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O e-Learning sem Psicologia não é e-Learning, é E-learning

Aquando da minha pesquisa em torno de questões relacionadas com o e-


Learning e a criação de ambientes de aprendizagem ricos e estimulantes,
deparei-me com uma série de artigos que me ajudaram a repensar a minha
própria metodologia enquanto docente. O presente texto tem como intuito,
portanto, dar conta dos achados nos referidos artigos, ou seja, reflectir
sobre o porquê da resistência do corpo docente ao uso das tecnologias de
Informação e Comunicação e ilustrar as potencialidades do uso destas. Em
última análise, a experiência bem sucedida de e-Learning é aquela que
abraça uma metodologia capaz de dar resposta às necessidades individuais
de cada aprendente e às necessidades sociais vigentes.

Quando usadas para promover uma “aprendizagem colaborativa”, as


Tecnologias de Informação e Comunicação podem ser extremamente úteis
ao Ensino. De acordo com as teorias construtivistas, o verdadeiro
conhecimento só se constrói mediante a interacção do sujeito com o objecto
de conhecimento, interacção essa estimulada pela elaboração de um
projecto colectivo, no seio do qual se processa o diálogo e se motiva cada
pessoa a pensar e repensar o pensamento do outro, selando o acto de
aprender, que nunca é individual.

Neste sentido, o uso de computadores com ligação à Internet permite,


mediante o recurso, por exemplo, a mailing lists, fóruns ou bloggers, de um
espaço de partilha e de construção de conhecimento, supressor de
constrangimentos temporais ou geográficos, onde “o professor tem a
oportunidade de perceber as opiniões dos alunos” e “os mais tímidos têm a
chance de se posicionarem em relação aquilo que está sendo construído, da
mesma forma que os alunos mais dominadores são conduzidos a dividir o
espaço com os demais”, de modo a que, “professor e aluno, terão o seu
tempo para pensar e refletir sobre as idéias coletivas”1.

1
BITTENCOURT, Carla Simone, et al., “Aprendizagem Colaborativa Apoiada por Computador”, p.4 do pdf
disponível no site do CINTED (Centro Interdisciplinar de Novas Tecnologias na Educação, na UFRGS -
Universidade Federal do Rio Grande do Sul), Brasil), no endereço:
http://www.cinted.ufrgs.br/renote/mar2004/artigos/01-aprendizagem_colaborativa.pdf
No entanto, conforme refere a educadora e linguista Rosa María-Torres, no
artigo “Educação na Sociedade da Informação”2, normalmente “as
preocupações continuam centralizadas em torno da oferta, das
oportunidades e do acesso (ao computador, à Internet) mais do que em
torno da pertinência e da qualidade de conteúdos e métodos, das condições
de produção e difusão de tais conteúdos e, geralmente, da pergunta de qual
informação/educação e para quê (impacto social). O hardware prevalece
sobre o software das tecnologias e da própria educação, a informação sobre
a comunicação, o conhecimento e a aprendizagem. Da mesma forma, prima
um enfoque passivo e reativo diante das TIC - vistas como ferramentas
capazes de difundir informação - ao invés de um enfoque ativo e proativo
que vê os indivíduos não unicamente como consumidores, mas também
como criadores de informações e conhecimento”. A supracitada autora
acrescenta ainda, a propósito deste último aspecto, que a “Educação na
sociedade da informação é um enunciado problemático, difícil de
ressignificar, encerrado em dois termos: educação (quando se busca a
aprendizagem, o aprender a aprender) e informação (quando o objetivo é
transcender o dado, conhecer, compreender, aprender, criar)”.

De modo a compreender os factores desencadeantes do referido facto,


aconselha-se a leitura do artigo “A(s) Ecologia(s) Cognitiva(s) e a
Informática na Educação”3, elaborado por Mara Lúcia Fernandes Carneiro,
no qual se “questiona a simples inserção da tecnologia no processo
educacional e destaca a necessidade de reavaliar-se a preparação de
professores e alunos para ingressarem nesta nova sala de aula”.

Baseada num estudo de M. Wild4, Maria Lúcia Carneiro afirma existirem três
falhas possíveis na formação de professores, condutoras a um uso ineficaz
das TIC: a falha de propósito (“relacionada com o fato de que os cursos de
formação consideram a aprendizagem do uso do computador como
imperativa, sem questionar porque os professores precisam aprender para
inseri-lo em sua prática docente e o quê eles querem e precisam saber. Para
2
O artigo encontra-se disponível no site da VECAM, em: http://www.vecam.org/auteur.php3?
id_auteur=233&lang=pt&nemo=edm
3
pdf do artigo online no site do CINTED, em:
http://www.cinted.ufrgs.br/renote/nov2005/artigosrenote/a43_meio_ambiente_educacao_informatica.pdf

4
WILD, M. Technology refusal: Rationalising the failure of student and beginning teachers to use
computers. British Journal of Educational Technology, Coventry, v.27, n.2, p.134-143, 1996.
o autor, neste tipo de curso a tecnologia é vista como algo que existe e,
portanto, deve ser aprendida, ou seja, considera que os professores e
alunos precisam adequar-se ao computador e não o contrário. Cursos que
adotam esta visão podem restringir-se ao treinamento no uso de programas
específicos, como a edição de textos, criação de apresentações (slides) ou
uso de planilhas eletrônicas. Mas somente o domínio do recurso tecnológico
pode induzir o professor a pensar que a tecnologia serve para auxiliá-lo na
digitação das provas, na “transmissão” de informações em maior
quantidade e em menos tempo ou no cálculo das médias de seus alunos” 5);
a falha do método (“refere-se à falta de preocupação de quem planeja e
organiza os cursos de formação de professores sobre como efetivamente as
pessoas adquirem habilidades no uso da tecnologia e como efetivamente
aprendem. Ele exemplifica com um estudo sobre a relação entre a
habilidade no uso do teclado e a produção textual, destacando o fato de que
há outros fatores a serem considerados além do número de palavras que o
estudante consegue digitar em um determinado tempo. O aprendizado de
um processador de textos deveria questionar como ele poderia ser usado
pelos professores no desenvolvimento de estratégias metacognitivas para
auxiliar a escrita, solução de problemas, cooperação, planejamento de
atividades, etc.”6), e, a falha de significado (“das atividades propostas pode
também confundir os professores que estão iniciando seu aprendizado no
uso da informática na educação. Para Wild, essa capacitação deveria
privilegiar a construção de sentido sobre esse uso e sobre suas implicações
no processo educacional, indo bem além da instrumentalização dos
professores em formação”7).

Por outro lado, segundo um trabalho de Ramal 8 consultado pela mencionada


autora, a rejeição por parte dos professores no uso dos computadores
relaciona-se com factores, dos quais destacaria a insegurança (“gerada pela
falta de domínio no uso dos recursos tecnológicos e pelo senso comum
ainda vigente de que o professor é o “dono” do conhecimento a ser

5
p.6 do pdf referido na nota 3
6

Ibidem

7
Ibidem

8
RAMAL, A. C. Educação na cibercultura: hipertextualidade, leitura, escrita e aprendizagem. Porto
Alegre, ArtMed, 2002.
transmitido”9); o medo (“de danificar equipamentos de custo elevado,
fazendo com que muitos dirigentes não permitam o acesso aos laboratórios
de informática ou mantenham os equipamentos lacrados, até que chegue à
escola alguém que efetivamente ‘saiba’ usá-los), e, o preconceito contra o
uso do computador (“comparando o investimento na tecnologia com as
dificuldades salariais ou a falta de merenda na escola”).10

Igualmente o texto “Professores utilizadores das TIC em contexto educativo:


que aspectos os condicionam?11”, decorrido de um estudo realizado entre o
ano de 2002 e o ano de 2004 numa escola secundária da área
metropolitana de Lisboa com alguma tradição no uso das TIC, aponta para o
facto de a escola oferecer uma formação que se coloca quase
exclusivamente ao nível da iniciação à manipulação de meios informáticos,
concluindo-se sobre a necessidade de impor uma nova dinâmica formativa
com vista à preparação dos docentes para a exploração pedagógica desses
meios. Essa formação deverá contribuir para que os professores
ultrapassem o desconhecimento das potencialidades das TIC, deixando de
as usar em função de velhas pedagogias, de modo a “não só mudarem o
que fazem mas, também, o que pensam sobre o que fazem e, ainda, o facto
deste processo só ser bem sucedido se for encarado numa dimensão
eminentemente colectiva”.

Um bom exemplo pragmático do enunciado até ao momento pode


encontrar-se num projecto desenvolvido por alunas da Escola Superior de
Educação do Instituto Politécnico de Setúbal, que procurou fazer das TIC um
recurso para a área curricular não disciplinar do Estudo Acompanhado12. A
intenção do mesmo é óbvia: desenvolver, mediante a articulação entre as
TIC e o Estudo Acompanhado, aprendizagens partilhadas e cruzadas com as
diferentes áreas disciplinares, dotando os alunos de competências

9
p.6 do pdf referido, nota 3

10
ibidem, p.7

11
Texto online em:
http://www.microsoft.com/portugal/educação/parceirosnaeducação/professoresinovadores/newsletter/out
ubro/artigoasilva.mspx
12
O projecto foi orientado pelo Professor José Duarte e realizado por Conceição Lameiras, Teresa
Gouveia e Orquídea Gomes, em Julho de 2002. A fundamentação, materiais e desenvolvimento do
mesmo podem consultar-se no documento disponível no endereço: http://www.ese:ips-
pt/nonio/definitivo/corpo_trabalho_1_46.pdf
transversais, nomeadamente, no que concerne ao relacionamento
interpessoal e de grupo, aos métodos de trabalho e de estudo, ao
tratamento da informação, às estratégias cognitivas e à comunicação,
facultando-lhes o acesso a ferramentas que as possam valorizar,
contribuindo deste modo para o seu desenvolvimento enquanto cidadãos
autónomos e participativos na sociedade em que estão inseridos.

Concluo com a ideia de que o computador não substitui o papel do


professor, valoriza-a. É, pois, urgente que este último assuma o seu novo
papel de “arquitecto cognitivo”, aquele que traça percursos de
aprendizagem, auxiliando o aluno a reflectir criticamente e interpretar as
informações adquiridas e a usar a linguagem para se assumir enquanto
agente activo no mundo. A não esquecer é que, só conhecendo e sabendo
usar a tecnologia e partindo de um outro domínio de convivência,
conseguirá o professor, efectivamente, desempenhar esta função.

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