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Ao entender o princípio norteados por trás deste livro você poderá aproveitá-lo melhor.
O princípio em questão é o da atenção seletiva que parte do pressu-posto de que
você não tem tempo de se familiarizar com todos os aspectos da história do
pensamento cristão, mas deseja ter um conhecimento geral dos seus elementos mais
importantes. A abordagem adotada consiste em começar pintan-do uma cena com
pinceladas amplas e, depois, preencher os detalhes de cercam-nadas áreas Ao
concluir a leitora deste livro, você terá, portanto, uma compreensão geral
adequada do desenvolvimento da teologia cristã. Apesar de seu caráter sucinto, a
obra inclui um grande número de informações – bem mais do que normalmente se
pode encontrar em introduções do gênero.
Este livro começa com uma Introdução que procura explicar o que é Teologia
Histórica, como ela se encaixa no estudo da teologia em geral, e por que é uma
disciplina a ser estudada. Recomendamos fortemente que você leia essa
introdução antes de prosseguir com a leitura.
Costuma-se dividir a história do pensamento cristão em quatro perío-dos
amplos:
Essas divisões são um tanto arbitrárias; mas têm se mostrado úteis num
contexto pedagógico e, portanto, foram mantidos. Cada capítulo é
constituído de duas seções principais:
Se você estiver usando este livro para estudar Teologia Histórica sozinho,
é recomendável que você leia os capítulos na seqüência em que são apre-
sentados. Cada parte desta obra e desenvolvida com base no conteúdo
das partes anteriores. Assim, o texto sobre o período medieval pressupõe
que você está familiarizado com o período patrístico; o texto sobre o século
16 pressupõe que você está a pardo período medieval, e assim por diante. No
entanto, se você estiver usando este livro como parte de um curso, pode
trabalhar facilmente com as seções da obra relacionadas ao material
adotado por seu professor. Em caso de dúvida, peça orientação.
Ao se deparar com termos desconhecidos, você tem duas opções.
Primeira, procure usar o glossário no final desta obra, no qual você
poderá encontrar uma definição breve do termo e a indicação de uma
discussão do conteúdo relevante do texto. Ou então, procure usar o
índice, que lhe dará uma análise mais completa dos textos em que você
encontrará as principais discussões desta obra.
Por fim, podemos lhe garantir que tudo neste livro — tanto o conteúdo
quanto a organização — foi testado por alunos e leitores da Austrália, Canadá,
Reino Unido e Estados Unidos, visando tomar o texto absolutamente
acessível. No entanto, o autor e a editora estão abertas para sugestões de
professores e alunos que poderão ser incluídas em edições posteriores da
obra.
INTRODUÇÃO
Esta obra tem por objetivo servir de introdução à Teologia Histórica. Assim, é
importante situar essa disciplina e entender sua relevância dentro da teologia como
um todo. Podemos começar considerando as origens da teologia como disciplina
acadêmica distinta e, deste modo, compreender seus princi-pais componentes.
Uma das justificativas mais fortes para a necessidade das faculdades de teologia
nas universidades foi apresentada no início do século 19 por E D. E.
Scbleiemacher, segundo o qual essa disciplina era essencial para o bem tanto da
igreja quanto do Estado no tocante à formação de um clero devidamente instruído.
Em sua obra Linef OutHue of the Study of Aeology [Um breve esboço do estudo
da teologia] (1811), Schleiermacher argumentou que a teologia apresentava três
elementos principais: a teologia filosófica (que identifica a "essência do
Cristianismo"); a Teologia Histórica (que trata da história da igreja a fim de
entender sua situação e necessidades atuais) e a teologia prática (que trata das -
técnicas" da liderança eclesiástica e sua práxis). Essa abordagem da teologia levou
suas credenciais acadêmicas a serem ligadas ao consentimento público de que em
importante a sociedade ter um eleito devidamente instruído. Essa suposição se
mostrou adequada para a Berlim do início do século 19, o contexto de
Sclileiconacher. Mas com o avanço do secularismo e do pluralismo no Ocidente, sua
validade passou a ser cada vez mais questionada.
Em países que adotaram uma abordagem fortemente secular, a teologia cristã foi
praticamente excluída do currículo universitário. A revolução francesa de 1789
levou a uma série de medidas criadas com o propósito de elimirim a teologia cristã
de todos os níveis do ensino público. A maioria das universidades mais antigas
da Austrália (como as Universidades de Sidnei e Melbourne) foi fundada sobre
alicerces extremamente seculares, excluindo a teologia por uma questão de
princípio. À medida que essas ideologias de caráter intensamente secular têm
perdido força, é possível encontrar cursos universitários de teologia ou com
elementos teológicos expressivos nas escolas superiores da Austrália.
A ARQUITETURA DA TEOLOGIA
O grande estudioso medieval Eficime, Gilson gostava de comparar os prin-
cipais sistemas da teologia escolástica a -catedrais da mente". Trata-sede uma
imagem poderosa que sugere permanência, solidez, organização e estimara —
qualidades extremamente valorizadas pelos escritores daquele período.
Talvez a imagem de uma grande catedral medieval que provoca a
admiração de grupos de turistas empunhando câmeras fotográficas não
seja tão apropriada nos dias de hoje; ao que parece, o máximo que muitos
professores universitários podem esperar hoje é uma paciência tolerante.
Mas o conceito de que a teologia possui uma estrutura continua sendo
importante. Isso porque a teologia é uma disciplina complexa que mante,
diversas áreas relacionadas numa aliança difícil. Nesta obra, concentraremos
nossa atenção na Teologia Histórica, a qual iremos explorar na próxima
seção. No entanto, convém apresentarmos antes alguns dos outros
elementos que constituem a disciplina da teologia.
Estudos bíblicos
A fonte suprema da teologia cristã é a Bíblia que dá testemunho da base
histórica do Cristianismo tanto na história de Israel quanto na vida, morte e
ressurreição de Jesus Cristo. (Observe que, para fins teológicos, os pares
de temos "Escritura" e "a Bíblia" e "csscriturístico- e "bíblico" são
sinônimos.) Como se costuma ressaltar, o Cristianismo diz respeito à crença
numa pessoa (Jesus Cristo), e não num texto (a Bíblia). Não obstante, os dois
se encontram intimamente entretecidos. Em termos históricos, não
sabemos praticamente nada sobre Jesus Cristo, exceto aquilo que
encontramos no Novo Testamento. Ao procurar tratar da identidade e do
significado de Jesus Cristo, a teologia cristã se vê obrigada a lidar com os
textos que transmitem conhecimento a respeito dele. Em decorrência
disso, a teologia cristã é intimamente ligada à ciência do criticismo e à
interpretação bíblica - em outras palavras, à tentativa de avaliar com
precisão a natureza literária e histórica distintiva dos textos bíblicos e de
entender seu significado.
Não é difícil demonstrar a impartância dos estudos bíblicos para a teologia.
O avanço dos estudos bíblicos humanistas no início do século 16 revelou
uma série de erros de tradução nas versões em latim da Bíblia. Em decorrência
disso, tomou-se cada vez mais intensa a pressão para revisar algumas das
doutrinas cristãs com base em passagens bíblicas que antes eram tidas como
corroboração de tais doutrinas, mas que, na verdade, diziam algo diferente.
Pode-se argumentar plausivelmente que a Reforma do século 16 representou
uma
Teologia Sistemática
Teologia Filosófica
Teologia Pastoral
mento se reflete na presente obra que foi escrita com base na suposição
de que, como o presente autor, muitos de seus leitores desejam trazer
todos os recursos críticos da teologia cristã para a esfera do ministério
pastoral.
A história da igreja
O conhecimento acerca do desenvolvimento da história do Cristianis mo,
especialmente seus elementos institucionais, é considerado de modo geral
uma parte integrante da disciplina da teologia. Para os estudantes que
pretendem ministrar dentro de determinada tradição cristã ou que estão
interessados em aprofundar seu conhecimento e a apreciação da sua
própria tradição, a história dessa tradição é particularmente importante.
Muitos cursos de História da Igreja incluem elementos da Teologia
Histórica. É difícil, por exemplo, entender as origens e o desenvolvimento
da Reforma na Europa sem certa compreensão da doutrina de Lutero da
justificação somente pela fé, da mesma maneira como uma falta de
conhecimento acerca das questões relacionadas â controvérsia donatista
dificultou o entendimento da história da igreja no norte da África no século
4°.
Não obstante, a História da Igreja deve ser considerada uma disciplina à parte,
apesar de haver um sobreposição entre os seus interesses e os da Teologia
Histórica. O Édito de Tolerância de Valéria (abril de 311) é extremamente
importante para a história da igneja, uma vez que instaria o Cristianismo como
religião legítima dentro do Império Romano e abriu caminho para o cresci -
mento numérico e o progresso institucional. No entanto, o édito não tem
grande relevância para a Teologia Histórica uma vez que não contribuiu
diretamente para o desenvolvimento da reflexão teológica. Tratar da história da
igreja é estudar fatores culturais, sociais, políticos e institucionais que
moldaram o desenvolvimento da igreja ao longo das eras. É estudar o
surgimento, de instituições (como o papado, o episcopado e as irmandades
leigas) e movimentos (como o metodistrio, o pentecosndismo e os cátaros). O
Cristianismo é situado dentro do fluxo da história e a história da igreja visa
explorar o lugar específico de idéias, indivíduos e instituições cristãs dentro
desse fluxo. Essa influência é bilateral: o Cristianismo influencia a cultura e é
influenciado por ela. O estudo da história da igreja permite compreendera
história em geral e a teologia em particular com maior profundidade.
Esse conceito foi transmitido à teologia cristã em seu estágio inicial. Filo, um
judeu helenista cujos textos eram extremamente admirados pelos escritores
cristãos primitivos, escreveu um tratado chamado Qod Deus inumttabilis sit,
"Eis que Deus é imutável", defendendo energicamente a impassibilidade de
Deus. Em sua argumentação, as passagens bíblicas que pareciam se referir ao
sofrimento de Deus deviam ser consideradas como metáforas, e não de modo
inteiramente literal. Reconhecer que Deus estava sujeito a mudanças seria negara
perfeição divina. "Que impiedade maior poderia haver do que supor que o Imutável
muda?", indagou Filo — uma pergunta aparentemente sem resposta. Para Filo, não
era possível permitir que Deus sofresse ou experimentasse qualquer coisa que
pudesse ser chamada de "paixão".
É por esses motivos que esta obra visa oferecer aos seus leitores o máximo
de contexto histórico para as discussões teológicas dentro dos limites do
espaço disponível. Muitas vezes, as discussões teológicas são realizadas
como se a controvérsia tivesse começado ontem. Um debate informado
dessas questões exige que entendamos como chegamos aqui.
Gastamos tempo suficiente introduzindo nosso tema. É hora de mergu lhar
no universo complexo da teologia patrística ao iniciar nossa investigação do
surgimento da tradição teológica cristã.
CAPÍTULO 1
O PERÍODO PATRÍSTICO,
C. 100 151 D.C.
O período patrestico, foi essencial para esclarecer várias questões. Uma das
tarefas de relevância inicial foi definira relação entre o Cristianismo e o
Judaísmo. As cartas de Paulo no Novo Testamento dão testemunho da
importância dessa questão no primeiro século da história cristã, â medida
que começou a vir a lume uma série de questões práticas e doutrinárias.
Os cristãos gentios (ou seja, os que não eram judeus) deviam ser
circuncidados? Como interpretar corretamente o Antigo Testamento?
Esse fato é relatado tanto por escritores cristãos quanto pagãos. O que não ficaclara é
a data exata da conversão. Alguns escritures cristãos (como 1 areando e Eusébio)
sugerem que a conversão ocorreu antes da batalha decisiva e que Consistíamo teve
uma visão celestial ordenando que ele colocasse o sinal da em no escudo dos seus
soldados. Quaisquer que tenham sido os motivos da sua conversão e quer esta
tenha ocorrido antes ou depois da batalha na ponte Mílvio, não há dúvidas quanto à
sua realidade e conseqOéticias. Aos poucos, Roma se tomou cristianizada. Sob
instruções do próprio imperador, a estátua erigida no Fórum mostra Consistimo
carregando uma cruz - -o sinal de sofrimento que trouxe salvação", de acordo
coma inscrição redigida pelo imperador. Em 321, Constáramo transformou os
domingos em feriados públicos. Símbolos cristãos começaram a aparecerem
moedas romanas. O Cristianismo não era mais apenas legítimo; também estava em
via de se tomara religião oficial do império.
Em decorrência disso, as discussões teológicas construtivas se tornaram
acontecimentos públicos. Com exceção de um curto período de incerteza durante o
reinado de Juliano, o Apóstata (361-363), a igreja passou a contar com o apoio do
Estado. Assim, a teologia emergiu do mundo oculto das reuniões secretas da igreja
para se tomar uma questão de interesse e preocupação pública por todo o Império
Romano. Cada vez mais, os debates doutrinários adquiriram relevância política e
teológica. Constantino desejava ter uma igreja unificada em rodo o seu império e,
portanto, considerou prioridade que as diferenças doutrinárias fossem discutidas e
resolvidas.
À medida que a igreja em Roma se tomou cada vez mais poderosa,
começaram a se desenvolver pontos de tensão entre a liderança cristã em
Roma e em Consuantinopia, prenunciando o cisma posterior entre as igrejas do
Ocidente e Oriente originárias desses respectivos centros de poder. Além de
Roma e Constantumpha, várias regiões figuraram como centros importantes de
discussão teológica.
Três desses centros podem ser destacados por sua relevância, sendo que
nos dois primeiros falava-se grego e no terceiro, latim
Isso não significa que outras cidades do Mediterrâneo não foram importantes.
Milão e Jerusalém também foram centros de reflexão teológica cristã,
mesmo que nenhuma das duas cidades tenha alcançado a preeminên cia
de suas rivais.
À medida que o Cristianismo se consolidou no mundo mediterrâneo,
formaram-se as condições estáveis necessárias pua a reflexão teológica
séria. Em decorrência disso, o período parístico posterior (de cerca de
310 a 451) pode ser considerado um ponto alto da história da teologia
cristã. Os teólogos passaram a desfrutar a liberdade de trabalhar sem a
ameaça de perseguição e puderam tratar de uma série de questões de
grande importância para a consolidação do consenso teológico que
estava surgindo dentro das igrejas. Esse consenso envolveu amplas
discussões e um processo de aprendizagem doloroso no qual a igreja
descobriu que precisava aprendera lidar com as discórdias e tensões
contínuas. Não obstante, pode-se observar nesse
O termo "paidstico" vem da palavra latina pater, "pai", e designa tanto o período
dos patriarcas ou pais da igreja quanto as idéias características que se
desenvolveram nesse período. Trata-se de um termo não-inclusivo; ainda
não foi sugerido na literatura nenhum termo inclusivo de aceitação geral.
Os seguintes temos relacionados são de uso freqüente e devem ser
observados.
O período patrístico
Essa designação vagamente definida costuma ser entendida como uma
referência ao período que vai da conclusão dos escritos do Novo
Testamento (c. 100) até a reunião decisiva do Concilio da Calcedênia (451).
Patrístico
Patrologia
Em outros tempos, esse termo significava literalmente "o estudo dos patriarcas"
(assim como -teologia" significava "o estudo de Deus Itheos]"). Nos últimos
tempos, porém, essa palavra passou por uma mudança de significado. Agem,
se refere a um manual de literatura patrística, como o do conhecido
estudioso alemão Joharmes Quasten, que oferece aos leitores fácil acesso
às idéias centrais dos escritores fantásticos e a alguns dos respectivos
problemas de interpretação.
PRINCIPAIS TEÓLOGOS
(na atual Argélia) em 395. Nos trinta e cinco anos restantes de sua vida,
envolveu-se em uma série de controvérsias extremamente importantes para o
futuro da igreja cristã no ocidente, e teve uma contribuição decisiva em
cada uma delas. Sua exposição minuciosa do Novo Testamento,
especialmente das cartas de Paulo, lhe deu amputação que permanece até
hoje de "segundo fundador da fé crisff'(Jerônimo). Quando a idade das
trevas finalmente se encerrou na Europa ocidental, o conjunto substancial
de escritos teológicos de Agostinho formou a base para um grande programa
de renovação e desenvolvimento teológico, consolidando sua influência
sobre a igreja ocidental.
Uma parte considerável da contribuição de Agostinho diz respeito ao
desenvolvimento da teologia como disciplina acadêmica. Não se pode dizer
que a igreja primitiva desenvolveu qualquer "teologia sistemática". Sua
preocupação central era defender o Cristianismo de seus críticos (como nas
obras apologéticas de Justino Mártir) e esclarecer os aspectos centrais de
seu pensamento, combatendo as heresias (como nos escritos antignósticos
de trinca). Não obstante, uma desenvolução doutrinária momentosa ocorreu
durante os quatro primeiros séculos, especialmente em relação à doutrina
da pessoa de Cristo e ir doutrina da Trindade.
A contribuição de Agostinho foi a estruturação de uma síntese do pensa-
mento cristão, expressada de forma suprema em seu principal trotado De
Civitam Dei, "Sobre a Cidade de Deus". Como o famoso romance de Charles
Dickens, a "Cidade de Deus" de Agostinho é um conto de duas cidades – a
cidade do mundo e a cidade de Deus. A obra é de tom apologético:
Agostinho se mostra sensível â acusação de que a queda de Roma foi
decorrente do fato de haver abandonado o paganismo clássico em favor do
Cristianismo. No entanto, ao defender o Cristianismo dessa acusação,
acabou inevitavelmente fazendo uma apresentação e exposição
sistemática das linhas principais da fé cristã.
Além disso, porém, pode-se argumentar que Agostinho realizou contribuições
críticas em três áreas de grande importância da teologia cristã: a doutrina da
igreja e dos sacramentos que surgiu da controvérsia comunista; a doutrina da
graça que surgiu da controvérsia pelagiana; e a doutrina da Trindade. É
interessante observar que, na verdade, Agostinho nunca explorou a área
da cristologia (ou seja, da doutrina da pessoa de Cristo), que teria, sem
dúvida alguma, sido beneficiada por sua grande sabedoria e
discentintento.
PRINCIPAIS DESENVOLUÇOIes TEOLÓGICAS
O papel da tradição
Em latim, a palavra credo significa "eu creio", com a qual se inicia o Credo
Apostólico - provavelmente o mais conhecido de todos - "Creio em
Deus..... Essa expressão passou a se referir a uma declaração de fé que
resume os pontos da convicção cristã comum a todos os cristãos. Por esse
motivo, o termo "credo" nunca é aplicado a declarações de fé associadas
com denominações específicas. Estas últimas costumam ser chamadas de
"confissões" (como a Confissão de Augsburg, luterana, e a Confissão de
flesíninster, reformada). Uma "confissão" diz respeito a uma denominação e
inclui crenças e ênfases específicas relacionadas a essa denominação; um —
credo" diz respeito a toda a igreja cristã e inclui nada mais nada menos do
que uma declaração de convicções que todo cristão deve ser capaz de
aceitar e se comprometer. Um "credo" é reconhecido como uma declaração
concisa, formal, universalmente aceita e autorizada acerca dos pontos
principais da fé cristã.
A doutrina da Trindade
Uma vez que as discussões cristológicas da igreja primitiva haviam sido
resolvidas, as conseqüências dessas decisões passaram a ser exploradas.
Nesse período extremamente criativo e interessante da teologia cristã, a
doutrina da Trindade começou a tomar uma forma identificável. A
característica básica dessa doutrina é a afirmação da existência de três
Pessoas dentro do Ser Divino - Pai, Filho e Espírito Santo - e a necessidade
de considerá-las igualmente divinas e de mesmo status. A co-igualdade do
Pai e do Filho foi comprovada por meio das discussões cristológicas que
levaram ao Concílio de Nicéia;
passou a ser normativo dentro da igreja, exerceu um, impacto profundo sobre
o pensamento cristão acerca da natureza da igreja e seus ministros.
A discussão donatista, da qual trataremos em mais detalhes em outra parte
desta obra, foi a primeira a girar em torno da questão da doutrina da igreja
(conhecida como "celesiologia") e temas relacionados, como a adminis-
tração dos sacramentos. Várias das questões levantadas pela controvérsia
voltaríam â tona no tempo da Reforma, quando os aspectos celesiológicos
passariam novamente a ocupar o primeiro plano. Pode-se dizer o mesmo
acerca da doutrina da graça, da qual trataremos a seguir.
A doutrina da graça
Pura Agostinho, a "graça" é uma dádiva imerecida concedida por Deus, pela
qual ele rompe voluntariamente o domínio do pecado sobre a humanidade.
A redenção só é possível como um dom divino. Não é algo que nós mes -
mos podemos alcançar, mas algo que é feito por nós. Assim, Agostinho
enfatiza que os recursos da salvação se encontram fora da humanidade,
no próprio Deus. É Deus quem inicia o processo de salvação, e não os seres
humanos.
Pelágio via a situação de maneira muito diferente. Ensinava que os recursos
para a salvação se encontram dentro da humanidade. Seres humanos indi-
viduais têm a capacidade de salvar a si mesmos. Não estão sob o domínio do
pecado; antes, têm a capacidade de fazer tudo aquilo que é necessário para a
salvação. A salvação é conquistada por intermédio de boas obras que
levam Deus a ter um obrigação para com a humanidade. Pelágio
marginalizou a idéia da graça, entendendo-a em termos daquilo que Deus
exige da humanidade a fim de que esta possa alcançara salvação —como os
Dez Mandamentos ou o exemplo moral de Cristo. O ethos do Pelagianismo
pode ser resumido como "salvação por mérito", enquanto Agostinho ensinava
"salvação pela graça".
É evidente que essas dutis, teologias diferentes envolvem conceitos distintos
acerca da natureza humana. Para Agostinho, a natureza humana é firaca, de-
caída e impotente; para Pelágio, é autônoma e auto-suficiente. Para Agostinho,
a humanidade precisa depender de Deus para recebera salvação; para
Pelágio, Deus simplesmente indica o que precisa ser feito para que a salvação
possa ser obtida e, então, deixa que os seres humanos cumpram essas
exigências por sua própria conta. ParaAgostinho, a salvação é uma dádiva
imerecida; pato Pelágio, a salvação é uma recompensa justamente merecida.
Ao terminar este capítulo, você terá visto os seguintes termos que voltarão a
aparecer ao longo da obra. Faça o que for necessário para entendê-los.
Agostiniano Eclesiológico
Apolinarismo Encanação
Arianismo Extracanônico
Cânon Patriarcas da Capadócia
Canónico Parristico
Concílio ecumênico Patrologia
Credo Pelagianismo
Cristologia Pelagiano
Cristológico Soteriologia
Donatismo Trindade
Doraústa Trinjuírio
Eclesiologia
PERGUNTAS (1)
1, O próprio Evangelho de Marcos, que parece ter sido usado como fonte
para Mateus e Lucas. Assim, 90% do conteúdo do Evangelho de Marcos
pode ser encontrado em Mateus; 53% de Marcos pode ser encontrado em
Lucas. O estilo de Marcos tem características de um texto mais antigo do
que as passagens correspondentes em Mateus ou Lucas que usam várias
expressões semíticas. É extremamente difícil explicar essa observação com
base em qualquer outra hipótese senão aquela de que tanto Mateus, quanto
Lucas se basearam em Marcos e organizaram seu conteúdo.
2. Dados que Mateus e Lucas apresentam em comum. Essa seção do tex-
to com cerca de 200 versicudos, de extensão costuma ser chamada de "Q".
Não há nenhuma evidência de que Q era um evangelho completo ou que
existiu como fonte escrita independente.
3. Dados encontrados apenas em Mateus (texto chamado normalmente
de "M"),
4. Dados encontrados apenas em Lucas (texto chamado normalmente de "L").
antes de Lucas. Mateus e Lucas tiver= acesso à fonte conhecida Q. Além disso,
Mateus teve acesso a outra fonte conhecida como M; Lucas teve acesso a uma
fonte diferente, conhecida como L. Apesar de essa teoria identificar quatro
fontes (Marcos, Q, M e L), é chamada de -teoria das duas fontes" graças à
importância de Marcos e Q em relação a sua abordagem.
Essa temia encontrou mais aceitação entre os estudiosos modernos do Novo
Testamento. No entanto, não é de maneira nenhuma a única teoria a receber tal
recitação. Há estudiosos que regam, por exemplo, a existência de Q e
argumentam que Lucas simplesmente usou Mateus como fonte. J. J. Griesbach
desenvolveu uma hipótese influente de acordo com a qual Mateus foi escrito
primeiro, seguido de Lucas (que usou Mateus). Marcos foi escrito depois, usando
Mateus e Lucas. Também é preciso ressaltar que o -problema sinóptico' diz
respeito à nossa visão de como a tradição oral referente a Jesus nos foi transmitida.
Não questiona sua precisão histórica ou conflabilidade teológica, mas permite
uma compreensão mais profunda do período formativo das tradições do
evangelho, no qual as palavras e atos de Jesus foram entregues e transmitidos
entre as décadas de c. 30 - 60.
No entanto, neste estudo de caso nosso interesse diz respeito a uma questão
ligeiramente distinta, referente à idéia de "tradição" que se tomou tão importante
durante o século 2'. Um movimento conhecido como "Gnosticismo" surgiu como
ameaça séria à igreja cristã desse período, em parte devido ao fato de seus
ensinamentos serem superficialmente parecidos com os do próprio Cristianismo.
Muitos escritores gnósticos argumentavam que a salvação era obtida por meio do
acesso a um ensinamento secreto, sendo esta a única maneira de os devotos
garantirem que seriam salvos. Para alguns escritores gnósticos, o
"conhecimento secreto" em questão era quase uma forma de "senha cósmica".
Quando alguém morria, seu espírito era liberto de sua prisão física e podia, então,
começar sua longa e complexa jornada até seu destino final glorioso. Para chegar
lá, era preciso passar por uma série de possíveis obstáculos que só podiam ser
transpostos com o "conhecimento secreto",
Uma das principais contribuições a essa questão foi feita em 434 por Vicente de Lérias
que vivia no sul da França e em chamado por vezes pelo pseudônimo -Peregrinas".
Escrevendo depois da controvérsia pelagiana, Vicente de Lérias expressou sua
convicção de que as controvérsias da época haviam dado origem a inovações
teológicas como, por exemplo, novas maneiras de interpretar certas passagens
bíblicas. Fica claro que ele considerava a doutrina de Agostinho da dupla
predestinação (que surgiu como resposta às idéias de Pelágio acerca da graça)
um desses casos. Mas como tais inovações teológicas podiam ser
identificadas? Em resposta a essa pergunta, ele argumenta em favor de um critério
triplo pelo qual os ensinamentos cristãos podem ser definidos: ecumenicidade (crido
em toda a parte), antiguidade (crido sempre) e consenso (crido por todos). Esse
critério triplo é descrito com freqüência como "Cânon Vicentino", serid que a
palavra "cânon" neste caso remo sentido de "regra" ou "norma".
comum, filho humano de Maria e José. Essa cristologia reduzida foi julgada
totalmente inadequada por seus oponentes e logo caiu em esquecimento.
Um ponto de vista mais relevante e diametralmente oposto ficou conhecido
como Docerisnuí, do verbo grego dokein (parecer). Essa abordagem – que
provavelmente deve ser considerada uma tendência dentro da teologia e não
uma posição teológica definida – argumentava que Cristo era totalmente
divino e que sua humanidade era apenas uma aparência. Assim, os
sofrimentos de Cristo eram considerados igualmente aparentes, e não reais.
O Decetismo se mostrou particularmente, atraente para os escritores
gnósticos do século 2 e, período em que atingiu seu ponto culminante. A essa
altura, porém, estavam se formando outros pontos de vista que acabariam
obscurecendo essa tendência.
luxúria Mártir é o expoente de um desses pontos de vista. Considerado um
dos apologistas mais importantes do século 2°, Justino Mártir se dedicou
especialmente a mostrar que a fé cristã representou a consumação tanto
da filosofia grega quanto do Judaísmo. Adolf voo Hamack resumiu a
maneira como Justino alcançou esse objetivo: argumentou que "Cristo é o
Logos e o Nomos". É particularmente interessante observar a cristologia do
Logos desenvolvida por Justino, na qual ele explora o potencial apologético da
idéia do "Logos" corrente tanto no Estoicismo quanto no Platonismo
médio desse período. O Logos (um temo grego que normalmente é
traduzido como "palavra" – e.g., como no caso de Jo 1. 14) deve ser
considerado a fonte suprema de todo conhecimento humano. Esse mesmo
Logos é conhecido tanto pelos cristãos quanto pelos filósofos pagãos;
estes últimos, porém, têm apenas um acesso parcial a ele, enquanto os
cristãos têm pleno acesso a ele graças à sua manifestação em Cristo. Assim,
Justino reconhece que filósofos seculares pré-cristãos como Flemelito ou
Sócrates tiveram acesso parcial à verdade em função da maneira como o
Logos se encontra presente no mundo.
Uma idéia especialmente relevante neste contexto é a do logos
spermankos, que parece ter origem no Platonismo médio. O Logos divino
lartçou, sementes por toda a história humana; é de esperar, portanto, que esse
"Logos que produz sementes" seja conhecido, ainda que parcialmente,
pelos não-cristãos. Assim, Justino argumenta que o Cristianismo se
desenvolve a partir dos indícios e prenunciações da revelação de Deus
encontrados por toda a história pagã e que representa seu cumprimento. O
Logos se revelou temporariamente por meio das teofimias (isto é, aparições
ou manifestações de Deus) do
Observamos antes como faturo Mártir argumentou que o Logos era acessível
a todos, mesmo que de modo fragmentário, e que sua revelação plena se
deu apenas em Cristo. Idéias relacionadas podem ser encontradas em outros
escritores que adotaram a cristologia do Logos, incluindo On gerres.
Orgenes adotou uma abordagem à revelação segundo a qual o ato revelatório
de Deus é comparado a ser iluminado pelos "raios de Deus" causados pela
"luz que é o Logos divino". Para Origens, tanto a verdade como a
salvação podem ser encontradas fora da fé cristã.
O que foi dito até aqui tem por objetivo servir de introdução a um dos
marcos mais importantes da discussão teológica do período patirístico - a con-
trovérsia ariana do século P. A controvérsia ariana continua sendo um
ponto de referência no desenvolvimento da cristologia clássica e, portanto,
requer uma discussão mais ampla. Convém observar que certos aspectos da
história
Atanásio não deu crédito às distinções sutis de Ário. Se o Filho é ama criatura,
então ele é uma criatura como todas as outras, incluindo os seres humanos.
Afinal, que outro tipo de existência criada há? Para Atanásio, a afirmação da
existência criada do Filho tem duas conseqüências decisivas, cada uma com
implicações uniformemente negativas para o Arianismo.
Em primeiro lugar, Atanásio argumenta que somente Deus pode salvar. Deus, e
mais ninguém, pode romper o poder do pecado e nos conduzir à vida eterna. Uma
característica essencial de ser uma criatura é a necessidade de redenção.
Nenhuma criatura pode salvar outras criaturas. Somente o Criador pode redimir a
criação. Depois de enfatizar que somente Deus pode salvar, Atanásio apresenta
o argumento teológico que os arianos tiveram mais dificuldade de refutar. Tanto o
Novo Testamento quanto a tradição fiongica cristã consideram Jesus Cristo como
sendo Salvador. E, no entanto, Atanásio ressal
tou: somente Deus pode salvar. Como devemos entender isso?
De acordo coma argumentação de Atanásio, a única solução possível é aceitar
que Jesus é Deus encarnado. A lógica desse argumento é expressa, por vezes, da
seguinte forma:
Não afirmamos que a natureza do Logos passou por uma mudança e se tomou
carne, ou que foi transformada em um ser humano pleno ou perfeito constituído
de carne e corpo; antes, dizemos que o Logos... uniu-se pessoalmente a natureza
humana com uma alma viva, tornou-,,c um ser humano e foi chamado de Filho do
Homem, mas não por mera vontade eu favor.
Com isso, levantou-se a questão do tipo de natureza humana que havia sido
assumida. Podemos voltar ao século 4- e investigar essa questão em mais
detalhes. Apolinário de Lturdicéia considerou preocupante a crença cada vez
mais amplamente difundida de que o Logos assumiu a natureza humana em
sua totalidade. A seu ver, isso indicava que o Logos havia sido contaminado
pelas fraquezas da natureza humana. Como era possível permitir que o Filho
de Deus Ítissemaculado por princípios diretivos puramenachumarios? De acordo
com Apolinário, a impecabilidade de Cristo tera sido comprometida se ele
tivesse assumido uma mente absolutamente humana; pois, afinal, não era a
mente humana a fonte do pecado e rebelião contra Deus? A impecabilidade de
Cristo só poderia ser mantida se a mente humana fosse substituída por uma
força motivadora e diretora divina. Por isso, Apolinário argumentava que, em
Cristo, uma mente e almaputamenac hummas foram substituídas porunta mente
e alma divina: "a energia divina cumpre o papel de animara alma e a mente
humanas" em Cristo. A natureza humana de Cristo é, portanto, incompleta.
Pode-se ver isso claramente numa carta escrita por Apolinário para os
bispos de Dioeesareia apresentando as principais características de sua
crístrilogia. A mais importante é a asserção inequívoca de que, na
encamiação, o Verbo não assumiu uma mente humana "mutável", o que
teria levado o Verbo a se ver preso no pecado humano. Antes, pressupunha
"uma mente divina imutável e celestial". Em decorrência disso, não se pode
dizer que Cristo foi totalmente humano.
Cristo é indivisível no sentido de que ele é Cristo, mas é duplo no sentido de que
ele é tanto Deus quanto ser humano. Ele é um em sua filiação, mas é dois naquilo
que toma e que é tomado... Pois não reconhecernos, dois Cri,tos ou dois filhos ou
"migênitos" ou Senhores; não um filho e outro filho, não um primeiro
"primogénito" e um novo "primogênito", não um primeiro e segundo Cristo, mas
um único e mesmo Cristo.
[Nestrario] tinha como colega o presbítero Anastácio que ele havia trazido de
Antioquia. Ele o tinha em alta consideração e o consultava acerca de
várias questões. Um dia, Anastácio estava pregando na igreja
e disse: "Que ninguém chame Maria de Mãe de Deus (Theotokos): pois
Maria foi apenas um ser humano e é impossível Deus ser nascido de um ser
humano". Isso causou grande escândalo e pesar tanto para o clero quanto
para os leigos uma vez que, até então, haviam sido ensinados a reconhecer
Cristo como Deus e a não separar sua humanidade de sua divindade em
função da economia [da salvação]... Apesar de a igreja ter se ofendido
grandemente com aquilo que foi proclamado desse modo, Nestório, que
estava ansioso para introduzira proposta de Anastácio –pois não desejava
que alguém a quem ele considerava em tão alta estiam fosse tido como
culpado de blasfêmia – continuou a instruir a igreja com frequência acerca
dessa questão. Adotou uma atitude controversa e rejeitou inteiramente o
termo Theotokos. A controvérsia sobre a questão foi entendida de uma
forma por alguns e de outra forma por outros e a discussão resultante
dividiu a igreja e começou se parecer com uma luta no escuro na qual os
envolvidos apresentavam asserções de todos os tipos, cada uma mais
confusa e contraditória do que a outra. Nestório adquiriu a reputação popular
de afirmar que o Senhor não passava de um ser humano e de tentar impor à
igreja os ensinamentos de Paulo de Samosata e Fotino. Isso levou a um
protesto tão intenso que se considerou necessário convocar um concilio
geral para decidir a questão em discussão. Uma vez que eu mesmo estudei
os escritos de Nestório, devo dizer que, a meu ver, se trata de um homem
inculto e pretendo expressar minhas próprias idéias a seu respeito. Não
posso reconhecer que ele era seguidor de Paulo de Samosata ou Fotino,
ou que em algum momento ele afirmou que o Senhor não era nada além
de um ser humano. No entanto, ele pareceu se assustar diante do termo
Theotokos, como se fosse um espectro terrível. Na verdade, a inquietação
infundada que ele demonstrou a esse respeito apenas revelou sua extrema
ignorância: pois sendo um homem de aptidão natural para falar, foi
considerado culto, mas, na realidade, é terrivelmente ignorante. O fato é
que ele não teve tempo para o trabalho árduo que uma investigação precisa
dos intérpretes antigos teria exigido e, tomado arrogante em função da sua
facilidade de expressão, não dedicou sua atenção aos antigos,
considerando-se, antes, superior a eles.
Esse tipo, de argumento se tomou cada vez mais comum na igreja do século 4%
de fato, sereia com freqüência como meio de testara ortodoxia de um teólogo.
Deixar de concordar que Maria era a "Mãe de Deus" se tornou equivalente a uma
recusa em aceitara divindade de Cristo. Pode-se ver isso, por exemplo, na
resposta de Gregório de Nissa a Apolinário, observada no estudo de caso 1.3.
Mas até onde esse princípio é válido? Considere, por exemplo, a seguinte linha de
argumentação:
3. Portanto, em seu terceiro ponto, Cirilo condena a idéia de uma "união segundo
o bel-prazer de Deis", uma das características da escola antioquina.
Rejeitando-a como uma mera "conjunção", e não uma verdadeira união, Cirilo
argumenta que se trata de algo totalmente meticaz para salvaguardar os
princípios teológicos e espirituais vitais em jogo na doutrina da encarnação.
Fica claro, assim, que a cristologia foi uma questão de suma importância durante o
período patrística. Das discussões desse período, começaram a surgir os
contamos de um consenso cristão acerca desse assunto, trazendo avanços para a
discussão teológica. Há praticamente um consenso de que, uma vez que as
questões crismirigicas foram resolvidas, o tema seguinte a ser discutido era a
doutrina cristã distintiva acerca de Deus. Isso nos leva, naturalmente, à
doutrinada Trindade, o rema do próximo estudo de caso.
outras duas. Uma imagem que costuma ser usada para expressar essa idéia é
a de "uma comunidade de existência", na qual cada pessoa, apesar de manter
sua identidade distinta, penetra outras e é penetrada por elas.
Modalismo
O temo'Snodalismo" foi introduzido pelo historiador alemão dos dogmas, Adolf
von Hamack, para descrever o elemento comum de um grupo de heresias
trinitárias associado a Noeto e Práxeas no final do século 2 v e a Sabélio
no século 3-. Cada um desses escritores se preocupou em salvaguardar a
unidade do Ser Divino, temendo um lapso em alguma forma de triteísmo
decorrente da doutrina da Trindade. (Como ficará clara adiante, um medo
bastante justificado.) Essa defesa enérgica da unidade absoluta de Deus
(chamada com frequência de "monarquianismo", das palavras gregas que
significam "princípio único de autoridade-) levou esses escritores a
enfatizarem que o Deus único se revelou de três maneiras diferentes em
ocasiões diferentes. A divindade de Cristo e do Espírito Santo deve ser
explicada em temos das três maneiras ou modos de revelação divina (daí a
designação -vandalismo"). Dentro disso, propõe-se a seguinte seqüência
trinitária:
De que maneira, então, uma substância pode estar presente em três pessoas? Os
capadócios respondiam a essa pergunta apelando para a relação entre o universal e
seus elementos particulares - por exemplo, a humanidade e os seres humanos
individuais. Assim, Basílio de Cesaréia argumenta que a substância única dentro da
Trindade pode ser considerada análoga ao universal, e que as três pessoas são os
elementos particulares. Uma natureza humana comum, compartilhada por todas as
pessoas, não significa que todos os seres humanos são idênticos; antes, significa
que mantêm sua individualidade apesar de compartilharem uma natureza em
comum. Gregório de Nissa coloca essa questão da seguinte maneira:
Pedra, Tiago e João são considerados três seres, humanos apesar de com-
partilharem uma humanidade em conaum... Então, como podemos conciliar
nossa convicção de que o Pai, o Filho e o Espírito Sinno têm uma única
divindade com a negação que estamos falando de três deuses?
Assim, cada uma das três pessoas dentro da Trindade tem características
particulares. De acordo com Basilio de Cesméia, o caráter distintivo de cada uma
das pessoas é o seguinte: o Pai é distinguido por sua paternidade; o Filho, por sua
filiação; e o Espírito, pela capacidade de santificar. Para Gregório de Nazianzo, o
Pai é distinguido por "ser não-gerado" (agennesis, uma palavra difícil que
transmite a idéia de "que não foi originado" ou "que não é derivado de nenhuma
outra fiente'), o Filho, por "ser gerado" (gennesis, que também pode ser
traduzido como "ser originado" ou "cujas origens são derivadas de outrem") e o
Espírito por "ser enviado" ou "procedente". A dificuldade dessa analogia para os
leitores modernos encontra-se no fato de parecer sugerir um
triteísmo. Enquanto o Platonismo de Gregônio lhe permite pensar em
"Poder, Tiago e João" como exemplos diferentes da mesma natureza
humana, a maneira mais natural de interpretara ilustração hoje em dia é com
referência a três indivíduos independentes e distintos.
Esse estilo de análise foi criticado por suas deficiências óbvias, sendo uma delas
a geração de um conceito curiosamente despersonalizado do Espírito. O Espírito
parece ser um tipo de cola que liga o Pai e o Filho, e que liga os dois aos cristãos. A
idéia de "ser ligado a Deus" é uma característica central da espiritualidade de
Agostinho e talvez seja inevitável que esse interesse apareça de modo
preeminente em sua discussão da Trindade.
A controvérsia de filioque
Igualmente, não podemos dizer que o Espírito Santo não procede tara,
bem do Filho. Afinal, diz-se que o Espírito é o Espírito Santo cinto do Pai
quarto do Filho [João 20.22 é citado na seqüência] . . . O Espírito Santo
L,evarate, as idéias de Cipriara, além daqueles que pareciam ser seus limites
pretendidos, os donatistas argumentavam que as ações eclesiásticas podiam
ser consideradas inválidas em função das imperfeições subjetivas da pane
da pessoa que as ministrava. Assim, os donatistas afirmavam que aqueles
que eram batizados ou ordenados por sacerdotes ou bispos que não haviam
aderido ao movimento donatista precisavam ser batizados ou ordenados
novamente por ministros donatistas. Os sacramentos derivavam sua
validade das qualidades pessoais do indivíduo que os ministrava.
Em resposta a essa abordagern. Agostinho argumentou que o Donatismo dava
ênfase excessiva às qualidades do agente humano e peso insuficiente à
graça de Jesus Cristo. De acordo com ele, é impossível os seres
humanos decaídos distinguirem cri" quem é puro e quem é impuro, digno
e indigno. Esse ponto de vista, inteiramente coerente com seu conceito de
igreja como "corpo misto" de santos e pecadores, afirma que a eficácia dos
sacramentos não tem como base os méritos do indivíduo que os está
ministrando, mas sim, os méritos daquele que os instituiu - Jesus Cristo. A
validade dos sacramentos independe dos méritos de quem os ministra.
Em seguida, Agostinho qualifica suas asserções num contexto importante.
Argumenta que é preciso fazer uma distinção entre "batismo" e "o direito de
batizar". Apesar de o batismo ser válido, mesmo quando ministrado por
aqueles que são hereges ou cismáticos, isso não significa que o direito de batizar
é distribuído indiscriminadamente entre todos. O direito de conferir o batismo
existe somente dentro da igreja e é concedido, mais especificamente, aos ministros
que ela escolheu e autorizou para ministrar os sacramentos. A autoridade pua
ministrar os sacramentos de Cristo foi confiada por ele aos apóstolos e, por meio
deles e de seus sucessores, os bispos, aos ministros da igreja católica.
A questão teológica em jogo é representada mediante dois lemas em latim,
cada um refletindo uma visão diferente das bases para a eficácia dos
sacramentos.
Essa controvérsia, que irrompeu no início do século 54, trouxe a lume uma série
de questões sobre a natureza humana, o pecado e a graça. Até então, a igreja havia
testemunhado um número relativamente pequeno de discussões acercada
natureza humana. A controvérsia pelagiana mudou isso e garantiu às questões
associadas à natureza humana um lugar próprio cri" os temas discutidos na
igreja ocidental. A controvérsia girou em tomo de dois indivíduos: Agostinho de
Hipona e Pelágio. Trata-se de uma discussão complexa tanto em âmbito histórico
quanto teológico e, tendo em vista seu impacto sobre a teologia cristã ocidental,
deve ser discutida mais demoradamente. Resumiremos os pontos principais da
controvérsia em quatro seções: (1) o conceito de "livre-arbítrio"; (2) o conceito de
pecado; (3) o conceito de graça e (4) o conceito das bases para a justificação.
O "livre-arbúWo"
Em 413, Pelágio escreveu uma longa carta a Demétrias, que havia deci-
dido há pouco tempo deixar suas riquezas pua se tomar freira. Em sua
cana, Pelágio explicou com uma lógica fria as conseqüências de suas
idéias acerca do livre-arbítrio humano. Deus criou a humanidade e sabe
exatamente o que ela é capaz de fazer. Em decorrência disso, todos os
mandamentos que nos foram dados podem e devem ser obedecidos. Não é
válido argumentar que a fragilidade humana não permite que esses
mandamentos sejam cumpridos. Deus criou a natureza tramara, e exige dela
somente o que ela pode suportar. Assim, Pelágio declara implacavelmente
que, tendo em vista a perfeição ser possível para a humanidade, ela é,
também, obrigatória.
A natureza do pecado
Para Agostinho, a humanidade é afetada universalmente pelo pecado como
conseqüência da Queda. A mente humana foi obscurecida e enfraquecida pelo
pecado. Ele impede que o pecador pense com clareza e, especialmente, que
compreenda verdades e idéias espirituais mais elevadas. Semelhantemente,
como vimos, a vontade humana foi enfraquecida (porém não eliminada) pelo
pecado. Para Agostinho, o simples fato de sermos pecadores significa que nos
encontramos num estado de enfermidade grave, incapazes de diagnosticar nossa
doença adequadamente e, muito menos, de cura Ia. É somente por meio da graça
de Deus que nossa doença é diagnosticada (pecado) e a cura é oferecida (graça).
O argumento essencial de Agostinho é que não temos nenhum controle sobre
nossa pecaminosidade. Ela é algo que contamina nossa vida desde nosso
nascimento e passa a dominó-la daí em diante. É um estado sobre o qual não
exercemos nenhum controle decisivo. Podemos dizer que, na visão de Agostinho,
a humanidade nasce com uma disposição pecaminosa como parte da natureza
humana, como uma propensão inerente para os atos de pecado. Em outras
palavras, o pecado causa pecados: o estado de pecaminosidade provoca atos
individuais de pecado. Agostinho desenvolve essa questão usando três analogias
importantes: o pecado como uma "doença", como um -podei` e como "culpa".
Para Pelágio, porém, o pecado deve ser entendido por outra perspectiva. Em
seu raciocínio não há lugar para a idéia de uma propensão humana para o
pecado. Para Pelágio, não se deve pensar que o poder humano de amo-aper-
feiçoamento está comprometido. É sempre possível aos seres humanos
cumprirem suas obrigações para com Deus e seu próximo. Não há
justificativas para não fazê fo. O pecado devia ser entendido como um ato
cometido deliberadamente contra. Deus. Assim, o Pelagianismo parece ser uma
forma rígida de autoritarismo moral – uma insistência de que a humanidade
tema obrigação de ser impecável e uma rejeição absoluta de qualquer
desculpa para o fracasso. A humanidade e nascida sem pecado, e só peca
por atos deblieradox Pelágio insistia que, na verdade, muitas figuras do
Antigo Testamento permaneceram sem pecado. A participação na igreja é
permitida somente àqueles que são moralmente justos. Com seu conceito
de natureza humana decaída, Agostinho, por sua vez, não tinha problemas
em considerara igreja um hospital onde a Imtremulado, decaída podia se
recuperar e crescer gradativamente em santidade por meio da graça.
A natureza da graça
Um dos textos prediletos de Agostinho é João 15.5, "porque sem mim nada
podeis fazer". Para Agostinho, somos totalmente dependentes de Deus
para nossa salvação, desde o começo até o fim de nossa vida. Agostinho
faz uma distinção cuidadosa entre as faculdades humanas naturais –
concedidas à humanidade como dádiva natural – e os dons adicionais e
especiais da graça. Deus não nos deixa em nossa condição natural,
incapacitados pelo pecado e incapazes de nos redim i r; antes, ele nos dá
graça a fim de que possamos ser curados, perdoados e restaurados. Na
visão de Agostinho, a natureza humana é frágil, fraca e perdida e precisa de
assistência e cuidado divino para ser restaurada e renovada. De acordo com
ele, a graça é a atenção generosa e absolutamente imerecida que Deus dá
à humanidade pela qual esse processo de caia pode ter início. A natureza
humana precisa ser transformada pela graça de Deus que é dada com tanta
generosidade.
A base da salvação
Em seu "Tratado Sobre a Doutrina Crista", escrito originalmente em latim por volta
de 397, Agostinho trata com certa minúcia da relação entre Crisfiainstria, e filosofia
pagã. Usando o êxodo do Egito como modelo, Agostinho argumenta que não há
motivo para os cristãos não extraírem todas as coisas boas da filosofia e colocá-las
a serviço do evangelho. A analogia que ele usa para justificar essa abordagem
se encontra no Livro de Êxodo no Antig
tomaparasiemsegredo
C A P Í T U L O 2
AIDADE MÉDIA E 0
RENASCIMENTO, c.500-1500
As ORIGENS W MONASTICISMO
fascínio com o mundo natural como meio de conhecera Deus. O Deus que
fez o mundo é o mesmo Deus que protegerá os cristãos de todos os perigos.
Os mosteiros irlandeses atuavam como centros de atividade missionária, usando as
vias marítimas como canais para a transmissão do Cristianismo. Brendan
(falecido e. 580) e Columba (falecido c. 597) são excelentes exemplos desse tipo
de missionário. Num, poema chamado "A Navegação de São Brendan" (c. 1050),
ele é louvado por suas viagens para "as ilhas do norte e do leste" (normalmente
entendidas como as Ilhas órcades e Hébridas, próximas à costa da Escócia).
Columba levou o Cristianismo do norte da Irlanda para as Ilhas Hébridas
Exteriores da Escócia e fundou o mosteiro de lona como posto avançado
missionário. De lá, o Cristianismo se espalhou em direção ao sul e leste. Aidan
(falecido em 651) é um excelente exemplo de um monge de lona que atuou como
missionário dessa maneira. A convite do rei da região da Normanbria, fundou
um mosteiro missionário na Ilha de Lindisfante, próxima à costa leste do norte da
Inglaterra. O Cristianismo celta começou a penetrar a França e se tomou cada vez
mais influente nessa região.
Era impossível ignorar as tensões entre essa forma de Cristianismo e seus rivais
romanos. A fé celta ameaçava solapar o episcopado, reduzir o poder de Roma,
dificultar que o Cristianismo se tomasse culturalmente aceitável e transformar o
monasticismo em norma para a vida cristã. Em 597, o ano da morte de Columba,
o predomínio da visão celta parecia inevitável. No entanto, o século seguinte
trouxe uma série de acontecimentos que levaram ao obscurecimento gradativo
da fé celta fora das regiões centrais da Irlanda. Por uma coincidência da
História, o episódio que desencadeou esse obscurecimento ocorreu no ano da
morre de Columba. Em 597, Agostinho foi enviado pelo papa Gregário à Inglaterra
para evangelizar os ingleses. Uma vez que as formas romanas de Cristianismo se
estabeleceram na Inglaterra, surgiram tensões entre os cristãos do norte e do sul
da Inglaterra, sendo que os primeiros permaneceram fiéis ás tradições celtas
enquanto os últimos adotaram as formas romanas. Em geral, considera-se que o
Sínodo de Whitby (664) estabeleceu a predominância do Cristianismo romano na
Inglaterra. Apesar de o Sínodo ter se concentrado na questão da celebração ou
não da Páscoa (as tradições celtas e romanas diferiam nessa questão) o que estava
de fato em discussão era a influência crescente da sé de Canterbury. As invasões da
Inglaterra pelos saxões no século anterior resultaram em mudanças culturais pro-
fundas na região, tomando inevitável uma erosão gradativa da cultura celta,
inclusive de sua abordagem característica do Cristianismo.
Pode-se considerar que o ano 700 marcou o final do crescimento do
Cristianismo celta. Porém, também é tido como o marco inicial de um novo
período de consolidação cultural e intelectual enquanto a Europa entrava no que
chamamos hoje de `Idade Média". No século 11, a Europa apresentava um grau
expressivo de estabilidade, com três grupos centrais de poder que surgiram para
tomar o lugar do antigo Império Romano.
A Idade Média
O Renascimento
Escolasticismo
Realismo e Nominalismo
A via moderna
Humanismo
Uma abordagem mais realista, que tem ganho aceitação ampla nos meios
acadêmicos, é considerar o burramente, um movimento cultural e educacional que
visava, em primeiro lugar, promovera eloqüência em suas várias formas. Seu
interesse pela moral, filosofia e política é de importância secundária. Ser um
humanista é se preocupar, acima de tudo, com a eloqüência e tratar de outras
questões apenas de maneira secundária. O Humanismo foi, essencialmente, um
programa cultural que lançou mão da antiguidade clássica como modelo de
eloqüência. Na arte e na arquitetura, como na escrita e na oratória, a antiguidade
era vista como um recurso cultural do qual o Renascimento podia se apropriar.
Assim, o Humanismo tratou da maneira como as idéias eram obtidas e
expressadas, e não da substância propriamente dita dessas idéias.
O Humanismo norte-europeu
O Humanismo inglês
PRINCIPAIS TEÔWGOS
Aquita, começou seus estudos em Paris, antes de se mudar para Colônia em 1248.
Em 1252 voltou a Paris a fim de estudar teologia na universidade. Durante os três
anos seguintes, lecionou sobre o Evangelho de Mateus e começou a escrever a
Summa contra Gentiles, "Suma Contra os Gentios". Nessa obra de grande
relevância, Aquino apresentou argumentos importantes em favor da fé cristã,
beneficiando aqueles que atuavam como missionários entre muçulmanos e
judeus. Em 1266, iniciou o seu escrito mais famoso, conhecido por seu título em
latim, Summa Theologiae. Nessa obra, Aquino desenvolveu um estudo detalhado
de aspectos críticos da teologia cristã (como o papel da razão e da fé), bem como
uma análise minuciosa de questões doutrinárias fundamentais (como a divindade
de Cristo). A obra é dividida em três partes, sendo que cada uma das duas
primeiras partes tem duas subdivisões. A Parte 1 trata, essencialmente, de Deus
como criador; a Parte 11, da restauração da humanidade a Deus; e a Parte RI, da
maneira como a pessoa e obra de Cristo realizam a salvação da humanidade.
No dia 6 de dezembro de 1273, Aquino declarou que não podia mais escrever.
"Para mim, tudo que escrevi parece palha", disse ele. É possível que ele tenha
sofrido algum tipo de colapso, talvez como resultado de trabalho excessivo.
Aquino faleceu em 7 de março de 1274.
Erme suas principais contribuições para a teologia, estas que são relacionadas a
seguir e discutidas mais adiante são particularmente relevantes:
Scotus foi, indiscutivelmente, uma das mentes mais brilhantes da Idade Média. Em
sua vida cana, lecionou em Cambridge, Oxford e Paris e produziu três versões de
um Comentaria sobre as Sentenças. Conhecido como "o doutor sutil- em função
das distinções extremamente tênues que costumava fazer entre possíveis
significados de termos, foi responsável por várias desenvoluções importantes pua a
teologia cristã. Apenas três destas serão consideradas aqui.
Com o fim da idade das trevas, a tendência dos teólogos foi continuar suas
investigações do ponto em que os escritores patrísticos haviam parado. Uma
vez que a igreja ocidental era de língua latina, é natural que seus teólogos
tenham se voltado para as coleções extensas de escritos de Agostinho de
Hipona, usando-as como ponto de partida para suas próprias especulações
teológicas. As Sentenças de Pedro Lombardo podem ser consideradas uma
compilação crítica de citações ("Sentenças") extraídas em sua maior paire dos
escritos de Agostinho sobre as quais era obrigatório os teólogos medievais
tecerem seus comentários.
A TEOLOGIA BIZANTINA
PERGUNTAS (2)
1. Qual era a língua falada pela maioria dos teólogos ocidentais durante
esse período?
2.'sOs humanistas eram pessoas interessadas em estudara Roma clássica."
A seu ver, essa é uma definição útil?
3. Quais são os principais temas da teologia escolástica?
4. Por que houve um interesse tão grande na teologia dos
sacramentos durante a Idade Média?
5. A que se refere o lema ad fontes?
Isso porque, se Deus não existe, o conceito de Deus permanece, mesmo que
a realidade de Deus esteja ausente. E, no entanto, a realidade de Deus é
maior do que a idéia de Deus. Portanto, se Deus é "um ente tal que não se
pode conceber nada maior do que ele", o conceito de Deus deve levar à
aceitação da realidade de Deus uma vez que, de outro modo, o mero
conceito de Deus é a maior coisa que se pode conceber. E isso contradiz a
definição de Deus que fundamenta essa argumentação. Tendo em vista,
assim, a existência do conceito de Deus e a aceitação da definição de
Deus como "um ente tal que não se pode conceber nada maior do que
ele", a realidade de Deus é a conclusão lógica.
um ser vem a existir porque algo que já existe lhe deu existência. Em outras
palavras, nossa existência é causada por outro ser. Somos efeito de uma
série de causação. Acompanhando essa série de volta até sua origem,
Aquino declara que essa causa original da existência só pode ser alguém cuja
existência é necessária — em outras palavras, Deus.
A quanta, via parte, dos valores humanos como a verdade, a bondade e a
dignidade. De onde vêm esses valores? O que os causa? Aquino
argumente que deve haver algo que é, em si mesmo, verdadeiro, bom e digno
e que dá existência aos nossos conceitos de verdade, bondade e
dignidade. A origem dessas idéias, conforme Aquino sugere, é Deus, sua
causa original.
A quinta e última via é o argumento teológico propriamente dito.
Aquino observa que o mundo mostra várias evidências de um intento,
um plano inteligente. Os processos e objetos parecem ser adaptados com
certos objetivos definidos em mente. Parecem ter um propósito. Parecem ter
sido planejados. Mas essas coisas não planejam a si mesmas: elas são
causadas e planejadas por alguma outra coisa ou pessoa. Partindo dessa
observação, ele conclui que é preciso reconhecer que a fonte dessa ordem
natural é Deus.
Fica evidente que a maioria dos argumentos de Aquino é relativamente
conhecida. Cada um depende da volta a uma causa original e da
identificação da mesma como sendo Deus. As "Cinco Vias" foram alvos dos
comentários de vários críticos de Aquino durante a Idade Média, entre
eles, Duns Sentas e William de Ockham. As seguintes observações são
especialmente importantes:
Uma idéia semelhante pode ser encontrada no mistério (peça teatral medieval)
inglês do século 14 que descreve o "saque do inferno" da seguinte forma:
quando Cristo estava morto, seu espírito se apressou até o
inferno.
logo ele derrubou as podas fortes que estavam injustamente
trancadas para ele... Prendeu Satanás com cadeias eternas, de modo que
Satanás permanecerá preso até o dia do juízo final. Levou consigo Adão e Eva e
Outros que lhe eram queridos todos estes ele levou para fora do inferno e
colocou no paraíso.
Uma abordagem bem diferente foi desenvolvida por Anselmo de
Canterbury que reagiu a essas idéias de que Deus enganou o diabo,
ou de que o diabo tinha "direitos" de qualquer espécie sobre a
humanidade decaída, ou ainda, de que Deus tinha qualquer obrigação
de respeitar esses "direitos". No máximo, é possível que o diabo tenha
recebido permissão de exercer um poder de facto sobre a
humanidade – um poder que existe em temos práticos, mesmo que
ilegítimo e injustificado. Porém, não se pode considerar tal poder uma
autoridade de jure – ou seja, uma autoridade firmemente alicerçada
num princípio legal ou mora]. "Nao vejo que validade isso tem", comenta
Anselmo descartando essa idéia. Anselmo também descarta qualquer
idéia de que Deus enganou o diabo no processo de redenção. A
trajetória da redenção em sua totalidade é baseada na retidão de
Deus e reflete esse atributo divino.
Para Abelardo, "o propósito e causa da encarnação foi para que Cristo
pudesse iluminar o mundo com sua sabedoria e despertá-la para amá-lo".
Abelardo não apresenta uma base teológica adequada que nos permita
entender exatamente o motivo pelo qual a morte de Cristo deve ser
considera-da uma demonstração do amor de Deus. Não obstante, sua
abordagem ao sig-nificado da morte de Cristo evidenciou o impacto
subjetivo poderoso dessa morte, algo que havia sido ignorado ou
negligenciado por escritores contem-porâneos como Anselmo de
Canterbury.
Fica claro, portanto, que o período medieval testemunhou um interesse
considerável na doutrinada obra de Cristo e fez contribuições expressivas para
o seu desenvolvimento. Pode-se dizer algo parecido acerca da sua abordagem
à questão da natureza e função dos sacramentos, da qual trataremos
Na Antiga Lei, havia unguentes de certo tipo, mas eles eram figurati-
vos e não curavam. A doença era letal, mas as unções eram superficiais...
Ungüentos genuinamente curativos devem trazer tanto a unção espiritual
quanto um poder vivifica ter; foi somente Cristo nosso Senhor que flez
isso, uma vez que... por meio de sua morte, os sacramentos têm o poder
de dar vida.
Estes significados ocultos das Escrituras inspiradas podem ser discernidos pelo
exercício das nassas melhores aptidões, com graus va-riáveis de sucesso. E, no entanto,
estamos convictos do princípio de que todos estes acontecimentos históricos e suas
narrativas moem sempre torna antevisão das coisas vindouras, e de que devem sempre
ser inter-pretados com referência a Cristo e sua igreja.
1. Mateus, 4.17
Esse versículo descreve o início do ministério de Jesus e o conteúdo básico de
sua pregação nesse estágio. Na Idade Média, o evangelho de Mateus em
amplamente usado como fonte de ensino cristão em sermões paroquiais e, em
decorrência disso, esse versículo parece ter exercido um impacto considerável
sobre a visão popular da essência do Cristianismo. O texto em latim da Vingam
diz:
2. Lucas 1.28
Esse texto descreve o episódio que costuma ser chamado de "anunciação" - ou seja,
a declaração de Gabriela Maria de que ela teria um filho. O texto em latim da
Vingam diz:
et ingressos angelus at estio dixit: ave grafia plena Dominas tecum bendicta tu in
mulientais.
Uma tradução aproximada seria: "E o anjo entrou, e lhe disse: 'Salve, aquela
que e cheia de graça (ave grada plena) o Senhor é convosco, bendita sois vós
entre as mulheres—. Essa saudação tem implicações sérias, uma vez que indica
claramente que Maria deve ser considerada uma pessoa "cheia de graça". Na
teologia medieval, a graça era considerada caracteristicamente como sendo de
substância quase divina, e não uma atitude graciosa da parte de Deus. Assim, essa
passagem era entendida como uma indicação de que Maria era um vaso que
continha graça, sugerindo, portanto, que era possível ter acesso a tal graça em
tempos de aflição. Não há dúvida que esses temas se tomaram um aspecto
importante da espiritualidade mariana do final da Idade Média. No entanto,
estudiosos humanistas (como Erasmo) argumentaram que o ori-ginal grego do
evangelho não podia ser traduzido dessa maneira. A interpre-tação natural do
texto devia se referira Maria como "aquela que encontrou favor [com Deus]",
uma idéia que podia ser expressada pelo termo latino gratificala, em vez de
grafia plena. As implicações teológicas dessa mudan-ça de tradução tanto para
a teologia quanto para a espiritualidade eram, por-tanto, potencialmente críticas.
De acordo com esses teólogos, a aliança entre Deus e os seres humanos definia as
condições necessárias para a justificação. Deus determinou que um indivíduo é
aceito sob a condição de cumprir, em primeiro lugar, cenas exigências. Essas
exigências foram resumidas na expressão em latim Lacere quod in se est,
literalmente, "fazer o que está dentro de ti" ou "fazer o seu melhor". Quando os
indivíduos cumpriam essa precondição, pelos termos da aliança Deus era
obrigado a acená-los. A máxima em latim usada com freqüência para expressar
essa idéia era: facienti quod in se est Deus mai denegar gradam: "Deus não
negará sua graça àqueles que fizerem o que está dentro deles".
O conhecido teólogo do final da Idade Média Gabriel Biel, que exerceu uma
influência claro sobre Lutem através de seus escritos, explicou que "fazer o
seu melhor` significava rejeitar o mal e procurar fazer o bem.
Nesse ponto, os paralelos entre a via moderna e Pelágio ficam evidentes.
Ambos afirmam que homens e mulheres são aceitos com base em seus
próprios esforços e realizações. Ambos afim~ que as obras humanas
colocam Deus sob a obrigação de recompensá-las. Tem-se a impressão de
que os escritores da via moderna estão simplesmente reproduzindo as
idéias de Pelágio ~o uma estrutura pactua] mais sofisticada. Mas, nesse
ponto, os teólogos da via moderna se valeram de uma teoria econômica
contemporânea para argumentar que não estavam, de maneira nenhuma,
repetindo Pelágio. Seu uso da teoria econômica medieval posterior é
fascinante, pois ilustra como os teólogos me-dievais estavam preparados
para explorar idéias extraídas de seu contexto so-cial. Vejamos esses
argumentos em más detalhes.
O exemplo clássico de invariabilidade citado por esses teólogos para ilus-trar a
relação cri" as boas obras e a justificação é o rei e a pequena moeda de
chumbo. A maioria dos sistemas de cunhagem medievais empregava
moedas de ouro e prata. Com isso, tinha-se a vantagem de garantir o valor das
moedas, mesmo que incentivasse a prática de "aparar' o metal precioso
das suas bor-das. A introdução das bordas serrilhadas, representa uma
tentativa de evitar a remoção de ouro ou prata dessa maneira. No entanto,
havia ocasiões em que os reis se viam numa crise financeira decorrente,
por exemplo, de uma guerra. Uma forma comum de lidar com essa crise era
tirar de circulação as moedas de ouro e prata e fundir o seu metal. O ouro e a
prata obtidos desse modo podiam, então, ser usados para financiar uma
guerra.
Entremeares, ainda era necessário fazer circular algum tipo de moeda.
Para suprir essa necessidade, cunhavam-se moedas de, chumbo que tinham o
mesmo valor das de ouro e prata. Apesar de seu valor inerente ser
insignifican-te, o valor que lhes era atribuído ou imposto era considerável. O rei
prometia substituir as moedas de chumbo por suas equivalentes de ouro ou
prata assim que a crise tivesse passado. Assim, o valor das moedas de
chumbo estava na promessa do rei de remi-las numa data posterior pelo valor
total que lhes havia sido atribuído. O valor de uma moeda de ouro é derivado
do ouro – mas o valor de uma moeda de chumbo é derivado da aliança real
segundo a qual essa moeda seria tratada como se fosse de ouro. Uma
situação semelhante existe, evidente-mente, na maioria das economias
modernas. As cédulas de papel, por exem-plo, têm um valor inerente
insignificante. Seu valor é derivado da promessa do banco que emitiu essas
notas de honrar o seu valor determinado.
Os teólogos da via moderna usaram essa analogia econômica para refu-tar
a acusação de Pelagianismo. Diante da sugestão de que estavam exageran-
do o valor das obras humanas (uma vez que pareciam considerá-las capazes
de tomar o indivíduo merecedor da salvação), responder= que não
estavam fa-zondo nada disso. Argumentaram que as obras humanas eram
como moedas de
Esse valor era inerente à morte de Cristo ou lhe era atribuído por Deus?
Calvino deixa clara a sua visão de que a base para o mérito de Cristo não se
encontra no fato de Cristo ter oferecido a si mesmo (o que corresponderia à
abordagem intelectualista do rabo menti Christi), mas sim, na decisão divina de
aceitar essa oferta como sendo de mérito suficiente para a redenção da hu-
manidade (que corresponde à abordagem voluntarista). Para Calvino "sem o bel-
prazer de Deus, Cristo não poderia ter merecido nada". Fica evidente a ligação
entre Calvino e a tradição voltantarista do final da Idade Média.
Essa observação oferece uma transição conveniente para a parte seguinte desta
obra que trata do período da Reforma propriamente dita.
CAPÍTULO 3
UM ESCLARECIMENTO DE TERMOS
A Reforma luterana
A Reforma calvinista
O termo "calvinismo" costuma ser usado para se referir às idéias religio sas
da igreja reformada. Apesar de ainda ser amplamente empregado na litera-
tura relacionada à Reforma, trata-se de uma prática desestimulada nos dias
de hoje. Está cada vez mais claro que a teologia reformada do século 16 se
valeu de outras fontes além das idéias do próprio Calvino. Chamar o
pensamento reformado do final do século 16 e do século 17 de "calvinista"
sugere que era, essencialmente, o pensamento de Calvino e o consenso atual
é de que as idéias de Calvino foram modificadas sutilmente por seus
sucessores. Hoje em dia, o termo "reformado" é considerado preferível para se
referir às igrejas (especialmente na Suíça, Países Baixos e Alemanha) ou aos
pensadores religiosos
(como Teodoro Beza, William Perkins e John Owen) que se basearam no livro-
texto religioso célebre de Calvino As Instituras da Religião Cristã, ou ainda,
para os documentos eclesiásticos (como o conhecido Catecismo de Heidelberg)
com base nessa obra.
Das três alas que constituíram a Reforma protestante-luterana, reforma-da ou
calvinista e anabatista — a ala reformada se mostrou particularmente importante
para os países de língua inglesa. O puritanismo, que ocupa uma posição
preeminente na história inglesa do século 17 e é fundamental para as idéias
religiosas e políticas da Nova Inglaterra no século 17 e depois, é uma forma
específica de Cristianismo reformado. A fim de entendera história reli-giosa e
política da Nova Inglaterra ou as idéias de escritores como Jonathan Fdwwds, por
exemplo, é preciso compreender pelo menos alguns dos concei-tos teológicos e
parte da visão de mundo religiosa do puritanismo subjacente às suas aturdes
sociais e políticas.
Vários elementos em comum podem ser observados dentro das diversas linhas
do movimento anabatista: uma desconfiança geral das autoridades ex-temas; a
rejeição do batismo de crianças em favor do batismo de cristãos adul-tos; a
posse comum de propriedades; e uma ênfase sobre o pacifismo e não-
resistência. Com relação a esse terceiro ponto: em 1527, os governos de Zurique,
Berna e Saint Gallen acusaram os anabatistas de crer que "reatam cristão
pode pagar ou cobrar juros ou honorários sobre uma soma de capital; que to-
dos os bens temporais são livres e comuns e que todos têm pleno direito de
propriedade sobre esses bens". Por esse motivo, o "anabatismo" é
com freqüência de "ala esquerda da Reforma" (Refundi H. Bainton) ou
"Rema-ma radical" (Cícorge flutuaria Williams). Para Williams, a "Reforma
radical" devia ser contrastada com a "Retomou magisterial" que ele
identificou de maneira ampla com Lutero e os movimentos reformados.
Cada vez mais, esses temos estão se tornando correntes entre os
acadêmicos reformados e é bem provável que você os encontre nos textos
mais recentes sobre o movimento.
A Reforma católica
Esse termo costuma ser usado panu, se referir ao reavivamento dentro do
catolicismo no período posterior ao início do Concílio de Trento (1545).
Nas obras acadêmicas mais antigas, o movimento é chamado com
frequência
de "Contra-Reforma": como o termo sugere, a igreja católica romana
desenvol-
veu meios de combatera Reforma protestante visando limitar sua
influência.
No entanto, está cada vez mais claro que, em parte, a igreja católica romana
se
opôs à Reforma refistriando-se também internamente a fim de remover
aquilo
que justificava as críticas protestantes. Nesse sentido, o movimento foi uma re-
forma da igreja católica e, ao mesmo tempo, uma reação à Reforma
protestante.
As mesmas preocupações por trás da Reforma protestante no norte da
Europa se manifestaram na renovação da igreja católica, especialmente
na
Espanha e Itália. O Concílio de Trento, o elemento principal da Reforma
cató-
lica, esclareceu os ensinamentos católicos acerca de várias questões
confusas
e introduziu mudanças há muito necessárias na conduta do clero, disciplina
eclesiástica, educação religiosa e atividade missionária. Esse movimento
den-
tro da igreja foi fortemente estimulado pela reforma de várias das ordens
re-
ligiosas mais antigas e pela fundação de outras ordens (como a dos
jesuítas).
Os aspectos de caráter teológico da Reforma católica serão considerados
em
relação aos seus ensinamentos sobre as Escrituras e a tradição, a
justificação
pela fé e os sacramentos. A Reforma católica acabou com vários outros
abusos
que haviam levado tanto humanistas quanto protestantes a exigirem
mudanças.
PRINCIPAIS TEÓLOGOS
As fontes da teologia
A Reforma principal visava não apenas a instituição de uma nova tradição cristã,
mas também uma renovação e correção de uma tradição existente.
1. Nos casos em que não era possível demonstrar que uma crença se
baseava nas Escrituras, essa crença devia ser rejeitada ou não devia ser imposta a
ninguém. Um exemplo disso foi a pouca atenção que os reformadores dedicaram
à doutrina da imaculada conceição de Maria (isto é, a crença de que, como mãe de
Jesus, Maria foi concebida sem a mácula do pecado). Para eles, essa doutrina não
tinha base escriturística e, portanto, a descartaram.
2. Uma nova ênfase passou a ser dada ao sanas público das Escrituras
dentro da igreja. Os sermões expositivos, o comentário bíblico e as obras de
teologia bíblica (como as Instauras de Calvino) passam a ser elementos
característicos da Reforma.
A doutrina da graça
O primeiro período da Reforma é dominado pelo programa pessoal de
Maminha Lutero. Convicto de que a igreja havia caído num Pelagianismo
involuntário, Lutero proclamou a doutrina da justificação pela fé a todos que lhe
deram ouvidos. A pergunta "Como posso encontrar um Deus cheio de
graça?" e o lema "somente pela fé" (sola file) ecoaram por grande parte da
Europa ocidental e atraíram ouvintes de uma parte considerável da igreja. As
questões envolvidas nessa doutrina são complexas e serão discutidas em
detalhes numa ocasião apropriada mais adiante.
A doutrina da justificação pela fé é associada de modo particular à Reforma
luterana. Calvino continuou a honrar essa doutrina, mas também iniciou
uma tendência que se tornou cada vez mais importante para a teologia
reformada posterior: a discussão acerca da graça em relação â doutrina da
predestinação, em vez da justificação. Para os teólogos reformados, a
declaração suprema da "graça de Deus" não estava no fato de Deus ter
justificado pecadores; antes, podia ser vista na eleição da humanidade por
Deus independente de realizações ou méritos antevistos. A doutrina da "eleição
incondicional" passou a ser considerada um resumo conciso da natureza ime-
recida da graça.
A doutrina da igreja
Parece ser uma regra geral da História que períodos de enorme criatividade são
seguidos de eras de estagnação. A Reforma não é exceção. Talvez num desejo
de preservar as idéias da Reforma, o período Pós-Reforma testemunhou o
desenvolvimento de uma abordagem fortemente escolástico â teologia.
As idéias dos reformadores foram codificadas e perpetuadas através do
desenvolvimento de uma série de apresentações sistemáticas da teologia
cristã.
No período depois da morte de Calvino uma nova preocupação com o
método – isto é, coma organização sistemática e dedução coerente de idéias –
ganhou impulso. Teólogos reformados se viram obrigados a defender suas
idéias diante de oponentes luteranos e católicos. O aristotelismo, que
Calvino encarou com certa suspeita, passou a ser considerado um aliado.
Tomou-se cada vez mais importante demonstrar a solidez e coerência
interna do calvinismo. Em decorrência disso, muitos escritores calvinistas, se
voltaram para Aristóteles na esperança de que seus escritos sobre método
oferecessem indicações de como a teologia reformada poderia ser
fundamentada numa base racional mais firme.
Catolicismo romano
Um dos sinais mais claros dessa nova segurança pode ser visto nos estudos
pautuísticos realizados pelos católicos. O apelo dos protestantes ao período
patrística foi, inicialmente, tão eficaz que alguns dos escritores católicos
da metade do século 16 parecem ter considerado escritores patrísticos
como Agostinho como sendo prato-protestantes. No entanto, nos últimos
trinta anos desse século os escritores católicos se romanos tomaram mais
seguros da ligação entre eles próprios e os escritores pairsticos. A obra mais
importante que estabeleceu essa ligação foi o texto de Marguérin de Ia
Bigne, Bibliotheca Patrum (-Biblioteca dos Patriarcas"), cujos oito volumes
em formato in-fólio foram publicados em 1575. Essa obra foi seguida de
contribuições importantes de escritores como Antoura, Amauld e Pierre Nicole.
Essa nova certeza da ligação com a tradição católica levou a uma ênfase
crescente sobre a constância dos ensinamentos, católicos. O escritor mais co-
nhecido a desenvolver essa ênfase foi Jacques-Bénigne Bossuet (1627 -
1704), cuja Histoire des variations des églises protestamos (-História das
Variações das Igrejas Protestantes") se tomou uma ama importante nas
discussões entre católicos protestantes. Para Bossuet, os ensinamentos da
igreja haviam permanecido os mesmos ao longo das eras. Uma vez que os
protestantes haviam se separado desses ensinamentos, quer pela introdução
de inovações ou pela negação de alguns dos seus elementos centrais,
haviam perdido o direito de serem considerados ortodoxos. Os apóstolos
haviam transmitido aos seus sucessores um depósito fixo de verdades que
havia sido mantido ao longo de gerações sucessivas.
Puritanismo
Um dos principais estilos de teologia associada aos países de língua inglesa
surgiu na Inglaterra no final do século 16. Pode-se definir melhor o puritanismo
como uma versão da ortodoxia reformada que deu ênfase particular aos aspectos
experienciais e pastorais da fé. Fica claro que os escritos dos teólogos puritanos
mais preeminentes como `Xilharra Perkins (1558 — 1602), Wilharia Ames (1576 —
1633), e John Owen (1618 — 1683) são fortemente influenciados pelas idéias de
Beza, especialmente com relação aos seus ensinamentos acerca da extensão da
morte de Cristo e da soberania divina na providência e na eleição.
Pietismo
À medida que a ortodoxia ganhou influência dentro do protestantismo, suas
deficiências também se tomaram mais claras. No sentido mais positivo, a
ortodoxia se concentrava na defesa racional das asserções cristãs da
verdade e na precisão doutrinária. No entanto, muitas vezes isso se mostrava
na forma de uma preocupação acadêmica com sutilezas lógicas, e não num
interesse pela relação entre teologia e as questões do quotidiano. O termo
"pietismo" é derivado da palavra latina pieias (cuja tradução mais exata é
"devoção" ou "piedade") e, inicialmente, era usado como termo pejorativo
pelos oponentes do movimento para descrever sua ênfase sobre a
importância da doutrina cristã para a vida diária dos cristãos.
Costuma-se considerar que o movimento pietista teve início com a publicação
da obra Pia desideria ("Desejos Piedosos", 1675) de Philip Jacob
Spener. Nessa obra, Spener lamentava o estado da igreja luterana alemã
depois da Guerra dos Trinta Anos (1618-1648), e apresentava propostas para
a revitalização da igreja de sua época. Dentre essas propostas, a principal
era uma nova ênfase sobre o estudo bíblico pessoal. Os teólogos
acadêmicos trataram as propostas de Spener com menosprezo; não obstante,
elas se mostraram influentes em círculos eclesiásticos da Alemanha,
refletindo uma crescente desilusão e impaciência com a esterilidade da
ortodoxia diante das condições sociais chocantes que o povo teve de
suportar durante a guerra. Para o pietismo, uma reforma doutrinária devia
sempre ser acompanhada de uma reforma de vida.
O pietismo se desenvolveu em várias direções, especialmente na Ingla terra
e na Alemanha. Dentre os expoentes do movimento, convém observar dois
em particular.
anabatismo ortodoxia
calvinista pietismo
confessionalismo protestante
deísmo puritano
evangélico Reforma católica
luterano reformado
metodismo
PERGUNTAS (3)
1. Qual o significado do termo "Refoma'?
2. Qual reformador é associado especificamente à doutrina da
justificação somente pela lê?
3. Qual foi a importância do Humanismo para as origens e
desenvolvimento da Reforma?
4. Por que os reformadores deram tanta ênfase â revisão das
doutrinas existentes na igreja?
5. Que fatores levaram ao desenvolvimento (a) do
confessionalismo e (b) do pietismo?
6. Por que os escritores católicos romanos pós-Midentirais (Concilio
de Tremo) deram tanta ênfase à ligação com a igreja primitiva?
O papel da tradição
A posição católica
Martinho Lutero
Em 1545, um ano antes de falecer, Lutero acrescentou um prefácio ao primeiro
volume da edição completa de seus escritos em latim no qual ele desci evia como
havia rompido com a igreja de sua época. O prefácio é redigido com clareza visando
apresentar Lutem a leitores que talvez não soubessem como ele havia desenvolvido
as idéias reformadoras radicais associadas ao seu nome. Nesse -fragmento
autobiográfica" (como costuma ser chamado), o objetivo de Lutero é oferecer aos
leitores informações contextuais sobre o desenvolvimento de sua vocação como
reformador. Depois de fatia de alguns dados históricos preliminares, estendendo
sua narrativa até o ano de 1519, ele se volta pua a descrição de suas dificuldades
pessoais como problema da' Justiça de Deus":
Certamente desejava compreender Paulo em sua carta aos Romanos. Mas o que me
impedia de fazê Ia não era tanto uma timidez, tar, sim, aquela frase no começo
do primeiro capítulo: "ajustiça de Deus se revela no evangelho" (Ria 1. t7).
Porquanto eu detestava essa expressão "a justiça de Deus", que me haviam
ensinado a entender como a justiça pela qual Deus é justo e castiga os
pecadores iníquos.
Apesar de levar uma vida irrepreensível como monge, sentia que em um pecador
com uma consciência inquieta diante de Deus. Também não podia crer que o havia
agradado com minhas obras. Em vez de amar esse Deus justo que castigava os
pecadores, na verdade eu o odiava... Estava desesperado para entender o que
Paulo queria dizer nessa passagem. Por feri, meditei dia e noite acerca das
palavras "a justiça de Deus se revela no evangelho, de fé em fé, como está
escrito: O justo viverá por fé" e comecei a entender que a 'Justiça de Deus" é
aquela pela qual a pessoajuna vive pelo dom de Deus (fé) e que essa expressão —
aputiça de Deus se revela" se refere a um justiça passiva, pela qual o Deus
misericordioso nos justifica pela fé, como está escrito, "o justo viverá pela
fé". Isso me fez sentir, no mesmo instante, como se tivesse nascido de novo,
cort. se tivesse entuido pelas portas sfixatas do próprio paraíso. Daquele
momento em diante, vi as Escrituras sob uma nova luz... E as palavras que
eu antes detestava — "a justiça de Deus" — comecei a amar e exaltar como a
mais doce das frases, de modo que essa passagem na, texto de Paulo se
tornou, para mim, a portado paraíso.
Sobre o que Lutero está falando nessa passagem conhecida que vibra
com a eirtísilgação da descoberta? É evidente que sua visão da
expressão "justiça de Deus" sofreu uma mudança radical. Mas qual a
natureza dessa mudança?
situação. Assim, tanto para Agostinho quanto para Lutem, as boas novas do
evangelho consistem no fato de que você recebeu a soma necessária para
comprar a sua liberdade. Em ou~ palavras, o pré-requisito foi preenchido por
outrem.
De acordo com o insight de Lutero, que ele descreve nesta passagem
autobiográfica, o Deus do evangelho cristão não é um juiz severo que
recompensa indivíduos de acordo com seus méritos, mas sim um Deus
gracioso e bondoso que concede justiça aos pecadores como um dom. O
consenso geral entre os estudiosos de Lutem é de que sua teologia da
justificação passou por uma mudança decisiva em algum momento em 1515.
Um dos conceitos centrais da visão de Lutero é a doutrina da 'justificação
somente pela fé". A idéia de justificação já é conhecida. Mas e quanto à
expressão "somente pela fé"? Qual a natureza da fé justificados? "O
motivo pelo qual algumas pessoas não entendem por que somente a fé
justifica é o fato de não saberem o que é fé." Ao escrever essas palavras,
Lutero chama nossa atenção para a necessidade de investigar mais de perto
essa palavraerigarrossimente simples: "fé". Três pontos intimamente
relacionados ao conceito de Lutero acerca da fé podem ser destacados
por sua relevância particular para a sua doutrina da justificação. Cada um
desses pontos foi retomado e desenvolvido por escritores posteriores como
Calvino, indicando que Lutero realizou uma contribuição fundamental para o
desenvolvimento do pensamento da Reforma nessa questão. Eis os três
pontos:
(institia aliena). Deus trota ou "considera" essa justiça como se fosse parte da
pessoa do pecador. Em suas preleções de 1515 — 1516, Lutero desenvolve
a idéia da Justiça alheia de Cristo" que nos é imputada— e não concedida—
pela fé como a base da justificação. Seus comentários sobre Romanos 4.7 são
particularmente importantes:
O Concílio de Trento
Estava claro que a igreja precisava dar uma resposta oficial e definitiva a
Lutero. Em 1540, Lutero já havia se tomado um nome conhecido por toda a
Europa. Seus escritos estavam sendo tidos e estudados com diferentes graus de
entusiasmo, mesmo nos círculos eclesiásticos mais elevados na Itália. Algo pre-
cisava ser feito. O Concilio de Trento, convocado em 1545, começou o longo
processo de formular uma resposta abrangente a Lutero. Uma de suas priorida-
des foi a doutrinada justificação.
A crítica de Trento à doutrina da justificação defendida por Lutero pode ser dividida
em quatro seções:
1. A natureza da justificação.
2. A natureza da justiça justificados.
3. A natureza da fé justificados.
4. A certeza da salvação.
1. A natureza da justificação
Em sua fase inicial, por volta dos anos 1515 – 1519, a tendência de Lutero era
entendera justificação como um processo de transformação, no qual o cristão
era conformado gradativamente à semelhança de Jesus Cristo através de um
processo de renovação interna. A analogia que Lutero usa de uma pessoa enferma
sob cuidados médicos competentes indica essa visão ilajustificação, como também
o faz sua famosa declaração nas preleções sobre Romanas em 1515 – 1516, "a
justificação diz respeito à transformação". Porém, em seus escritos posteriores
datados da metade da década de 1530 em diante, talvez sob a influência da
abordagem mais forense de Melâncton à justificação, Lutem tende a tratar da
justificação como uma questão de ser declarado justo, e não como um processo
de ser tomado justo. Cada vez mais, Lutero veio a considerara justificação um
acontecimento que era completado pelo processo distinto da regeneração e
renovação interna por meio da atuação do Espírito Santo. A justificação altera o
status externo do pecador aos olhos de Deus, enquanto a regeneração altera a
natureza interna do pecador.
2. A natureza daJustiçajushificatk)ritt
No entanto, Trento não lhe deu atenção. O uso da palavra "única" foi
deliberado, visando eliminara idéia de que podia haver mais de uma causa.
A causa direta única riajustificação era o dom interior clajustiça.
3. A natureza da fé justificadora
4. A certeza da salvação
Para Lutero, como para os reformadores em geral, um pessoa podia ter certeza
da sua salvação. A salvação era alicerçada na fidelidade de Deus às suas
promessas de misericórdia; deixar de ter certeza da salvação era, na verdade, o
mesmo que duvidar da conflabilidade, e fidelidade de Deus. E, no entanto, essa
certeza não deve ser vista como uma confiança suprema em Deus sem nenhum
traço de dúvida. Fé não é o mesmo que certeza; apesar do alicerce teológico da fé
cristã permanecer firme, a percepção humana desse alicerce e seu compromisso
com o mesmo podem vacilar.
Calvino, considerado com freqüência o reformador mais seguro quanto às
questões de fé, fala claramente dessa relação entre certeza e percepção,
apresentando do seguinte modo a sua definição de fé:
Transubstanciação
que pela consagração do pão e do vinho ocorre uma mudança na qual toda a
substância do pão se toma a substância do corpo de Cristo nosso Senhor e toda
a substância do vinho se tom. a substância do seu sangue. À essa mudança, a
Igreja Católica dá o nome apropriado e cometa de "transubstanciação".
Lutero; consubstanciação
Da minha grade, se não sou capar, de sondara maneira como o pão é o corpo de
Cristo, ainda assim levarei cativo o meu pensamento â obedienvia de Cristo e,
simplesmente me apegando as suas palavras, crerei firmemente não apenas que o
corpo de Cristo está no pão, mas que o pão é o corpo de Cristo. Minha justificativa
paio isso são as palavras: "to-ateu o pão; e, tendo dado graças, o partiu e disse:
Isto [ou seja, este pão, que ele havia tomado e partido] é o meu corpo" (1 Co
11.23-24).
Zwinglio: memorial
Mas e quanto às palavras "isto é o meu corpo" (Mt 26.26), que haviam servido
de pedra angular para as idéias católicas da presença real e que Lutero havia
usado para defender essa mesma presença? Zwinglio argumentou que "há
inúmeras passagens nas Escrituras nas quais a palavra V quer dizer 'se -
proscrita—. A questão a ser tratada, portanto, é
Se as palavras de Cristo em Matruz 26, "isto é o meu corpo" também podem ser
entendidas memfaricariaen[e ou in tropice. Já ficou claro o suficiente que neste
contexto a palavra "é" não pode ser entendida literalmente. Segue-se, portanto,
que deve ser entendida melaffidca ou figuriucamente Nas palavras "isto é o meu
~', o termo "isto" se refer, ao pão e o termo "corpo", ao corpo que foi morto por
nós. Logo, a palavra "é" não pode ser entendida literalmente, pois o pão não é
o corpo.
João Calvino
Como anteriormente vimos, a discussão central entre Lutem e Zwinglio dizia
respeito à relação entre o sinal sacramental e o dom espiritual que este
representava. Pode-se dizer que Calvino ocupa uma posição mais ou menos
intermediária entre esses dois extremos. Argumenta que, nos sacramentos,
há uma ligação tão próxima entre o símbolo e o dom que ele simboliza que
podemos "facilmente passar de ura, para o outro". O sinal é visível e físico,
enquanto aquilo que é representado é invisível e espiritual — e, no entanto,
a ligação entre o sinal e aquilo que é representado é tão íntima que é
permissível aplicar um ao outro. Aquilo que é representado é realizado pelo
seu sinal.
Os cristãos devem sempre viver segundo esta regra: sempre que verem símbolos
determinados pelo Senhor, devem pensar e se convencer de que a verdade
daquilo que é representado está presente ali. Pois, por que o Senhor colocaria
em tuas mãos o símbolo de seu corpo se não estivesse certo de que
participarias de fato dele? E se é verdade que um sinal visível nos é dado para
selara dádiva de algo invisível, havendo recebido o símbolo do corpo,
estejamos certos de que o próprio corpo também nos foi dado.
Desse modo, Calvino pode manter a diferença entre o sinal e aquilo que é
representado e, ao mesmo tempo, insistir que o sinal aponta, de fato, para o
dom que ele representa.
A Reforma surgiu dentro de utra contexto que deu nova ênfase à impor-
tância desse grande escritor do final do século 5- e começo do século 6',
refletida na publicação da edição de Amerbach das obras de Agostinho em
1506. Em vários sentidos, porém, as idéias dos reformadores acerca da
igreja são o seu calcanhar-de-aquiles. Os reformadores foram confrontados
com dois pontos de vista firmes, porém opostos, acerca da igreja, dotados
de uma lógica com a qual não conseguiam competir – os pontos de vista
de seus oponentes dentro do catolicismo e da Reforma radical. Para os
primeiros, a igreja era uma instituição visível e histórica que possuía uma
ligação histórica com a igreja apostólica; para os últimos, a verdadeira igreja
estava no céu e nenhuma instituição aqui na terra era digna de ser
chamada pelo nome de "igreja de Deus". Os reformadores magisteriais
tentaram se colocar numa posição intermediária entre esses dois pontos de
vista opostos e, em decorrência disso, acabaram envolvidos em
incoerências graves. Neste estudo de caso, investigaremos os diversos pontos
de vista acerca da doutrina da igreja encontrados na Reforma protestante,
observando os paralelos extraordinários com a controvérsia donatista
(da qual tratamos no estudo de caso 1.6).
Lutem estava certo de que a igreja de seu tempo e de sua era havia
perdido de vista a doutrina da graça, que ele considerava o centro do
evangelho cristão. Convicto de que a igreja católica havia se
desviado dessa doutrina, Lutem concluiu (ao que parece, com certa
relutância) q ue havia perdido seu direito de ser considerada uma
igreja cristã autêntica. Os católicos responderam a essa sugestão com
desprezo: Lutem estava apenas criando uma facção separatista sem
nenhuma ligação com a igreja. Em outras palavras, era um cismático
– e, acaso, o próprio Agostinho não havia condenado o cisma e dado
grande ênfase à unidade da igreja dentro da qual Lutem ameaçava
causar separação? Podemos observa aqui um ponto de referência
histórico importante que teria um papel crítico nas discussões sobre a
igreja no século 16: a Reforma pode, pelo menos em alguns sentidos,
ser considerada uma reprise da controvérsia donatista do século 4-. Ao
que parece, Lutem só podia defender a doutrina de Agostinho acerca
da graça rejeitando a doutrina de Agostinho acerca da igreja.
"Considerada internamente, a Reforma foi apenas o triunfo final
Matúnho Lutero
A Reforma radical
Afirmo, contra todos .,, doutores, que todas as coisas externas que esta vam
em uso na igreja dos apóstolos foram abolidas e que nenhuma delas deve
ser restaurada ou reinstituída, ainda que eles tirâmir, ido além da sua
autorização ou chamado e tentado restaurar esses sacramentos decaídos.
Porquanto a igreja permanecerá dispersada entre os pagãos até o tim do
mundo. De fato, o Anticristo e sua igreja só serão derrotados e eliminados na
vinda de Cristo, que reunirá o seu remo, Israel, que foi dispersado pelos
quatro cantos do mundo... As obras [daqueles que entenderam isto] foram
reprimidas como heresias ímpias e discursos bombásticos, e o lugar de honra
foi dado a insensatos como Ambrósia Agostinho, Ierônimo, Gregõrio – dos
quais nenhum conheceu a Cristo nem foi enviado por Deus paio ensinar.
Antes, todos foram e continuarão sendo apóstolos do Anticristo.
Agostinho usou a "parábola do trigo e do joio" (Mt 13.24-3 1) para apoiar sua
argumentação. Nessa parábola, o proprietário de um campo descobre certa
manhã que há trigo e joio crescendo lado a lado em suas terras. Uma vez
que não existiam herbicidas seletivos naquele tempo, ele se mostra
relutante em tentar remover o joio: ao fazê-lo acabaria, inevitavelmente,
danificando também uma pane do trigo. Sua solução para o problema é
esperar até o trigo estar pronto para a colheita e, então, separa m do joio.
De acordo com Agostinho, essa parábola se aplica à igreja. Como o campo
da parábola, a igreja tem tanto trigo quanto joio, os justos e os ímpios, que
coexistem até o dia do julgamento.
Nesse dia, Deus fará distinção entre eles – e nenhum ser humano tem
permissão de realizar antecipadamente o julgamento de Deus. Assim, até o
fim dos tempos, haverá tanto o bem quanto o mal dentro da igreja. Agostinho
argumenta que o retino "católico" (que significa, literalmente, "inteiro"),
conforme este é aplicado à igreja, descreve sua membresia mista de santos e
pecadores.
Os conceitos "donatistas" e "agostinianos" de igreja são, portanto, bas -
tante distintos. Lutem aceitou a visão de Agostinho de que a igreja é uma con-
gregação "nisto", enquanto os radicais desenvolveram uma visão donatista
da igreja corno uma congregação dos justos e somente destes. Como os
donatistas, os radicais exigiam de seus membros a perfeição moral. A
igreja e o mundo eram tão opostos quanto a luz e as trevas e não havia lugar
em seu pensamento para considerar aquilo que, para eles, não passava de
transigência política da parte de Lutero e Zwinglio. Para Lutero, porém, é
possível encontrar membros corruptos dentro da igreja "como é possível
encontrar excrementos de rato no meio de grãos de pimenta ou Joio no meio
do trigo". Trata-se de um dos fatos eclesiásticos d a vida que Agostinho
reconhece e com o qual Lutem concorda. A Reforma magisterial conduz,
portanto, ao estabelecimento de uma igreja, enquanto a Reforma radical
conduz à formação de seitas. A distinção sociológica entre os dois
movimentos reflete seus conceitos diferentes da natureza da igreja. Nesse
ponto, a teologia e a sociologia se encontram estreitamente ligadas.
(Observamos anteriormente a máxima conhecida que representa a Reforma
como o triunfo da doutrina de Agostinho acercada graça sobre a sua
doutrina acerca da igreja: é necessário observar aqui que Lutero e
outros reformadores magisteriais mantiveram pelo menos esse aspecto da
teoria de Agostinho acerca da igreja.) Mas que justificativa Lutero tem, então,
para se separar da igreja católica? Esse aspecto da sua teoria da igreja não
indica, necessariamente, que sempre haverá corrupção dentro da
verdadeira igreja? Tomando por base a teoria de Agostinho, a corrupção
da igreja católica não significa, obrigatoriamente, que ela é uma Igreja falsa".
João Calvino
existe lV. Assim, não é a qualidade de seus membros, mas a presença do meio
autorizado da graça que constitui a verdadeira igreja. Isso pode ser visto clara-
mente na discussão de Calvino sobre as características identificadoras de uma
igreja, o assunto do qual trataremos a seguir.
3.4.2 João Calvino e as características distintivas da igreja
Onde quer que vejamos a Palavra de Deus sendo pregada puramente e ouvida e
os sacramentos sendo ministrados segundo a instituição de Cristo, não se pode
duvidar de maneira nenhuma que existe uma igreja de Deus... Se o ministério
tema Palavra e a honra, se tem a ministraÇão dos sacramentos, merece, sem
dúvida alguma, ser julgado e considerado uma igreja... Quando dizemos que o
ministério paro da Palavra e o modo puro de celebrar os sacramentos são
penhore garantia suficientes pelos quais podemos reconhecer uma igreja em
qualquer sociedade, queremos dizer que no lugar em que essas duas mamas
existem, a igreja não deve ser rejeitada, ainda que repleta de falhas em outros
aspectos. E mais, algumas faltas podem se infiltrar na trutristração da doutrina
ou dos sacramentos, mas isso não deve nos afastar da comunhão com essa igreja.
Pois nem todos os artigos da verdadeira doutrina têm o mesmo peso. Alguns
desses artigos devem, necessariamente, ser conhecidos e permanecer in-
contestáveis e indiscutids e ser considerados por todos artigos próprios para a
religião, como: Deus é um; Cristo é Deus e o Filho de Deus; nossa salvação se
baseia na misericórdia de Deus e assim por diante. Há outros [artigos de doutrina]
que são discutidos entre as igrejas e que, ainda assim, não rompem a unidade
da fé... Não estou sendo conivente com o erno, por mais insignificante que seja,
nem desejo incentiva M. No entanto, estou dizendo que não devemos desertar
uma igreja em função de um desacordo secundário caso esta preserve a sã
doutrina no tocante à piedade e o uso dos sacramentos instituídos pelo Serlhor.
A fira de que ninguém seja excluído do meio de obter essa felicidade, aprouve a
Deus não apenas colocar em nossa mente as sementes da religião sobre as quais já
falamos, mas também tomar conhecida sua perfeição em toda a estimara do
universo e colocar-se às nossas vistas diaramente de maneira que não podemos
abrir nossos oflios, sem sermos compelidos a observá-lo... Para provar essa
sabedoria extraordinária, tanto os céus quanto a terra nos temerem evidências
incontáveis — não apenas as provas mais avançadas que a astronomia, a
medicina e todas as outras ciências naturais têm o propósito de ilusicar, mas
também as provas que chamam a atenção até do camponês mais iletrado que
não é capaz de abrir seus olhos sem vê-las.
CAPÍTULO 4
Durante a segunda metade do século 15, o Cristianismo se tomou cada vez mais
uma religião européia. O islã havia iniciado um jihad ("guerra sana") contra o
Cristianismo vários séculos antes. Por volta de 1450, como conseqüência direta de
suas conquistas militares, o islã se encontrava firmemente estabelecido nas
regiões sudoeste e sudeste da Europa. Apesar de comunidades cristãs
continuarem a existir fora da Europa (principalmente no Egito, Etiópia, índia e
Síria), o Cristianismo estava se tomando geograficamente restrito e seu futuro
parecia incerto.
Um dos acontecimentos mais dramáticos desses últimos séculos foi a
recuperação do Cristianismo dessa crise. No século 20, o Cristianismo já se
encontrava firmemente estabelecido como religião predominante nas Améri-
cas, Austrália, sul da África e em várias nações insulares do Pacífico sul. Ao
longo deste capítulo, investigaremos de que maneira isso ocorreu. No entanto,
apesar dessa expansão dramática fora da Europa, o Cristianismo sofreu uma
série de retrocessos internos em seu antigo centro — a Europa ocidental.
0 ILUNIÊNISNIO
Nesse ponto, convém observar que foi a teologia protestante, e não seus
comelativos católicos romanos ou ortodoxos orientais, que se mostrou
especialmente aberta para as novas correntes que surgiram do Iluminismo e de
seus resultados. Essa desenvolução parece ter sido influenciada por vários
fatores, dos quatis os seguintes são particularmente relevantes:
Como ficará claro pelos textos apresentados na seção seguinte, isso sig-
nifica que todo relato da influência do Iluminismo sobre a teologia moderna se
concentrará na teologia protestante.
A possibilidade de milagres
O conceito de revelação
O problema do mal
08 MOVIMENTOS T ~) G I C O S OCIDENTAIS
DESDE O ILUMINISMO
Rrutrantistrim
Na última década do século 18, um número crescente de apreensões co-
meçou a ser expressado em relação à qualidade árida do racionalismo. A
razão, outrora vista em seu papel de libertadora, passou a ser considerada
cada vez mais como =a forma de escrarvização espiritual. Essas
ansiedades não formo, em sua maioria, expressadas nas faculdades de
filosofia das universidades, mas sim nos círculos artísticos e literários,
especialmente da capital da Prússia, Berfim, onde os irmãos Friedrich e
August William Schlegel se tomaram particularmente, influentes.
0 -romantismo" é conhecido por ser um movimento difícil de definir. Pode
ser considerado uma reação a certos temas contrais do futurismo, prin-
cipalmente à afirmação de que a realidade pode ser conhecida pela razão
humana. Essa redução da malidade a uma série de elementos simples
racionalivados parecia, para os românticos, uma interpretação equivocada,
grosseira e censurável. Enquanto os ilutrunistas; apelaram para a razão
humana, os românticos se valeram da imaginação humana que é capaz de
reconhecer a sensação profunda de mistério que surge da percepção de
que a mente humana não é capaz de compreender nem sequer o mundo
finito, quanto mais o infinito além dele. Esse ethos é expressado de maneira
adequada pelo poeta inglês William Wordsworth, que falou da imaginação
humana transcendendo as limitações da razão humana, indo além dos limites
deste mundo de modo a experimentar o infinito através do fimito. Em suas
palavras, a imaginação:
Não passa de outro nome para o poder absolun,
E para o discernimento mais elam, a amplitude da mente E a Rano é
seu modo mais exaltado.
da falta desse consolo por tanto tempo". Idéias semelhantes podem ser citadas em
relação ao contexto alemão nos últimos anos do século 18.
Acontecimentos na Inglaterra, Alemanha e América do Norte deixam claro que o
racionalismo fracassou em sua tentativa de solapar a religião. A nova força
evidente no pietismo alemão e no evangelicalismo inglês do século 18 comprova
o insucesso do racionalismo em prover uma alternativa convincente para a
sensação humana prevalecente de necessidade pessoal e significado. A filosofia
passou a ser vista como uma disciplina estéril e "acadêmica" no pior sentido da
palavra, uma vez que se encontrava separada tanto das realidades; exteriores da
vida quanto da existência interior da consciência humana.
É neste contexto de crescente desilusão com o racionalismo e nova simciação pelo
"sentimento" humano que a contribuição de Friedrich Daniel Estíst Schleiermacher
(1768 – 1834) deve ser vista. Schleiermacher capitalizou esse interesse no
sentimento. Argumentou que a religião em geral e o Cristianismo em particular são
uma questão de sentimento ou "autmonsciência". Sua principal obra de teologia
sistemática The Christian Farth [A fé cristal (1821; revisada em 1830), é uma
tentativa de mostrar como a teologia cristã é relacionada a um sentimento de
"dependência absoluta". A estrutura de A fé cristã é complexa e gira em tomo da
dialética entre o pecado e a graça. A obra é organizada em três pames. A primeira
trata da consciência de Deus, concentrando-se em questões como a criação. A
segunda trata da consciência do pecado e suas implicações, como um percepção
da possibilidade de redenção. A última par te reflete sobre a consciência da graça,
e trata de questões como a pessoa e a obra de Cristo. Desse modo,
Schleiermacher argumenta que "tuclo é relacionado à redenção realizada por
Jesus de Nazaré".
A contribuição de Scideietenacher para o desenvolvimento da teologia cristã é
considerável e será examinada em maior profundidade no penas apregoado desta
obra. No entanto, voltamos nossa atenção agora para um movimenta que, apesar
de não ser estritamente teológico – alias, poderia ser chamado de ateufrigico –
exerceu um grande impacto sobre a teologia ocidental moderna. O movimento em
questão é o marxismo.
Maindsmo
Protestantismo liberal
Modernismo
Neo-ortodoxia
A Primeira Guerra Mundial testemunhou uma desilusão, porém não uma rejeição
definitiva da teologia liberal que havia sido associada a Schleiermacher e seus
seguidores. Vários escritores argumentaram que Sebleiemacher havia, com efeito,
reduzido o Cristianismo a pouco mais do que uma experiência religiosa,
tomando-o, desse modo, centrado no ser humano, e não em Deus. De acordo
com os críticos, a guerra havia destruido a credibilidade dessa abordagem. A
teologia liberal parecia dizer respeito a valores humanos – e como estes podiam
ser levados a sério se haviam gerado conflitos globais de grande escala? Ao
enfidizarrem, o "caráter distinto" de Deus, escritores como Karl Barth, (1886 – 1968)
acreditavam que poderiam escapar da teologia antropocêntrica do liberalismo que
estava condenada à extinção.
Barth expôs essas idéias de forma sistemática em Church Dogmatics [Teologia
dogmática eclesiástica] (1936 – 1969), possivelmente a realização teológica mais
expressiva do século 20. Uma vez que Barth não viveu para concluir essa
empreitada, sua exposição da doutrina da redenção ficou incompleta. O tema
central que ressoa por toda a obra é a necessidade de considerar a revelação
própria de Deus em Cristo por meio das Escrituras com extrema seriedade. Apesar
dessa declaração parecer pouco mais do que reiteração de temas já associados
firmemente a Calvino e Lutero, Barth realizou seu trabalho com uma criatividade
que o consolidou como grande pensador por seus proprios, méritos.
Apesar disso, indícios claros da tendência a uma renovação teológica podem ser
discernidos no século 19. O catolicismo romano alemão foi profundamente tocado
pelo desenvolvimento do idealismo do movimento romântico que reavivou o
interesse em vários aspectos da prática e fé católica, inclusive em seus aspectos
experienciais. Esse novo interesse na experiência pode ser visto na ascensão da
escola católica de Túbingen durante a década de 1830, quando escritores como
Johann Sebastian voo Drey (1777 - 1853) e Johann Ai= Móhler (1796 - 1838)
começaram a enfatizara idéia de tradição como voz viva da igreja. John Henry
Newman (1801-1890),ofigináriodoanglicanismo, também deu uma injeção de
segurança e discernimento teológico na teologia católica do final do século 19,
mesmo que sua influência tenha, sem dúvida, sido maior no século 20 do que em
seu próprio tempo. Talvez sua contribuição mais importante piado avanço da
teologia católica seja relacionada às áreas de desenvolvimento da teologia e do
papel dos leigos na igreja.
Depois da Segunda Guerra Mundial (1939 - 1945), pode-se ver sinais de um
reavivamento expressivo na teologia católica. Um dos temas mais importantes
é o do resgate da herança patrística e medieval do catolicismo, evidente nos
escritos de Henri de Lulhae e Yves Congar. O Segundo Concílio
A ortodoxia oriental
Feminismo
Pós-modernismo
Teologia negra
A teologia negra é uma teologia da libertação dos negros. Visa sondar a condição
dos negros à luz da revelação de Deus em Jesus Cristo de modo que a
comunidade negra possa ver o evangelho como sendo emeusanalo comas
realizações da humanidade negra. A teologia negra e uma teologia da "negritude".
É a afirmação da humanidade negra que emancipa o povo negro do racismo
branco e, desse modo, proporciona liberdade verdadeira para o povo branca e
negro.
Pós-liberalismo
Uma das desenvoluções mais importantes na teologia desde cerca de 1980 foi
um ceticismo crescente acerca da plausibilidade da cosmovisão liberal. Vários
acontecimentos acompanharam esse afastamento do liberalismo, dentre os
quais talvez o mais importante tenha sido o resgate dos pontos de vista mais
conservadores. Uma dessas desenvoluções foi o pós-libemlismo que passou a
ser associado especificamente à Yale Divinity School. Seus principais
fundamentos são abordagens narrativas â teologia, como as desenvolvidas por
Hans Frei e as escolas de interpretação social que enfatizam a importância da
cultura e da linguagem na geração e interpretação da experiência e do
pensamento.
Evangelicalismo
O termo "evangelicalismo- pode ser datado do século 16, quando foi usado para
se referir aos escritures católicos que desejavam voltara crenças e práticas mais
bíblicas do que aquelas associadas à igreja no final do período medieval. Foi
usado especialmente na década de 1520, quando os termos évangélique
(francês) e evangelisch (alemão) começaram a ganhar preeminência nos escritos
do início da Reforma. Nos dias de hoje, o termo é usado de maneira ampla para
se referir a uma tendência muistlenominacional na teologia e espiritualidade que dá
ênfase específica ao lugar das Escrituras na vida cristã. O evangelicalismo
apresenta quatro pressuposições centrais:
Uma questão essencial que exige esclarecimento neste ponto diz respeito à relação
entre o fundamentalismo e o evangelicalismo. O fundamentalismo surgiu dentro
de algumas igrejas norte-americanas como reação ao avanço da cultura secular.
Foi, desde o princípio, e continua sendo, um movimento contracultural, usando
afirmações doutrinárias centrais para definir seus limites culturais. Certas
doutrinas centrais — especialmente a autoridade literal absoluta das Escrituras e a
segunda vinda de Cristo antes do fim dos tempos (uma doutrina que costuma ser
chamada de "volta premilenar de Cristo") —
O sudeste da Ásia
África
O Cristianismo se estabeleceu no norte da África durante o primeiro século da Era
Cristã. Igrejas foram fundadas ao longo de boa parte da costa norte da África, nas
regiões conhecidas hoje como Argélia, Tunísia e Líbia. Uma presença cristã
particularmente forte se desenvolveu no Egito, tendo a cidade de Alexandria
como centro emergente de vida e pensamento cristãos. Uma boa parte dessa
presença cristã foi eliminada pelas invasões árabes do século 7-. Mas, mesmo
como uma fé minoritária, o Cristianismo sobreviveu no Egito. Apenas o
pequeno reino da Etiópia (termo que designa um território muito menor do que a
ama] nação que leva esse mesmo nome) permaneceu uma nação cristã. No início do
século 16, a África se encontrava dominada pelo Islantuístro ao norte e pelas
formas nativas de religião ao sul. Com exceção do caso isolado da Etiópia, riso
havia absolutamente nenhuma presença cristã expressiva.
Outras questões também são importantes. Dois fatos miar-relacionados podem ser
destacados. O período depois da Segunda Guerra Mundial testemunhou o fim do
colonialismo. As potências coloniais – como a Bélgica, a França e a Grã-Bretanha –
se retiraram gradativamente da região, deixando para trás nações independentes.
Juntamente com essa transição parar a independência, as igrejas da região foram, aos
poucos, deixando sua dependência das igrejas-mães
Pacífico sul
A índia
esse trabalho pudesse ser transferido para agências com base na própria
índia. Em sua proposta, pode-se ver a base do movimento missionário que
estava destinado a causar um fone impacto sobre o Cristianismo indiano.
Dentre as principais contribuições do trabalho missionário na índia, as
seguintes podem ser destacadas. A primeira grande missão protestante na
índia tinha sua base em Tranquebar, na Costa de Corourianidel, cerca de 200
quilômetios ao sul de Madras. Dentre os missionários liderares alemães, os
mais notáveis foram Barflutilormita Ziegenbalg (que dirigiu a missão desde sua
fundação em 1706 até 1719) e Christian Frederick Schwartz (diretor de
1750 a 1787). No entanto, o poder político crescente da Grã-Bretanha na
região favoreceu, inevitavelmente, as atividades dos missionários
britânicos, sendo que o primeiro (o batista William Carey) começou a
trabalharem Bengala em 1793. A decisão de Clemente XIV de extinguira
Companhia de Jesus também contribuiu para esse favoritismo. A bula
Dominus ac Redemptor (21 de julho de 1773) encerrava formalmente 'Iodas
as suas funções e ministérios". Suspenderam-se, portanto, todas as atividades
missionárias dos jesuítas na índia e em outras partes do mundo. Ainda assim,
sabe-se de pelo menos 50 jesuítas que continuaram o trabalho missionário na
índia depois da extinção da sua ordem, apesar dos esforços dos portugueses
para repatriá-los.
Também provocou uma série de críticas dentro dos círculos cristãos eu-
ropeus, especialmente dos protestantes mais conservadores como
Deocar Schmidt, um pastor luterano. Schmidt argumentou que os preceitos
morais de Cristo não podiam ser separados da questão teológica da
identidade de Cristo e das implicações subseqüentes disso para o
conceito trinitário de Deus. Rammohun Roy replicou que era impossível
um findo aceitar um conceito limitaria de Deus; não obstante, uma visão
unitária de Deus associada a uma ênfase sobre o código moral do
evangelho podia muito bem se mostrar aceitável. Era possível os pecados
serem perdoados sem que a expiação realizada por Cristo fosse necessária,
uma idéia que ele considerava completamente alheia ao hinduismis (o teísmo
bramanista, por exemplo, rejeita tanto o conceito de revelação quanto o de
expiação). Em 1829, ele fundou a Bratítirio Samaj, uma sociedade teísta
que usava conceitos tanto do hinduísmo quanto do Cristianismo; dentre
as idéias derivadas deste último, encontrava-se a prática da congregação
regular para cultuar, algo até então desconhecido no hinduísmo. Porém, sob
seu sucessor, Devendrarradi Tagore, a Samaj tomou um rumo defi-
nitivamente mais hindu. No entanto, alguns aspectos da visão de
Rammohun Roy acerca da relação entre Cristianismo e hindutísara, foram
criticados por outros hindus que haviam se convertido ao Cristianismo.
Assim, o escritor hergali Krishna Mohan Banorjei, argumentou que havia
afinidades estreitas entre o conceito védico de sacrifício Purusha e a
doutrina cristã de expiação, desafiando desse modo a visão de Rammohun
Roy de que havia diferenças radicais entre as duas religiões nesse ponto.
Essa abordagem foi desenvolvida por Neiteassial, Goreh (1825 - 1895), que enfatizou a
facilidade com que era possível passar de um conceito hindu de Deus para o
conceito apresentado agora pelo Cristianismo:
Podemos nós, os filhos da índia, dizer que a unidade com Deus, que aprouve
aos nossos pais chamar de "Sal, Cit, Ananda Brahman", pelo qual ansiavam
ardentemente, mas no sentido criado... Deus nos concedeu — a nós. os filhos
desses pais — fazê-lo no sentido comem? Essa aspiração e anseio, ainda que
malcompreendidos por eles, foram um pressentintento da dádiva fartura? Ateraz-ra,
com freqüência penes que sim.
Uma idéia relacionada foi desenvolvida mais recentemente por Raimundo Panikkar
em sua obra Unknown Christ of Hinduísm [O Cristo desconhecido do
hinduísmo] (1981), na qual ele argumentou em favor da presença oculta de Cristo na
prática hindu, especialmente em relação às questões de justiça e compaixão.
Jesus and Freedom [Jesus e a liberdade] (1978). No entanto, tudo indica que a
investigação da relação entre o Cristianismo e o hinduísmo continuará sendo uma
característica expressiva da teologia cristã indiana por algum tempo. A relação
entre a doutrina cristã da encarnação e o conceito hindu de avatar, por exemplo,
tem se mostrado uma discussão importante dentro da teologia indiana (ver V.
Cbakkarai, Jesus the Avatar [Jesus o Avatar]).
Oito abordagens gerais a essa questão podem ser discernidas dentro do
pensamento cristão indiano contemporâneo:
Esse resumo sucinto dos acontecimentos dentro da teologia cristã desde 1750
documentou a maneira como o Cristianismo se tornou uma religião global, cujo centro
gravitacional numérico mudou para os países em desenvolvimento. Fica claro como
é cada vez mais provável que a educação e reflexão teológicas sigam essa mudança
global, com o surgimento nesses países de seminários que se tomarão os centros de
desenvolvimento teológico do segundo milênio.
No~ PALAVRAS E E~~ES MAIS RELEVANTES
a busca pelo Jesus histórico evartígelicalismo
f e m i n i s m o Grande Despertar I l u m i n i s m o l i b e r a l i s m o
m a r x i s m o m o d e r n i s m o movimento carismático
Movimento Patriótico das Três Autonomias neo-ortodoxia
pós-liberalismo pós-modernismo romantismo
teologia da libertação
teologia dialética teologia negra
PERGUNTAS (4)
O trecho final, chamado "Acerca dos objetivos de Jesus e seus discípu los",
tratava da natureza de nosso conhecimento de Jesus Cristo e levantava
questões quanto aos relatos do evangelho sobre Jesus terem sido
modificados pelos cristãos primitivos. Remataras argumentou que havia uma
diferença radical entre as crenças e intenções do próprio Jesus e aquelas da
igreja apostólica. A linguagem e as imagens de Deus apresentadas por
Jesus eram, de acordo com Retiraras, as de um visionário apocalíptico
judeu com referência e relevância cronológica e política radicalmente
limitadas. Jesus tomou sobre si a expectativa do Judaísmo posterior de um
Messias que livraria seu povo da ocupação romano e creu que Deus o
ajudaria nessa tarefa. Seu clamor de desamparo na cruz representou o
momento final em que ele se deu conta de sua própria ilusão e equívoco.
Entretanto, os discípulos não aceitaram que a história terminasse assim.
Inventaram a idéia de uma "redenção espiritual" no lugar da visão política
concreta de Jesus de uma Israel liberta da ocupação estrangeira.
Inventaram a idéia da ressurreição de Jesus a fim de encobrira vergonha
causada por sua morte. Em decorrência disso, os discípulos criaram doutrinas
que Jesus nunca ensinou, como a de sua morte em expiação pelos pecados
humanos, acrescentando essas idéias ao texto bíblico para que este se
harmonizasse com suas próprias crenças. Por isso, o Novo Testamento
que conhecemos agora se encontra repleto de interpolações fraudulentas.
O verdadeiro Jesus da História foi ocultado de nós pela igreja apostólica
que colocou em seu lugar um Cristo da fé fictício, o redentor da humanidade
do pecado.
Em seu estudo magistral, The Quesi of the Historial Jesus [A busca pelo Jesus
histórico], Albert Schweitzer resume a importância das sugestões radi cais
de Reitraras; da seguinte forma:
[se] desejamos obter uma visão histórica dos ensinantentos, de Jesus, devemos
deixar para trás aquilo que aprendemos no catecismo com referência à filiação
divina metalesica, âTranclaulee a conceitos dotaciticos, do gênero e entrar num
universo de pensamento inteiramente judaico. Somente aqueles que aplicam os
ensinamentos do catecismo às pregações do Messias judaico chegam â
conclusão de que ele foi o fundador de uma nova religião. Para todas as
pessoas imparciais fica claro que "Jesus não tinha nenhuma intenção de acabar
coma religião judaica e colocar outra religião em seu lugar'.
De acordo com esse ponto de vista, Jesus foi simplesmente uma figura
política judaica que esperava, confiadamente, ser capaz de desencadear uma
revolta popular decisiva e vitoriosa contra Roma e que foi arrasado por seu
fracasso.
Na época, os seguidores dessa proposta foram poucos ou inexistentes, mas
Remontas levantou questões que adquiririam importância fundamental nos anos
subseqüentes. Mais especificamente, sua distinção explícita entre o Jesus histórico
legítimo e o Cristo da fé fictício teve uma relevância enorme. A "busca pelo Jesus
histórico" subseqüente foi resultado direto da suspeita racionalista crescente de
que o retrato neotestamentário de Cristo não passava de uma invenção
dogmática. Acreditava-se, de fato, ser possível resconstrofir a figura real de Jesus
e livrá-la das idéias dogmáticas com as quais os apóstolos a haviam encoberto.
A ilusão não podia durar muito tempo. O desafio mais intenso ao movimento da
"vida de Jesus" desenvolveu várias frentes na última década do século 19. Três
críticas centrais da cristologia da "personalidade religiosa" do protestantismo liberal
surgiram nas duas décadas que antecederam a Primeira Guerra Mundial;
trataremos de cada uma delas separadamente.
1. A coroa apocalíptica, associada principalmente a Johantics, Weiss (1863 — 1914)
e Albert Schweitzer (1875 — 1965), afirmava que a tendência fortemente
escatológica da proclamação de Jesus do reino de Deus colocava em dúvida a
interpretação liberal de cunho essencialmente kantiano desse conceito. Em 1892,
Johannes Weiss publicou a obra Jesus' Proclamation of the Kffigdoui of God [A
proclamação de Jesus do Reino de Deus]. Nesse livro,
Para Kafficr, não importa quem Cristo foi, mas sim o que ele faz hoje pelos
cristãos. O "Jesus da História" não tem a relevância soteriológica do
"Cristo da fé". As questões complicadas de cristologia podem, portanto, ser
deixadas para trás a fim de desenvolver o que ele chamou de "soteriologia" e
definiu como "o conhecimento da fé referente â pessoa do salvador". Na
verdade, Kãhler argumenta que o movimento da ' & vida de Jesus" não fez
muita coisa além de criar um Cristo luseudocientífico desprovido de relevância
existencial. Para Kãhler, "o Cristo real é o Cristo proclamado". A fé cristã
não é baseada nesse Jesus histórico, mas numa figura de Cristo
existencialmente relevante que desperta a fé. Considerações como essas
passaram, gradativamente, a dominar o cenário teológico e pode-se dizer
que chegaram ao seu auge nos escritos de Rudolf Bultmaiin, para o qual nos
soltamos agora.
Fica claro que a "nova busca pelo Jesus histórico" é qualitativamente distinta da
busca desacreditada empreendida no século 19. O argumento de Kãsemann se
baseia no reconhecimento de que a descontinuidade entre o Jesus da História e o
Cristo da fé não significa que são entidades sem nenhuma relação entre si, como se
o último não tivesse nenhuma base ou fundamento no primeiro. Antes, é preciso
discernir o kerigma nas ações e na pregação de Jesus de Nazaré de modo que haja
uma ligação contínua entre a pregação de Jesus e a pregação sobre Jesus.
Enquanto a busca anterior havia pressuposto que a descontinuidade entre o Jesus
histórico e o Cristo da fé indicava que este último em, possivelmente, uma ficção e
que precisava ser reconstruído à luz da investigação histórica objetiva, Kãsemann
enfatiza que essa reconstrução não é necessária nem possível.
A terceira busca
Desde o colapso geral da "nova busca" na década de 1960, um série de
obras foram publicadas oferecendo reavaliações do Jesus histórico. O
temo "terceira busca" pode ser aplicado a esse conjunto de obras. Essa
designação foi questionada por vários escritores que ressaltam que as obras e
estudiosos reunidos sob esse termo não têm elementos em comum em
nomeio suficiente para serem categorizados dessa maneira. Alguns
escritores dentro do grupo apelam, por exemplo, para fontes fora do Novo
Testamento, especialmente para o Evangelho Copta de Tomé, em sua
análise; outros restringem sua análise ao conteúdo do Novo Testamento,
especialmente aos evangelhos sinópticos. Apesar dessa reserva, o termo
parece estar ganhando aceitação e, portanto, é apropriado incluí-to neste
estudo.
A "primeira busca" abordava as histórias de Jesus à luz de suas suposições
fortemente nacionalistas e filtrava os aspectos miraculosos das narrativas do
evangelho. A "nova busca" apresentava a tendência de se concentrar nas
palavras de Jesus. A "terceira busca" parece incluir um enfoque sobre as
curas e exorcismos de Jesus como indicação do caráter distintivo de sua
missão e a sua visão de seus próprios objetivos. Dentre os expoentes dessa
`terceira busca", podemos destacar os seguintes indivíduos:
A critz não é um tema teológico, nem um dispositivo forense, mas sim a case
do universo moral numa escala muito maior do que a guerra roucas. É a
teodicéia de Deus como um todo tratando da alma inteira do airado inteiro
com amor santo, julgamento justo e graça redentora.
Por meio da critz, Deus visa restaurara retidão do mundo de maneira legílima - uni
tema central da doutrina de Anselmo reafirmado de maneira criativa.
Mais importante ainda é a discussão extensa do tema da "expiação" ou
"reconciliação" (a palavra em alemão, Versólinung, pode ter os dois sentidos)
encontrada na obra de Kml Barth, Teologia dogmática eclesiástica. A seção
central (IV 11, §59, 2) que trata dessa questão tem um título expressivo: "O
Juiz Julgado em Nosso Lugar". Esse título é derivado do Catecismo de
Heidelberg que fala de Cristo como o juiz que "me representou diante do jul-
gamento de Deus, e removeu de mim toda a condenação". A seção em questão
pode ser considerada um comentário ampliado desse texto clássico da tradição
reformada que trata da maneira como o julgamento de Deus é, em primeiro
lugar, revelado e realizado e, em segundo lugar, recai sobre o próprio Deus (um
tema anselmiano central, mesmo que Anselmo não tenha conseguido integrá-
lo dentro de um contexto trinitáriso.
A seção inteira é repleta de linguagem e imageria de culpa, julgamento e perdão.
Na cariz, podemos ver Deus exercendo seu julgamento justo sobre a
humanidade pecaminosa (Barth usou o termo composto Sisidermensch para
enfatizar que o "pecado- é um aspecto inseparável da natureza humana). A
cruz evidenciou as ilusões humanas de auto-suficiência e autonomia de jul-
parmentro, que para Barth se encontram resumidas no relato de Gênesis 3: 'o ser
humano deseja ser o seu próprio juiz".
A natureza da salvação
É necessário ressaltar que uma questão teológica insportante, se encontra por trás
das maneiras diversas como a salvação é interpretada. O crescimento do
Cristianismo nos últimos séculos, principalmente através do trabalho missionário,
levantou a questão da conteximilização. De que maneira o vocabulário e estrutura
conceitua) da tradição cristã podem ser adaptados ou redefinidos para ir ao encontro
das novas situações nas quais a fé cristã se expandiu? Harvey M. Com é um dos
escritores que destacam a importância dessa questão, observando que a
salvação deve ser particularizada em termos da situação à qual o evangelho está
se dirigindo em determinado momento. Em termos históricos, isso significa que os
conceitos de salvação variavam de um contexto cultural para outro — um ponto
que dá mais peso ao pedido de Wolfhart Parmenberg para que as cristologias não
sejam elaboradas exclusivamente sobre alicerces escattilógicits, mas que se
relacionem e fundamentem em alicerces soteriológicos. Uma revisão sucinta mostra
uma diversidade considerável de conceitos de salvação que adquiriram influência
desde 1700.
Conclusão
Este levantamento breve dos conceitos de salvação no pensamento cristão moderno
tocou nas questões principais da discussão. A maioria dos assuntos foi,
inevitavelmente, tratada de maneira muito mais sucinta do que merece. No entanto,
fica claro que a discussão dessas questões – inclusive da contextualização da
salvação – permanecerá uma tarefa perene da teologia custa responsável.
Mas, uma vez que a verdade desses milagres cessou completamente de ser
demonstrável por milagres atuais, um vez que estes não passara de relatos
de milagres... nego que possam e devam me obrigara ter um mínimo de
fé que seja nos outros ensinamentos, de Jesus.
Em sua obra Life of Jesus [Vida de Jesus] (1835), Strauss apresentou uma
abordagem nova e radical à questão da ressurreição de Cristo. O próprio
Strauss observa que a ressurreição de Cristo é de importância central pata a fé
cristã:
A raiz da fé em Jesus era a convicção da sua ressurreição. Acreditava-se
que aquele que havia sido morto, por maior que tivesse sido durante sua vida, não
podia ser o Messias: sua restauração nraculosa â vida provou
com muito mais veemência que ele era o Messias. Liberto do reino das sombras
por meio de sua ressurreição e, ao mesmo tempo, exaltado aci-
ma da esfera da humanidade terrena, ele foi transportado para as resides, celestiais
e assumiu seu lugar à destra de Deus.
Strauss observa que essa visão daquilo que ele chama de "cri qtologia do
sistema ortodoxo" foi alvo de uma série de ataques desde o lluminismo, o
que se deve, principalmente, à suposição flunímista de que milagres (como a
ressurreição) são impossíveis.
Com base nessa suposição a priori, que corresponde perfeitamente à
cosmovisão iluminista, Strauss declara sua intenção de explicar "a origem
da fé na ressurreição de Jesus sem nenhum fato miraculoso
correspondente". Em outras palavras, Strauss desejava explicar de que
maneira os cristãos vieram a crer na ressurreição quando não havia
nenhuma base histórica objetiva para essa crença. Depois de excluir a
ressurreição como uma "ocorrência objetiva miraculosa", Strauss situou a
origem da crença em um nível puramente subjetivo. A crença na ressurreição
não deve ser explicada como uma resposta a "uma vida restaurada
objetivamente", mas sim como "uma concepção subjetiva na mente". A fé na
ressurreição de Jesus é decorrente do exagero de "uma lembrança da
personalidade do próprio Jesus", pelo qual uma memória foi projetada na
idéia de uma presença viva. Um Jesus morto é, portanto, munsfiguiando numa
imageria de um Cristo ressurreto — usando o termo apropriado, um Cristo
ressurreto mítico.
A contribuição distintiva de Strauss para a discussão foi introduzira idéia de
"mito" — um reflexo do condicionamento social e do ponto de vista cultural dos
escritores do evangelho. Assim, vírgeair que seus escritos eram parcialmente
"míticos" representava mais um reconhecimento da visão moderna do
período em que esses textos foram redigidos do que um desafio à sua
integridade. Strauss se distancia da sugestão de Reimarus de que—quer
inconsciente ou deLberadamente — os evangelistas distorceram suas
descrições de Jesus de Nazaré.
Argumenta que a linguagem mítica é o modo natural de expressão de
uma cultura corporativa primitiva que ainda não havia alcançado o
nível da conceitualização abstrata.
Para beiramos, os escritores do evangelho eram indivíduos confusos ou
mentirosos - mais provavelmente estes últimos. Strauss removeu a
discussão desse âmbito introduzindo a idéia de "mito". A ressurreição
devia ser vista como um mito - não uma invenção deliberada, mas uma
interpretação dos acontecimentos (especialmente a memória e "visão
subjetiva" de Jesus) em termos daquilo que fazia sentido para a cultura
palestina do primeiro século, uma cultura dominada por uma cosmovisão
mítica. Deve-se considerar que a crença na ressurreição como um
acontecimento objetivo se tomou impossível com a extinção dessa
cosmovisão.
A Vido de Jesus de Strauss, juntamente com outras obras racionalizadoras do
mesmo período, como o livro homônimo de Emest Renan (1863) atraíram
grande atenção. A ressurreição, considerada tradicionalmente a base da fé
cristã, passou a ser vista como um produto dessa fé. O Cristianismo é tido
como uma fé relacionada à memória de um Jesus morto, e não à
celebração de um Cristo ressoarem. No entanto, a discussão não havia,
de maneira algum, se encerrado. A seguir, consideraremos as
desenvoluções posteriores desse capímio intrigante da teologia moderna.
Talvez o escritor a reinterpretar Strauss de maneira mais aguçada tenha
sido Rudolf Bultmann, cujas idéias distintivas sobre a ressurreição
constituem o tema de nossa próxima discussão.
Barth escreveu uma obra curta chamada The Resurrection of the Dead [A
ressurreição dos mortos] em 1924. No entanto, suas idéias maduras sobre a
relação da ressurreição com a História vieram bem depois e for= claramente
influenciadas por Bultmann. O ensaio de Barth 'Rudolf Bultmann –An Attempt
to Understand Hin' [Rudolf Bultituanti – uma tentativa de entendê-lo] (1952)
expressa suas apreensões em relação à abordagem de Bultmann. Esse texto
foi seguido de um estudo contínuo das questões em jogo articulado na obra
Church Dogmatics [Teologia dogmática eclesiástica] IV 11 (1953). A seguir
procuraremos apresentar a posição de Barth e compará-la com a de Bultmann.
Jesus – God and Man [Jesus – Deus e homem]. Seu argumento básico
contra essa posição pode ser apresentado da seguinte forma.
Para Pannenberg, Troeltsch tem uma visão restrita e pedante da
História que elimina certos acontecimentos de antemão com base em
um conjunto de avaliações provisórias que receberam indevidamente
o vieras de leis absolutas. A "constrição da investigação histórico-
crítica" injustificada de Troeltsch se mostrou "tendenciosa" e
""wopocêntrica". Supunha que o ponto de vista humano era o único
ponto de vista aceitável e normativo dentro da História.
Karl Barth
O próprio fato de a revelação ter ocorrido exige, portanto, uma explica ção.
Para Barth, isso indica que a humanidade é passiva no processo de recep-
ção; o processo de revelação é, do começo ao fim, sujeito à soberania de
Deus como Senhor. A fim de que a revelação seja revelação, Deus deve ser
capaz de se revelar (o que Barth entende claramente como "revelação
própria") à humanidade apesar dessa pecturutrosidade.
Uma vez que esse paradoxo foi considerado, é possível acompanhar a
estrutura geral da doutrina de Barth acerca da Trindade. Barth argumenta
que na revelação, Deus deve ser, em si mesmo, aquele que ele revela
ser. Deve haver uma correspondência direta entre o Revelador e a
Revelação. Se "Deus se revela como Senhor" (uma asserção típica de Barth),
então deve ser Senhor "antecedentemente em si mesmo —. A revelação é a
reiteração no tempo daquilo que Deus é em si mesmo na eternidade.
Existe, assim, ama correspondência direta entre:
1. O Deus revelador
2. A revelação própria de Deus.
Karl Rahner
Robert Jenson
Apesar de manter uma visão institucional da igreja, Lubac deu um novo senso
de identidade e propósito às concepções católicas da igreja: a igreja está
aqui para tomar Jesus Cristo presente para o mundo. O aforismo de
Inácio recebe, portanto, um novo significado através dessa visão
sacramental do papel da igreja.
Em 1953, Otto Sentrarelroth publicou um estudo bastante influente com o
título The Church as Primordial Sacrament [A igreja como sacramento
primordial], no qual ele argumenta que a igreja é o "sacramento primordial
((h,sakrawnt)" que demonstra a capacidade de Deus de usar a ordem
material para dar testemunho da ordem espiritual. O teólogo dominicano
Edward
O Vaticano 11 e a igreja
O Segundo Concílio do Vaticano revitalizou a discussão acerca da dou-
trina da igreja, em parte por sua reapropriação da imageria bíblica
relacionada à mesma. Antes do Concilio, a tendência dos escritores católicos
romanos era pensar na igreja em termos de uma "sociedade perfeita". Esse
estilo de imageria pode ser datado da segunda parte do século 16 e
enfatizava as credenciais institucionais eclesiásticas, especialmente à luz do
poder cada vez maior das nações-Estado européias. Parte da estratégia
da igreja para defendera independência do poder crescente do Estado
era afirmar sua própria identidade como sociedade. Assim Roberto
Belarmino, um dos escritores mais importantes da Reforma católica,
argumentou que a igreja era uma realidade social tão visível e tangível
quanto -o reira, da França e a república de Veneza". Assim, a edição-padrão
do livro-texto pré-conciliar de Adolphe Tanquerey (1854-1932) dedica coma
de 64 páginas à demonstração de que a igreja é (a) uma sociedade infalível,
(b) uma sociedade perfeita, (c) uma sociedade hierárquica e (d) uma
sociedade monárquica.
Dos vários modelos de igreja apresentados pelo Vaticano II, o mais im-
portante é o da igreja como "povo de Deus". Trata-se de uma idéia
intensamente bíblica, com raízes profundas tanto no Antigo quanto no
Novo Testamento. O Vaticano 11 toma o cuidado de evitar a identificação
direto do "povo de Deus" com a "igreja católica romana", ou a sugestão de
que a igreja substituiu Israel de algum modo como povo de Deus. Aliás, o
segando capítulo do texto do Concílio sobre a vida interior da igreja
descreve a igreja como o "novo povo de Deus", ligado a Israel. A eleição
da igreja como povo de Deus não implica na rejeição de Israel; antes, é
a ampliação do reino de Deus. Esse penas fica particularmente claro na
Declaração do Concilio acerca das Religiões Não-Cristãs, que reconhece um
lugar especial permanente para os judeus nos propósitos salvadores de
Deus.
A criação ocorre ev nihilo por um ato livre da volição. Nada tem um motivo rucessá-
do alem da existência de Deus. A criação depende da decisão divina de criar;
Deus poderia ter decidido não criar nada.
Deus existe num estado de perfeição absoluta e não o, pode concebera existência
de um estado de perfeição mais elevada.
Tanto Deus quanto a criação existem necessariamente. O mundo não depende de
nenhuma ação de Deus para sua existência, apesar dos detalhes, mais precisos da
natureza de sua existência serem uma questão de contingência.
Deus é um agente dentre muitos no mundo e tem tanto poder quanto qualquer
outro agente. Esse poder não é absoluto, mas sim, untado,
Em qualquer ponto no tempo, Deus e mais perfeito do que qualquer outro agente no
mundo. No cantam, Deus é capaz de alcançar níveis mais elevados de perfeição
num estágio posterior de deonvolvintica to tendo em vista o envolvimento de Deus
como mundo.
Falar de Deus como Pai é dizer que o papel de pai na Israel antiga nos
permite discernir melhor a natureza de Deus. Não corresponde a dizer que
Deus é um ser humano do sexo masculino. Não se deve atribuir a Deus nem
o
Hoje em dia cada vez mais feministas ensinam que Deusta combina características
masculinas e femininas. Como aqueles que supõem que Deus é exclusivamente
masculino, nos feministas devem se lembrar que qualquer atribuição de
sexualidade a Deus é uma volta ao paganismo.
Não é necessário voltara idéias pagãs de deuses e deusas para resgatar o conceito
de que Deus não é nem do sexo masculino nem do feminino; essas idéias já se
encontram potencialmente presentes, ainda que negligenciadas, na teologia cristã.
Wolfhart Pannenberg desenvolve esse assunto em mais detalhes em sua obra
Teologia Sistemática:
Vi que Deus se regozija em ser nosso Pai, e que também se regozija em ser nossa
mãe; e ainda, que se regozija em ser nosso verdadeiro Marido, tendo nossa alma
como sna noiva amada... Ele é a fundação, a substância e a coisa em si, aquilo
que ela é por numera. Ele é o Pai e a Mãe daquilo que as coisas são por
natureza.
A crítica feminista vai além da questão da "masculinidade" de Deus e se
estende a outras áreas da teologia. Podemos observar delas
A. discussões sobre a verdadeira c.,ênda da religião são imitei,,. A religião não existe.
Existem apenas tradições, movimentos, comunidades, pessoas, crenças e práticas que
apresentam cameierenicas associadas por muitos aquilo que chamam de religião.
Cobb enfatiza que a suposição de que a religião tem uma essência é responsável
por distorções e confusões sérias nas discussões recentes acerca da relação entre
as tradições religiosas do mundo. Ressalta, por exemplo, que tanto o budismo
quanto o confucionismo apresentam elementos "religiosos" —mas que isso não
significa necessariamente que podem ser categorizados como "religiões". Muitas
"religiões" são compreendidas mais adequadamente como movimentos culturais
com elementos religiosos.
A idéia de um conceito universal de religião, do qual religiões individuais são
subconjuntos, parece ter surgido no tempo do futurismo. Usando uma analogia
biológica, a suposição da existência de um gênero da religião, do qual as
religiões individuais são espécies, é uma idéia extremamente ocidental, sem
nenhum paralelo real fora de sua cultura — exceto da parte daqueles que foram
educados no Ocidente e assimilaram uraliscriminadamente, as suas
pressuposições.
A abordagem particulariçta
Barth declara que a salvação só é possível por meio de Cristo. Ainda assim, ele insiste
na vitória escatológica suprema da graça sobre a incredulidade —isto é, no fim da
história. A seu tempo, a graça de Deus triunfará completamente e todos crerão em
Cristo. Esse é o único caminho para a salvação — mas é um caminho que, pela
graça de Deus, é eficaz para todos. Na visão de Barth, a particularidade da
revelação de Deus por meio de Cristo não é negada pela universalidade da
salvação.
A abordagem inclusiva
Titularemos em mais detalhes das três primeiras teses. Fica claro que Rahner
afirma categoricamente o princípio de que a salvação só pode ser obtida por meio
de Cristo, conforme este é interpretado pela tradição cristã. "O Cristianismo se
considera a religião absoluta, intencionada para todas as pessoas e que não pode
reconhecer o direito igual de nenhuma outra religião." No entanto, Rahner
complementa isso com uma ênfase sobre a vontade salvadora universal de
Deus. Deus deseja que todos sejam salvos, mesmo que nem todos conheçam a
Cristo: "De algum modo, deve ser possível a todas as pessoas serem membros
da igreja".
Por esse motivo, Rahner argumenta que a graça salvadora deve se encontrar
disponível fora dos limites da igreja e, assim, em outras tradições religiosas.
Ele se opõe energicamente àqueles que adotam soluções extremamente
inflexíveis, insistindo que ou a tradição religiosa vem de Deus ou é
inautêntica e não passa de invenção humana. Enquanto ]soraerner
argumenta que as tradições religiosas não-cristãs não passavam de criações
humanas visando a justificação própria, Rahner argumenta que essas
tradições podem muito bem incluir elementos da verdade.
Rahner justifica essa sugestão considerando a relação entre o Antigo e o Novo
Testamento. Ainda que, estritamente falando, o Antigo Testamento represente a
perspectiva de uma religião não-cristã (o Judaísmo), os cristãos podem lê-lo e
discernir nele certos elementos que continuam sendo válidos. O Antigo
Testamento é avaliado à luz do novo e, em decorrência disso, certas práticas
(como as leis alimentares) são consideradas inaceitáveis e são descartadas,
enquanto outras (como a lei moral) são mantidas. Rahner argumenta que a mesma
abordagem pode e deve ser adotada no caso de outras religiões.
A graça salvadora de Deus se encontra, portanto, disponível por meio de tradições
religiosas não-cristãs, apesar das deficiências destas. De acordo com Rahner,
muitos dos seguidores dessas tradições aceitaram a graça sem estar inteiramente
cientes disso. É por esse motivo que Rahner introduz a designação "crismes
anônimos" para se referir àqueles que experimentaram a graça divina sem
necessariamente saber disso.
Essa designação foi intensamente criticada. John Hick, por exemplo, sugeriu
que ela é paternalista e oferece "uma posição honorária concedida
unilateralmente a pessoas que não expressaram nenhum desejo de recebê-la".
Ainda assim, a intenção de Rahner é dar espaço para os efeitos reais da graça
divina na vida daqueles que pertencem a tradições não-cristas. O acesso pleno à
verdade acerca de Deus (conforme esta é entendida dentro da tradição cristã)
não é, necessariamente, uma precondição para o acesso à graça salvadora de
Deus.
Rahner não permite que o Cristianismo e outras tradições religiosas sejam
tratados com igualdade nem como casos particulares de um mesmo encontro com
Deus. Para Rahner, o Cristianismo e Cristo têm um stanto, exclusivo, negado a
outras tradições religiosas. Fica a questão: essas outras tradições religiosas podem
dar acesso à mesma graça salvadora que é oferecida pelo Cristianismog A
abordagem de Rahner lhe permite sugerir que as crenças de tradições religiosas
não-cristãs não são necessariamente verdadeiras e, ao mesmo tempo, reconhecer que
podem, não obstante, mediara graça de Deus pelo estilo de vida que produzem —
como o amor abnegado ao próximo.
A abordagem pluralista
O expoente mais expressivo da abordagem pluralista às tradições religiosas é John
Hick (nascido em 1922). Em sua obra God and the Univerye offailhs [Deus e o
universo das fés] (1973), Hick argumenta em favor da necessidade do deslocamento
de um abordagem centrada em Cristo para uma abordagem centrada em Deus.
Descrevendo essa mudança como uma "revolução copemicana", Hick declarou
que era necessário passar "do dogma de que o Cristianismo se
Esse apelo à experiência foi desenvolvido no século 20 por Paul Tillich, cujo
"princípio de correlação" pode ser considerado uma extensão da abordagem de
Schleiermacher. O objetivo de Tillich era tomar o Cristianismo relevante num
período da cultura ocidental em que ele parecia estar perdendo sua
Pela análise sucinta apresentada neste estudo de caso. fica claro que várias ou
diferentes abordagens ao método teológico podem ser encontradas no
pensamento cristão moderno. Algumas enfatizam a experiência individual,
enquanto outras ressaltam a importância das idéias e valores mediados pela
tradição. Trata-se de uma diversidade frustrante, especialmente para alguém
que esteja tentando lecionar teologia: é extremamente difícil conseguir descre-
ver e explicaras diferenças dentro da teologia moderna neste ponto da História. No
entanto, esperamos que este levantamento sucinto de algumas das abordagens
tenha dado ao leitor pelo menos uma idéia das questões envolvidas.