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CÂNCER DE PULMÃO
LUNG CANCER
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Docente da Disciplina de Pneumologia; 2 Médicos Assistentes. Departamento de Medicina da Escola Paulista de Medicina da UNIFESP.
CORRESPONDÊNCIA: Disciplina de Pneumologia EPM / UNIFESP Rua Botucatu, 740, Vila Clementino, São Paulo-SP – CEP:04023-062.
Tel: (011) 5491830.
UEHARA C; JAMNIK S & SANTORO IL. Câncer de pulmão. Medicina, Ribeirão Preto, 31: 266-276, abr./jun. 1998
RESUMO: Este artigo contém os fundamentos básicos para o diagnóstico, tratamento e con-
duta dos pacientes portadores do carcinoma broncogênico. Nele, ainda, descrevemos os conheci-
mentos mais recentes que são discutidos na literatura mundial. É voltado para graduandos,
pós-graduandos de Pneumologia, pneumologistas e generalistas.
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noma broncogênico e, destes, 50% morrem. Estes óbi- nar. Portanto se faz necessário realizar toda uma
tos foram atribuídos à asfixia. propedêutica para o diagnóstico de infiltração.
3.2.1.3 Dor Torácica 3.2.2.3 Síndrome de Pancoast
Dor torácica está presente em 27 a 49% dos A síndrome de Pancoast, nos casos de tumor
casos de neoplasia de pulmão. O tipo de dor é fre- do sulco superior, caracterizada por dor, síndrome de
qüentemente intermitente do lado do tumor, tornan- Horner, destruição óssea, a atrofia de músculos da
do-se intensa e persistente devido à extensão para mão. O sulco superior é um sulco criado pela passa-
mediastino, pleura ou parede torácica. gem da artéria subclávia até a pleura dos ápices dos
lobos superiores.
3.2.1.4 Sibilos ou Estridor Os carcinomas não pequenas células são as cau-
Sibilos localizados sugerem obstrução do sas mais freqüentes de tumor do sulco superior.
brônquio, enquanto que obstrução da grande via aé-
rea produz estridor. Neste último, a análise da curva 3.2.2.4 Síndrome da Veia Cava Superior
fluxo-volume pode ser útil, na identificação de lesão Obstrução ao fluxo sangüíneo na veia cava su-
de traquéia ou laringe. perior. Os sintomas mais comuns são: sensação de
aumento de volume da cabeça e dispnéia. A tosse,
3.2.1.5 Dispnéia dor e dispnéia são menos freqüentes. Os principais
Dispnéia está presente em aproximadamente sinais clínicos incluem dilatação de veias do pesco-
37% da população com câncer de pulmão. As causas ço, circulação colateral na parede torácica anterior,
de dispnéia incluem obstrução de grande via aérea, edema facial e, em extremidades superiores, “facies”
intrínseca e extrínseca, pneumonite obstrutiva ou ate- pletórica. Carcinoma broncogênico é a causa de 65 a
lectasia, derrame pleural, linfangite, derrame pericár- 80% dos casos desta síndrome e ela representa 4%
dico, embolia tumoral, tromboembolismo, e condi- das manifestações clínicas.
ções comórbidas, como doença pulmonar obstrutiva
crônica e insuficiência cardíaca. 3.2.2.5 Coração
Em estudos “post-mortem”, metástase no peri-
3.2.2 Efeitos Metastáticos cárdio e derrame no pericárdio ocorreram em 30%, e
Metástases extrapulmonares para câncer de todos os tipos histológicos podem evoluir com esta
pulmão ocorrem mais freqüentemente para o fígado, manifestação clínica. Os sintomas e sinais mais co-
supra-renais, ossos e cérebro. muns são: dispnéia, tosse, pulso parodoxal, estase
jugular e aumento da área cardíaca.
3.2.2.1 Rouquidão e Paralisia de Diafragma
Rouquidão, como primeiro sintoma, ocorre em 3.2.2.6 Fígado
18% dos pacientes. Paralisia da corda vocal esquerda Metástases hepáticas estão presentes, em casos
é a mais comum, devido à localização e trajeto do de necrópsias, em cerca de 30% dos casos de carcino-
nervo laríngeo-recorrente esquerdo. A paralisia de ma espinocelular e de 60% do carcinoma de pequenas
corda vocal bilateral é mais rara. células. No período do estadiamento, as metástases
Paralisia diafragmática é usualmente assin- hepáticas são encontradas em 26% dos pacientes.
tomática, é achado radiológico. A paralisia de dia- Inicialmente, os casos são assintomáticos. Au-
fragma, em 1/3 dos casos, teve o câncer de pulmão mento do volume do fígado, nódulos hepáticos pal-
como causa. páveis podem estar presentes. Icterícia e ascite são
infreqüentes. Alterações bioquímicas (TGO e TGP)
3.2.2.2 Derrame Pleural
podem identificar casos assintomáticos de metásta-
Sabe-se que em torno de 7% dos pacientes com
ses hepáticas.
câncer de pulmão estão envolvidos com derrame
pleural maligno. Estes derrames pleurais são exudatos 3.2.2.7 Supra-renal
sero-sanguinolentos e são, comumente, associados Em autópsias, metástases supra-renais estão
com adenocarcinomas. presentes em 25 a 40% de pacientes com câncer de
Nem todos os derrames pleurais, em pacientes pulmão, mas a insuficiência de supra-renal é raramente
com neoplasia de pulmão, são devidos a metástases observada clinicamente. Menos da metade das mas-
pleurais, outras causas são: obstrução linfática, pneu- sas de adrenal são malignas, portanto é necessário con-
monite pós-obstrutiva ou atelectasia e infarto pulmo- firmar o diagnóstico com biópsia com agulha.
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Isto também é válido no estadiamento dos car- combater as possíveis micrometástases. No nosso ser-
cinomas pequenas células, quando a sobrevida dos viço, utilizamos a associação ifosfamida e a farmor-
portadores de doença limitada é superior à dos por- rubicina.
tadores de doença disseminada. À presença de mar- Consideramos contra-indicação cirúrgica:
cadores tumorais (Cmyc, Kras, p185, Cerb B-2) os obstrução da veia cava superior, paralisia da corda
pacientes têm apresentado menor sobrevida que a da- vocal, invasão do esófago, tumores de Pancoast, com
queles pacientes onde eles foram negativos. À pre- invasão da coluna vertebral, e presença de derrame
sença de tumores diplóides, os pacientes têm menor pleural com citologia classe V, ou biópsia pleural com
sobrevida em cinco (5) anos que os que têm tumores tumor, ou seja, estádios IIIb e IV.
aneuplóides (80% x 20% nos carcinomas não pe- Aos pacientes com metástases à distância há
quenas células). As mulheres têm, consistentemente, contra-indicação cirúrgica, sendo esta considerada
maior taxa de sobrevida que os homens. uma exceção, quando o paciente apresenta uma lesão
pulmonar ressecável e uma metástase solitária no cé-
7. TRATAMENTO rebro ou fígado.
Só se realizará cirurgia em CIPC em duas
O tratamento de escolha para carcinoma bron- condições: para se fazer diagnóstico de nódulo ou
cogênico é a ressecção cirúrgica, porque é a modali- como adjuvante à quimioterapia. O tratamento prin-
dade que oferece a maior chance de cura. cipal do CIPC é a quimioterapia e, no nosso serviço,
Infelizmente, na maioria dos casos, o diagnós- utilizamos carboplatina e vepeside.
tico é feito em uma fase tardia, onde o tumor já se A radioterapia é outra modalidade terapêutica,
espalhou além dos limites de ressecabilidade. Assim, e ela é utilizada nas doenças localizadas ou em doen-
as outras formas de tratamento tornam-se de grande ças disseminadas, visando, na última, o controle de
importância para a diminuição da morbidade e pro- determinada sintomatologia, por exemplo, um paci-
longamento da sobrevida. ente com câncer de pulmão com dor óssea por metás-
Optaremos pela cirurgia, se o tipo histológico tase, ou metástase cerebral com sinais localizatórios.
for carcinoma não pequenas células, se o estadiamento Com este tratamento, podemos ter alguns efeitos co-
clínico for I, II ou, em alguns casos, III e se as fun- laterais mais comuns: esofagite, pneumonite aquití-
ções cardiopulmonares não contra-indicarem o trata- nica, fibrose pulmonar, derrame pleural e dermatite.
mento cirúrgico. A moderna quimioterapia iniciou-se com a des-
A ressecção cirúrgica de câncer de pulmão tem coberta da mostarda nitrogenada. Os resultados de-
se tornado um procedimento seguro, com baixas ta- pendem do tipo histológico. O carcinoma indiferenci-
xas de complicações e mortes pós-operatórias. Um ado de pequenas células responde melhor que tumo-
estudo com mais de dois mil (2.000) pacientes mos- res de qualquer outro tipo histológico, no pulmão.
trou uma taxa média de mortalidade, após trinta (30) A resposta do tumor depende de uma série de
dias, de 3,7%. Variando de 1,4% para pequenas fatores: “performance status”, peso inicial do pacien-
ressecções (menos que uma lobectomia) a 6,2% para te, extensão da doença na apresentação, número de
pneumectomia. As principais causas de morte no sítios metastáticos conhecidos, sítios específicos das
pós-operatório foram: insuficiência respiratória por metástases e histologia.
pneumonia, fístula broncopleural com empiema, pro- Poucas drogas dão alguns benefícios e algu-
blemas cardíacos e embolia pulmonar. mas, como os corticosteróides, encurtam a sobrevida
No intra-operatório, o cirurgião optará, depen- (Tabela IV).
dendo do estádio real do tumor e da necessidade de pre- Atualmente se usa combinações de drogas, pois,
servar a função pulmonar pela ressecção em cunha, assim, obtemos melhores respostas e sobrevida. O
segmentectomia, lobectomia ou mesmo uma pneumec- ideal é que cada droga aja independentemente, tenha
tomia com extensa ressecção dos nódulos linfáticos, diferentes toxicidades e um sinergismo na destruição
responsáveis pela drenagem do tumor. Logo, o cirur- das células tumorais. Isto é difícil de se obter.
gião deve tentar remover o mínimo de pulmão possí- Na prática, para realizarmos o tratamento,
vel, associado com a completa ressecção do câncer. dividimos os pacientes em dois (2) grupos: carci-
Nós acreditamos que todos os pacientes sub- nomas indiferenciados de pequenas células (CIPC)
metidos a uma ressecção completa deveriam realizar e os de não pequenas células (CEC, adenocarcinoma
pelo menos quatro (4) ciclos de quimioterapia, para e CIGC).
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instilação de substâncias esclerosantes, que visam A grande parte dos nódulos é detectada pelo
obliterar o espaço pleural e, com isso, não deixar acu- Rx convencional de tórax, que nos permite a avalia-
mular líquido, evitando-se os sintomas. Este tratamen- ção do tamanho, de calcificação no interior do nódu-
to é paliativo, e está contra-indicado na presença de lo, e pode servir de guia para biópsia de aspiração por
atelectasia e drenagem torácicas inadequadas. agulha. Estudos seriados de Rx de tórax, permite ava-
As principais substâncias esclerosantes descri- liar se a lesão é estável, e, em conjunto com informa-
tas são: tetraciclina, bleomicina e talco, (Tabela V) ções clínicas, supor quadro de benignidade. A tomo-
infundidas através do dreno torácico, após pequena grafia computadorizada do tórax (TC) em especial a
quantidade de xilocaína. de cortes finos, permite estudo mais fidedigno do ta-
manho, calcificação, número e densidade da lesão. A
presença de margens imprecisas, lobuladas, espicula-
Tabela V - Principais agentes, suas doses e efi- das e com baixo coeficiente de atenuação é sugestiva
cácia em um (1) mês, utilizadas para pleurodese de malignidade.
Eficácia O principal objetivo da biópsia é estabelecer
Agentes Dose
após 1 mês que a lesão é benigna, e evitar a toracotomia. Infeliz-
Tetraciclina 35mg/kg (2,0g) 69% mente, em lesões menores que 3 cm, a sensibilidade é
Bleomicina 60U 84%
bastante reduzida, principalmente quando se utiliza a
broncoscopia como método para coleta de material.
Talco (solução) 96%
Apesar de uma positividade maior na biópsia por as-
C. Parvum 7mg – piração com agulha transtorácica, guiada por TC ou
fluoroscopia, os resultados falso-negativos chegam até
29%, não afastando definitivamente a presença de
Nos tipos histológicos, sensíveis à quimiotera- malignidade.
pia (CIPC e linfomas) o tratamento com as drogas O tempo de duplicação, que é o tempo requeri-
podem ser suficiente, para conter a recidiva do derra- do para o nódulo dobrar de tamanho, em caso de nó-
me pleural. dulo maligno, varia de trinta (30) a quatrocentos (400)
dias. Já em nódulo benigno, pode ter um crescimento
variável, < 20 dias ou mais lento > 450 dias. Cálculo
NÓDULO PULMONAR SOLITÁRIO
do tempo de duplicação, através de radiografias seria-
Caracterizado por lesão única, em forma de das, é criticado, pois esta estratégia pode resultar na
esfera, no parênquima pulmonar, apresentando, como diminuição da taxa de sobrevida em cinco (5) anos,
limite superior, 3 cm no maior diâmetro, pois, acima uma vez que este é inversamente relatado com o ta-
deste tamanho, é considerado massa, embora alguns manho da lesão que é retirado com a toracotomia. A
autores sugiram o limite de 6 cm. Em aproximada- taxa de sobrevida é superior a 80%, num período de
mente 40 a 50%, tais lesões são malignas, e, em sua cinco (5) anos, quando o tamanho do nódulo é menor
maioria, carcinoma broncogênico. Nos casos de le- do que 3 cm de diâmetro e há ausência de metástases
são benigna, predomina o granuloma de origem in- nos nódulos linfáticos.
fecciosa, e hamatoma é mais raro. Mais recentemente, tem se utilizado a videoto-
Como boa parte dos nódulos solitários são racoscopia para a ressecção de nódulo pulmonar, di-
carcinomas broncogênicos, a sua retirada resultando minuindo o tempo de internação e complicações no
em alta taxa de sobrevida em cinco (5) anos, a toraco- pós-operatório, embora este método não seja consen-
tomia exploratória é freqüentemente considerada e so entre todos os cirurgiões.
indicada. Alguns critérios clínicos podem ajudar a Como observamos, a decisão da conduta fren-
pensar em benignidade e retardar uma possível tora- te a um nódulo solitário do pulmão é difícil e duvido-
cotomia: 1) calcificação no nódulo (distribuição be- sa. A grande maioria dos pneumologistas levam em
nigna). 2) estabilidade do nódulo observado por pelo conta a pCA (probabilidade de câncer). Se for alta,
menos dois (2) anos, através de radiografia do tórax deve-se realizar a toracotomia imediata; no entanto,
ou 3) idade inferior a trinta e cinco (35) anos, em in- se for baixa, pode-se esperar e observar. Outro aspec-
divíduo não fumante. to a ser analisado é a ansiedade do paciente.
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UEHARA C; JAMNIK S & SANTORO IL. Lung Cancer. Medicina, Ribeirão Preto, 31: 266-276, apr./june
1998.
ABSTRACT: The present article reviews basic concepts about diagnosis and treatment of lung
cancer patients. The authors also discuss current aspects of the international literature in the field.
This review is intended to medical students, pulmonologists and family doctors.
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