desmoronamento global não aconteceu mas a teoria
dominante manteve-se prevendo um colapso de curto prazo, fruto de uma
crise inultrapassável do capitalismo.

Evgueny Varga, figura destacada do poder na URSS, apercebeu-se das


capacidades de adaptação do capitalismo em 1946 mas, foi obrigado a
reconhecer que as economias capitalistas só conheceriam o colapso;
Varga terá pensado a execução de Kondratiev, uns anos antes, por ter
concluído – e acertadamente – que a escolástica era uma mera
construção ideológica se a realidade a desmentia. A realidade estaria …
errada; Stalin e os trotskistas ocidentais estavam de acordo sobre a
eminente derrocada do capitalismo a ocidente, como consequência de
uma próxima estagnação que, afinal só surgiria, muito mais tarde, nos
anos setenta e que então trouxe a implantação do paradigma neoliberal e
não a revolução ou mesmo, um placebo chamado “socialismo”.

O segundo pós-guerra constitui o início da fase ascendente da quarta


onda de Kondratiev que irá atingir o ponto de inflexão nos primeiros anos
da década de 70. É um período de grandes inovações, como os
transístores, o cálculo automático, os materiais sintéticos, a televisão, a
pílula, o consumo em massa, a automatização, a exploração espacial, a
energia nuclear e uma nova corrida aos armamentos. Trata-se de um
período de crescimento dos aparelhos de estado, do alargamento da sua
ação e também da criação de grupos de estados-nação com vários graus
de articulação e integração.

Adiante abordaremos vários elementos estruturantes de âmbito


geopolítico e social e que marcam a cena política e económica do pós-
guerra.

13 - A reformulação do pensamento político e o esplendor keynesiano

1
“Modernity and the Holocaust”, citação em Colapso, de Carlos Taibo
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O rolo compressor do exército soviético sobre os nazis, na fase final da
guerra, impulsionou o apoio aos partidos socialistas e comunistas de
então, por parte dos povos e, durante alguns anos, atraiu mesmo a
intelectualidade; ainda que a destruição do fascismo tenha estacado a
norte dos Pirinéus, poupando os regimes de Franco e Salazar.

Essa dinâmica popular de simpatia para com o modelo soviético começou


a decair quando se foram divulgando as práticas repressivas de Stalin.
Apesar disso, os próprios partidos então socialistas, eram forçados a
apresentar ideias sociais avançadas, numa dinâmica progressista que
obrigou os conservadores a adaptarem-se aos novos tempos. Os
trabalhistas ingleses, que chegaram ao poder isolados em 1945, criaram
um serviço nacional de saúde e um estado de bem-estar social universal
e por toda a vida, para além de terem iniciado a descolonização; na maior
parte dos casos, com a concordância dos conservadores,
tradicionalmente pouco dados a grandes envolvimentos do Estado e,
ainda convencidos do caráter de grande potência do país… promoveram
o armamento nuclear.

De modo diferente dos pragmáticos ingleses, a França mostrou, com as


guerras coloniais na Indochina e na Argélia, dificuldades em se adaptar
aos novos tempos. Ainda que com o predomínio da direita no poder,
instituiu-se uma segurança social2, estendeu-se o direito de voto às
mulheres, enquanto se procedia à nacionalização dos grandes bancos,
das companhias de seguros, das companhias elétricas e das indústrias de
ferro e carvão, sem que a posse da bomba atómica tivesse ficado
esquecida.

Na Europa Ocidental vivem-se os tempos de aplicação das políticas


keynesianas com forte investimento público, grande intervenção dos
governos e incremento do consumo. No Leste europeu, os procedimentos
eram idênticos, com uma muito mais elevada intervenção do Estado, na
decisão e na execução, um reduzido papel da iniciativa privada e uma
grande preocupação investidora, em detrimento do consumo.
2
Neste campo, em França, cabe sublinhar o papel de Ambroise Croizat que incluiu
todos os riscos sociais dos trabalhadores numa só instituição, a criação de um sistema
de segurança social que abrange ativos e não ativos, com financiamento das
empresas, do nascimento até à morte e com uma gestão confiada aos próprios
beneficiários. Um dos aspetos mais avançados socialmente era a atribuição de um
salário equivalente a 225 h mensais a uma mãe que ficasse a tomar conta de dois
filhos, como reconhecimento de um trabalho efetivo, desligado da órbita do capital
(conf “Acabar com as Lutas Defensivas” de Bernard Friot (Le Monde Diplomatique,
nov/2017)
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14 - A reconstrução das infraestruturas e o início da integração europeia

Os EUA, com os seus poderes económico e militar não só intactos mas,


também reforçados após o final da guerra, face a uma Europa Ocidental
fragilizada, financiam parte da reconstrução daquela através do Plano
Marshall e do investimento de empresas americanas. Estas, viram na
Europa uma oportunidade para a efetivação de grandes ganhos de capital
a partir da reconstrução das infraestruturas e da reativação dos circuitos
de comércio e de capitais; e, a partir daí, visavam também estancar ou
reduzir o interesse pelo modelo soviético.

Por outro lado, estando fresca a memória do crash bancário de 1929,


efetuou-se um forte controlo sobre a capacidade do sistema bancário para
a concessão de crédito, com as reservas bancárias obrigatórias a
corresponder a 20/25% do total do crédito concedido; por comparação,
refira-se que o BCE atualmente apenas exige 1% de reservas de caixa,
uma vez que sendo o dinheiro, em geral, um produto de registos
contabilísticos informáticos, no âmbito das operações de crédito, não sai
do sistema bancário, ficando de fora, com valores comparativamente
diminutos, as notas e as moedas. Daí resulta parte importante do poder
actual do sistema financeiro, do seu domínio sobre as economias
nacionais, empresas, famílias e Estados, através da dívida, delegando
nas classes políticas a transferência dos efeitos da insanidade do
capitalismo e do sistema financeiro, para as populações.

Voltando ao pós-guerra, as taxas de juro reais eram então, baixas ou


mesmo negativas, facilitavam os devedores, mormente os Estados, que
encontravam assim formas de se financiarem sem onerar as sociedades
com cargas fiscais elevadas; ao mesmo tempo que permitiam a erosão da
dívida pública. Hoje, não é assim; os Estados endividam-se em paralelo
com uma tributação fiscal elevadíssima, num contexto de baixa inflação.

Na sequência do Plano Marshall, criava-se, no Leste, o Comecon (janeiro


de 1949) entre a URSS e os países que haviam adoptado o seu modelo
estatizante e de partido único, um conjunto desconectado do sistema
capitalista de mercado, ocidental; e em acerba competição estratégica
com este último.

Essa competição, num contexto de Guerra Fria e de grandes clivagens


políticas no eixo esquerda-direita, seria o ponto de partida para a criação
de uma sequência de actos de integração económica e política na Europa
Ocidental. Referimo-nos ao Conselho da Europa (maio 1949), à
declaração de Schuman (maio de 1950) e mais estruturadamente, com a

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criação da CECA – Comunidade Europeia do Carvão e do Aço (1951), da
Comunidade Económica Europeia (1957); neste último caso, a preceder
uma longa série de decisões e tratados, sempre na forja, visando a
constituição de um super-estado (a União Europeia) que se mostra, hoje,
crescente em dimensão, profundidade e em totalitarismo; e cujas
instituições se coadunam aliás, em perfeitamente com as oligarquias
nacionais, em competição no reacionarismo. Afastado o perigo de
confrontação e competição com um adversário a Leste, depois de 1991, a
UE vem acentuando o seu pendor economicista e oligárquico, a favor das
multinacionais e do sistema financeiro, ao mesmo tempo que acompanha
os EUA nas aventuras guerreiras na área do Mediterrâneo.

O forte sentimento nacionalista de de Gaulle colocou a Grã-Bretanha –


tomada como sob forte influência dos EUA - fora do processo de
integração europeia, retirou as tropas francesas da cadeia de comando da
NATO e avançou para um arsenal nuclear. No mesmo sentido, de Gaulle
almejava uma suserania da França no espaço europeu ocidental
beneficiando da então debilidade da Alemanha Ocidental; mais tarde essa
suserania evoluiu para uma paridade (o eixo franco-alemão) o qual se
transformou em supremacia alemã, com a pujança da sua economia e a
reunificação.

Também no plano militar se estruturam à época, coligações antagónicas


que separam a Europa em duas partes, com escassos países neutros de
permeio. A NATO3 (1949) configura-se como expressão da suserania
americana que perdura até hoje, de defesa face a uma propagandeada
ameaça soviética e hoje, russa; insere-se na supervisão militar que os
EUA entendem estender a todos os quadrantes do planeta, com um
assumido direito de bombardear, invadir, bloquear, manipular e financiar
regimes, grupos militares ou meramente terroristas. No contexto da
Guerra Fria, em resposta à criação da NATO surgiu, dominado pela
URSS, em 1955, o Pacto de Varsóvia, entretanto extinto na sequência do
desmoronamento do Bloco de Leste. No campo militar, como em muitos
outros, entre os dois blocos de regimes em oposição na Guerra Fria,

3
O derrube do Muro de Berlim e o desmembramento do bloco de Leste e da URSS
conduziram à desaparição do Pacto de Varsóvia mas não a da NATO. Os EUA
precisam de manter um pé na Europa, como monitores, agitando uma ameaça russa
para garantirem a venda de armas; e, na prática, diretamente, através da NATO ou
outras siglas militaristas onde participa, vem intervindo em áreas geográficas que não
envolvem, nem sequer confinam com países membros ou ainda, de onde não partem
ameaças para aqueles.
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vigorava o mimetismo; até mesmo na forma oligárquica como as
populações eram (e são) afastadas das decisões sobre as suas vidas.

15 - Instituições supra-nacionais configuram a globalização

Bretton Woods foi o cenário onde se estabeleceu em 1944 a nova ordem


monetária e financeira global, com o domínio total dos EUA e do dólar. Foi
então, criado o FMI, destinado ao apoio a países com problemas de deficit
externo, de crescimento económico, visando o aumento do emprego e a
redução da pobreza (!). Depois do fim da convertibilidade do dólar em
ouro (1971) e o ocaso do keynesianismo, adoptou os preceitos neoliberais
impondo medidas draconianas aos países em dificuldades e que
resultam, invariavelmente, em programas de austeridade sobre a
população e privatizações em troca dos financiamentos concedidos, com
taxas elevadas. Em Portugal, a intervenção do FMI sucedeu em 1977,
1983/85 e, recentemente (2011/14), no âmbito do programa de
reajustamento estrutural, com o FMI em parceria com o BCE e a
Comissão Europeia. Outra instituição saída de Bretton Woods foi o Banco
Mundial, vocacionado para financiar projetos de apoio ao
desenvolvimento.

Ainda em Bretton Woods foi desenhado um modelo estável de


relacionamento entre as moedas nacionais, com a fixação de uma
paridade para o dólar, em $ 35 por onça de ouro, servindo a moeda
americana de referencial, evitando-se assim flutuações com impactos
nocivos no comércio internacional; esse papel central do dólar, não
ofereceu grande contestação, numa época em que os EUA detinham 80%
das reservas mundiais de ouro, uma capacidade produtiva não destruída
pela guerra e uma enorme supremacia no comércio global. O sistema
funcionou enquanto a economia americana teve grande domínio também
nas relações económicas internacionais; quando o dólar começou a
decair, em paralelo com uma intensa procura de ouro ou de outras
moedas, como o marco alemão ou o yen japonês, países com fortes
excedentes comerciais, os EUA acabaram com a convertibilidade, em
1971.

Em 1947 foi criado o GATT - Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio, com
o objetivo da liberalização do comércio mundial, restrito antes da guerra,
então sob forte protecionismo no seio de cada um dos impérios potências
coloniais, bem como entre os estados-nação, na sua generalidade.
Entendia-se que o comércio livre, isento de barreiras, era fonte de
eficiência económica, que alimentava a democracia e o bem-estar social;
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e, nessa lógica, além do comércio de mercadorias foi-se incluindo os
serviços, os investimentos e as patentes, num processo que foi permitindo
o domínio das multinacionais e o alargamento da sua presença pelo
mundo processo esse que culminou em 1995 com a criação da OMC -
Organização Mundial de Comércio, onde estão presentes a grande
maioria dos países, predominando, entre as ausências, numerosos países
árabes ou muçulmanos que se reservam na situação de observadores.

Cabe ainda referir várias das muitas instituições de caráter global ou


regional que federam ou substituem os estados-membros e que mostram
ser cada vez maior o número e a extensão dos problemas que não podem
ou devem ficar cingidos à lógica autárcica do estado-nação e das suas
domésticas oligarquias. Entre as globais, podem referir-se a UNESCO -
Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura,
a OMS - Organização Mundial da Saúde, a OCDE - Organização para a
Cooperação e o Desenvolvimento Económico, a OIT - Organização
Internacional do Trabalho, a FAO – Organização para a Agricultura e a
Alimentação, a AIEA – Agência Internacional de Energia Atómica, a
CNUCED/UNCTAD - Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e
Desenvolvimento…

Porém, as agressões ao ambiente e as alterações climáticas, embora


pouco discutidas durante os 30 gloriosos anos de crescimento do famoso
PIB, têm hoje uma importância incontornável e tardam em ter órgãos
globais de gestão, tudo ficando dependente de conferências episódicas e
temporárias, no final das quais, os principais estados-nação responsáveis
pelos problemas existentes, agem como entendem, sem serem objeto de
sanções ou boicotes, como acontece sempre que estão em jogo clivagens
geopolíticas ou ao interesses comerciais das grandes potências.

As instituições internacionais de caráter regional são muitas, sendo


incontornável referir a União Europeia como caso único de
aprofundamento de integração política e económica, com múltiplos órgãos
decisórios que se colocam acima dos estados-membros. Referimos ainda,
nas Américas, o NAFTA e o Mercosul, na Ásia, a ASEAN, a APEC e a
Liga Árabe ou, em África, a SADC e a CEDEAO/ECOWAS. São ainda de
referir as instituições não estatais com uma abrangência global para
temas específicos, como a Cruz Vermelha ou a Amnistia Internacional.

Em termos políticos, foi criada em 1945 a ONU como forum de diálogo e


concertação entre as nações… representadas pelas classes políticas
nacionais e, para mais, com a constituição de um diretório, com direito de
veto, constituído por EUA, URSS, França, Grã-Bretanha e China (o
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regime de Taipé) e que se mantém até hoje, com a República Popular da
China a substituir a ilha de Taiwan ou Formosa e a Rússia a herdar o
lugar da extinta URSS, todas potências nucleares.

16 – A descolonização e o declínio das nações colonizadoras

Para além da crispação latente nas fronteiras dos dois blocos que
dividiam a Europa, uma outra ameaça provinha da descolonização que se
desenhava e que tornaria os países europeus, no seu conjunto, potências
regionais ao abrigo da sombra protetora dos EUA uns, da URSS, outros,
com muito poucas neutralidades.

As neutralidades face ao antagonismo Leste-Oeste viriam a crescer,


sobretudo nos novos estados-nação, erigidos nas antigas colónias e,
durante algum tempo, na sequência da Conferência de Bandung tiveram
algum protagonismo, sob o impulso de Nehru, Tito e Chu-En-Lai. Porém,
para muitos dos novos países, sobretudo em África, uma coisa era a
independência política, criar hino e bandeira e outra, bem mais complexa,
era criar coerência económica e autonomia, tendo como substrato
material estruturas vocacionadas para o abastecimento dos países
ocidentais em matérias-primas, minerais e produtos agrícolas de
plantação, numa situação de dependência quanto a mercado e preços; e,
tudo isso, em paralelo com a vida tradicional de populações inseridas em
agricultura tradicional de subsistência, ignoradas pelo antigo colonizador e
desprezadas pelas novas elites.

Aí, sucediam-se golpes de estado com o apoio de grupos de militares ou


eram as próprias hierarquias militares, que assumiam diretamente a
predação em conluio com as multinacionais ou interesses ancorados nas
antigas metrópoles europeias, para que se mantivesse a exploração
colonial, depois da independência, sob outra bandeira; e há mesmo casos
de intervenção de mercenários. Noutras situações, dirigentes corruptos -
Mobutu, Houphouet-Boigny, Idi Amin, Mugabe, Bokassa, Nguema, J. E.
dos Santos… - montavam regimes repressivos e predatórios,
personalizados. Nos poucos casos em que houve a chegada ao poder de
grupos com intenções louváveis, estes esbarravam com a falta de capitais
e tecnologia e ainda com as manobras de multinacionais que exploravam
divergências étnicas ou tribais conducentes ao seu derrube. A
continuidade das fronteiras coloniais na sua total artificialidade, a
existência de estruturas tribais separadas por essas fronteiras minavam
possíveis solidariedades e, pelo contrário, impunham conflitos e guerras,
o mais grave deles no Ruanda.
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Noutros casos, as partilhas coloniais haviam dividido territórios com
estruturas estatais antigas, redesenhando-as ou impondo novas
entidades, gerando ou exacerbando antagonismos étnicos e religiosos,
como se verificou após o desmantelamento do Império Otomano, com a
invenção de novas entidades como o Líbano, a Jordânia ou a entidade
sionista; neste caso, sob a forma de ocupação territorial por estranhos à
região, com a expulsão dos seus ancestrais habitantes. O mesmo se
observou na separação entre hindus e muçulmanos na Índia, geradora de
um artificial Paquistão como pretenso unificador de bengalis, pashtuns,
baluches e outros, na base da crença religiosa. Bem mais recentemente,
afirmou-se o drama sudanês, numa primeira fase e sul-sudanês, na
atualidade. No Golfo Pérsico, os Ocidentais têm sustentado a
“democracia” gerida por reis e dignitários medievais que garantem o
policiamento dos poços de petróleo, à custa da ausência de quaisquer
liberdades cívicas. Finalmente, depois do desmoronar em Dien Bien Phu
da dominação francesa no Vietnam, foram os EUA que tentaram colocar
os vietnamitas nos eixos do neocolonialismo … através da aspersão com
napalm e com o agente laranja.

Dois cancros políticos e humanitários sobreviveram no período em


apreço, sob formas degeneradas de estados-nação; o apartheid sul-
africano que haveria de durar até 1994 e a demência genocida israelita,
de fachada religiosa, que perdura. No primeiro caso, a maioria da
população não “branca” era confinada em bantustões, como reservas de
mão-de-obra, carinhosamente designados por homelands; ou remetida
para os subúrbios, para as townships onde se amontoavam trabalhadores
sem direitos, nem condições decentes de habitabilidade, a quem o regime
concedia, magnânimo, diariamente, o acesso precário às áreas dos
senhores, como gastarbeiters na sua própria terra. Tratava-se de um
regime cuja estrutura social e de captura do trabalho era estudada e
montada metodicamente, na base de um cientismo racista e laico.

Na entidade sionista, devido à exiguidade do território, há uma acrescida


e constante ocupação do espaço que continua, no entanto, a ser
partilhado, em camadas sobrepostas ou células que se pretendem
estanques. Uma, mais rica, de senhores e outra, em constante
reconfiguração, com controlos militares em cada esquina, constituída
pelos habitantes de sempre, espoliados, humilhados, segregados, perante
o passivo incómodo da “comunidade internacional”, por mais etéreo que
seja este conceito. A ideologia deste regime racista não inclui tanto a
expulsão dos palestinianos, como a sua submissão como fornecedores
precários de trabalho barato; sagrado desígnio estatal que preenche os

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fanáticos religiosos é uma esperança vã, ameaçada por uma demografia
desfavorável4. A continuidade da entidade sionista estará assegurada
enquanto aos EUA5 e ao Ocidente em geral, for necessária a existência
de um quartel para controlo das terras do petróleo; só assim se entende
que aos sionistas seja permitida a posse de armas atómicas e dos
mísseis Jericó, com um alcance de 11500 Km (que podem atingir o…
Rio de Janeiro…).

De modo mais lato, a proliferação de condomínios fechados, bem


equipados, protegidos e guardados (na África do Sul de hoje, como nos
meios ricos de outros países), faz parte da lógica de segmentação social
em que o resto da população vive em townships, sejam os subúrbios das
cidades europeias ou a grande parte das enormes conurbações africanas
(Lagos, Nairobi…).

17 - A aceitação pelos trabalhadores da ordem capitalista

As inovações técnicas, a reconstrução do pós-guerra, a vulgarização da


produção em massa, o aumento do emprego, o afluxo de gente do campo
para as cidades, as emigrações dos europeus do Sul para Norte, o
grande aumento da produtividade, são factores que criaram uma grande
massa de gente e de rendimentos, geradores de consumo acelerado. É
um período de grande intervenção do Estado, também na análise da
conjuntura e do planeamento, exigentes da elaboração de detalhadas
estatísticas.

4
Em Portugal, a pequena e isolada comunidade judaica de Belmonte tem sido objeto
de assédio junto de jovens para que vão viver para os territórios ocupados pelos
sionistas. Para agradar aos sionistas e… atrair investimento estrangeiro, nos meios
governamentais da paróquia lusa pretende-se atribuir passaporte português a
sefarditas de origem lusitana emigrados para a Grã-Bretanha quando da sua expulsão
há cerca de 500 anos; o que não é extensível aos descendentes de mouros expulsos
na mesma ocasião… Dentro da imbecilidade que é apanágio da classe política
portuguesa, aguarda-se que sejam atribuídos – num 10 de junho, dia da “raça” -
passaportes póstumos a David Ricardo e Benedito Spinoza, que tiveram ancestrais
próximos membros de comunidades judaicas de origem portuguesa.

5
A posição das grandes potências tem sido comum na sustentação do sionismo em
terras palestinianas. A Grã-Bretanha favoreceu a instalação das primeiras levas de
judeus para a Palestina, no final da II Guerra; a França forneceu a tecnologia nuclear;
os EUA são os grandes financiadores de capitais privados e de armamento; e a
URSS, nos anos 80 encaminhou centenas de milhares de judeus soviéticos para
reforçar o povoamento da entidade sionista.
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Num renovado papel do Estado, exigia-se dele fórmulas de controlo
político do trabalho que não poderiam corresponder à sua militarização,
como praticada pelos fascistas; e, muito menos, permitir propensões
revolucionárias nos trabalhadores. A acumulação capitalista do pós-
guerra fez-se através da inovação tecnológica e na gestão, na
organização do trabalho, na produção em massa, com o desenvolvimento
de um mercado tendencialmente global, aberto e não maculado com
guerras como as havidas nas últimas décadas; fez-se também através
dos objetivos introduzidos nas expectativas dos trabalhadores, com o
acesso fácil a bens de consumo diversificados, bons salários e pouco
desemprego, garantias contra despedimento, segurança social, férias
pagas, saúde e educação públicas. Certamente alguns think tanks do
capitalismo (Mises, Hayek, Friedman), perante estes “capitais”
desperdiçados em medidas de caráter social, terão sorrido e grunhido…
“dentro em breve, cá vos apanharemos!”

Esse enquadramento converteu também os sindicatos a uma atuação


complacente e rotineira, sem pretensões revolucionárias, como aconteceu
também com os partidos incluídos no espectro da esquerda. Se isso fosse
conseguido – e foi, durante os 30 anos gloriosos – não havia que temer a
concorrência do modelo soviético, com todos aqueles ingredientes, mas
sem conseguir a produção em massa de bens de consumo, nem a
liberdade de expressão existente no Ocidente. A contestação a esse
modelo de acumulação – conhecido por modelo social europeu – surgiu
de movimentações de estudantes e trabalhadores em Itália e França, no
período 1967/68, alimentadas por um ensino burocratizado e conservador
como também pela massificação fordista do trabalho nas fábricas. A
procura de uma saída sistémica, ainda que minoritária, era alimentada
pela Revolução Cultural de Mao, pela intervenção militar dos EUA no
Vietnam, pelo romantismo do Che, enquanto os tradicionais partidos
comunistas se tornavam cordatos, conservadores, tal como a sua
concorrência eleitoral e não complacentes com a invasão soviética da
Checoslováquia (excepto o PCP).

A normalização, a uniformização, a pacificação social passaram também


pelos sistemas partidários nacionais e pelos modelos de representação. A
conjuntura favorável apontava para o conservadorismo e a aceitação de
fórmulas de alternância entre dois partidos, uma combinação de
rotativismo com bipartidarismo entre duas formações políticas pouco
diferenciadas mas que serviam para enquadrar as esperanças populares
ora num, ora noutro, nada se alterando de substancial.

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O pântano criado, marcava uma diferença face ao período entre as duas
guerras, com turbulência política entre múltiplas e instáveis formações
partidárias, com a presença de partidos e milícias fascistas e mesmo de
regimes fascistas em grande parte da Europa. De facto, a harmonização
conseguida evitou a guerra na Europa (mas não as atividades
guerrilheiras do IRA, das Brigate Rosse, da RAF ou da ETA); não evitou
nesse período mas, por instigação das potências europeias e da tutela
norte-americana promoveu, fora de portas, a guerra na Jugoslávia, cerca
de vinte anos depois.

(continua)

Este e outros textos em:

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