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Obra publicada com 0 auxflio Alain Lipietz ério da Cultura eda Comunicacao da Franca Audacia Uma alternativa para o século 21 Tradugaio Estela dos Santos Abreu Este livro foi impresso em papel Pélen, especialmente desenvolvido para 0 mereado editorial. Sua tonalidade, ao absorver ‘melhor 0s raios de luz, permite uma leitura mais agradavel. Publicado originalmente sob o titulo: Choisir Vaudace- une alternative pour le XXF sidcle Sumério (© 1989 Eaitions La Découverte, Paris (© 1991 Livraria Nobel SA. Direitos reservados para o Brasil Livraria Nobel S.A. ‘Departamento Editorial Rua Maria AntOnia, 108 -01222-St0 Paulo, SP - Fone: (O11) 257-2744 Prefaciando com audacia Prlogo a edigao brasileire Introdugiio ..... Coordenagao de revisor Maria Vieira de Freitas ‘Revise: Ronaldo Antonelli copidesque), Gamalie! Inacio da Silva e Wagner Gomes dos Santos _ 1,0 compromisso fordista. © que 6 um modelo de desem ‘Capa Orlando Maver ¢ ‘Composigéo: Compupress: O fordismo Impresséo Lia Grafica e Béitora Ltda. ‘A hegemonia americana .. A visio ford 2, O fim da Idade de Ouro A crise do fordismo A internacionaliza ‘As trés primeiras fases de mundo Dados Internacionais de Catalogagdio na Publicagdio (CIP) (Camara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Libiets, Alain. ‘Adela uma elterativaparaeséeulo21/ Alain Lipet;tradugd Bstela dos Sento | Abrea.— 880 Paso = Nabe, 1081 ISBN 85.218-0708.9 1. Desenvolvimento econfaice 2. Politics ecandmic 2, Relates econdmias inter §, Entéio, o que fazer’ pp 1089 4, Os impasses do liberal-produtivismo. ‘Um-modelo nov sociedade lugao do taylorismo. A volta da instabilidade econdmi A (grande desordem internacional 6 A crise ecolégica... O ovologismo é um humanis Impasse dos produtivisme {nhatore oro paid ela 88, de 1d de deere 1079, argon 122130, Impress no Brasi/Printed i Bran 6. A hora da alternativa .. Prefaciando com audacia 7. Por um novo pacto salarial. O compromisso da implicagiio negocis A estabilidade dinamica do empre; al 8. Pelo aumento do tempo livre Nem tudo nem nada.... Elogio da redugao do tempo de trabalho.. O esforgo necessario ... Olivro que ora se publica compée-se, no fundamental, dda tradugao brasileira do Choisir Vaudace. Agregaram-se- Ihe dois textos recentes do professor Alain Lipietz, um sobre 4s conseqiiéncia da guerra do golfo e outro sobre a crise do ‘imurxismo, O conjunto prima pela atualidade e contempo- raneidade dos temas e pelas incisivas e marcantes aborda- 9, Pela comunidade-providéncia Resolver a crise do Estado-providéncia Por um terceiro setor de utilidade social Iniciativa e solidariedade: a sintese comunitaria... 10.Por uma ordem econémica internacional ipictz j4 6 conheeido do ptblico universit4rio brasi- ‘oram publicados entre nés dois livros de sua auto- Iragens e milagres (Sao Paulo, Nobel, 1988) e O ¢ seu espaco (Sao Paulo, Nobel, 1987). Este tiltimo mou-se numa obra de referéncia para urbanistas, res, ge6grafos, socidlogos e economistas na ampla \tersecgdio de espago, economia e sociedade. Lipi- nu-se, certa vez, de que seu livro ficasse restrito a ja que ampla, mas assim mesmo restrita, circu- Jago. Como no teatro e na literatura, o destino das pro- so intelectuais nao € definido, a priori, pelos seus res, mas pelo uso que delas fazem seus ptblicos. Beittamonte, oe lio no corre orisco anterior. ‘Alain Lipietz faz parte da chamada “escola francesa lo rogulagao” na qual se destaca entre outros como Michel ‘Agliotta, Robert Boyer, Robert Delorme, Bruno Théret, Juoques Mistral, André Orléans; um micleo que, pelos s0- , era nitidamente francés e hoje congrega pes- Cldusulas sociais sobre o livre com Uma agéncia para a protecdo do patrimdnio comum da humanidade 150 Primeiro a Europa Anova fronteira Conclusio .... Posfacio: O século XXIjé comegou. Crises domarxismo: da teoria social ao principio da esperanga..... ee 221 ie regulacionistas. O desiderato do regulacionismo é, para sintotizar, atualizar a economia politica marxista, subme- 7 tendo-a ao crivo das poderosas e importantes transforma- es ocorridas no capitalismo um século e meio, quase, de- pois da aparieao da obra fundante do marxismo, que é, sem dtivida, O capital. Tal empreendimento nao percorre os sendeiros da reivindicagao ortodoxa, mas, ao contrério, como o préprio Marx procedeu, abre-se as contribuigées de outros campos e outros “paradigmas” teéricos. Na obra dos regulacionistas, o outro prineipal campo ou paradigma influenciador 6, sem duivida, o keynesianis- mo. Além disso, o nticleo original da “escola regulacionista” beneficiou-se extraordinariamente da experiénciaem lidar, cotidianamente, com os chamados temas ou questées da conjuntura econémica. Entretanto, o resultado obtido ndo €0 de uma mera “contaminacao” de campos tedricos, mas 0 de uma rica fecundagiio; a estrutura conceitual basica é (daa partir das categorias centrais do pensamen- a, dando como resultado uma vigorosa constru- € conceitual que mediatiza 0 marxismo de ori- tizadas”, Muito para além disso, ela constr6i novos concei- tos e empreende uma démarche que se diferencia notavel mente da dominante neoclassica-monetarista, e mesmo do keynesianismo despolitizado; apenas para salientar uma das notaveis difereneas, o Estado, eterno quebra-cabegas ¢ “externalidade” para os neoclassicos, monetaristas e key- nesianos conservadores, ganha um estatutodentrodo campo te6rico-conceitual reconstrufdo, que ndo permitemaisa sur- presa, ingénua as vezes e ignorante na maior parte dos ca- 808, de que “a inflacdo nao pode ser controlada porque os po- liticos nao deixaram”, ou os gastos nao puderam ser doma- dos porque o Estado gasta demais. Ja vimos e ouvimos essa “surpresa” em tantos atores estatais da politica econdmica no Brasil de antes e de agora, que uma proposigao conceitu- almente diferente 86 pode ser bem-vinda, a condigao, claro, de que ela também, dades” para uma iidade” em que as diferengas entre o Estado e a sociedade se subsumam, mistificada- mente, numa homogeneidade teérica que o real nao tem. ‘olvimento, constituido pelo tripé de um de um regime de acu- e de um modo de regulacdo. Trata-se — para nao nos detalhes que a leitura deste livro, como de ita “escola”, pode propiciar — de uma construgdo {tual mediantea qual osregulacionistastentam baixar de abstrago mais geral dado pelo conceito mar- “modo de produgdo”, para a contemporaneidade mas concretas mediante as quais e pelas quais 0 italismo se produz e reproduz. Ja é uma tenta- vel, posto que, apesar de Marx ter insistido in- mente no estudo concreto dos casos concretos, » 6 reconhecer que incontaveis “estudos” e andlises jiram no marxismo equivocadamente passam do e produgao” para as andlises empfricas, sem uma \ceitual mediadora. 0 resultado mais geral, ismo, nesse uso comum, om uma enteléquia a girar num espago abstrato © o concreto vira “expresses” de uma essenciali- jutavel. Tudo ao contrério da démarche marxista, ir dessa estrutura conceitual mediadora, 0 rece como a forma par excellence do capita- pordneo. Uma combinagao ndo-aleatéria, mas e determinada pela Iuta de classes, de um modo ago do trabalho, de um regime de acumulacaoe ‘ma devastadora, sobre essa forma contempo- wa vez, 6 bom remarcar, a critica nao se volta perdido”, mas incide sobre os limites, as estruturais socialmente desigualitarias, 0 finalmente, sobre a destruigo ambiental que temporéinea produz, necessariamente, pelo insformagao passa pelos processos de valori- como critério soberano e hegeménico. Vale Jogo, que o exercicio critico nao é ingénuo: pois \dade destrutiva da forma “fordista” do capitalis- 9 mo contemporéneo esta presente, também, nos sistemas chamados de “socialismo real”, hoje j4 em escombros, exa- tamente porque esse socialismo nao se libertou, ou ndo criou uma alternativa, & alorizacao que se pensava era propria apenas do capitalismo. “Ento, que fazer?”, uma velha pergunta, estrutura toda a segunda parte do livro, a partir do capitulo 3. Comegando por um exame do neoliberalismo, que o autor chamaliberal-produtivismo, Lipietz apontaas falsas saidas dessa vaga mundial, para tentar construir uma alterna- tiva, no terreno da “ecologia politica”. A diferenga marcante a respeito do mais geral e comum dos discursos ambienta- listas 6 que a “ecologia politica” de Lipietz nao paira numa indeterminagaogeral; aocontrario, busca as determinagdes sociais pelas quais passa a construcao dessa alternativa, presentes jé no esgotamento do fordismo, o que quer dizer queo préprio sistema, na sua complexidade s6cio-econdmico- politica, elabora, a partir dos conilitos, possibilidades novas antevistas na propria nova organizacao do trabalho — 0 trabalho flexivel, por exemplo—, o qual por sua vez influiré em novos regimes de acumulagao e num novo modo de regulacao. Em termos franceses, trata-se de um plaidoyer, itério, uma convoca¢do, para, através de uma ica decisiva, passar para 0 concreto, e torné-las hegemOnicas, as virtualidades abertas e propostas pelo proprio desenvolvimento em proceso, e visiveis pela exaus- tao do modelo em vigéncia. Essa acdo conereta nao é nada automética, nem se daré pelo mercado; sero as classes e novos sujeitos da economia e da politica os tinicos capazes de dar o passo da virtualidade para o pleno desabrochar. O artigo “Crises do marxismo” nao comparece ao livro apenas como quem junta material para fazer um livro maior. Une-se ao nticleo do livro do ponto de vista de que, para Lipietz, anovautopia situa-sena “alternativaecolégica”, que substitui, para ele, com vantagens, o comunismo como fim da hist6ria por uma histéria aberta; uma bissola que indica o norte, sem determinar 0 percurso nem o resultado final. A vantagem situa-se em que a “ecologia politi proposta em Choisir 'audace clabora uma alternativa inclusiva de todos os mais radicais movimentos sociais do 10 que querem mudar 0 estado de coisas — o femi- proprio ambientalismo, todas as minori a a do proletariado. Para tanto, Lipietz desenvolve isa, embora resumida, histéria das crises do mar- lesde as mais superficiais até as mais profundas, que dio um xeque-mate ndo apenas nas formas da @ marxista, mas poem em tela de jufzo as préprias wt0es, as préprias perguntas sobre as quais e a partir is 0 marxi ecularmente, interrogou e inter- ujeito histérico definido, teoriado ago entre economia e politica, destino final das mages engendradas pelo capitalismo, socialismo oduto necessério das contradigées. © prefiicio tem que “escolher a audécia” de b pena de transformar-se em agao entre amigos, » ao prestigio do autor o suposto prestigio do pre- Se 0 prefiicio no deve ter a maliciosa pretensao ia ou ostensivamente, substituir a obra pre- je também no deve, acriticamente, colar-se & faciada, Em empatia— posto que nao se prefaciam ’igos — com a obra prefaciada, o preficio, em em de espago e reconhecendo sua posigao secun- "ye empreender um auténtico debate intelectual. A de Lipietz abre a possibilidade desse debate. 9 preliminares, para nao dar a um diélogo de -se preciso estabelecer dois pontos iniciais, que terreno. Em primeiro lugar, nao se questiona ilquer intelectual deixar de lado, ou consi- desatualizado, o campo te6rico dentro do qual anterior. Sem “acusagées” de foitaa aa de Lipietz que emerge de “Crises usca detectar “incoeréncias” ou “desvios”. ido, busca clarificar a questo da propria desa- marxismo, que 6 0 ponto central da posigao de Lipiets. E inegavel que a cobranga que Lipietz faz ao mar- xismo, através da andlise de suas sucessivas criticas, de- tecta, desde e no interior das crises por ele alcunhadas de superficiais, a faléncia de todo 0 areabougo te6rico, que 56 viria a mostrar-se, em sua plenitude, com a crise atual, mais profunda e definitiva, Hé aqui, subrepticiamente, ¢ sem queo autor pereeba, uma manifestagao de “crise religiosa”. Em outras palavras, Lipietz cobra do marxismo a inflexibilidade que ele nao teve, tentando, ao contrario, adaptar-se aos chamados “novos tempos” do capitalismo. B como se, mal comparando, um crente cat 0, apés a morte — essa constatagio 6 possivel? — se desse conta de que 0 Paraiso niio existe e chorasse sobre o“leite derramado” das transgressées que nao fez, dos pecados que nao cometeu, dos gozos a que se furtou. Nesta critica, 0 tom jocoso nao deve esconder qual é 0 problema central da desilusio lipietziana. Este se situa na questao de para que serve uma que Lipietz é um dos mais autorizados pensadores, derruba todo o trabalho da “escola regulacionista”, sem piedade. A quem quer que ja tenha se dado ao prazeroso trabalho de estudar a teoria da regulagdo, no escapou que ela de- pende, inteiramente, do marxismo. Alids, esse trabalho de identificagao da matriz te6rica nao 6, a rigor, necessério: toda a primeira parte da obra seminal da teoria da regu- lag, 0 livro de Michel Aglietta, Régulation et crises du capitalisme: Vexperiénce des Etats Unis (Paris, Calmann- Lévy, 1976), é explicita em estabelecer os con: categorias centrais do marxismo como sua base; trata de uma utilizagdoad hoe, pois. A propria incorporacéo ulterior, por Aglietta e Orléans, em A violéncia da moeda (Sao Paulo, Brasiliense, 1990), de conceitos e paradigmas tomados de empréstimo a René Girard (La violence et le sacré, Paris, Grasset, 1972) cabe, por inteiro, dentro do rol que o marxismo reserva para a violéncia na histéria, e, 0 que € mais importante, nao constitui sendo uma variante muito rica dos fundamentos do fetiche nas relagdes hu- manas. Sem diivida, contemporaneamente, desde os tem- 12 pos do préprio Marx, o lugar do fetiche 6 exclusive apar ‘ismo no terreno das ciéncias humanas; num ¢ campo, a psicandlise, com o qual as relagdes do marx ram historicamente negativas, evoluindo depois pe tercambio, o principio de Edipo ocupa lugar central, ¢ torna outro ramo das ciéncias humanas que néio trab m transparénciasisénomaseisomorfas;masapsican inda nao resolveu satisfatoriamente o lugar de orige complexo de Edipo: se social, se biolégico, se ! Aqui é preciso ser severo: a obra dos regulacion: ou desembocou numa falsa saida, para a qual sua pré reelaboracéo do marxismo foi insuficiente, ou deve lerada, em sua totalidade, um enorme equivoco .ctual. Uma opgdo menos seve: mais perversa, ¢ jue os regulacionistas, pela dialética do seu proprio € jo suportaram a pressio do establishment académ. telectual, ao qual de direito e de fato pertencem, ¢ ‘odugdes anteriores néo devem ser consideradas st mo rescaldos de um modismo — no caso, 0 proprio 1 smo jé nas vaseas da agonia segundo Lipietz, pois 0 e Aglietta é de 1976 — cuja ultrapassagem os regul ibém acossa todos os que pertencem ao establish: © ar que se respira é viciado: alé1 arros e da poluigo ambiental, nojentay imarxista, patrulheiramente antimarxista. Tal ietz reconhece: “.. a idéia de uma relacdo estreita po de trabalho e o valor das mercadorias s6 cons} ‘itar total reserva dos ex-cavaleiros do marxismo”} ia acrescentar que uma tal idéia, hors du suspeitos de acoplar uma estrutura conceitual -se de uma rica discussio no interior do campo uns, como Elster, tém proposto a adogao da teori para estes, ndo necessita disso, e, pior, o funcionalismo “perverteria” toda a construgéo; outros, na linha de Cohen, acham, pelo contrério, que 0 marxismo é decisivamente fancionalista — neste caso, pré-funcionalista —e o defeito da vulgata seria o de nao tomar a sério o que nao é apenas parentesco, mas ancestralidade legitima, e praticar 0 pior funcionalismo, que é 0 das causagées lineares, do tipo A explica B, enquanto que o marxismo-funcionalista seria do tipo B que explica A. Assim, a teoria da regulagao poderia se reconhecer, ainda, como uma elaboragao marxista mais rigorosa, pois teria levado a sério essa originalidade fun- cionalista do marxismo. Ora, é precisamente isso que os regulacionistas recusam peremptoriamente. Emndosendo, pois, um marxismo funcionalista rigoroso, sobraria a possi- lade de que a regulacao se assumisse, de corpo e alma, como uma construgao funcionalista. Ai é que “o carro pega”: pois ou os regulacionistas refazem seu corpus te6rico- conceitual, expurgando-o de sua base marxista, de modo a que ele subsista autonomamente, como uma teoria dentro da rica constelagao funcionalista ou como uma verdadeira novidade, ou “a vaca vai pro brejo”, pois a persistirem, na construgdo regulacionista, os conceitos e categoria cen- trais do marxismo, com 0 abandono das conseqiiéncias transformacionistas que 0 marxismo impée — grifado, impde mesmo —, 0 que se obtém é uma teoria que se fundamenta na exploragiio e desemboca numa banali- zagao de precos de equilibrio. Hélas! Soyons serieux! O ponto central da teoria marxista € sua teoria do valor, e 0 fetiche que opera nas relacdes humanas, inclusive, ou talvez prineipalmente, nas formas do valor. Tudo o mais pode ser considerado como os equi- pamentos auxiliares desse micleo central e, aqui sim, passtveis de aperfeicoamentos, adaptagées, reelaboragbes. Tal como o micleo central da teoria neocléssica é seu conceito de equilibrio e a formagao do valor — e dos pregos, pois hé isonomia e isomorfismo totais entre valor e prego— como centramento ou descentramento em relagao a0 ilfbrio. Os aperfeigoamentos técnico-tedricos, ricos e ados ao longo de mais de um século de hegemonia. nsamento econdmico, remetem sempre a0 equilibrio. mpe-se com a teorizagaio neocldssica quando se rompe equilfbrio geral; mesmo quando se elaboram con- € teorizagoes sobre o desequilfbrio dinamico, est4-se tro, ainda, do campo neoclassico. transformacionismo inerente ao marxismo nfo teoricamente, nenhuma teleologia, nenhum finalis- entre os quais se inscreve 0 socialismo. Esses fun- 1m no campo tedrico como imantagées, cuja polaridade ‘ga As operacdes de transformaconos pressupostos. E, ‘amente, prova apenas, ¢ esse apenas é muito, issimo, que o movimento social fez, de alguma dentre sibilidades da transformagao, seu objetivo, seu alvo. uma prova da histéria pela qual poucas teorias is passaram, e bem: no jogo de palavras citado por por que Marx e no Spencer? Entre estas poucas, marxismo, o préprio liberalismo e, no campo da jolitica, recentemente o keynesianismo. Qual é0 jonismo que o marxismo impoe? O de que, a seus pressupostos, e sob 0 acicate da dialética so- proprios pressupostos sejam negados. Em outras 5, 0que omarxismo pede e exige é que sua teoria do ja negada a partir dela prépria, que a mercadoria mercantilizada, y compris a forea de trabalho. Que es humanas sejam desfetichizadas. E este o im- jue chegaram os regulacionistas. Pois emnenhuma dugdes, da hoje jé vasta produgdo regulacionista, mento de transformagao aparece. Em que dé 0 iento de um modelo de desenvolvimento? Em outro de desenvolvimento, com outra organizacao do tra- uutro regime de acumulaedo, outro modo de regu- A suspeita, pesada, de funcionalismo aparece af sans we esse 6 0 tinico resultado. A “obra aberta”, sem ¢ apenas com “biissola”, resolve-se na “ecologia jeveria resolver-se num p6s-marxismo, para ser ga discussao anterior também no deve enganar Poisse trata de uma discussdo intelectual, a qual a a problematizagao posta pelo autor pre- vale repetir, seu valor. O livro de Lipietz incor- 15 pora, ainda, um artigo sobre as conseqiiéncias da guerra dlo golfo. Aqui o autor recupera seu melhor falego. Para nés, mo Brasil, que s6 conhecemos esta ultima guerra — que cér- tamente nao seré a derradeira— através do videogame das televisdes orquestrado pelo préprio Pentagono, e da pifiia cobertura da imprensa escrita, o artigo 6 de uma imensa atualidade. Para nao nos alongarmos para além do que a paciéncia do leitor autoriza, a andlise da posigao dos BUA presente no artigo é, pelo menos, surpreendente. Sai dalli nao a poténcia plenamente vencedora e irremediavelmentie hegemGnica, mas uma poténcia militar que financia seus gastos através do mereenariato de seus soldados. Ao com- trério das conseqiéncias da Segunda Guerra Mundial, em que os EUA mandaram seus soldados ocuparem a Europa , pagando seus soldos, de algum modo financiaram, para além do Plano Marshall, a reconstrueao da Europa, agora os EUA mandam seus soldados, cujos soldos sio pagos pela... Arabia Saudita, Kuwait, Alemanha, Japao, Emira- dos Arabes. Trata-se de uma renda de migracao mili- tar, muito semelhante a renda que os imigrantes geral- mente do Terceiro Mundo mandam para seus paises de origem a partir de seus empregos no Primeiro Mundo. ‘Talvez esse epilogo mostre até onde vai a crise americana... Francisco de Oliveira Pesquisador do CEBRAP Professor do Depto. de Sociologia da FFLCH/USP Sao Paulo, julho de 1991 16 Prologo a edicdo brasileira Em 1981, na Franea, assumia o poder uma coalizéio dos partidos Socialista e Comunista, dirigida pelo presidente Frangois Mitterrand e portadora de todas as esperangas do povo francés “de esquerda”. A politica dessa coalizéo logo {ria esbarrar na crise econémica e na pressao que faziam sar sobre o pais asinstituiedes da Comunidade Leonémica uuropéia. Em margo de 1983, diante da agravagio do Wéficit comercial eda persisténcia do desemprego,ogoverno ubandonava suas ambigdes da reforma social, sacrifican- do-ns & competitividade empresarial francesa. Naépoca, euera um economista militantedeesquerda, embora criticasse desde 1968 as orik itagdes (estatais, produtivistas) da esquerda francesa. No inicio de 1984, publiquei 0 livro L’Audace ou Venlisement. Sur les poli- liques économiques de la gauche (“A audécia ou o atoleiro. Sobre as politicas econdmicas da esquerda”), pela editora Lin Découverte, em Paris. Nele eu explicava os motivos do fracasso de 81-83 mas também criticava a capitulagao de margo de 1983 e propunha uma “outra politica”. O livro (ove grande repercussdo: fiz mais de cem conferéncias, pro- ramas de radio ete. O governo (que os comunistas haviam Wvixado) voltou-se, porém, para uma politica cada vez mais ‘no sentido econdmico do termo) e tograda. Em 1986, a direita ganhou as eleigdes e apressou a ipo da Franga para o liberalismo, Em 1988, Francois ‘and foi reeleito e, a seguir, as eleigdes legislativas ram o poder ao Partido Socialista, que desde entéo porsiste numa polftied liberal. Resultado: no decorrer dos WW anos 80, o desemprego agravou-se na Franga e as desigual- dades sociais se acentuaram muito mais. Sobre esse fundo de mal-estar social, com todas as esperangas de transformacdo prejudicadas, a extrema- direita racista (0 Front National de Jean-Marie Le Pen) ‘comegou a prosperar, atingindo 10% ja nas eleigses para o Parlamento Europeu de 1984 e 15% na eleic&o presidencial de 1988. Para mim, ficou claro que a esquerda francesa nao representava mais uma alternativa: nem o Partido Socia- lista, transformado em simples gerente dos interesses capi- talistas, nem 0 Partido Comunista, emperrado numa ideo- logia produtivista e estatal, incapaz de romper com o stali- nismo. Desde 1986, eu encabecava a lista dos ecologistas ¢ “alternativos” as eleigées legislativas desse ano na regiéo operéria Seine-Saint-Denis. Meuresultado, comoodequase todos os ecologistas, foi muito fraco (3%). Mesmo assim, entrei em 1988 para o Partido Verde, sem abandonar, como economista, meus trabalhos sobre a crise e suas saidas, sobretudo no Terceiro Mundo*. ano de 1989 prometia ser importante, com eleigoes municipais e européias. Escrevi, por isso, este breve livro com propostas, sem cunho académico, a titulo de contri- buigdo a reflexao econdmica dos verdes. Oavango dos verdes foi espetacular, ultrapassando 03 20% em algumas grandes cidades e atingindo 11% nas eleigdes do Parlamento Europeu (nove deputados de um total de oitenta deputados franceses). Infelizmente, o Front National conseguiu alguns votos a mais. O Partido Socia- lista obteve 22% e o Partido Comunista, 7%. Hoje, a ecologia politica, representada por um grupo de verdes com 39 deputados no Parlamento Europeu, est em expanséo na Europa Ocidental, que se propde uma unificagio acelerada. Mas, desde a publicagao deste livro (inicio de 89), a Buropa acaba de passar por outra mudanga espetacular, O que, na conclusao deste livro, representava um objetivo — a libertacao do Leste europeu — tornou-se, no fim do ano de 1989, realidade. 18 ‘Nao desdigo nada do que propunha para o Leste ‘uropew no tiltimo capitulo, Muito pelo contrério, Acrescen- nova fei¢ao que o mundo assumiu. Quanto ao resto, alterei muito pouco o conterido da edieao original. Apenas suprimi © que é incompreensfvel aos ndo-franceses. Além disso, ncrescentei A edigéo brasileira um texto sobre a crise do marxismo, que podera ajudar alguns leitores a compre- enderem minha evolugao intelectual e outros leitores a rofletirem sobre a del Agradeco muito a tradutora, que teve a paciéncia de ‘adaptar o livro, originalmente dirigido ao piblico francés. Continuo convencido de que néo se trata apenas de um documento sobre as idéias progressistas francesas, mas que poderd contribuir para os debates dos movimentos decididos a transformar o mundo, a fim de salvé-lo das catastrofes que o ameagam, tanto a Leste como a Oeste, 40 Norte como ao Sul. Introdugao Os economistas costumam considerar o objeto de seus ntudos (nossas sociedades mercant pudesse ser definido por um conjunt inagdo, perfectivel decerto mas jé de’ has gerais, capaz de garantir a maxima eficdcia na pro- houve e haveré outros modos de produgao, mas, 's muralhas da China representadas pelas revo- modos de produgao(eem particular o capitalista) iam “na esséncia” imutaveis. A passagem para 0 seria o bastante para de fato “mudar de légica”, omo se sai da Babilénia para fundar a Nova Jerusalém, Sem diivida, os melhores economistas, marxistas ou hllo-marxistas, souberam destacar as transformagées, mais, ‘0 menos progressivas ou acidentadas, que o sistema jo apresenta ao longo de sua hist6ria. Mas eles ou conforme a “légica global do sistema”: progresso de izagéio, concentragao da propriedade etc. Hoje temos uma idéia mais clara de quao complexa, ‘ubsisténcias” do antigo regime econdmico), o capitalismo Yaiwou por transformagées mais considerdveis do que ‘fonhum dos pensadores socialistas da época pode imagi- Transformagdes mais profundas até do que as que eles 21 esperavam da passagem para o sbcialismo! Durante todo ‘esse processo, enormes tensdes sociais e graves problemas econdmicos se acumularam, resultando em crises, lutas politicas, guerras e, as vezes, em... revolugées politicas. Mas essas revolugdes, mesmo stas”, até agora no Jevaram a formas de organizagdo econdmica fundamen- talmente diferentes e, diante de suas préprias dificuldades, tendem hoje a adotar de modo explicito as regras tradi nais do capitalismo: o mercado ¢ o lucro. Apesar dessa histéria conturbada, ocapitalismoparece funcionar de maneira bem estével por longos periodos. Sempre ha lutas, muitas vezes recessdes, mas, durante esses periodos, o quadro geral, os objetivos as regras do jogo 8&0, grosso modo, de bom ou mau grado, aceitos por quase todo mundo. Esse quadro, os objetivose regras sofre- ram na historia trés grandes abalos: no fim do século XIX, nos anos 30-50 ¢ desde o fim dos anos 60. Mas, nos _intervalos delimitados por essas crises maiores, um “grande | podeesperarde melhor desua atividade econdmica: principios | compromisso” ¢ aceito pelos grupos sociais. Na base desses compromissos, um “modelo de desenvolvimento”. Fa de= finiedo, provisoriamente adotada, do que a humanidade de organizago do trabalho, metas da produeao, regras da jogo para a solucao das tensoes. 7 © proprio modelo de desenvolvimento se insere em: uma “visio de mundo” mais ampla, que inclui uma defini go da alegria de viver em sociedade, a qual consolida 0 Grande Compromisso. Este pode entao ser defendido por uma extensa gama de familias politicas, da direita atéa es querda. Elas se opdem a respeito de interesses particulares, de melhorias que poderiam ser efetuadas no seio do proprio modelo, de acordo com a mesma visao de mundo. Mas 0 mo= delo, e a maneira de ver nfo so questionados: todos acei- ‘tam como ideal prético, como meta de sua atividade social (econémica ou politica), as promessas especificas do modelo. Emtais periodos, existem utopias transformadoras, mas elas se afastam desmesuradamente da pratica cotidiana (“refor= mista”, digamos) daquelas ¢ daqueles que a elas recorrem. ‘Bem diversa 6 a situagdo nas “grandes crises”. Nesse ‘caso, omodelo, seus objetivos, regras e promessas parecem 22, ltrapassados: economicamente invidveis, politica e so- Imente rejeitados. Esses periodos sao bifurcagées da his- ria, em que o peso da rotina cede a vez as iniciativas \sformadoras. Periodos abertos, cujo desfecho perma- neerto por mais de uma década. Perfodos de rede- Wio de projetos, de realinhamento das forgas sociais. ismo desafiavam o conservantismo liberal em crise, oncorréncia mortal com o fascismo e o stalinismo. Hoje, e ha vinte anos, estamos num desses periodos ‘tos em que o objetivo da contestacdio ja néio é a implan- is justa ou mais eficiente de um modelo conhecido, yrépria definigao do que seria um novo modelo de de- iento, um novo grande compromisso. Nao esta- yenas numa crise econémica, mas numa crise do omisso que funda a sociedade, na crise do projeto. O tas vezes 6 chamado de “crise da hegemonia’, isto 6, da lade das elites e dos grupos sociais que as sustentam por uma visdo de mundo e um modelo de desen- to aceitdveis para toda a sociedade. Neste livro, lembraremos primeiroomodelo de desen- lento hegem@nico do pés-guerra e os motivos de sua intes de tudo, porque as questdes provocadas por (“o que nao esta dando certo?”) constam dos itens quer projeto que pretenda “sair da crise”, Mesmo » as respostas divergem, devem obrigatoriamente \der (nom{nimo)a essa lista de questdes. Em segundo 1, porque seré para n6s ocasio de distinguir os compo- de qualquer modelo de desenvolvimento que pre- er consisténcia. xaminaremos, em seguida, as forgas ¢ as fraquezas 9 que se apresentou nos anos 80 como o principal dato ao papel de novo modelo de desenvolvimento, amarei de “liberalismo produtivista”. Mesmo que no \o ele esteja meio abalado, mesmo que seus arautos ‘tados Unidos, na Gra-Bretanha)enfrentem grandes lades, mesmo que variantes parciais de outro mo- ham hoje algum sucesso, ele ainda representa “o wadrio principal” para quem néo adota a visao de que o sustenta. Enfim, proporei um outro modelo de desenvolvimento, fundadoem outra visto demundo. Ou, maismodestamente, alguns tragos do que poderia ser o grande compromisso do pés-crise, Uma alternativa para o século XXI, ou mesmo para 0s anos 90 Cuidado, porém! Se a visio de mundo atinente a um modelo de desenvolvimento que atingiu a hegemonia se a- péia na estabilidade e nas vantagens do modelo, de modo a parecer natural a todos, a visdo de mundo correspondente um modelo ndo-estabilizado, nao-realizado, jamais passa de projeto. Esse projeto ndio se deduz de nenhuma lei hist6- rica, € muito menos econémica. Falsas foram as variantes vulgarizadas do marxismo que prometeram um futuro ra~ dioso como conseqiiéncia necesséria do desenvolvimento das forgas produtivas e das leis da dialética hist6rica. Tgual- mente falsas (nutridas, alids, pelo mesmo caldo produtivis- ta, tecnocratico) sao hoje as ideologias que, enquanto anun- ciam o “fim das ideologias”, pretendem deduzir as vias da sociedade futura a partir dos caracteres da atual “revolugao tecnolégica”. Sem diivida, o projeto alternativo seria apenas uma utopia revoluciondria a mais (e jé seria étimo e util, como uma bissola indicando o pélo norte para um veleiro nave- gando da Cérsega até Marselha) se no estivesse enraizado nas aspiragdes e comportamentos presentes na realidade. Nao seria a prefiguracao de um futuro grande compromisso se j nao cruzasse hipéteses de trabalho, experiéncias, realizagdes que tivessem dado certo, em determinados paises, por parte de determinados setores das classes dominantes. Como qualquer visdo de mundo (diremos mais adiante, numa expressao pedantemas maisexata, qualquer “paradigma societal”), a alternativa terd, se se tornar hegeménica, sua “direita” e sua “esquerda”. Haveré uma verso patronal da alternativa — que, alids, jé existe! NAo venham, por isso, falar de “apropriagao™: desejar que seu * Récupération: (giria politica francesa) 0 modo de uma corrente politica assumir como suas, deformando-as, as idéias de outra corrente. (N. da T.) 24 to se torne dominante 6 aceitar que o outro dele se deforme-o ¢ o desfigure, mas é também fazer com ite os valores de quem propée o projeto (ainda que iinda que diluidos): 6 fazé-lo aceitar um ‘compromisso mais avangado. Antes de ser “apropriado”, uim projeto novo encontra rsdrios. Nao apenas “o velho que agoniza”, mastambém outros projetos, que propdem outras respostas as mesmas ies, até contornando certas questdes. Respostas que nsores do projeto alternativo julgam inaceitaveis, desumanas, mas infelizmente respostas possfveis, j4 ado- u . Como 0 fascismo era uma resposta As questées sus- jas pela anarquia do mercado, a crise de superprodugao ismo liberal. “Solugao” que as vezes coincidia com pages da social-democracia, dos comunistas ou sevelt. Assim mesmo, foi necesséria a Segunda rdadeira guerra civil em nivel mundial, para que izasse 0 compromisso social-democrata ¢ se ar- asse o movimento de independéncia dos povos coloni- . Reformismo cho? “Apropriagao” da esperanga dos 's e dos combatentes da liberdade? Decerto, mas yres essas “apropriagdes” do que a vit6ria das slugées”. Quando falo de alternativa, apéio-me, portanto, na de mundo que emerge aos poucos da prética e das, as dos chamados movimentos “alternatives” na ‘adicais” nos Estados Unidos, dasnovas tendéncias icalismo, da ecologia, do feminismo. Mas nao esque- la também existe, desde agora, sob forma insossa, praticas de compromisso industriais ou insti- is. E que, sob suas variantes radicais como sob suas moderadas, ela deve enfrentar um candidato poderoso, embora minado por contradigdes gri- vral-produtivismo, J a citar mais uma vez.o velho barbudo: “Os homens ua prépria histéria, mas a partir de certas con- , herdadas do passado”.

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