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M E N A S C H E

 
A D V O G A D O S   A S S O C I A D O S   S / C  
 
 

RUA TEÓFILO OTONI, 123-A - 5º ANDAR TEL.: (55 21) 2233-4393


20090-080 - RIO DE JANEIRO - RJ FAX: (55 21) 2263-0044
BRASIL
 
Artigo

“À luz do art. 32 da Lei nº 4.357/64, alterado pelo art. 17 da Lei 11.051/04, uma empresa estaria
proibida de fazer distribuição de lucros (dividendos) tendo débitos tributários com a União com sua
exigibilidade suspensa?”

Reza o art. 32 da Lei nº 4.357/64 que:

Art 32. As pessoas jurídicas, enquanto estiverem em débito, não garantido, para com a
União e suas autarquias de Previdência e Assistência Social, por falta de recolhimento
de imposto, taxa ou contribuição, no prazo legal, não poderão:
a) distribuir ... (VETADO) ... quaisquer bonificações a seus acionistas;
b) dar ou atribuir participação de lucros a seus sócios ou quotistas, bem como a
seus diretores e demais membros de órgãos dirigentes, fiscais ou consultivos;
c) (VETADO).
§ 1o A inobservância do disposto neste artigo importa em multa que será imposta:
I - às pessoas jurídicas que distribuírem ou pagarem bonificações ou remunerações,
em montante igual a 50% (cinqüenta por cento) das quantias distribuídas ou pagas
indevidamente; e
II - aos diretores e demais membros da administração superior que receberem as
importâncias indevidas, em montante igual a 50% (cinqüenta por cento) dessas
importâncias.
§ 2o A multa referida nos incisos I e II do § 1o deste artigo fica limitada,
respectivamente, a 50% (cinqüenta por cento) do valor total do débito não garantido da
pessoa jurídica.

Antes de comentar as hipóteses de aplicação do dispositivo em questão, convém fazer uma


observação no sentido de que a norma tem sido objeto de litígios judiciais, porque:

“Ao determinar que a pessoa jurídica que possuir débitos com a União e suas autarquias
não poderão distribuir bonificações ou participações sobre o lucro a seus sócios e
dirigentes, essa norma instituiu uma forma indireta de cobrança de tributos, pois
condiciona o regular prosseguimento da atividade empresarial de pessoa jurídica ao
pagamento de seus débitos fiscais. A medida afigura-se ilegítima, por caracterizar um
meio impróprio de cobrança de tributos, constrangendo o contribuinte a quitação dos
débitos”.1

O Fisco dispõe de outras medidas legais para recebimento de seus créditos, sendo que, ao
condicionar distribuição de bonificações e participações no lucro à regularização dos débitos pendentes, a
norma afronta jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Federal (STF), que rechaçou diversas vezes
medidas extraordinárias aos ditames do CTN que visam coagir o contribuinte ao pagamento de tributos. O
Parecer supramencionado foi sustentado pelas súmulas 70, 323 e 547 do STF, que versam sobre essa
temática:

1
Parecer do Ministério Público Federal nos autos do Mandado de Segurança Coletivo nº
2005.61.00.004084-7, impetrado pela OAB/SP. Na referida ação houve liminar deferida, que foi objeto de
Agravo improvido pelos desembargadores do Tribunal Regional Federal da 3ª Região. A segurança foi
concedida pelo Juiz Federal e agora é objeto de Recurso de Apelação ainda não julgado.
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SÚMULA Nº 70

É INADMISSÍVEL A INTERDIÇÃO DE ESTABELECIMENTO COMO MEIO


COERCITIVO PARA COBRANÇA DE TRIBUTO.
SÚMULA Nº 323

É INADMISSÍVEL A APREENSÃO DE MERCADORIAS COMO MEIO COERCITIVO


PARA PAGAMENTO DE TRIBUTOS.
SÚMULA Nº 547

NÃO É LÍCITO À AUTORIDADE PROIBIR QUE O CONTRIBUINTE EM DÉBITO


ADQUIRA ESTAMPILHAS, DESPACHE MERCADORIAS NAS ALFÂNDEGAS E
EXERÇA SUAS ATIVIDADES PROFISSIONAIS.

Neste parecer, entretanto, não entraremos no mérito da constitucionalidade ou não do dispositivo.

Observa-se no dispositivo retro mencionado que, para que o contribuinte incorra em penalidade
fiscal pela distribuição de lucros, é mister que o mesmo possua “débito não garantido” (art. 32 da Lei nº
4.357/64) perante os fisco federal e/ou a Previdência social.

A Previdência Social, por intermédio da sua Secretaria de Receita Previdenciária, anteriormente à


fusão com a Secretaria de Receita Federal, regulamentou a norma em questão através da Instrução Normativa
MPS/SRP nº 03/2005, art. 649, §4º:

Art. 649. Por infração a qualquer dispositivo da Lei nº 8.212, de 1991, exceto no que
se refere aos prazos de recolhimento de contribuições, da Lei nº 8.213, de 1991 e da
Lei nº 10.666, de 2003, fica o responsável sujeito a multa variável, conforme a
gravidade da infração, limitada a um valor mínimo e um valor máximo previstos no
RPS e atualizados mediante Portaria Ministerial, aplicada da seguinte forma:
[...]
VIII - cinqüenta por cento das quantias pagas ou creditadas a título de bonificação,
dividendo ou participação nos lucros por empresa em débito com a Previdência
Social, conforme previsto no art. 285 do RPS;
[...]
§ 4º Consideram-se débitos, para fins da multa prevista no inciso VIII do caput,
desde que não estejam com a exigibilidade suspensa, a NFLD e o AI transitados em
julgado na fase administrativa, o LDC inscrito em dívida ativa, o valor lançado em
documento de natureza declaratória não recolhido e a provisão contábil de
contribuições sociais não recolhidas.

Com a regulamentação citada, não restaram dúvidas de que, no que tange aos débitos
previdenciários, se os mesmos estiverem com exigibilidade suspensa, não se aplica a vedação da distribuição
de lucros.

Já na esfera dos demais tributos federais administrados pela Receita Federal do Brasil, não houve
regulamentação do art. 32 da Lei nº 4.357/64 pela então Secretaria da Receita Federal, e por isso, a
interpretação da referida norma tem gerado controvérsias relativamente ao conceito de “débito não
garantido”.

O Art. 9º da Lei 6.830/80 que dispõe sobre a cobrança judicial da Dívida Ativa da Fazenda reza:
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Art. 9º - Em garantia da execução, pelo valor da dívida, juros e multa de mora e
encargos indicados na Certidão de Dívida Ativa, o executado poderá:

I - efetuar depósito em dinheiro, à ordem do Juízo em estabelecimento oficial de


crédito, que assegure atualização monetária;
II - oferecer fiança bancária;
III - nomear bens à penhora, observada a ordem do artigo 11; ou
IV - indicar à penhora bens oferecidos por terceiros e aceitos pela Fazenda
Pública.

À luz da norma legal supracitada, em análise da questão, alguns tributaristas defendem que as
empresas devedoras só poderiam legalmente distribuir lucros se os débitos estivessem acobertados por
penhora, depósito ou fiança bancária. Todavia, essa interpretação do conceito de “débito garantido” é
limitada e, inclusive, conflitante com o Código Tributário Nacional, pois não compreende as diversas
situações, legalmente reconhecidas, em que a pretensão do Fisco de cobrança do crédito fica impedida, por
estar este com a exigibilidade suspensa.

A este respeito, o artigo 151 do Código Tributário Nacional dispõe:

“Art. 151. Suspendem a exigibilidade do crédito tributário:

I – Moratória;
II – O depósito do seu montante integral;
III – As reclamações e os recursos, nos termos das leis reguladoras do processo
tributário administrativo;
IV – A concessão de medida liminar em mandado de segurança.
V – A concessão de medida liminar ou de tutela antecipada, em outras espécies de
ação judicial; (Incluído pela Lcp nº 104, de 10.1.2001)
VI – O parcelamento. (Incluído pela Lcp nº 104, de 10.1.2001)

Parágrafo único. O disposto neste artigo não dispensa o cumprimento das


obrigações assessórias dependentes da obrigação principal cujo crédito seja
suspenso, ou dela conseqüentes.”

A suspensão da exigibilidade do crédito inibe a pretensão de cobrança do fisco, deixando o


contribuinte numa situação de regularidade. Por isso, inibe, também, a prática de quaisquer atos ou o
emprego de quaisquer procedimentos, diretos ou indiretos, que externem a finalidade de coerção ao
pagamento. Não por outra razão, nessa hipótese, assiste ao contribuinte o direito à obtenção de certidão
positiva com efeitos de negativa (art. 206 do CTN), situação esta que ganhou inclusive amparo no próprio
CTN:

Art. 205. A lei poderá exigir que a prova da quitação de determinado tributo, quando
exigível, seja feita por certidão negativa, expedida à vista de requerimento do
interessado, que contenha todas as informações necessárias à identificação de sua
pessoa, domicílio fiscal e ramo de negócio ou atividade e indique o período a que se
refere o pedido.
Parágrafo único. A certidão negativa será sempre expedida nos termos em que
tenha sido requerida e será fornecida dentro de 10 (dez) dias da data da entrada do
requerimento na repartição.
Art. 206. Tem os mesmos efeitos previstos no artigo anterior a certidão de que
conste a existência de créditos não vencidos, em curso de cobrança executiva em que
tenha sido efetivada a penhora, ou cuja exigibilidade esteja suspensa.
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Outrossim, ainda antes de limitar a expressão “débito garantido”, vale mencionar a hipótese de
obtenção de liminar em mandado de segurança ou ação cautelar, onde a exigibilidade do crédito é suspensa
por força do art. 151 do CTN, não por garantia concreta do futuro pagamento (depósito, fiança ou penhora),
mas pela probabilidade de que o débito venha a ser declarado inexigível.

Neste diapasão também se manifesta a doutrina:

“Débito garantido será sempre aquele que (mesmo ainda estando sendo discutido na
esfera judicial): Em caso de execução fiscal, se houver penhora de bens do sujeito
passivo, o executado, garantindo o juízo (cf. §1º do art. 16 da Lei nº 6.830, de 22 de
setembro de 1980); ou em caso de ação de iniciativa do contribuinte (sujeito passivo) seja
dos tipos anulatória ou declaratória, houver depósito judicial do montante exigido (cf.
item II do art. 151 do CTN, combinado com o §1º do art. 585 do Código de Processo
Civil); ou se houver concessão de medida liminar em mandado de segurança; ou em
outras espécies de ação judicial, incluída, aqui, a tutela antecipada (cf. itens IV e V do art.
151 do CTN).”2

“A vedação para distribuir bonificações em dinheiro ou lucros tem aplicação quando a


pessoa jurídica tiver débito, não garantido, de imposto, taxa ou contribuição por falta de
recolhimento no prazo legal. A lei não faz distinção se o débito é de um dia ou de um ano.
O débito com a exigibilidade suspensa não é considerado débito para esse fim. Não
entra, também, na vedação o débito garantido por depósito integral em dinheiro ou em
bens (grifo nosso)..”3

Assim, o art. 32 da Lei nº 4.357/64 refere-se àqueles débitos que, uma vez definitivamente
constituídos pelo lançamento, não estejam com a exigibilidade suspensa por qualquer das causas previstas no
art. 151 do CTN ou, então, não sejam garantidos por penhora em sede de execução fiscal (art. 206 do CTN).

O entendimento jurisprudencial ainda não foi massificado. Entretanto no Recurso Voluntário nº


141.833, julgado pela Sexta Câmara do Segundo Conselho de Contribuintes, houve argüição, pelo
contribuinte recorrente, de que o Auto de Infração foi lavrado indevidamente, pois, distribuiu lucros
enquanto seu débito perante a previdência social estava com exigibilidade suspensa. Em seu voto o Relator
preocupou-se em afastar este argumento, mencionando que, segundo o Relatório Fiscal, a multa foi aplicada
porque foi constatado, na escrituração contábil do contribuinte, a existência de débito junto a Seguridade
Social, ressaltando assim que a penalidade imposta foi fundamentada pelos débitos inscritos na contabilidade
e não pelos débitos com exigibilidade suspensa. A seguir destacamos o trecho em questão:

“Quanto ao argumento da contribuinte de que o presente crédito previdenciário não


poderia servir de suporte à penalidade aplicada, uma vez estar com sua exigibilidade
suspensa, com arrimo no artigo 151, inciso III, do CTN, mais uma vez, o insurgimento da
contribuinte não merece acolhimento. Conforme se extrai do Relatório Fiscal, às fls. 07, o
débito junto à Seguridade Social fora constatado da análise da própria escrituração
contábil da contribuinte, senão vejamos:

“ [...] Nos mesmos livros diários e razões acima, foram verificados a existência de
débito com a Seguridade Social, através de provisões de contribuições
previdenciárias não recolhidas na conta do passivo nº 2.01.02.02.036 – INSS GPS a

2
BRITO, Edvaldo. O Conceito de Débito Não Garantido nos Campos Tributário e Previdenciário.
Revista Dialética de Direito Tributário, nº 119. São Paulo: Dialética, ago.-2005, p. 137.
3
HIGUCHI, Hiromi, HIGUCHI Fábio Hiroshi, HIGUSHI, Celso Hiroyuki. Imposto de Renda das Empresas.
Interpretação e Prática. São Paulo: IR Publicações Ltda, 2007, p. 515.
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pagar (anos 2003 e 2004), e conta do passivo nº 2.01.02.02.0003 – INSS GPS a
recolher (ano 2005), conforme saldos acumulados mensais para os meses de
11/2002 a 12/2005 descritos na planilha II, ou seja, meses em que deveria ter sido
efetuado o pagamento (regime de caixa). [...]”

Como se observa, não foi o crédito previdenciário sub examine que fundamentou a
penalidade imposta. Ao contrário, foram os débitos inscritos na contabilidade da
própria contribuinte que deram margem à aplicação da multa, [...}.”4

Pelo posicionamento acima, destacamos que, numa interpretação lógica, se, de fato, a multa fosse
aplicada por ter o contribuinte somente débitos com exigibilidade suspensa, teria seu recurso provido. Se
assim não o fosse, o relator não teria se preocupado em esclarecer que a multa não fora aplicada por conta do
débito suspenso.

Outro Recurso Voluntário, o de nº 144297, julgado pela 4ª Câmara do Primeiro Conselho de


Contribuintes, teve a seguinte decisão:

MULTA REGULAMENTAR - DISTRIBUIÇÃO DE LUCROS – DÉBITOS SEM


GARANTIA - PARCELAMENTO - SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE – Como o
parcelamento suspende a exigibilidade do crédito tributário não há impedimento à
distribuição de lucros e, portanto, afastada a hipótese de incidência prevista na norma
ensejadora da penalidade.5

A decisão não foi unânime, pois três de oito conselheiros tiveram votos vencidos no sentido de
aplicar a multa mesmo estando a contribuinte recorrente com o crédito tributário suspenso pelo
parcelamento. Entretanto, destacamos abaixo trechos da redação do voto vencedor que ratificam nosso
posicionamento:

“Desde logo registro que no voto vencido do r. Acórdão da DRJ/CTA nº. 7.433/2004, às
fls. 1022/1023, foram levantados contundentes argumentos, que ora adoto, no sentido da
inaplicabilidade da multa regulamentar.no caso dos autos. São eles:

a) Como a adesão ao programa de parcelamento Refis suspende a exigibilidade do


débito, não está caracterizada a situação prevista no art. 889 do RIR/1999, como
pessoa jurídica em débito, não garantido, por falta de recolhimento de imposto no
prazo legal.
(...)

Corroborando esses motivos, vejamos as causas de suspensão da exigibilidade do crédito


tributário, tal como elencadas no Código Tributário Nacional:

Art. 151.
Suspendem a exigibilidade do crédito tributário:
I a moratória;
II o depósito do seu montante integral;
III as reclamações e os recursos, nos termos das leis reguladoras do
processo tributário administrativo;
IV a concessão de medida liminar em mandado de segurança.
V a concessão de medida liminar ou de tutela antecipada, em outras

4
Voto do Relator Rycardo Henrique Magalhães de Oliveira, da Sexta Câmara do Segundo Conselho de
Contribuintes. Recurso Voluntário 141.833, que teve provimento negado por unanimidade de votos.
5
Acórdão nº. : 104-21.178 da 5ª Câmara do 1º Conselho de Contribuintes
M E N A S C H E ,   M O R R I S   6
A D V O G A D O S   A S S O C I A D O S   S / C  
 
 
espécies de ação judicial;
VI o parcelamento.

Como visto, o parcelamento suspende a exigibilidade do crédito tributário e, em sendo


assim e como já dito, não há como se exigir eventuais garantias, o que afasta a presente
situação do tipo descrito na norma penalizante.”

Por todo o exposto, posicionamo-nos no sentido de que a sociedade que possui débitos com
exigibilidade suspensa, por alguns dos motivos do art. 151 do CTN ou por ter débitos garantidos
judicialmente pelas causas do §1º do art. 16 da Lei nº 6.830/80, pode fazer a distribuição de lucros, por não
retratarem, estas situações, hipótese de débitos tributários não garantidos.

André Puente Menasche


OAB/RJ 83.044

Priscila Kelly de Macedo Veiga dos Santos


OAB/RJ 145.522

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