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0 Fstado ndo uma ampliagdo do eirculo Familiar e, ainda m nos, uma intepragao de certos agrupamentos, de certas vontades par ticularistas, de que a familia ¢ 0 melhor exemplo. Nao existe, entre © cireulo familiar e 0 Estado, uma gradagao, mas antes uma des continuidade e até uma oposi¢do. A indistingdo fundamental entre as duas formas € prejuizo romimtico que teve os seus adepioy mais centusiaslas durante 0 séeulo XIX, De aeordo com esses doutrinado: res, 0 Estado ¢ a sits instituigdes descenderiam em linha rela, e por simples evolucio, da familia, A verdade, bem outra, & que perten cmt a orden diferentes em esséncia. $6 pela transeressao da ordem doméstica e familiar & que nasee 0 Estado ¢ que o simples individuo se faz cidadao, contribu recrutavel e respons vel, ante as leis da Cidade. Ha nesse fato um triunfo do 6 particutar, do intelectual sobre o material, do abstraca sobre 8 eae itor, clegive eral sobre Oreo € naw uma depuragdo sucessivt, unta espiritualizagao de For ‘mas mais naturais e rudimentares, uma procissao das hipostases, para falar como na filosofia alexandrina, A ordem familiar, em sua for- ma pura, & abolida por uma transcendéncia, Ninguém exprimiu com mais invensidade a oposigao ¢ mesino a incompatibilidade fundamental entre os dois prineipios do que Sd focles, Creonte encarna a nogio absirata, impessoul da Cidade em luca contra essa realidade eonereta e tangivel que &a familia. Anti gona, sepultando Polinive contra as ordenagdes do Estado, atra so bre si a edlera do irmao, que nio age em nome de sua vontade pes soal, mas da suposta voutade geral dos cidadaos, da patria: E todo aquele que acima da Pasa Colac seu amigo, eu 0 tere por nul 0 conttito entre Amtigona e Creoute & de todas as épocas e pre serva-se sua veeméncia ainda em nossos dias, Em todas as cultura, at © processo pelo qual a lei geval suplanta a lei particular faz-se aeom. panhar deerises maisou menos gravese prolongadas, que podem ate ar profundamente a esiratars da soviedade. O estas dessas erives ‘onstitui umt das temas Fundamentais da historia social. Quem eom pave, por exemplo, o regime do trabalho das vel rmios de artesdos com a “eseravidao dos sakiios™ nas usinas moder- nas fem um elemento presiose para o julgamento da inquietagao social Ue noxsos dias. Nats velhas corporagies 0 mesite e seus aprendizes & jormaleiros formavaany cone ania so Familia eujos membros se sujei ‘am a uma hierarquia natural, as que partithaa das mesinas privat gbes eeonfortos. Foie modesno sistema industrial que, separande os empre adores ¢ empreyados ios processos de manutatura e diferen: ciando eada vee mais sta Fungi, supeinin admosferade imimidade {que reinava entre unis e outros ¢ estimulou os angonismos de classe Onovoregime tomar mais fil, ake disso, a0 capitalista, explora fo trabalho de seus emprerados, a 1roc0 de salitios infimes. Para o cmpresador moderne — assinala um socidloge norte american — 0 empress Jo transforma-se ein um simples nines arelagao humana desaparecey., A produit kegs esa, a oF para colossais rendimentos, acento, aparentemente, ¢ exacerbout aa separayio das classes produtoras, tornanda inevitaivel um sentinien to de irreyponsabilidade, da parte dos que dirigent, pokts vidas dos trabalhaclores manuais. Compare se 0 sistema de proxlugito, tal eo tele de pritalos masse de trabilhe e complies resceisanos mo evista quando o mestre e seu aprendi2 ow empregado trabaha vam a mesma sala © ullizavant os mesmos instrumentos, vom o due corre na organizagaio habitual da corporagae moderna, No prinici= Fo, 8 rekagdes de empregador ¢ emprepado eram pressontis ¢diteta, indo havia autoridades intermediarias. Na dltima, entre o trabalha dor manual e 0 derradeira proprietario — 0 acionista — existe toda ania hierarquia de funcionarios © autoridacles representados pelo sr perintendente da wsina, 0 diretor-geral, 6 presidente da corporacao, 4 junta executiva do conselho de diretoria e o proprio conselho de diretoria. Como ¢ fail que a responsabilidad por acidentes do tra blo, salirios inadequados ou condigdes anti-hig tum extremo a0 outro dessa série A crise que acompanhow a transigio do trabalho industrial aqui assinalada pode dar uma idéia pallida das dificuldades que se opdem 182 4 abolico da velha ordem familiar por outra, em que as instituicoes eas relacdes soviais, fundadas em prineipios abstratos, tendem a e aos Ingos de afeto ¢ de sangue, Ainda hoje persistent dessas Familias “re- aqui eali, mesmo nas grandes cidades, algun lardatarias”, concentradas em si mesmas e obedientes ao vetho ideal que mandava educarem-se os illios apenas para 0 cireulo domésti co. Mas essas mesmas tendem a desaparecer ante as exigancis im petativay das noway eondigdes de vida, Segundo alguns pedazozos te psicolozos de nossos dias, a educagiio Familiar deve ser apents uni especie de propedsutiea da vida na sociedade, Fora da familia, E se beat considerarnos as teorias modernas, veremos que las sendem, cada ver mais, @ separa o individuo da conuunidade doméstica, & Tibertito, por assim dizer, das “virtudes" familiares. Dit-se-d que cosa separa e essa liberlasao representam as condigdes primarias © obrigatiias de qualguer a Nisso, a pedagori imente opostos aos que preconizavant os antigos métodos de edt= plagdo a “viet praia” ciemtisiea da atnalidade sceue ramos preci cago. Um dos seus adepios eligga i observatr, por exemple, que a pobedieneia, 1m dos prineipios basiens ua vel edneayan, 98 deve sor estimutada na medida em que poss permitir uma adagtio F208 vel de opinides ¢ regras que smuladas por adultos que tenhiam experigneia nos terrenos sociais em propria erianga reeanbega como For aque ela i “Ein particular”, aeresgemta, a erianga deve ser preparada para desobedecer nos pontos em qure Sela Falivcis as pr visdes dos pais.”” Deve adquitir progressivamente st individwalida de, “inien fndamiento justo das relagies Familiages". “Os casos Freqtientes em que os jovens sie dominads pelas mes e pais na es collia das roupas, dos brinquedos, dos intgresses ¢ atividaades gers, ‘a ponto dese lornarem incompetentes, ‘auto social, como individ riente, quando ndo psicopatas, so demasiado freqiientes para se fem ignorados."” E-aconselha: "Nao s6 os pais de idéias estreitas, mas especialmente os que sio extremamente atilados e inteligentes, lever precaver-se vontra essa atitude Fas, pois esses pais realment te inteligentes sio, de ordinatio, os que mais se inclinam a exereer dominio sobre a crianga. As boas maes causam, provavelmente, maio- res estrapos do que as mds, a acenedo mais peneratizada e popular estes voeibulos”. assente em bases muito solidas a idéia de familia —e prineipalmente onde predomina a Fa Com efeito, onde quer que prosp 3 ‘ola de tipo patriarcal — tende a ser precaria ea lutar contra fortes. restrigdes formagao ¢ evolugto da sociedade segundo conceives aluais, A crise de adaptagio dos individuos ao mecanismo social é assim, especialmente sensivet no nosso tempo devido ao decisive ‘usaf de certas virrudes anifamiliares por exceléncia, como 0 so, sem diivida, aquelas que repousam no espirito de iniciativa pessoal € na eoncorrGneia entre os vidadkos Enire nds, mesmo durante © Império, ja se tinham tornado ma: ssifeeas as limitagdes que 0s vinetlos familiares demasiado estreitos, eno raro opressivos, podem impor & vida wterior dos individos, Nao fallavam, sem divida, mios de se corrigirem os inconvenien: tes que miuitas vezes aearretam eertos padrées de conduit impostos dese eco pelo cireulo doméstico. E-ndo haverta grande exagero cm izer-se que, se os estabelecimentos de ensino superior, SOBEL (9 cursos jurdicos, funidados desde 1827 em Siw Paulo e Olinda, contribuiram argamente part a Formagio de homens piiblieos ca ‘paves, devemto-lo is possibilidades que, corn isso, aadquitiam nume rosos adolescentes rrancados 0s seus mieias provincia ¢ H¥sAis abe Vviver por si”, fibertando-se progressivamete dos velhos laos ea sciros, quiise tanto camo aos conhecimentos que ministravant as fa cus. ‘A porsonatfidade social do estudante, noha em readies aces tuidamente particularistas, radigdes que, eomo se sabe, costrntaint sor decisis inaperativas durante os primeiras quatro ou kinco anos: Ade vida da erianga,* era Forgada a ajusarse, nesses esos, a movits| simaydes ea novas relagdes socias que importavam ma necessidade 10, POF vezes raulieal, dos interesses, atividades, valo- rey, setimentos aides ¢ creneas adquitidos no eonvivio da familia Teanplantados para longe dos pais, muito jovens, os “flhos aerrados” de que Falava Capistrano de Abreu, so por essa For cconseguiiam aleangar um senso de eesponsabilidade que Ihes fora ate cemigo vedado, Nem sempre, € certo, as novas experigneias bastavam ‘part apagar neles © vinco domestico, a menlalidade eriada a0 con- tato de um meio patriareal, io oposto as exigencias de uma secie dade de homens livres e de inclinagao cada vez mais iguaitaria, Por isso mesmo Joaquim Nabuco pade dizer que, “em nossa politica e ‘em nossa sociedade [...], lo 0s dries, 08 abandanados, que ven cem a luta, sobem e governam".! ie Tem-se visto como a critica dirigida vontra a tendéncia recente de alguns Estados para a criagio de vastos aparelhamentos de seguro previdneia Social funda-se unicamente no Fato de deixarem mmarzem extremamente diminuta 3 agdo individual e também no definhamento 4 que tais instituros condenam toda sorte de competigdes, Essa ar ‘gumentacio é propria de uma época em que, pela primeira vez nt historia, se crisis a eoncarréncia entre os cidadaos, com todas as sts conseqiiéncias, em valor social positivo. ‘Aos que, com raziio de seu ponto de vista, condenam por moti vos pareciios 0s Ambitos familiares exeessivamente estecitos € exi gemes, isto, 40s que 98 condenaam por eircunscreverem demasiado 6s horiontes da erianea dentro da paisagem domestica, pode se res pondido que, cm rigor. s6 hoje tais ambientes ehevam a vonstituir, muitas vezes, verdadeiras esvolas de inadaptados w até de psicopa- tas. Hin cuttas époeas, tudo eontribuia pa nator coincidéncia entre as virundes que se formant ¢ se exiaers no a maior hatmontia ¢ reeesso do Tar e ay que’ assegurant a prosperidaide social © @ ordem entre as eidaddos, Nao esti muito distante @ tempo em awe o de Lobasou Favia ante 0 Seu bidgrafo a apologia crus dos eastigos vor- porais para os edueandos ¢ recontendavai a vara para "9 yeeror geral Parecia-the preferivel ese recurso a que se dissese, por exemplo, ao aluno “*Se Fizeres isto ow aquilo, serdis mais estimade do que 1eu irmao ou tua inna". Porque, seeundo dizi 4 vara fen1 im efeito que termina em si, ao pass gus se Forem in ‘cemtivalas as emulagdes ¢ as eo se-o, cont isso, as bases de um mal permanente, Fazendo com que @ Boswell, arayius de superiovidade, langar irmaos e irmay se detesiem uns aos outros. No Brasil, onde imperou, desde sempos comatas, 0 tipo primi tivo da fanilia patriarcal, o desenvolvimento da urbanizagdo — que no resulta unicamente do erescimento das cidades, mas também do crescimento das meios de comunicagsio, atraindo vastas areas rurais| para a esfera de influéncia day cidades ia avarretar um desequili brio social, cujos efeitos permanecem vives ainda hoje Nao era ficil aos dereniores das pasigdes publicas de responsa- bilidade, formados por tal ambiente, compreenderem a distingdo fun damental entre os dominios do privado e do publica, Assim, eles se caracterizam justamente pelo que separa 0 funcionatio “patrimo: 145 nial” do puro buroerata conforme a definigio de May Weber. Para oncrio “patrimonial”", a propria gesto politica apresenta-se como assunto de seu interesse particular; as Funedes, as empregos © 0s beneficios que deles aufere relacionam-se a direitos pessoais do Funcionirio ¢ nao a interesses objetives, como sucede no verdadeiro Estado burocritico, em que prevalecem a especializagio dis fungdes 0 esforeo para se assezurarem garantiay juridieas as cidadion. A excolha dos homens que irdo exercer Fungdes publicas fae-ve de ‘acordo com a eonfianga pessoal que meregam os vandidatos, e mi }0 menos de acordo com as suas capacidades proprias. Falla a tudo 4 ordenagao impessoal que caracteriza a vida no Estilo bucosti £0. O funcionalisme patrimonial pode, com at progressiva divisio tas Fomgdes¢ com a racionalizagdo, auquirt trays buroetiticos. Mas mt sect essEneia efe € tanto mais diferente do burocriticn, quanto, mais caracterizados estejam es dois tips No Brasil, pode dizer se que s6 exeepeions iuhninistrativo e um corpo de fonclonsivios puramente dedi dos a imeresses objetivose fuuctlos messes interesses. Ao contiaitio, © possivel acompanhatr, ao longo de nossit historia, 0 predomi constante das vontades partieulares que encontrant set ambiente pet prio em cireulos Fechados © ponco acessivels a uina ordenaeao. i Pessoal. Dentre esses cinenlos, foi sein divida 0 da familia aquiete dgue se exprimin com mais Forga € desenvolturs emt most soeiedide E uum dos efeitos devisivos da supremacia incontestivel, absorvente, do inicleo familiar — a esfora, por exeeténeia dos ehamados “com latos primitios”, ds lagos de sangue e de coragtio — est em que as relagdes que se etiam na vida doméstiea sempre Fornecerant 0 m1 Alo obr mesmo onde ay instituigdes democitcas, fundaclas emt prineipios satorio de qualuer composigaw social entre nds, 190 Ovorte nneutroy e abstratos, preteniden assentar a sosiedade em norma a Lipartieutaristas Li se disse, svima espsessao feliz, ane a contribuicie brasileira para a civilizagdo sera de cordiatidade — daremos ao mundo 0 “ho mem cordial”. A thaneza no (rato, a hospitalidade, a generosidade, Virludes td0 gabadas por estrangeiros que nos visitam, representa, com cfeito, um tayo detinide do cariter brasileiro, na medida, 40 menos, em que permanece ativa ¢ fecunda a influgncia ancestral 146 dos padrdes de convivio humano, informados no meio rural © pa- triareal. Seria engano supor que essas virludes possam significar boas maneiras”,civilidade, Siio antes de (udo expressdes exitimas de um undo emotivo extremamente rico ¢ transbordante, Na civil: dade hi qualquer coisa de eoercitivo — ela pode exprimie-se em man lamtentos & a polidez envolve os aspectos 4 4 ponte de vontundirse, por vezes, com a reverdneia religiosa J houve quem notayse este Fato signifieativo, de que as formas ex teriores de veneragao a divindade, no & sm sentengas. Entre 0s japoneses, onde, como se sabe, tis ordinarios do convivio social, che imonial xintofsia, mio dle rem essencialmente day maneitas sociais de demonstrar respeito, Nowhum povo est mais distante dessa nogao ritualista da vida do que o brasileiro. Nossa Forma ordiniria de convivio social &, no tat, jastanerte 4 conirérir da astider. Els guste itadir ca ap réncia— ¢ isso se explica pelo fato de a atitude polida consistir pre- cisamente em uma espévie de miniiea deliberad de mianifestagives {que so espontineas no “homem cordial”; €a forma natural e viva ‘que se eonverteu em formu, Akg disso a polider & dorganizagao de defesa ame a sociedade. Detém-se na parte exterior, epiddérmica do individao, podenda mesmo servir, quando necessi rio, de pega de resisténeia. Equivale a um disfarce que permitira ceada qual preservar intatas sua sensibilidade ¢ stsas emogoes, Je algum moxto, Por meio de semethante padronizagao das Formas exteriores da ccordialidade, que nd pr reveli-se um decisive triunfo do espirito sobre a vida, Armacdo dest imscara, 0 individluo consegue manter Sua supremacia ante 0 social £, efetivamente, a polides implica uma presenga continua ¢ sober tna do individuo, No “homen cordial”, a vida em sociedade & de certo modo, uma verdadeira libertagio do pavor que ele sente em viver consigo mesmo, em apoiar-se sobre si proprio em todas as circunstaneias da cexisizncia. Shia maneira de expansio para com 0s outros reduz 0 in- dividuo, cada vez mais, a parcela social, periériea, que no brasilei- a ser a gue mais importa, Ela G antes um viver nos oulros. Foi a esse tipo humano que se digi Nietzsche, quando disse: “Voss mau amor de vos mesmos vos do isolamento um eativeiro"” ‘Nad mais significativo dessa aversto ao ritualismo social, que por vezes, uma personalidade foriemente homogenea v equi ro — como bom american — tend 147 em todas as suas paztes, do que a dificuldade em que se sen almente, os brasileiros, de uma reveréncia peolongada ante superior. Nosso temperamentto admite férmulas de reverenci, «.€de bom grado, mas quase somente enquante no suprimam de todo a possibilidade de convivio mais familiar. A manifestagao nor- 'mal do respeito em outros povos tem aqui sua réplica, em reera geval, rng desejo de estabelecer intimidade. E isso é tanio mais especitico, quanto se sabe do apego freqiiente dos portugueses, 120 prdximos ‘le 0s em Lantos aspectos, aos titulos e sinais de revergncia No doininio da Ying, para vitar um © de ser parece refletir se em nosso pendor acentuade pi 0 emprego emplo, esse modo dos diminutivos. terminagdo “inho™, aposta as patavras, serve para nos familiarizar mais con as pessoas ou os objetos e, wo mesmo tem 1p, para thes dar relevo. F- maneira de fazé-tos mais avessiveis aos sentidos ¢ também de aproxind-los do eoracdo. Sabemos com ¢ Ire guente, entre portuzueses, © zombarem de cettos abusos desse tis 0 apezo aos diminutives, abusos to ridieulos para eles quanto o & para néy, muitas veces, & pieguice lusitana, lacrimosa ¢ amarga.” Um estudo atento das wassts Formas sintasieas traci, sem dvida revelagdes provioss a esse respeito. ‘A mesma orem de manifestayies perience certamentea tendéncia 1 omissio do nome de Familia no tratamiento sockal, Env repra 0 nome individual, de batismo, que prevalece, Essa tendéncia, que contre portugueses resulta de urna tradigao com velhas raizes — como, sesabe, os nomes de familia s6 entrama predomina na Europa cristal emedieval a partir do século Ni —, acentuou-seestranhamente entre ‘tos. Seria talvez plausivel relaciona® tal fatora sugestao de que o uso do simples presiome imprstaem abolir psicologivamente as barteiras determinadas pelo fato de exisirem familias aiterenteseindependen tesumas das outras, Corresponded atitude natural aos grupos huma hos que, aevitanddo de bom grado uma diseiplina da simpatia, da ‘con ordi -fepelem as do raciocinio absteato ou que 20 tenham como Fundamento, para empregar a terminologia de Tonnies, as comuni dades de sangue, de l 1 ou de espirito.” desconhecimento de qualquer forma de convivio que nao se- Ja ditada por uma ética de funco emotive representa um aspecto da Vida brasileira que ravosesteangeiros chegam a penetrar eom facil dade. E & Wo caracteristica, entre nés, essa mama de ser, que nao desaparece sequer n0s tipos de atividade que devernalimentar-se nor- 148 :malmente da concorséncia. Um negociante de Filadélfia manifestou certa vez a André Siegfried seu espanto ao vetificar que, no Brasil como na Argentina, para conquistar um fregués tinha necessidade de fares dele um amigo." Nosso velho gatolicismo, 130 caracteristico, que permite tratar 6s santos com una intimidade quase desrespeitosa e que deve pare cer estranho ds almas verdadeiramente religiosas, provém ainda dos mesmos motivos. A popularidade, entre nés, de uma santa Teresa de Lisieux — santa Teresinha — resulta muito do eardter intimista que pode adquisir seu culto, culto amavel e quase fraterno, que se acomoda mal a veriménias e suprime as distancias, E 0 que tam= bém ocorreu com o nosso Menino Jesus, companheiro de bringue do das eriangas.¢ que Faz pensar menos no Jess dos evangelhos cat ndnigos do que no de vertos apdecitos, principalmente as diversas ddagdes do Evangelho da Iulia, Os que assistiram as festas Jo Senhior Bom Jesus de Pirapora, em So Paulo, coniecem a histéria do Cristo que desce do altar para samnbar com o pove. Essa forma de culto, que tem antecedentes na peninsula Ibstiea, mnbém aparece na Europa medieval ¢ justamente com a decadén: cia da celigido palaciana, superindividual, em que a vontade comiunt Se manifesta na edifieagao dos grandiosoy’ monumentos g6ticos, Transposto esse periad — atirma um historiador — surge unt sen- Limento Feigioso mais humano ¢ singelo. Cada casa quer ter suit c& pola propria, onde os moradotes se ajoelham ante o padrociro € pro- tetor, Cristo, Nossa Senhora ¢ os santos J n2o aparevem como ents privilegiados ¢ eximidos de qualquer sentimento humano. Teds, fi Ualgos e plebeus, querem estar em intimidade com as sagradas eri turas ¢ 0 préprio Deus é um amigo familiar, doméstico e préximo — 0 oposto do Deus “palaciano™, a quem 0 cavaleiro, de joelhios, ‘ai prestar sua homenagem, como a um senbor feudal." (© que representa semelhante atitude é uma transposigdo carae: teristiea para 0 dominio do religioso desse horror as distdncias que parece constituir, ao menos até agora, o trago mais especifico do es pirito brasileiro. Note-se que aittda aqui nds nos comportamios de modo perfeitamente contro a atitude jé assinalada entre japone ses, onde o ritualismo invade 0 terreno da conduta social para dar Ihe mais rigor. No Brasil € precisamente o rigorismo do rito que se afrouxa e se humaniza 49 ritualisme conjuga-se mal — como é fei im ginar — cont un setianonce retighose verdadeiramente profundo ¢ ceonsciente, Newman, “firme eonviegaio cm um dos seus sevmes anglicanos, exprinnia de que a naga inglesa Iucraria se sta reigids Fosse mais supersticiosa, more brgoted, se estivesse mais avessivel influéneia popular, se falasse mais diretamente ds imaginagies e 40s ‘oraedes. No Brasil, ao vontraio, foi justamente © nosso eulto sex Sobrigagdes ¢ sem rigor, intimista e familiar, a gue se poderia cha ‘har, com alguina impropriedade, “democritics”. aun eulto auc dis Pensava no fief todo evtorso, toda dligéneta mesmo, 0 gue eorr toda tirania sobre si mpeu, pela base, o Nosso seutimento religioso. F signitieative que, 0 tempo da famosa questo eclesiistica, 0 tio, uma tua fuurioss, que durante largo tempo abalou o pais, se enh travado prineipalmente porque d. Vital de Oliveina se obi fava em main abandona seu “excesso de Zelo™. 10 mas singubi atte, entre os aetisadores do bispo de Olinda, por una imtransivc sia ue thes parecia imperdoxivel ¢ eriminosa, Figtrassem kia pou es ealicas, oUt gue se imaginavam sineeramente eatdlicos. A uma religiosidacle te superticie, menos aenta ao sent in ‘imo day eerimonias do que ao goloride ¢ & pompa exterior, yuise carnal em seu apego ao eonerety ¢ em sta raseaFosa ineompreetsao de toda verdadeira espiritualidades tansigente, por isso mesmo que Drona acordos, ninguém pediia, vertaniente, ae se clevasse a pre duzir qualyuer moral social podrosa, Religiosidade que se perdia €¢ confiyndia am mud som Jorma eau por ise aaesttir, dr Hinha foreas para the impor sua orden, Assini, nenhum elabora cio politica seria possivel sendo fora dela, fora'de unt gulto que 3 apelava para os sentimentoy e 0s sentido © quase nica para ar 220 € 4 vontade. Nao admita pois, que nossa Repiblica tenia sido Teita pelos positivista + On agndsticos, e nossa Independencia Fosse tes Se entegou com tanta publicidade nosso primeiro imperador, que 0 fato cheparia a alarmar 6 proprio princi pede Movernict, petos perigosas exempos que encerrava sua atitude: A pouea devogao dos brasileiros¢ até das brasileiras € coisa que s¢ impde aos ollios de todos os viajantes estrangeiros, desde os tenn os do padre Ferno Cardim, que dizia das pernambucanas quinher listay serem “muito senhoras e nao muito devotas, nem frequentarem missas, prozacées, confissies ete.”. Auguste de Saint-Hi Visitou a cidade de Sao Paulo pela semana santa de 18 obra de magons. A. re, que 150 ‘come the dofa a pouca atengao dos Fis durante os servigos relig Ninguém se eompenetra do espitito das solenidades", observa. "Os homens mais distntos delas partieipam apenas por habito, e 6 pove compareve como se Fosse a um folguedo. No oficio de Endoeneas, a maioria dos preventes reeebeu 2 comuntdo da mo do bispo. Olha- ‘vam A direita ea esquerda, nee recomegavam 2 conversar logo depois.” As ris, aereseenta pou co adiante, “viviam apinhadas de gente, que corria de iereit a igre ja, mas somente para védas, sem 0 menor sina) de fervor Em verdaue, muito pouco se poderia esperar de uma devoxao swonsida por condimentos conversaivam antes desse momento sole: ‘que, como ess, duct Ser eontinisamente fortes e que, pata Ferir as alma, hi de ferir primiramente os olhios © 08 ouvides. “Em meio do ruido © da mixordia, da jovialidade & dla ostemtagiio que caracterizam todas essay eelebragives goriowas, _pompusas, esplendorosas™ nota o pastor Kidder, “quem descie en contrar, jn digo estinua, mas so menes Inga pars aM culo inaiy espinituat, provistes Ser singutarmente fervorase.""™ Quito vi sitante, de meados do século pasado, mvanifestt profuandats divides sobre a possibilidade de se implantarenr algun dit, so Brasil, For sms mais Fiparistas de eulto, Conta-se que os proprios protestates Jogo degeneram aqui, evclama, F aerescemta: “E que o clint no Tavoreee a severidade das seitas nérdicas. 0 austero metodismo ou © puritanismo jamais Morewerdo tos tripicos” ‘A exaltagio dos valores eordiais ¢ das formes coneretas ¢ oust veis da religiie,, que no eatolicismo tridentino parecem representa ‘unm exigéneta do estoryo de reconquista espiritual ¢ da prop dla f8 porate ofensiva da Reforma, encontraran entre nds unt Lee reno de eleigio e acomodaram-se bem a outros aspectos tipicos de nosso comportamenta social, ny particular Iwalismo & expliedvel, até certo ponto, nesta “terra retissa ¢ alo rmelaneélieg™, de que Falavam os primeiros observadores europeus, por isto gue, no fundo, o ritualisino ngio nos é necessitio. Normal mente nossa reacdo ao meio em que vivemos nao é uma reagdo de dotesa. A vida intima do brasileiro nem & bastante coesa, tem bas ante disciplinada, para envolver ¢ dominar toda a sua personalidht- de, integrando-a, como peca consciente, no conjunto social, Ele & livre, pois, para Se abandonar a todo o repertério de ideas, gestos formas que encontre em seu caminho, assimilando-os frequente: mente sem majores dificuldades Ist

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