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Gosto muito da forma como nosso Rogério Greco aborda a matéria no seu
CURSO DE DIREITO PENAL. Explicando o assunto, ele trata de quatro vertentes da
teoria segundo Claus Roxin e de outras quatro segundo Gunther Jakobs. Confesso
que, não obstante a clareza habitual do autor, precisei de algumas boas lidas para
entender alguma coisa. Para o estudante de segundo ano, continua sendo uma
tarefa no mínimo notável entender a imputação objetiva como algo diferente de pura
teoria, o que dificulta muito a compreensão.
Então, tive uma idéia: que tal criar um modelo “visual” para ensinar imputação
objetiva? Eu sei que, para não aprofundar o estudo teórico, deveria ser suficiente
dizer que:
forma a provocar a morte de sua sogra? Sim. Logo, houve conduta. Ela morreu?
Sim. Logo, houve resultado. Sua conduta teve uma colaboração causal para o
evento morte de sua sogra? Para responder a essa pergunta, podemos utilizar o
Processo Hipotético de Eliminação de Thyrén, em plena sintonia com a teoria da
equivalência dos antecedentes causais: suprimindo mentalmente a conduta, o
resultado é modificado ou mesmo evitado? Sim. Isso indica que sua conduta foi
causa do resultado. Talvez não a única, mas uma das causas. Finalmente, você quis
a morte da sua sogra? A resposta também deve ser afirmativa, o que significa que
você agiu com dolo.
Outro bom exemplo (e até mais simples) é aquele do sujeito que, percebendo
a iminência de um pesado vaso cair na cabeça de um terceiro, empurra-o,
causando-lhe lesões nas mãos com a queda, mas salvando-o da morte certa pela
lesão na cabeça. Mediante uma conduta não necessariamente orientada à causa de
um dano, efetivamente se deu causa a lesões corporais nas mãos do terceiro. Se
suprimirmos a conduta do sujeito salvador, é óbvio que as mãos do sujeito lesionado
continuarão intactas, o que demonstra o nexo causal entre a conduta e o resultado,
ainda segundo a teoria da equivalência dos antecedentes causais.
Pois bem. Ao lado do mundo natural (mundo dos fatos) temos o mundo
normativo (mundo do Direito). Se Antônio, com seus disparos de arma de fogo,
desencadeia os processos naturalísticos que culminam na extinção da força vital de
Paulo, podemos dizer que há uma relação de causa e efeito também naturalística
entre a conduta e o resultado.
O direito pode fazer isso? Sim, ele pode. Pode dizer que embora “aquilo” seja
nexo de causalidade segundo as leis naturais, somente será causalidade para
efeitos jurídicos (a partir de seu ingresso no mundo jurídico) aquilo que ele, o senhor
do Direito, disser que deva assim ser absorvido. E uma vez que o senhor do Direito
lhe negou essa qualificação, ela não poderá migrar para o mundo do Direito,
conferindo àquele fato a significação jurídica correspondente.
causalidade puramente natural ali encontrada pode migrar para o mundo do Direito
ao aplicarmos a teoria da imputação objetiva?
Vamos ver.
Dessa forma, voltando ao caso da sogra que pega o avião para o Iraque,
sabemos que a supressão da conduta do genro em lhe presentear com a passagem
importaria na supressão do evento morte. Logo, no plano fático, material ou real,
houve relação de causa e efeito. Mas aqui devemos perguntar se o risco de que
decorreu a morte da sogra foi uma criação consciente e controlada da conduta
desse genro. Em outras palavras, é possível dizer que a morte foi decorrência direta,
consciente e controlada da conduta do agente, ou que ele simplesmente se
aproveitou de um mero acaso, que poderia, inclusive, nem ter ocorrido?
Parece-me óbvio que, embora o Iraque não seja lá o lugar mais seguro do
mundo, não creio que seja possível dizer que o agente manteve o controle do nexo
causal gerador da morte da vítima. Ele contou com um acaso e esse acaso produziu
a morte da vítima, sem que ele tenha agido de qualquer forma que pudesse
aumentar o risco juridicamente proibido.
resultado. Basta ver que a mulher bem poderia estar brincando; se estivesse falando
sério, bem que poderia mudar de idéia sobre matar o marido, sobre matá-lo naquele
dia, sobre matá-lo por envenenamento com pães.
Diante disso, o senhor do mundo do Direito pode dizer o seguinte: “ah, claro,
estou vendo que no mundo dos fatos a causalidade é um fator bastante visível;
contudo, uma vez que essa causalidade material traduziu o simples e regular
cumprimento de seu papel na sociedade, sem um controle efetivo da causalidade
em face do resultado, eu, senhor do Direito, me nego a aceitá-la como idônea a se
converter numa causalidade normativa para fins de imputação dos elementos
objetivos do tipo de um crime”.
Nesses casos, não importa se todos nós vemos causa e efeito no mundo
natural. O crime, como instituto jurídico, depende de essa causalidade natural ser
absorvida pelo mundo do Direito como uma causalidade normativa. É a causalidade
normativa, não a naturalística, o verdadeiro requisito do fato típico e, portanto, do
crime. Se o mundo jurídico não aceitar essa causalidade naturalística como
normativa, não haverá crime por ausência do nexo causal.
mundo dos fatos, a teoria da imputação objetiva elege critérios para filtrar esses
resultados, permitindo o ingresso no mundo do direito – como causalidade normativa
– apenas daquilo que poderá, segundo seus próprios critérios, compor os institutos
do mundo jurídico.