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– Pedir conselho.
– A falsa prudência.
I. JESUS ENVIA os Doze por todo o país para anunciarem que o Reino de
Deus está já muito próximo. E dá-lhes uns conselhos bem precisos sobre o que
devem fazer e dizer, e fala-lhes das dificuldades que encontrarão. Assim,
lemos no Evangelho da Missa: Olhai que eu vos envio como cordeiros entre
lobos. Sede pois prudentes como as serpentes e simples como as pombas1.
Os Apóstolos devem ser cautos para não se deixarem enganar pelo mal,
para reconhecerem os lobos disfarçados de cordeiros, para distinguirem os
falsos profetas dos verdadeiros2, e para não desaproveitarem uma só ocasião
de anunciar o Evangelho e de fazer o bem. Mas devem ser ao mesmo tempo
simples, porque só quem é simples pode conquistar o coração de todos. Sem
simplicidade, a prudência converte-se facilmente em astúcia.
Nós, cristãos, devemos caminhar pelo mundo com essas duas virtudes, que
se fortalecem e complementam. A simplicidade implica rectidão de intenção e
coerência na conduta. A prudência mostra em cada ocasião quais os meios
mais adequados para cumprirmos o nosso fim. Santo Agostinho ensina que a
prudência “é o amor que discerne o que ajuda a ir para Deus daquilo que o
dificulta”3.
Mas há tantas outras circunstâncias em que não chegamos por nós mesmos
a um critério seguro ou em que percebemos claramente que “o juízo próprio é
mau conselheiro!”9 É um conflito familiar, que não sabemos como resolver de
modo a retornar à paz e ao bom entendimento. É um filho ou uma
filha-problema, que não vemos como encaminhar. É a grave questão da
paternidade responsável, que não pode ser resolvida consultando
apressadamente o comodismo, o conforto material ou a opinião das vizinhas. É
o dilema de saber se determinado gasto mais vultuoso é realmente necessário
ou não é ditado pela vaidade, pela ânsia do supérfluo e por tantos outros
motivos igualmente fúteis. A virtude da prudência exige nesses casos que
saibamos procurar quem nos possa dar um conselho experiente e isento e
ajudar-nos a formar um critério cristão que, seja do inteiro agrado de Deus.
Jesus foi tachado de louco11, e a mais elementar cautela lhe teria bastado
para escapar da morte. Umas poucas fórmulas lhe teriam sido suficientes para
mitigar a sua doutrina e chegar a uma “conciliação de interesses” com os
fariseus, para apresentar de outra maneira a sua doutrina sobre a Eucaristia na
sinagoga de Cafarnaum12, onde muitos o abandonaram; ter-lhe-iam bastado
umas poucas palavras – a Ele que era a Sabedoria eterna! – para conseguir a
liberdade quando estava nas mãos de Pilatos.
Jesus não foi prudente segundo o mundo, mas foi mais prudente do que as
serpentes, mais do que os homens, mais do que os seus inimigos. Com outro
gênero de prudência. Essa deve ser a nossa, ainda que, ao imitá-lo, os homens
nos chamem loucos e imprudentes. A prudência sobrenatural mostra-nos em
todo o momento o caminho mais rápido e directo para chegarmos a Cristo...,
acompanhados de muitos amigos, parentes, colegas...
“Queres viver a audácia santa, para conseguir que Deus actue através de ti?
– Recorre a Maria, e Ela te acompanhará pelo caminho da humildade, de modo
que, diante dos impossíveis para a mente humana, saibas responder com um
«fiat!» – faça-se! – que una a terra ao Céu”13.
(1) Mt 10, 16; (2) Mt 7, 15; (3) Santo Agostinho, Dos costumes da Igreja Católica, 25, 46; (4)
João Paulo II, Alocução, 25-X-1978; (5) Lc 2, 47; (6) cfr. R. Garrigou-Lagrange, Las tres
edades de la vida interior, vol. II, pág. 625 e segs.; (7) São Josemaría Escrivá, Amigos de
Deus, n. 86; (8) São Tomás, Suma Teológica, II-II, q. 49, a. 3.; (9) cfr. São Josemaría Escrivá,
Caminho, n. 59; (10) cfr. Rom 8, 6; (11) Mt 3, 21; (12) cfr. Jo 6, 1 e segs.; (13) São Josemaría
Escrivá, Sulco, n. 124.