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Tiago, o irmão de Jesus - Parte 2

Mário Porto

4. Tiago na Paixão de Cristo e na última ceia. Tiago não aparece no Novo Testamento nas narrativas da paixão de
Cristo ou nos momentos que a antecedem como a última ceia. O primeiro relato de sua participação relacionada com
estes eventos está em 1 Coríntios 15:3-8 quando Paulo reporta a lista das pessoas para as quais Jesus aparece depois
de morrer. É de suma importância lembrar aqui que o chamado Tiago, filho de Alfeu, não é o Tiago, irmão do Jesus, do
qual estamos tratando embora uma tradição da Igreja católica baseada na teoria epifaniana ainda os identifique como a
mesma pessoa o que pode causar certa confusão durante a leitura dos sinópticos. Para o pesquisador à luz da história não
pode ser real ou histórico aquilo que escapa às categorias da razão humana. Ora, a ressurreição ou aparição de um morto é
algo que a razão não explica e o que importa aqui é determinar os motivos pelos quais Paulo o criador desta epifania
inclui Tiago entre os visitados por Jesus. Por outro, lado as aparições de Jesus após sua morte são um expediente claro
para identificar, assegurar e reconhecer status para um personagem na hierarquia da Igreja Primitiva. É interessante
notar que Paulo é o único a mencionar Tiago entre as aparições e esta é uma questão prioritária para ser verificada em
nosso estudo. A cronologia desta mitologia começa com Marcos e sua bem elaborada criação literária de histórias de
milagres que visavam elevar Jesus ao status divino e caracterizá-lo como filho de Deus a quem os demônios se curvam.
Um miraculoso caminho sobre o mar e a alimentação de pessoas no campo são itens padrões na epopéia do Êxodo do
Egito assim a figura de Jesus como um fundador é mostrada se assemelhando a Moisés e Elias personagens mitos da
origem judaica. Paulo enfrentava dificuldades na Igreja de Corinto com a descrença sobre a ressurreição, um dos pilares
do kerigma cristão e precisava dar a seus seguidores em Corinto uma prova que os convencesse. Por isso a alegação de
aparição a mais de 500, alguns segundo ele ainda vivos como a sugerir que poderia ser verificado embora ninguém fosse
fazer isto e principalmente a menção de uma aparição para alguém que era considerado descrente, neste caso Tiago. Esta
aparição como já mencionamos na parte 1 é considerada por muitos como o momento da conversão de Tiago, mas isto
é uma questão de fé e não histórica, visto ser a própria aparição também uma questão de fé. No entanto, mesmo olhando-
se do lado da fé não existe nenhum escrito neotestamentário ou apostólico que suporte isto. Paulo parece apresentar
esta aparição, da qual ele mesmo se beneficiou, como alguma coisa excepcional. Uma passagem que também menciona
a aparição de Jesus a Tiago aparece no texto apócrifo O Evangelho dos Hebreus e o trecho que nos diz respeito aparece
em De viris illustribus de Jerônimo: Quando o senhor deu seu sudário ao servidor do sacerdote, foi para junto de Tiago e
apareceu a ele. Porque Tiago tinha jurado não comer mais pão desde aquele momento em que tinha bebido no cálice
do Senhor, até que ele estivesse reerguido do sono dos mortos; "Trazei" disse o Senhor, "a mesa e o pão".
Imediatamente ele tomou o pão e o abençoou, o partiu, e o deu a Tiago, O Justo, dizendo-lhe: "meu irmão, come teu pão,
uma vez que o Filho do homem ressuscitou dentre os mortos". Esta passagem curiosamente supõe que Tiago tenha
participado da ceia e mais ainda uma afirmação não escapa ao nosso maior interesse relativamente à entrega do sudário
ao servidor do Sumo Sacerdote o que implica que os sacerdotes judeus tomaram notícia do sumiço do corpo tão cedo
quanto os apóstolos. Presumivelmente, o servidor estava na sepultura e se assim for ela estava sendo guardada tanto
pelos soldados romanos como também pelos judeus. A natureza da relação de Jesus e Tiago talvez jamais
conheceremos, mas com toda a certeza podemos afirmar que pouco depois da morte de Jesus ele se tornou um dos
personagens mais importantes do nascente movimento em torno de Jesus. É isto que abordaremos no próximos tópicos. 5.
Tiago, primeiro Papa ou apenas líder da Igreja em Jerusalém Uma controvérsia a respeito da entrada dos gentios na
Igreja Primitiva e sua relação como os judeu-cristãos, no início do cristianismo, desvendada a partir dos Atos dos Apóstolos
e da Epístola aos Gálatas nos mostrou a importância conferida a Tiago nos revelando que sua autoridade transcendia
àquela dada a Pedro. Este é um assunto muito delicado para a Igreja católica, pois coloca em dúvida o primado de
Pedro, identificado como primeiro a ocupar o trono papal. Três esquemas são apresentados pelos exegetas para
explicar as relações de poder na Igreja Primitiva. Pelo primeiro esquema Pedro era o chefe da Igreja até seu martírio ou
desaparecimento quando então passou a Tiago a direção da Igreja a partir de Jerusalém. Pelo segundo esquema era o
colegiado dos doze que comandava a Igreja tendo esta autoridade passada a Tiago quando do desaparecimento de
Pedro que é relatado em Atos 12:17. Embora alguns vejam nele as características de primeiro papa com influência
sobre as outras Igrejas Pelo terceiro esquema Pedro e Tiago compartilharam esta liderança, mas esta chefia era,
provavelmente, local e resumida a Jerusalém e não longe dos limites da comunidade devido ao caráter descentralizado
e diversificado das práticas da Igreja Primitiva. Aqui esbarramos em algo que não está claro no Novo Testamento seja
nos evangelhos seja nas epístolas de Paulo: Era Tiago, aquele do qual estamos falando definido na Introdução, um dos
apóstolos? Paulo não nos deixa isto muito claro em Gl. 1:19 embora pareça claro que para Paulo, apóstolo não significava
ser um dos doze. O logion 12 do Evangelho de Tomé associa Tiago ao ministério de seu irmão que o teria nomeado
como sucessor: 12. Os discípulos perguntaram a Jesus: Sabemos que nos vais deixar. E quem será então nosso chefe?
Respondeu Jesus: No ponto onde estais, ireis ter com Tiago, que está a par das coisas do céu e da terra. A passagem
conhecida como Concílio de Jerusalém (Atos 15) é decisiva para determinarmos a real influência de Tiago nos
desígnios da Igreja. Tiago assume a palavra e resume os debates sobre a questão da entrada dos gentios e as tradições
judaicas. Ele propõe que a decisão figure em um Decreto Apostólico utilizando a palavra kríno, termo utilizado nos decretos
judaicos para significar "eu decreto", "eu julgo" ou "eu decido" Se Tiago não era um dos doze, sua condição de irmão de
Jesus e sua conhecida cultura e virtude teriam sido fundamentais para que ele ocupasse a posição de destaque que
sobressai dos escritos canônicos e apócrifos. 6. Morte e Legado de Tiago Graças ao historiador judeu Flávio Josefo
dispomos de um testemunho da morte de Tiago nas Antiguidades Judaicas (20: 197-203). Em 62 entre a morte de um
procurador romano e a chegada de outro para o lugar o Sumo Sacerdote Anás depois de uma reunião do Sinédrio
mandou apedrejar Tiago por transgressões da Lei. O prestígio de Tiago é atestado por Josefo que relata a indignação
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causada pelos moradores de Jerusalém especialmente os fariseus observadores da Lei, outros já afirmam que a
indignação foi mais causada pela irregularidade perpetrada por Anás ao convocar o Sinédrio sem seguir os
procedimentos corretos. O fato é que temos registros, Hegesipo, por exemplo, que aparece na História Eclesiástica de
Eusébio, do enorme prestígio de Tiago entre os judeus por causa de sua justiça. A tradição de Tiago é profundamente
enraizada na tradição judia. Ele considerava Jesus como o representante escatológico que anunciaria o Reino de Deus e
restauraria o trono de Israel. Sua oposição a Paulo é patente embora tenha sido minimizada pelos criadores da teologia
que hoje rege o cristianismo. Muitos consideram que Tiago tinha uma incapacidade de perceber o radicalismo da
mensagem da ressurreição e atribuem esta incompreensão ao fato dele não ser discípulo de Jesus fator que vimos, neste
mesmo ensaio, ser infundado. Tiago não pretendia criar uma comunidade de judeus e gentios que ultrapassasse os
limites do judaísmo, pois interpretava a mensagem de Jesus sem sair do tradicionalismo judeu. A morte de Tiago foi
sentida pelos movimentos cristãos e se nos lembramos de Josefo ela deixou mais marcas históricas do que as mortes de
Pedro e Paulo. Finalmente, a destruição de Jerusalém no ano 70 acabou com a igreja judeu-cristã na cidade e como a
Igreja já estava impregnada com as idéias paulinas os judeu-cristãos foram marginalizados numa seita denominada
Ebionismo que virá a fazer enorme oposição a Paulo até desaparecer. O prestígio de Tiago seguiu o mesmo rumo de
dificuldades que o judeu-cristianismo somente não sendo ainda mais diminuido pelas inúmeras menções ao irmão de
Jesus nos evangelhos e aos textos dos primeiros escritores cristãos como Eusébio, Hegesipo e Clemente de
Alexandria. Os textos destes autores inibiam os mentores da Igreja para os quais Tiago era uma fonte de problemas já
que a autoridade dele no Novo Testamento, como partidário da Lei mosaica e da separação judeu-cristãos, não se afinava
bem com o primado de Pedro e dos outros apóstolos. Apesar disto, em vista da falta efetiva de uma comprovação de
autoria, uma das epistolas mais importante do Novo Testamento, escrita no melhor grego do NT é atribuída a Tiago.
Escrita ou não pelas mãos de Tiago ela representa um testemunho indireto de seu pensamento e nela Jesus é
mencionado apenas em duas passagens que não nos dão conta do pensamento do autor em relação a Jesus e seu papel.
Como dissemos em 2. a aceitação da autoria da epistola como sendo de Tiago implica na revisão do nível sociocultural da
família de José ou então a existência de um redator fiel às tradições de Tiago. O fato interessante é que se pode comparar
o papel de Tiago em relação a Jesus com a epístola que leva seu nome i.e., quase nenhuma relação. Podemos citar até a
interessante história, contada por Hegesipo sobre Tiago, relatada por Eusébio na História Eclesiástica, na qual nos é
passada a informação dele ter sido convidado pelo Sumo Sacerdote para se dirigir ao povo na Páscoa com o fim de
dissuadi-los da sua crescente fé em Jesus e ele teria respondido com grande voz: "Por que me perguntam sobre o Filho
do Homem?".

[1] Tabor, James , A Dinastia de Jesus, Ediouro, 2006

[2] Bernheim, Pierre-Antoine, Tiago, o irmão de Jesus, Record, 2003

[3] Excavation at Sepphoris http://www.colby.edu/rel/archaeology/Israel.htm

The USF Excavation at Sepphoris http://www.centuryone.org/sepphoris-site.html

Tzipori, Archaeology http://www.jewishmag.com/32MAG/zippori/zippori.htm

[4] Cesaréia, Eusébio, História Eclesiástica, Fonte Editorial, 2005

[5] Eisenman, Robert, James , The Brother of Jesus,Watkins Publishing, 2002

[6] Nunes, Danillo, Judas Traidor ou Traído, Record, 1968

[7] Apócrifos e pseudo-epígrafos da Bíblia, Novo Século, 2004

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