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No livro “Após o Fim da Arte” Arthur Danto i levanta a discussão sobre a ideia de fim
da arte. Não que a arte não exista mais, o que deixa de existir é uma narrativa estética sobre
ela, ou seja, uma fôrma de regras, um esquema rígido no qual uma obra deve se enquadrar
para ser considerada arte. Não era o ponto de vista de Danto:
"que não haveria mais arte, o que certamente significa "morte”, mas o de que, qualquer
que fosse a arte que se seguisse, ela seria feita sem o benefício da narrativa legitimadora, na
qual fosse vista como a próxima etapa apropriada da história. O que havia chegado a um fim
era a narrativa, e não o tema da narrativa. (DANTO,2006,pag. 5).
Com isso, Danto quer dizer que durante séculos a arte passou por uma série de
mudanças em sua estrutura representacional, mas não em sua função ou em sua forma de
entendimento no qual ela deveria ser a representação do que há de belo no mundo. A cada
nova mudança a arte passava por uma espécie de "evolução", onde cada nova fase seria um
aperfeiçoamento técnico da anterior, mas que com a contemporaneidade a arte passa por um
rompimento dessa evolução não sendo a continuidade da arte antecedente. Se antes a arte
estava preocupada em buscar a beleza no mundo e existia independe do público, agora a arte
se volta para dentro do artista e do público, como se a arte só existisse à partir do sentido que
cada um dê à obra. Como um trabalho mental. É como se a arte tomasse consciência de si
onde não mais importa a simples aparência, mas o que está por trás dela, assim, não existiria
mais a antiga fôrma na qual a arte deveria se encaixar para ser legitimada.
A fim de localizar o que seria o "fim da arte", Danto delimita que antes de 1400,
período em que inicia a Renascença, não existia arte como a conhecemos atualmente, através
de um artista criador de obras. Os artistas anteriores à Renascença eram artesãos que não
tinham como principal objetivo focar suas obras em correntes estéticas e perfeições técnicas
tanto que muitos permaneceram anônimos, o que revela o modo como a sociedade atribuía
valor à arte neste período. Geralmente a criação artística estava vinculada à Igreja, onde o
propósito maior era a mensagem de Deus. Por meio do canto gregoriano, esculturas e pinturas
de santos, encenações bíblicas, a arte tinha um papel de ilustrar, exemplificar a mensagem
divina, o que a colocava num papel de simbolismo cristão. Era uma via de mão única e não
permitia interpretações distintas. De certa forma, a arte era usada como uma ferramenta para
outros ideais, e não era autossuficiente, no sentido de ser contemplada por si só.
O entendimento mais aceito sobre a arte, ou a própria arte, surge por volta desta época,
não repentinamente, mas sim como um processo necessário às transformações renascentistas,
onde o ser humano se tornou o centro das atenções, segundo a filosofia humanista. O
Humanismo coloca o homem no centro do que é importante no mundo, valorizando as ações e
desejos dos homens, dando autonomia para que os artistas pudessem ampliar sua estética.
Outra vertente filosófica que impulsionou o surgimento da arte foi o Naturalismo, que em
parte é a admiração pela natureza, pelas formas, pelo movimento, e foi responsável por
grandes mudanças na pintura, como a perspectiva, que é a capacidade técnica de representar
profundidade, iluminação, gestos, a realidade tridimensional. Logo, o cenário era oportuno
para o surgimento da arte, já que as ações humanas e a natureza ganharam privilégio, podendo
existir o que chamamos de artista, o criador que domina a técnica de representar belas formas.
Com este pensamento sobre o surgimento da arte, Danto então sugere que possa
também existir um período de fim da arte. Semelhante ao início, o fim também ocorre sem
aviso prévio, como consequência de uma fase de grandes mudanças na humanidade, como é o
caso do século XX, marcado por duas grandes guerras mundiais, uma relação global
econômica e cultural e principalmente o avanço tecnológico constante que mudou
completamente a forma de se relacionar com a arte.
Ao ver uma exposição de Andy Warhol, grande nome da chamada pop-art, em que ele
exibia uma caixa de sabão “brillo box” foi que Danto percebeu que algo profundo havia
mudado na arte. Ao analisar as vanguardas históricas da arte que surgiram no início do século
XX, percebeu cada vez mais desdobramentos em rumos e perspectivas artísticas distintas,
como o Dadaísmo, Expressionismo Abstrato, Cubismo, entre outras, cada uma com sua
particularidade. Era possível ainda dizer que uma obra fazia parte de certa corrente apenas
comparando sua aparência, como é o exemplo da definição de Expressionismo Abstrato por
Greenberg.
Ainda assim continuavam a surgir novos estilos que não se enquadravam mais ao
contexto modernista, ou de certa forma eram descartados e não tinham papel fundamental no
desenvolvimento histórico da arte, como é o caso do Surrealismo:
Com isso o termo contemporâneo era utilizado para designar a arte moderna que está
sendo feito hoje, porém não tinha ainda uma força para designar um estilo e devido a não ter
um modo satisfatório de se pensar, surgiu a classificação pós-moderna.
Danto cita uma fórmula possível para classificar as obras pós-modernistas. No livro de
Robert Venturi, de 1966, Complexidade e contradição em arquitetura, Venturi fala de
“elementos que são mais híbridos do que puros, contaminados em vez de limpos, ambíguos
em vez de articulados, perversos, bem como interessantes.” Com isso, seria possível
classificar a maior parte das obras pós-modernas de maneira bem homogênea, mas ainda
assim, muito da arte contemporânea seria deixada de lado. Foi sugerido então que usassem o
termo pós-modernismos, devido as grandes diferenças entre uma obra e outra, mas isso não
seria suficiente para classificar e reconhecer um estilo.
Assim Danto concebe o fim da arte, partindo desde sua origem na Renascença e sua
trajetória evolutiva que durou séculos, até chegar a um nível de produção que foge
completamente dos padrões anteriores, sendo um tipo de arte jamais visto em toda história.
Passando por uma série de rupturas, a arte chega a uma crise existencial onde era quase
impossível prever qual rumo ela tomaria. Portanto cada novo estilo era denominado
simplesmente como contemporâneo, como se fosse a sobra do que não servia, o que na
verdade era o avanço para além dos limites estilísticos, convenções ou técnicas.
A arte contemporânea é uma fase em que o artista está livre para fazer simplesmente o
que quiser com tudo o que foi feito e desenvolvido durante séculos, juntando, recortando,
destruindo ou apenas imitando.
Desta forma, não se poderia explicar o que é arte com exemplos, no sentido de
aparências, tudo pode ser arte. Era então preciso sair do sentido e voltar para o pensamento.
A arte contemporânea é então um estilo onde não há estilo, onde todos os limites
históricos foram rompidos, deixando-a livre para ser ela mesma em sua pura forma e cabendo
ao artista desenvolver suas próprias concepções.
Assim como as artes visuais, apresentadas por Danto para descrever o conceito de fim
da arte, a música também passa pelo mesmo processo de evoluções e rupturas, até atingir seu
próprio nível de abstração. Podemos entender que o séc XX trouxe consigo mudanças
profundas em vários campos da arte.
De acordo com Flo Menezes [??], a história da música pode ser entendida como um
afastamento físico do som. A música como expressão sonora, teve seu princípio com os
rituais tribais e por muitos anos se dava apenas em seu tempo real, o que significa que a
música não poderia ser analisada fora de seu fluxo temporal de escuta. Neste ponto o contato
com música é tão presente quanto a respiração. Segundo Schafer [??], os aborígenes não
tinham conhecimento sobre a diferença entre fala e canto, significado e sonoridade, o que
sugere que a comunicação entre eles era mais rica em questão de variedades sonoras, visto
que não se tinha uma escolha, um recorte sonoro com significados específicos. Ao definir um
sentido a um som, todas as outras possibilidades são excluídas, o que acaba por limitar as
expressões.
Porém, foi preciso firmar estes sons no tempo para poderem ser analisados e
articulados em maior escala. Utilizar somente do trabalho mental para construir sentidos aos
sons tem sua capacidade limitada, visto que a memória também é limitada. Por isto ao ser
preciso transmitir uma quantidade maior de informação, foi necessário a invenção da escrita.
Assim a escrita musical surge para representar o som a partir de símbolos, como uma irmã do
verbo. O verbo representando a fala e seus significados e a música representando o canto e a
sonoridade. No entanto, a escrita musical surge após à escrita verbal pelo fato de o verbo ser
insuficientemente capaz de expressar os parâmetros sonoros com precisão. A linguagem
verbal trabalha basicamente com oposição binária, tônico (vogal) e ruído (consoante), sendo
insuficiente para representações mais íntimas do som, como alturas definidas, modos de
ataque, duração, volume, etc. Assim, falar da história da música enquanto composição é
também, sobre um aspecto, falar sobre sua escrita, pois é uma das formas de se ter acesso à
músicas de tempos antigos.
Com a discriminação das qualidades prosódicas do som, e sua representação pela
escrita, o músico agora pode pensar e desenvolver a música fora do acontecimento físico do
som, construindo estruturas com sentido musical "responsável pela emergência de uma
sintaxe e de uma gramática da composição" (Menezes, 2014, pág.63). A essa gramática Flo
Menezes dá o nome de escritura, onde o compositor reorganiza os parâmetros musicais, o que
vai resultar na busca por recompor o próprio som.
Neste cenário da música eletrônica, a manipulação dos sons pode gerar algumas
consequências. Flo Menezes diz de forma metafórica que ao compor, o compositor escolhe
qual dos polos opostos do corpo quer atingir, a cabeça ou o pé. Se for para a cabeça, privilegia
a aperiodicidade, músicas com poucas sequências óbvias, o que resulta em meditação,
abstração. O ouvinte procura criar uma imagem convincente para si próprio para conseguir
visualizar e compreender a música, o que necessita um certo esforço mental. Por outro lado,
se for para o pé, tende à periodicidade que por proximidade dos ritmos corpóreos como
respiração, batimento cardíaco, tende a romper o estado de meditação e trazer para perto do
corpo, como os ritmos dançantes. No entanto o compositor pode utilizar tanto periodicidade
quanto aperiodicidade na mesma obra, o que tende a um grau maior de abstração pelo fato de
as duas formas, que são opostas e se complementam, coexistirem em um mesmo plano.
Este afastamento físico do compositor em relação ao som, que vai levar a música a
conceber um trabalho mais mental do que corpóreo, o acaba levando também a se afastar do
tempo, no sentido de conseguir visualizá-lo, ao menos mentalmente, como algo completo e
não fragmentado. Sendo conduzido a criar imagens e significados para os sons, o compositor
passa a se questionar sobre pontos fundamentais da música, como o tempo. Pensando
fisicamente, tempo e espaço são uma só coisa, o espaço-tempo. Quando assistimos uma
apresentação de rock, por exemplo, podemos presenciar os músicos e seus gestos no espaço
juntamente com a música no tempo. Sem a presença física de uma fonte de vibração e
emissão do som acústico, a mente por si só cria imagens e gestos para a movimentação
sonora, buscando recompor o espaço-tempo. Utilizando a concepção dos gregos antigos sobre
o tempo, em que este existia de três formas, pode-se elucidar esta questão.
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Arthur Coleman Danto (1924-2013) foi um filósofo e crítico de arte estadunidense. Professor emérito de
filosofia da Universidade de Columbia (Nova York) desde 1951 e também crítico de arte da revista The Nation.
Por seus trabalhos acadêmicos como crítico de arte recebeu diversos prêmios e bolsas, e sua teoria estética é
referência na discussão sobre a arte e seus rumos na atualidade.